Noronha Nascimento deu duas entrevistas às tv´s ( afinal deu mesmo três, incluindo a TVI) e disse algumas coisas interessantes mas ficou ainda quase tudo por esclarecer, nos aspectos técnicos e até mesmo teóricos.
Em primeiro lugar, Noronha Nascimento referiu que tomou conhecimento das primeiras escutas, em 5 de Agosto. Estava nos Açores e regressou, interrompendo as férias e foi para o Douro., estudar o assunto. Demorou semanas, em plena campanha eleitoral . No entanto, pelo meio, ainda arranjou tempo para vituperar a atitude da Associação Sindical dos Juizes, acusando-os de quererem interferir no processo político, por causa do assunto Rui Teixeira versus CSM. Este timing é precioso para se analisar a actuação "técnica" de Noronha Nascimento. Imputou à Associação Sindical um processo de intenção, numa altura em que a sua actuação, para além de técnica, era iminentemente política perante os envolvidos e o assunto em causa. Isto parece-me indesmentível e Noronha Nascimento, objectivamente desvalorizou os indícios que vinham nas escutas, mesmo as que apreciou ( e não apreciou todas ao contrário do PGR, sabe-se agora).
Além disso, ainda disse que perguntou a dois colegas da secção criminal do STJ a opinião dos mesmos sobre o assunto. Diga-se que Noronha Nascimento foi quase sempre juiz "do cível" e declarou recentemente que abominava o crime e não sentia vocação para julgar em crime. Nunca gostou de julgar crime. Percebe-se por isso que tenha consultado dois colegas da secção criminal do STJ. Pelo andar da carruagem há pelo menos dois colegas que não terão sido consultados. Escrevem em blogs e um deles já disse que tem muitas dúvidas sobre a legalidade dos despachos de Noronha Nascimento.
Ora o que estes dois colegas não identificados ( e que Noronha Nascimento poderia identificar, já agora, para se saber quem são tais juristas) disseram ao presidente do STJ terá servido para o mesmo justificar o despacho que exarou e que agora afirmou ser matéria sufragada por "vários juristas". Vários? Quem, afinal? E a opinião de Costa Andrade, porventura o maior especialista nesta matéria e que escreveu um artigo no Público, antes do último despacho de Noronha Nascimento? Não serve esta opinião, nem sequer para rebater? E perante essa opinião, deixa-se transitar um despacho com essa importância ( se se der de barato que tem validade, o que continuo a duvidar) e não se interpõe um recurso para o Tribunal Constitucional, numa matéria tão sensível como esta?
Chegados aqui, há perguntas a colocar sobre o timing destes despachos e decisões: ocorreram quase todos, no essencial, antes e durante todo o período de campanha eleitoral, quando se discutia em público, assuntos como as escutas ao PR e coisas assim.
Objectivamente, o PGR e o presidente do STJ, optaram por decidir de modo aparentemente estranho porque não habitual, algo que poderia fazer toda a diferença eleitoral nessa altura. Os magistrados que guardaram segredo fizeram muito bem. Mas guardar segredo para além do habitual e do exigível, passando a actuações nada habituais e reservadas a um círculo restritíssimo quando isso nunca ocorreu, levanta óbvias questões para saber se esses magistrados se preocuparam demais e por isso com o efeito que pretendiam evitar mas de sentido contrário...
Depois, Noronha Nascimento referiu que os magistrados de Aveiro, nos seus despachos, reportam-se a "dezenas, dezenas, dezenas, dezenas e dezenas" ( cinco vezes dezenas) de escutas e ele, Noronha, apenas apreciou uma dúzia! E ainda acentuou outro pormenor que se torna espantoso: disse para quem quis ouvir que as escutas não são provas, serão quando muito meios de obtenção de prova. E depois acrescenta que nas escutas que ouviu , -mas não ouviu todas, confessadamente-, não havia provas de crime algum...e ainda apresentou um exemplo ou dois, sobre o assunto. Disse que se por acaso houver uma escuta em que alguém diz a um terceito que outrém cometeu um crime de corrupção ou até um homicídio, essa escuta nada vale porque terá que se complementar com outras provas.
