terça-feira, janeiro 13, 2009

In Verbis tacit

A revista digital InVerbis, deu conhecimento, ontem, da publicidade ao despacho-sentença da juíza de Torres Vedras, sobre o caso Esmeralda. Publicidade essa, feita pelo Conselho Superior da Magistratura, com uma justificação razoável: a de dar a conhecer os motivos da decisão judicial, no sentido de atribuir, agora e efectivamente, a guarda da menor ao pai, tal como já se fizera um ano antes.
O despacho da juíza não foi transcrito, mas apenas mencionadas algumas passagens.
Em função dessa escolha parcimoniosa, alguns media, incluindo blogs, deturparam o próprio comunicado do CSM e deram mais uma vez, uma ideia errada do que se passou, insinuando que o CSM pediu justificações à juiza.
Hoje, o CSM, volta à carga, para tentar repor toda a verdade associada à decisão da juíza, esclarecendo que não foi o CSM quem pediu explicações à juiza.
A questão fora abordada aqui, neste blog, sob essse ponto de vista: o do facto de um juiz, na qualidade de titular de um poder soberano único, ter de pedir autorização a um órgão administrativo, que lhe gere a carreira e os incidentes relacionados com o cumprimento do seu estatuto, para se defender publicamente de ofensas à honra profissional ou mesmo para simples explicações sobre casos concretos que decida e dêem brado público.
Contextualizando com o preceito estatutário sobre o dever de reserva, entendi e entendo que o CSM não devia ter-se substituido ao órgão de soberania.
Os motivos e razões apresentados para a crítica a essa actuação do CSM, estão expostos no postal em causa.
Na revista digital InVerbis, o respectivo postal, sobre tal assunto, foi ontem mesmo suprimido quanto à possibilidade de comentários, porque o Administrador da mesma, entendeu que alguns comentários seriam ofensivos. Para o CSM, pressupõe-se.
Retirando a parte das ofensas a entidades colectivas que representam crime, também pode dizer-se que só ofende quem pode e que a liberdade de expressão para dizer disparates, deveria merecer uma maior amplitude, em casos como este.
Principalmente em casos como este, emblemáticos da amplitude dessa mesma liberdade de expressão.
O CSM não deve ser mais uma vaca sagrada, no domínio das nossas instituições e uma decisão de censura ou de limitação de comentários a propósito do seu papel e função, pode significar outra coisa, ainda mais perigosa: o medo que os juízes têm, de afrontar por pouco que seja e por pequena que seja a eventual ofensa, o seu órgão de disciplina e gestão.
E terão razões para isso, deve dizer-se, porque a susceptibilidade dos conselhos do género e dos seus inspectores, costuma ser acentuada.
Os magistrados, ao contrário dos professores universitários, são avaliados concretamente pelo que escrevem, dizem e fazem, até publicamente se preciso for. O que acrescenta gravidade ao ocorrido, porque este efeito, relativamente aos juízes, retira-lhes autonomia na vontade. Têm de se submeter a um silêncio por medo, puro e simples. Medo que rapidamente tende a transformar-se em imperativo categórico, (na acepção usada pelo presidente do CSM... ).
Nenhum professor universitário, tem este medo integrado no seu modo idiossincrático de ser e proceder. Por isso é que são mais livres e escrevem em blogs e jornais de modo mais livre e desprendido.
A partir do momento em que um juiz, mesmo fora do seu exercício de soberania, se sente inibido em falar abertamente sobre o papel do órgão autónomo e administrativo que o orienta na carreira, eximindo-se a tal, por receio de consequências desagradáveis, disciplinares, está objectivamente diminuido na sua capacidade de expressão e na sua liberdade, o que afronta a sua independência.
Este problema parece-me demasiado sério, porque ainda ontem mesmo, o presidente do sindicato dos juízes não teve qualquer pejo em criticar aberta e publicamente o PGR, Pinto Monteiro, por este ter afirmado numa entrevista ao Correio da Manhã que os magistrados tinham medo, receio, de aplicar a prisão preventiva.
Só que a PGR não é o CSM e duvido muito que o mesmo presidente do sindicato dos juízes fosse capaz de dizer o mesmo do presidente do STJ, por inerência também do CSM. E este, já por diversas vezes fez afirmações bem mais polémicas, no silêncio da ASJP.
Na própria revista InVertbis, se dá conta do tema e se anuncia que o presidente do sindicato dos juízes não tem dúvidas em afirmar que os juízes não têm medo disso, como se pudesse falar com firmeza por todo e qualquer um dos juízes e como se soubesse que nenhum deles tem medo de nada disso, nomeadamente das questões ligadas à nova responsabilidade civil dos juízes. E até dá um recado ao PGR: olhe para a sua casa.
Ora acontece que o nível de comentários nesse postal, designadamente no que se refere ao PGR Pinto Monteiro, não fica nada atrás na qualidade ofensiva de alguns comentários ao mesmo, dos que se puderam ler no postal sobre o CSM.
E aí não foram proibidos comentários...o que de qualquer modo, nem penso que o devessem ser.
Só que...as coisas são como são.

