A entrevista de Laborinho Lúcio, no Público de hoje, reflecte toda a idiossincrasia da personagem. Laborinho Lúcio é uma das figuras-chave do nosso sistema jurídico actual.
Foi responsável por uma escola de magistratura inspirada na francesa, mas a que ele mesmo, com a sua personalidade própria, soube dar identidade e relevo insofismável. Nos anos oitenta, quando tinha os seus quarentas e já uma larga experiência de magistrado ( como juiz e do MP), vindo do antigo Estatuto Judiciário e com um pé firme nas ideias iluministas do 25 de Abril, Laborinho colaborou na arquitectura do sistema.
Laborinho, nos anos oitenta, até chegar ao Governo de Cavaco, para ministro da Justiça, pela mão de Fernando Nogueira ( que o convidou na base da notoriedade do então director do CEJ), orientou o CEJ, onde formou centenas de magistrados e lhes imprimiu um ideário de tolerância e liberdade, associadas a uma experiência de dúvidas. Laborinho não é um duro da acção penal. Leu muito, reteve mais e transmite um discurso de sedução pela palavra e tom.
Conheço muito poucos magistrados que tendo-o conhecido, não tenham uma boa impressão do mesmo. Conto-me nesse número, também, apreciando o estilo. Que é o Homem, como se costuma dizer.
O conteúdo do discurso, para além do estilo, por vezes, deixa algo a desejar, porque promete e não está à altura da promessa .
Foi responsável por uma escola de magistratura inspirada na francesa, mas a que ele mesmo, com a sua personalidade própria, soube dar identidade e relevo insofismável. Nos anos oitenta, quando tinha os seus quarentas e já uma larga experiência de magistrado ( como juiz e do MP), vindo do antigo Estatuto Judiciário e com um pé firme nas ideias iluministas do 25 de Abril, Laborinho colaborou na arquitectura do sistema.
Laborinho, nos anos oitenta, até chegar ao Governo de Cavaco, para ministro da Justiça, pela mão de Fernando Nogueira ( que o convidou na base da notoriedade do então director do CEJ), orientou o CEJ, onde formou centenas de magistrados e lhes imprimiu um ideário de tolerância e liberdade, associadas a uma experiência de dúvidas. Laborinho não é um duro da acção penal. Leu muito, reteve mais e transmite um discurso de sedução pela palavra e tom.
Conheço muito poucos magistrados que tendo-o conhecido, não tenham uma boa impressão do mesmo. Conto-me nesse número, também, apreciando o estilo. Que é o Homem, como se costuma dizer.
O conteúdo do discurso, para além do estilo, por vezes, deixa algo a desejar, porque promete e não está à altura da promessa .
Assim:
1. Sobre a distinção entre corrupção para acto lícito e ilícito, Laborinho diz o que é possível dizer: que a lei distingue porque a gravidade não é idêntica e a prática deste tipo de ilícitos é tão vulgar e comum que não seria desejável confundir tudo e punir com gravidade . Porém, di-lo até ao ponto em que os entrevistadores lhe dizem: "então, como vamos vencer esta criminalidade ( a do corruptor activo para um acto legalmente admissível)?
Laborinho responde assim:
"Perante este caso concreto, gostaria que a nossa lei tivesse uma previsão mais alargada no ponto de vista da punição da corrupção, justamente pelo tipo de valores que estão envolvidos e pela iniciativa do próprio, ao que parece, em promover a corrupção."
Este é o típico exemplo do discurso de Laborinho: perante a verificação de uma dissonância lógica e que causa alarme comum, diverge no discurso, admitindo a diferenciação, sem compromisso. É uma atitude diplomática, política e de situação.
O exemplo paradigmático da dúvida permanente de Laborinho, pode ler-se nesta passagem:
Há umas teorias que dizem que o direito não tem de repor nenhuma moral, tem é de repor as normas e estas é que são essenciais para haver validade nelas e por isso é que as pessoas devem ser punidas.