Isto é extraordinário porque permite o seguinte entendimento: na avaliação das escutas em que o PM interveio, só haveria validação das mesmas se estas fossem a prova do crime em causa, ou melhor, se na mesma houvesse elementos suficientes de prova de um crime! E no entanto, o presidente do STJ, acha e escreveu e disse-o agora, que as escutas são um meio de obtenção de prova. Mas precisa de provas concretas para as entender como válidas...e como acha que não existiam porque afinal não é o titular do inquérito e só lhe apresentaram as escutas em que o PM interveio, achou que não mereciam ser meio de prova porque não tinham provas para ser...meio de prova. Entenderam bem este raciocínio do presidente do STJ?
Pois foi assim mesmo. E ainda se referiu ao crime em causa como de "golpe de estado por meio não violento" , para dizer que disto nada viu nem sombra.
Este raciocínio extraordinário ainda se complementa com outros factos, referidos na entrevista:
Recebeu o expediente do PGR, relativo às escutas, num molho de papéis avulsos e "às bochechas", como aprimorou por entender que há feminino na expressão...
Pois esse expediente às bochechas fora recebido anteriormente na PGR. O PGR analisou em primeira mão e ao contrário do que foi indicado nos despachos dos magistrados de Aveiro, titulares do processo de onde extrairam uma certidão, arquivou liminarmente esse expediente, por motivos que não foram ainda explicados cabalmente. Quer dizer, há aqui um ponto importante a ponderar:
O expediente de Aveiro, com os despachos dos magistrados, era para para autuar de modo autónomo ou era também para ser submetido ao presidente do STJ para apreciação da validade das escutas em que interveio o primeiro-ministro?
Parece que seria para ser autuado de modo autónomo, como outro inquérito porque só assim faria sentido. A não ser que fosse extraído de outro inquérito para investigação do crime de atentado ao estado de direito conexo com os crimes de corrupção em investigação no Face Oculta. E ainda assim, então, não precisava de passar pela mão do PGR, mas poderia ter sido remetido para a secção criminal do STJ, para o MP, na medida em que o presidente do STJ era o juiz de instrução competente para tal apreciação.
Assim, temos a primeira grande dúvida. Sabendo que Pinto Monteiro não autuou como inquérito o expediente por achar que não havia "indícios probatórios" que os magistrados de Aveiro entenderam existir, porque razão submeteu o expediente com esse despacho de arquivamento liminar, à apreciação do presidente do STJ?
Seria para ponderação de outros eventuais indícios e para que o presidente do STJ visse algo que o PGR não lobrigasse? Não parece nada porque o titular da acção penal é o MP e não o presidente do STJ. E este, segundo agora disse melhor, só apreciou as certidões relativas a escutas em que interveio o PM. Então, quid juris?
Que valor poderá ter o despacho jurisdicional do presidente do STJ, num expediente já arquivado no MP? E que não poderia fazer parte, por isso mesmo, do processo de Aveiro, como o presidente do STJ afirmou hoje às tv´s ?
Estas questões continuam por responder.
E parecem-me inteiramente legítimas.
Em primeiro lugar, Noronha Nascimento referiu que tomou conhecimento das primeiras escutas, em 5 de Agosto. Estava nos Açores e regressou, interrompendo as férias e foi para o Douro., estudar o assunto. Demorou semanas, em plena campanha eleitoral . No entanto, pelo meio, ainda arranjou tempo para vituperar a atitude da Associação Sindical dos Juizes, acusando-os de quererem interferir no processo político, por causa do assunto Rui Teixeira versus CSM. Este timing é precioso para se analisar a actuação "técnica" de Noronha Nascimento. Imputou à Associação Sindical um processo de intenção, numa altura em que a sua actuação, para além de técnica, era iminentemente política perante os envolvidos e o assunto em causa. Isto parece-me indesmentível e Noronha Nascimento, objectivamente desvalorizou os indícios que vinham nas escutas, mesmo as que apreciou ( e não apreciou todas ao contrário do PGR, sabe-se agora).
Além disso, ainda disse que perguntou a dois colegas da secção criminal do STJ a opinião dos mesmos sobre o assunto. Diga-se que Noronha Nascimento foi quase sempre juiz "do cível" e declarou recentemente que abominava o crime e não sentia vocação para julgar em crime. Nunca gostou de julgar crime. Percebe-se por isso que tenha consultado dois colegas da secção criminal do STJ. Pelo andar da carruagem há pelo menos dois colegas que não terão sido consultados. Escrevem em blogs e um deles já disse que tem muitas dúvidas sobre a legalidade dos despachos de Noronha Nascimento.
