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quinta-feira, setembro 10, 2009

Berlusconi e José S.

Há quinze anos que Berlusconi, de 73 anos, ocupa a ribalta da cena política italiana.
O jornal La Repubblica de ontem, trazia uma notícia sobre suspeitas de conluio com a Mafia, na altura da formação da Forza Italia, em 1984, pouco tempo depois da morte dos dois mais célebres juizes anti-mafia, Falcone e Borselino. Depoimentos de arrependidos dão conta de estranhas coincidências de pactos entre políticos e mafiosos nesse tempo em que nasceu a Forza Italia que ganhou eleições a seguir.

Seja como for, Berlusconi, encontra-se encostado a uma parede, empurrado por alguns...jornais, com destaque para o La Repubblica.
De há vários meses a esta parte, o jornal pertença de um dos poucos grupos de media que Berlusconi não domina ( toda a rede de tv é dele, em quase 90% e os jornais, na esmagadora maioria, pertencem a grupos que o mesmo domina), tem noticiado de modo intensivo e em reportagens obstinadas que nenhum Sol, Público ou TVI se atreveram a fazer neste país em relação a um primeiro-ministro.
Mais: o jornal italiano pegou na história de vida privada do "cavaliere" primeiro ministro e fustiga-o todos os dias com notícias de arrasar sobre os seus vícios privados e fraquezas públicas que qualifica de "satyriasis" senil. A acusação repetida e repescada tem a ver com a frequência de jovenzitas e prostitutas, para satisfação das necessidades sexuais de sua emittenza. Reportagens fotográficas, das villas do cavaliere, em Roma, Porto Cervo ou Milão que conduziram a mulher de Berlusconi a pedir publicamente o divórcio e até a que uma filha vituperasse publicamente o comportamento do pai, ao mesmo tempo que admitia que os comportamentos privados de figuras públicas, evidentemente se tornam públicos. Lógico e de senso comum.
Para agravar o panorama, Berlusconi meteu-se com a Igreja Católica, através de um jornal que lhe pertence. Il Giornale publicou um relato anónimo encalacrando o director do jornal católico LAvvenire, acusando-o de homosexualidade e ao mesmo tempo traição conjugal. O director, foi obrigado a demitir-se e ficou entornado o caldo na Igreja de Roma, com possíveis reflexos eleitorais.
A cereja no topo do bolo dos escândalos foi colocada por uma jovem aspirante a actriz, Noemia Letizia que chamava Papi a Berlusconi, a quem o verdadeiro pai apresentou e que participou numa festa de aniversário dos seus 18 anos, em situação pouco recomenável e que permitiu à mulher de Berlusconi denunciar a companhia deste com menores...

Além disto, pelo menos duas "acompanhantes de luxo" já se pronunciaram sobre a participação em festas privadas com pormenores picantes. O último conhecido é a existência de uma gravação entre duas ministras de Berlusconi. Mara Carfagna, antiga miss e Maria Stella Gelmini, trocaram conselhos que ficaram gravados, sobre a melhor maneira de satisfazer Berlusconi...mas em assuntos íntimos e fora do governo. A gravação ainda não foi tornada pública mas o Nouvel Observateur ( de 3-9 Setembro 2009) escreve que poderá vir a sê-lo.

Tudo isto tem sido noticiado com fotos captadas por papparazzi ( Zappadu que tirou fotos de acompanhantes em trajes menores na villa Certosa, de Berlusconi, na Sardenha) e revelações que já correram mundo.
Em Espanha o El Pais da Prisa, pegou no assunto e tem-no glosado até à exaustão. Em Inglaterra, o Guardian idem. Em França, o Nouvel Observateur, aussi. E até a Time já se interessou pelo assunto.
Em Portugal ninguém parece ligar muito. E muito menos ao facto de Berlusconi ter já processado meio mundo da imprensa italiana hostil e , claro, o Nouvel Observateur e o El Pais da Prisa que por cá se diverte a censurar o programa da TVI de notícias desagradáveis para o primeiro-ministro local e nem sequer são de natureza privada ou íntima. Vergonha da Prisa? Nenhuma. O antigo jornalista Cebrián não tem disso para mostra a ninguém.

Por causa de tudo isto e mais outras coisas, o La Repubblica tem publicado diariamente uma série de dez perguntas dirigidas a Berlusconi.
As primeira começam assim: Quando teve oportunidade de conhecer Nomei Letizia? Quantas vezes teve oportunidade de a encontrar e onde? Frequentou ou frequenta outras menores?
E ainda outra: qual a razão que o obrigou a não dizer a verdade durante quatro meses fornecendo quatro versões diferentes para o conhecimento de Noemi?