Este relativismo, vindo de leituras e confusões, centram-se em noções literárias, com relevo para Camus. As dúvidas humanistas de Laborinho, permitem um discurso interessante, porque maleável e susceptível de alteração e adequação , no quadro sinóptico de referências fundamentais, como a liberdade. Laborinho definiu-se em tempos ( numa entrevista ao Expresso, no tempo em que foi ministro) como adepto da democracia do centro social-democrata. Portanto, com latitude ideológica suficiente, para admitir pertença a diversos partidos em Portugal.
Sobre o caso Freeport, Laborinho refere o fundamental:
Penso que o caso Freeport, como é conhecido, coloca-nos três questões fundamentais, todas elas distintas mas essenciais para compreendermos o funcionamento de tudo isto. A questão mais fundamental de todas é a da investigação, a descoberta da verdade para chegar a uma conclusão. Interessa saber se houve infracção ou não e no caso de ter havido quem foi que a cometeu e qual o tipo das infracções cometidas. Esse é o objectivo da investigação criminal que está a decorrer. Segunda questão, a que cria a expectativa de saber o que terá acontecido ao processo durante quatro anos. Não vou perguntar porque esteve parado porque não sei se esteve, mas perante a opinião pública há uma interrogação: o que aconteceu nesses quatro anos. E do ponto de vista dos direitos de cidadania e da transparência do funcionamento do sistema, isso tem de ser esclarecido. Tem de haver informação no sentido de dizer o que aconteceu durante a investigação.
O que Laborinho não refere, porque não lhe interessará muito, é entrar nos aspectos fundamentais dos métodos de investigação em casos destes. Como é que o MP funciona e interage com a PJ e como é que se desenrolam, na prática, estas investigações. Mas ao dizer que tem de haver informação sobre o que aconteceu durante a investigação, permite que se entenda ter dúvidas sobre o que aconteceu. E essas dúvidas são apenas de uma natureza: saber se o MP e a PJ foram e são independentes do poder político executivo, ao ponto de não terem qualquer entrave, mesmo de ordem subjectiva e psicológica, na investigação, porque é esse o aspecto essencial.
Depois, Laborinho fala na comunicação entre quem decide nos tribunais, essas decisões e a opinião pública e publicada que não as entende. Para dizer que há uma tríplice dimensão nessa relação, relevando a de dentro para fora ( dos tribunais para os cidadãos), como uma obrigação de explicação em linguagem acessível do teor da decisão. E também releva o aspecto da comunicação pelos media. Não disse, mas devia dizer que há um défice acentuado de formação dos jornalistas e que não lhes permite entenderem o discurso jurídico, mesmo descodificado, por carência de formação cultural. Isto é preciso dizer-se porque é um dos problemas fundamentais do jornalismo actual.
Fala depois no Estatuto do MP e o perigo de perda de autonomia, com a correlativa funcionalização de magistrados, por escolha directa do PGR.
As críticas de Laborinho acompanham as do Sindicato do MP e são pertinentes. No entanto, são insuficientes por um motivo: o que está, atribuindo ao DCIAP e DIAP, determinado tipo de processos, com base em classificações legais, não resolve a questão essencial: como se podem fazer determinadas investigações quando os responsáveis por esses departamentos, são pessoas que podem não ter as características necessárias e essenciais de isenção e imparcialidade?
O problema é idêntico e deste modo é que nunca fica resolvido, porque a verdadeira autonomia e independência são apanágio de cada pessoa que não só a têm como interiorizadas, mas também a manifestam como princípio essencial.
E não é isso que acontece, actualmente.
1. Sobre a distinção entre corrupção para acto lícito e ilícito, Laborinho diz o que é possível dizer: que a lei distingue porque a gravidade não é idêntica e a prática deste tipo de ilícitos é tão vulgar e comum que não seria desejável confundir tudo e punir com gravidade . Porém, di-lo até ao ponto em que os entrevistadores lhe dizem: "então, como vamos vencer esta criminalidade ( a do corruptor activo para um acto legalmente admissível)?
Laborinho responde assim:
"Perante este caso concreto, gostaria que a nossa lei tivesse uma previsão mais alargada no ponto de vista da punição da corrupção, justamente pelo tipo de valores que estão envolvidos e pela iniciativa do próprio, ao que parece, em promover a corrupção."