Ora o que estes dois colegas não identificados ( e que Noronha Nascimento poderia identificar, já agora, para se saber quem são tais juristas) disseram ao presidente do STJ terá servido para o mesmo justificar o despacho que exarou e que agora afirmou ser matéria sufragada por "vários juristas". Vários? Quem, afinal? E a opinião de Costa Andrade, porventura o maior especialista nesta matéria e que escreveu um artigo no Público, antes do último despacho de Noronha Nascimento? Não serve esta opinião, nem sequer para rebater? E perante essa opinião, deixa-se transitar um despacho com essa importância ( se se der de barato que tem validade, o que continuo a duvidar) e não se interpõe um recurso para o Tribunal Constitucional, numa matéria tão sensível como esta?
Chegados aqui, há perguntas a colocar sobre o timing destes despachos e decisões: ocorreram quase todos, no essencial, antes e durante todo o período de campanha eleitoral, quando se discutia em público, assuntos como as escutas ao PR e coisas assim.
Objectivamente, o PGR e o presidente do STJ, optaram por decidir de modo aparentemente estranho porque não habitual, algo que poderia fazer toda a diferença eleitoral nessa altura. Os magistrados que guardaram segredo fizeram muito bem. Mas guardar segredo para além do habitual e do exigível, passando a actuações nada habituais e reservadas a um círculo restritíssimo quando isso nunca ocorreu, levanta óbvias questões para saber se esses magistrados se preocuparam demais e por isso com o efeito que pretendiam evitar mas de sentido contrário...
Depois, Noronha Nascimento referiu que os magistrados de Aveiro, nos seus despachos, reportam-se a "dezenas, dezenas, dezenas, dezenas e dezenas" ( cinco vezes dezenas) de escutas e ele, Noronha, apenas apreciou uma dúzia! E ainda acentuou outro pormenor que se torna espantoso: disse para quem quis ouvir que as escutas não são provas, serão quando muito meios de obtenção de prova. E depois acrescenta que nas escutas que ouviu , -mas não ouviu todas, confessadamente-, não havia provas de crime algum...e ainda apresentou um exemplo ou dois, sobre o assunto. Disse que se por acaso houver uma escuta em que alguém diz a um terceito que outrém cometeu um crime de corrupção ou até um homicídio, essa escuta nada vale porque terá que se complementar com outras provas.
Isto é extraordinário porque permite o seguinte entendimento: na avaliação das escutas em que o PM interveio, só haveria validação das mesmas se estas fossem a prova do crime em causa, ou melhor, se na mesma houvesse elementos suficientes de prova de um crime! E no entanto, o presidente do STJ, acha e escreveu e disse-o agora, que as escutas são um meio de obtenção de prova. Mas precisa de provas concretas para as entender como válidas...e como acha que não existiam porque afinal não é o titular do inquérito e só lhe apresentaram as escutas em que o PM interveio, achou que não mereciam ser meio de prova porque não tinham provas para ser...meio de prova. Entenderam bem este raciocínio do presidente do STJ?
Pois foi assim mesmo. E ainda se referiu ao crime em causa como de "golpe de estado por meio não violento" , para dizer que disto nada viu nem sombra.
Este raciocínio extraordinário ainda se complementa com outros factos, referidos na entrevista:
Recebeu o expediente do PGR, relativo às escutas, num molho de papéis avulsos e "às bochechas", como aprimorou por entender que há feminino na expressão...
Pois esse expediente às bochechas fora recebido anteriormente na PGR. O PGR analisou em primeira mão e ao contrário do que foi indicado nos despachos dos magistrados de Aveiro, titulares do processo de onde extrairam uma certidão, arquivou liminarmente esse expediente, por motivos que não foram ainda explicados cabalmente. Quer dizer, há aqui um ponto importante a ponderar:
O expediente de Aveiro, com os despachos dos magistrados, era para para autuar de modo autónomo ou era também para ser submetido ao presidente do STJ para apreciação da validade das escutas em que interveio o primeiro-ministro?