E segue por ali fora, num requisitório que em Portugal seria entendido por uma grave ingerência na vida privada de um político e um autêntico jornalismo de "sarjeta" por entrar na intimidade irredutível de um político.

Isto faz lembrar o quê, afinal? As notícias sobre a licenciatura do primeiro-ministro? Sobre as suspeitas que incidem em seus familiares directos, no caso Freeport? No caso Cova da Beira?

Pode fazer lembrar tudo isso e ainda mais: tal como Berlusconi, em Itália, também José S. negou e negou e accionou judicialmente os que escreveram mal dele, sobre esses assuntos.

José S, aqui em Portugal, com a conivência passiva da opinião pública que não é informada, conseguiu o que Berlusconi, com o seu imenso poder, não tem conseguido em Itália: calar a voz da imprensa livre, pelo menos de alguma e evitar que falem mal dele nesses aspectos que são uma verdadeira chatice. O modo como comentou com Louçã o episódio, captado pelos microfones da TVI, é exemplar da desfaçatez de um primeiro-ministro sem ponta de vergonha.


Por cá, a conclusão é evidente: não há imprensa livre, como em Itália.

Em Itália, tal como em Portugal, o primeiro-ministro Berlusconi, tem armado em vítima de cabalas e desinformação e tem processado a imprensa que o incomoda, pedindo milhões para amedrontar. Isso apesar de deter mais de 90% da tv e de uma parte importante de toda a imprensa de grande circulação que obviamente não publicam uma linha sobre o assunto.

Seria talvez caso para aconselhar Berlusconi a perguntar a José S. como faz aqui, em Portugal para evitar essas cabalas. Pedir conselhos à Prisa pode valer a pena, mas não adianta porque a Prisa é a TVI espanhola, para o italiano, e que este aliás processou por esse motivo.

Em relação aos italianos, Umberto Eco disse num artigo no L´Espresso, repescado pelo Guardian de Londres que a culpa era mesmo dos italianos que aceitam Berlusconi e votam nele. " Se a sociedade italiana permitiu a Berlusconi governar com todos os conflitos de interesses e de todo o seu comportamento controverso, porquê atirarem-se a ele em vez de à sociedade?"

Boa pergunta, de facto.
E em Portugal como é?

11 comentários:

  1. Permita-me a brincadeira, pois tanta desgraça não se mata sem um sorriso ...
    A esta hora está José Sócrates a dizer assim :
    - Ai aquele JOSÉ do PORTA DA LOJA é tão injusto... há lá comparação entre mim, que aplico no meu guarda roupa e adereços o dinheiro que sofridamente ganho neste Portugal que tão mal me compreende a alma e aquele Berlusconi que o gasta no guarda roupa e adereços femininos alheios...

    Melhor é que Socrates não se aconselhe com Berlusconi sobre "cabala", pois se já sofremos tanto estrago, sem bala, que seria se alguém o armasse ...
    :-)
    Seria um pesadelo, já imaginou, uma aspirante a actriz, junto de JS a pedir "papi, que tal umas parcelinhas do IRS dos portugas de classe "média" na minha nova metragem ...
    ... apoio à cultura...
    as mocinhas também o merecem ...
    :-)
    Eu peço desculpa, não consegui fugir ao gracejo.
    Contudo o tema é forte, o texto excelente, a comparação assertiva e a interrogação pernitente...
    Nas diferenças de forma há substâncias de fundo claramente similares materialmente e a questão é mesmo saber:
    como deve a comunidade lidar com isso?
    Cumps

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  2. Fazendo o contrário do que fazem os italianos.Não votando nele e votando na Manela que é séria e sem vícios.Ao contrário dos italianos que têm de optar entre o Berlusconi e a "esquerda",entre o Inferno e o Forno Crematório,os portugueses têm a sorte de o PSD não ter sido para já tomado de assalto pelos berlusconianos que por lá pululam e fazem tudo,mas mesmo tudo,para que ela perca e o Berlusconi da esquerda modernaça nacional triunfe.Se não agarrarmos a oportunidade agora por causa de minhoquices, no futuro só teremos como opção Berluscona e Berluscono.

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  3. Os dois heróicos magistrados foram assassinados em 1992.

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  4. O La Repubblica não merece quaisquer encómios. O jornal de referência da esquerda transalpina bem pensante ataca Berlusconi por ser de direita. Alguma vez o jornal denunciou os inúmeros podres do anterior governo do sinistro Prodi?
    Leio frequentemente críticas aos italianos por votarem em Berlusconi. Pensem no que seria ter em Portugal um governo de coligação PS-PCP-BE, equivalente ao que, com nuances, suportaram os italianos durante quatro longos anos. Ainda por cima com um presidente (eleito pelo parlamento) comunista!
    Entre vícios privados e desgoverno público os italianos fizeram a sua escolha.