10 comentários:

manuel disse...

Um esclarecimento, talvez desnecessário, para dizer que a decisão (paticamente integral - só lhe foi retirado o que manifestamente não era pertinente ou conveniente ser revelado), divulgada na revista digital inverbis, foi publicada no site da Associação dos Juízes (José chama-lhe Sindicato mas eu não gosto da expressão, dita assim, digamos, um pouco depreciativamente) e não pelo CSM.
O que não quer dizer que eu discorde da possibilidade do CSM assumir essa responsabilidade - porque concordo.

josé disse...

Fica a correcção, para quem ler.

Um sindicato é um termo depreciativo?

Não me parece nada. E a associação não é sindical?

Quanto á intervenção do CSM, claro que há muitos que concordam. É a isso que se pode chamar um reflexo corporativo.

O problema para mim, é o exposto.

e os juízes deveriam ser a última classe de profissionais a admitir o mais pequeno laivo corporativo.

hajapachorra disse...

Os magistrados, ao contrário dos professores universitários, são avaliados concretamente pelo que escrevem, dizem e fazem, até publicamente se preciso for.
Pois, meu caro os profs são avaliados concreta e publicamente, pelos alunos que sob anonimato no fim de cada semestre lhes atribuem uma nota, pelos colegas nacionais e estrangeiros que qualificam as unidades de I&D, pelos jurados que os classificam em provas públicas de mestrado, doutoramento, agregação, e em provas não públicas como concurso para associado ou para a nomeação definitiva que obtêm, quando a obtêm, ao fim de 20, 25 anos de serviço. E deixe de pôr vírgulas entre o sujeito e o predicado que é muito feio.

josé disse...

Os professores universitários não são avaliados no seu desempenho, depois de terem passado a barreira das qualificações académicas, integrando a carreira.

Não é por uma tese de doutoramento, por muito esotérica e especial que seja e ninguém leia, que se adquire capacidade para ensinar no ensino superior.

Não é por um currículo recheado de notas participativas em conferências, artigos de revista etc, que se alcança o estatuto de professor de corpo inteiro.

Não é pelo exercício continuado do magistério, prático que se obtém a qualidade de saber ensinar.

E nisso, os professores universitário, estão muito mais à vontade que os professores do secundário. Estes, mal ou bem, andam a penar para evitar uma avaliação estúpida e estupidificante.

Os professores universitários, em relação aos magistrados, nesse aspecto, têm mesmo muito que comparar.

E saem a ganhar na comparação, porque ninguém os questiona no exercício da sua actividade. Tanto faz terem 90% de reprovações dos seus alunos ( ás vezes até dá um prestígio esquisito, mas dá), do que 10%.
Tanto dá que a maior parte dos alunos reconheça a incapacidade no´tória para ensinar seja o que for, à semelhança de um Paulo FC, do que reconheça que é um bom professor. Este tem mais probabilidade de engorossar a fila dos desempregados, se não estiver inserido no grupo certo, com as pessoas certas.

É assim ou não?

Quanto às vírgulas: vou ter maior atenção, mas não prometo melhorias. A escrita jornalística não me atrai muito e meter uma vírgula entre o sujeito e o predicado até o O´Neill o fazia. E o Pacheco. O Assis, claro. E o Saramago não põe nenhumas, às vezes.

os estilos são assim: é para o que dá.

hajapachorra disse...

Não é questão de estilo, José, é de gramática. Nunca, nunca uma vírgula deve separar o sujeito do predicado. Quanto aos profs. universitários desculpe que lhe diga mas não faz a mínima ideia. Ou faz, julga a floresta pela pequena árvore das faculdades de direito, corpos, em muitos aspectos, ainda estranhos na universitas. Os profs., repito, são avaliados no seu desempenho pedagógico (que é, queira ou não, apenas um parte do seu trabalho), pelos alunos, pelas comissões de avalição externa, pelos superiores hierárquicos (directores de curso e de faculdade) que arbitrariamente podem pôr e dispor da vida de quem tem contratos a prazo, a larguísiima maioria dos prof. doutorados. Um prof. univ. não integra a carreira com o doutoramento, longe disso, muito longe disso. Ganha é um contratozinho de mais cinco anos, findos os quais pode simplesmente ir para o olho da rua, com 25 ou mais anos de serviço. Concursos para associado e para catedrático, com avaliação do currículo e trabalho científico-pedagógico, só se houver vaga. E na maioria das faculdades não há, nem vai haver. Depois do doutoramento aquilo que se pode fazer, aquilo que apenas depende do indivíduo, são as provas de agregação, dois dias de provas públicas de avaliação da lição e do currículo. Na maioria das faculdades quem reprovar 100% dos alunos está lixado. E quem chumbar 50% também. As universidades mudaram muito, meu caro, e duvido que tenha sido para melhor.

josé disse...

Talvez tenha razão, nas universidades, em certas faculdades.