Este é o típico exemplo do discurso de Laborinho: perante a verificação de uma dissonância lógica e que causa alarme comum, diverge no discurso, admitindo a diferenciação, sem compromisso. É uma atitude diplomática, política e de situação.
O exemplo paradigmático da dúvida permanente de Laborinho, pode ler-se nesta passagem:
Há umas teorias que dizem que o direito não tem de repor nenhuma moral, tem é de repor as normas e estas é que são essenciais para haver validade nelas e por isso é que as pessoas devem ser punidas.
Este relativismo, vindo de leituras e confusões, centram-se em noções literárias, com relevo para Camus. As dúvidas humanistas de Laborinho, permitem um discurso interessante, porque maleável e susceptível de alteração e adequação , no quadro sinóptico de referências fundamentais, como a liberdade. Laborinho definiu-se em tempos ( numa entrevista ao Expresso, no tempo em que foi ministro) como adepto da democracia do centro social-democrata. Portanto, com latitude ideológica suficiente, para admitir pertença a diversos partidos em Portugal.
Sobre o caso Freeport, Laborinho refere o fundamental:
Penso que o caso Freeport, como é conhecido, coloca-nos três questões fundamentais, todas elas distintas mas essenciais para compreendermos o funcionamento de tudo isto. A questão mais fundamental de todas é a da investigação, a descoberta da verdade para chegar a uma conclusão. Interessa saber se houve infracção ou não e no caso de ter havido quem foi que a cometeu e qual o tipo das infracções cometidas. Esse é o objectivo da investigação criminal que está a decorrer. Segunda questão, a que cria a expectativa de saber o que terá acontecido ao processo durante quatro anos. Não vou perguntar porque esteve parado porque não sei se esteve, mas perante a opinião pública há uma interrogação: o que aconteceu nesses quatro anos. E do ponto de vista dos direitos de cidadania e da transparência do funcionamento do sistema, isso tem de ser esclarecido. Tem de haver informação no sentido de dizer o que aconteceu durante a investigação.
O que Laborinho não refere, porque não lhe interessará muito, é entrar nos aspectos fundamentais dos métodos de investigação em casos destes. Como é que o MP funciona e interage com a PJ e como é que se desenrolam, na prática, estas investigações. Mas ao dizer que tem de haver informação sobre o que aconteceu durante a investigação, permite que se entenda ter dúvidas sobre o que aconteceu. E essas dúvidas são apenas de uma natureza: saber se o MP e a PJ foram e são independentes do poder político executivo, ao ponto de não terem qualquer entrave, mesmo de ordem subjectiva e psicológica, na investigação, porque é esse o aspecto essencial.
Depois, Laborinho fala na comunicação entre quem decide nos tribunais, essas decisões e a opinião pública e publicada que não as entende. Para dizer que há uma tríplice dimensão nessa relação, relevando a de dentro para fora ( dos tribunais para os cidadãos), como uma obrigação de explicação em linguagem acessível do teor da decisão. E também releva o aspecto da comunicação pelos media. Não disse, mas devia dizer que há um défice acentuado de formação dos jornalistas e que não lhes permite entenderem o discurso jurídico, mesmo descodificado, por carência de formação cultural. Isto é preciso dizer-se porque é um dos problemas fundamentais do jornalismo actual.
Fala depois no Estatuto do MP e o perigo de perda de autonomia, com a correlativa funcionalização de magistrados, por escolha directa do PGR.
As críticas de Laborinho acompanham as do Sindicato do MP e são pertinentes. No entanto, são insuficientes por um motivo: o que está, atribuindo ao DCIAP e DIAP, determinado tipo de processos, com base em classificações legais, não resolve a questão essencial: como se podem fazer determinadas investigações quando os responsáveis por esses departamentos, são pessoas que podem não ter as características necessárias e essenciais de isenção e imparcialidade?
O problema é idêntico e deste modo é que nunca fica resolvido, porque a verdadeira autonomia e independência são apanágio de cada pessoa que não só a têm como interiorizadas, mas também a manifestam como princípio essencial.
E não é isso que acontece, actualmente.
Gostei imenso. Mais palavras para que?
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