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  5. That´s not the point.

    O point neste caso, é o facto de um jornal italiano ( que aprecio mesmo sendo de esquerda centralizada) escrever desde há quatro meses a esta parte artigos vitriólicos para a reputação pessoal de Berlusconi e não ser possível a este, calá-lo como por aqui este execrável José S. fez com quase toda a imprensa e agora a TVI.
    Com um método bem mais eficaz: minar economicamente e aproveitar a debilidade dos media portugueses.

    Além disso, quanto a Berlusconi, já há antecedentes: a Economist, há uns anos colocou na capa o destaque essencial: esse indivíduo não ser digno de ser PM de um país europeu. Meses depois, voltou a ganhar eleições e processou a revista por essa campanha. Perdeu, mas agora a coisa reacendeu-se.

    Hoje, ( ontem) o La Repubblica publica na primeira página este título: "tutte le escort di Berlusconi"

    Imaginem um título idêntico do Público para este PM que temos...

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  6. Alguém tem qualquer dúvida que José S. tentou acabar com o Sol, manobrando para que os angolanos o comprassem?

    Eu não tenho.

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  7. Eu não José, até acabou com o Independente!

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  8. não há imprensa livre, como em Itália
    Hmmm... Acho uma conclusão um tanto precipitada. Pela seguinte razão: O homem pode ser bom lá no que é bom, o que não será coisa boa, mas tem a complacência de 10 milhões, menos meia dúzia. Mais que a complacência, parece até que tem 37% de apoio.
    O que se passa em Itália, que continuo a achar que será sempre fraco exemplo, pode dever-se a obstinação de um jornal e dois ou três jornalistas, não à particularmente grande liberdade de imprensa.
    Aliás José, no post seguinte, "Uma anomia que se estende a todo um povo". Pois é o que eu acho. A verdade é que o homem tem tido pouco trabalho. Fala em "campanha negra" e resolve logo o problema e isso, face à dimensão do seu curriculum, é que não é normal. -- JRF

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  9. A liberdade de imprensa é desde logo a liberdade de criticar e investigar casos incómodos como o Freeport, Cova da Beira, licenciatura etc etc.

    Há liberdade objectiva na maioria dos media portugueses, sem a oposição activa e massacrante do PS e do governo e apaniguados?

    Não há. E a prova é o que se passou com a TVI e está a passar-se com o Público,num silêncio cúmplice e de medo.
    O SOl, um dia destes, é dos angolanos, pelo mesmo motivo.

    Quem é que incentivou ou promoveu isto mesmo?

    É preciso responder?

    Mais: quem é que determina o silêncio e o respeitinho dos restantes media, através da nomeação de talking heads e de abúlicos para a direcção dos mesmos?

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  10. Eu, hoje 11 de Setembro, não me acredito que a forma como foi tratada (e já desapareceu) nas notícias o caso TVI/MMG, se deva apenas aos bons ofícios do senhor Sócrates e os seus insuportáveis apaniguados. No jornalismo há muito sabujo e muito sacanita, sempre disposto a dar uma mãozinha para enterrar o próximo e subir mais um degrauzinho lá na hierarquia.
    Pode dar jeito aos politiqueiros, que podem até cultivar esse estado de coisas, mas aproveitam-se de um meio, não o criaram totalmente. Estou certo? -- JRF

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  11. Caro José, eu concordo com a comparação no que diz respeito à possibilidade de a imprensa italiana poder ir ao fundo das suas críticas (o que era o objectivo do seu texto),em contraste comapressão insana do nosso governo e da candura indigna danossa imprensa. O que quis frisar foi que o La Repubblica não o faz por amor denodado à verdade e à ética mas por jogo político.
    A Itália em termos de liberdade de expressão é um caso à parte. Lembro-me de uma entrevista do comunista L'Unità a Fini, quando este era ainda o líder do MSI. Alguém imagina o Avante fazer uma entrevista a José Pinto Coelho?
    De resto, um país que permite logo após a queda do fascismo e o fim da guerra que um partido assumidamente neo-fascista concorra a eleições é um caso incomum.
    Com todas as suas contradições, escândalos, máfias, partidocracia, etc., continuo a achar que se há ainda esperança de a Europa não cair de vez na ditadura do politicamente correcto - essa esperança reside na Itália.

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