As que conheço não têm avaliação dos professores como deve ser.

Podem ter uma avaliação, segundo critérios específicos e determinados, mas não do mesmo modo que os magistrados têm.

Se um aluno é mal classificado, injustamente, que acontece?

Se as aulas são "dadas" de modo incompetente, sob qualquer ponto de vista pedagógio, que acontece?

Se o professor titular não aparece nas aulas e deixa a tarefa para os "escravos" que acontece?


Se o grau de actualização é fraco ou medíocre, que acontece?

Se o manual é desajustado e a bibliografia toda emprestada em terceira mão a ideias ultrapassadas que acontece?

Se não há experiências práticas decentes e competentes que acontece?

SObre as vírgulas, como questão gramatical fica para mais tarde.

verbojuridico.net disse...

Caro José:

Permita-me um pequeno esclarecimento.

Os comentários foram restringidos neste ponto, não por qualquer possibilidade de ofensa ao CSM (que, obviamente, não se publicaria), mas sim porque entendi restringir todos os comentários que dissessem respeito ao «Caso Esmeralda», como aliás, o tinha também feito no item anteriormente publicado sobre esse caso (encerrando o item).

A razão é unicamente pelo facto de já estarem suficientemente plasmadas as posições dos vários intervenientes sobre o caso e de sucessivamente se repetirem os mesmos argumentos em comentários que nada acrescentam aos anteriormente submetidos pelos mesmos ou outros comentários, alguns deles com natureza ofensiva, sendo reincidente nos últimos tempos alguns comentários gravemente injuriosos e que tivemos necessidade de obstar à sua publicação para evitar a ofensa dos direitos de personalidade de terceiros.

Finalmente, como já referiu o comentador «manuel» o texto publicado nesse item, bem como o texto da decisão foi transcrito do sítio da ASJP, conforme expressamente se fez constar dos créditos do item e não do CSM.

Ou seja, a restrição dos comentários não tem qualquer relação com qualquer observação que fosse tecida a propósito da intervenção do CSM.

Finalmente, a propósito, para constar, o comunicado do CSM encontra-se disponibilizado no respectivo sítio no seguinte endereço: http://www.csm.org.pt/m1/1231760704comunicadon12009.doc

Melhores cumprimentos.
Joel Pereira (Administrador In Verbis)

josé disse...

Caro Joel Pereira:

Entendamo-nos então. O CSM divulgou um comunicado em que aludia ao despacho da juíza. Fê-lo a pedido desta. Foi assim que escrevi, referindo que o CSM resolvera dar publicidade ao despacho da juiza e que tal tinha sido divulgado no InVerbis.

Depois escrevi que o CSM, desagradado com as reacções ao comunicado, decidiu repor a verdade.

A divulgação do despacho pelo CSM ou pelo sindicato ou por outra entidade, não consta do meu postal, embora tal pudesse ser entendido através da palavra publicidade.

Mesmo assim, o teor de ambos os postais sobre o assunto, não se circunscreve a isso, mas estende-se a outro problema que me parece o principal:
o de o CSM aparecer como porta-voz de juízes, por causa de processos concretos que eles decidiram no uso do poder soberano de decidir com independência, imparcialidade e isenção.


Por outro lado, a minha referência ao InVerbis tacit, tem a ver com a circustância de o assunto ter encerrado para comentários, com a justificação de que alguns deles eram ofensivos.

Compreendo, mas coloquei a suposição que tal se deveria a respeitinho ao CSM. Quem me parecia desnecessário e prejudicial até.

Se não foi o caso, fica registado.

Cumprimentos.

hajapachorra disse...

Que é que acontece? Não é renovado o contrato. Quer mais castigo? É encerrado o curso, a secção, o departamento. Quer maior punição? No caso das unidades da FCT - a avaliação é internacional e é publicita no site. Quem fica mal classificado não é subsidiado. Quer mais avaliação? As situações que refere estão longe da realidade, excepto talvez nalgumas fac. de direito. Se os alunos não gostam do professor no fim do semestre dão-lhe nota negativa. Se os programas e os sumários são desadequadas, isso não escapará às comissões de avaliação. E os relatórios lá ficam para penalizar os responsáveis quando convier. Faltar às aulas? Impossível, nem por doença. Quer dizer, faltar até se pode faltar mas as aulas têm de ser dadas na mesma. Não há falta de avaliação, a única coisa que se pode discutir é se ela não pode ser melhor, porque nas univ. as pessoas e serviços são avaliados de todas as formas e feitios, o que pode ter, e tem, efeitos perversos. Todavia tem razão num ponto: não há comparação possível com o mundo dos tribunais.

hajapachorra disse...

Com isto não quero dizer que a universidade portuguesa esteja de saúde. Não está. Mas não é por falta de avaliação. E o pouco que faz já é um verdadeiro milagre. A univ. de Nimega, do tamanho da univ. do Porto, tem um orçamento superior ao de todas as univ. públicas portuguesas no seu conjunto.