Parece que seria para ser autuado de modo autónomo, como outro inquérito porque só assim faria sentido. A não ser que fosse extraído de outro inquérito para investigação do crime de atentado ao estado de direito conexo com os crimes de corrupção em investigação no Face Oculta. E ainda assim, então, não precisava de passar pela mão do PGR, mas poderia ter sido remetido para a secção criminal do STJ, para o MP, na medida em que o presidente do STJ era o juiz de instrução competente para tal apreciação.
Assim, temos a primeira grande dúvida. Sabendo que Pinto Monteiro não autuou como inquérito o expediente por achar que não havia "indícios probatórios" que os magistrados de Aveiro entenderam existir, porque razão submeteu o expediente com esse despacho de arquivamento liminar, à apreciação do presidente do STJ?
Seria para ponderação de outros eventuais indícios e para que o presidente do STJ visse algo que o PGR não lobrigasse? Não parece nada porque o titular da acção penal é o MP e não o presidente do STJ. E este, segundo agora disse melhor, só apreciou as certidões relativas a escutas em que interveio o PM. Então, quid juris?
Que valor poderá ter o despacho jurisdicional do presidente do STJ, num expediente já arquivado no MP? E que não poderia fazer parte, por isso mesmo, do processo de Aveiro, como o presidente do STJ afirmou hoje às tv´s ?
Estas questões continuam por responder.
"Escrevem em blogs e um deles já disse que tem muitas dúvidas sobre a legalidade dos despachos de Noronha Nascimento"
ResponderEliminarPois, o PGR tambem não gosta de blogs...
José,
ResponderEliminarafinal, a prevalência (imposição) do "interesse público" é só no futebol?
Para despromoverem o Gil Vicente, que lançou uma providência cautelar, não alegaram, FPF e tutela, a supremacia do interesse público para os campeonatos começarem?
Foram 3 entrevistas (também à TVI24 às 23h), mas no essencial idêntica às duas referidas.
ResponderEliminarManuel Soares
Vou, com licença, continuar aqui um diálogo que estava a ter com o José na caixa de comentários anterior.
ResponderEliminarSe há um só inquérito e processo - o de Aveiro - isso significará, em primeiro lugar, que o titular do mesmo é o magistrado do ministério público no Baixo Vouga e isto não só relativamente ao caso da sucata, mas também ao caso das escutas (TVI).
Mas se é assim por que diabo é que o PGR que não é titular do inquérito andou a proferir despachos de arquivamento relativamente ao caso das escutas? Com que competências? Ao abrigo de que normas legais? Ou estou a ver mal ou parece-me que tais despachos do PGR só poderiam existir se tivesse havido um inquérito autónomo relativamente ao qual o PGR fosse competente. Certo?
Mais, se o processo é único e passa-se em Aveiro significa isso que o primeiro-ministro ainda está a ser investigado porque parantemente o MP de Aveiro ainda não arquivou o inquérito na parte relativa às escutas? Por outras palavras, se há um único inquérito em que situação se encontra o caso das escutas (em investigação ou arquivado?.
Ai o expediente às bochechas.
ResponderEliminarahahahahahha
JB:
ResponderEliminarAbsolutamente correcto.
Por isso é que o PGR deve dar explicações, porque poderá até ter enganado o presidente do STJ.
Este, segundo disse ontem, acha que despachou no processo de Aveiro. Ora não é isso que sucede porque o juiz de Aveiro pediu o processo administrativo 62/2009, autuado ( e arquivado na PGR) e isso significa que não era uma extensão do processo de Aveiro ( como lhe chama Noronha Nascimento) o que estava em causa.
Se ler o que escrevi aqui desde o primeiro dia em que esta polémica estalou, foi sempre isto que disse: ou há inquérito de Aveiro ou é um inquérito autónomo, mas pelo modo de proceder do PGR e pelos despachos dos magistrados de Aveiro é de um processo autónomo o que se trata e o PGR pode muito bem ter confundido as coisas...ou não.,
É isto que precisa de ser esclarecido até para se considerar válido ou não o que o presidente do STJ escreveu e despachou.
Pinto Monteiro está numa camisa de sete varas ( salvo seja, mas é assim mesmo).
ALiás, não é só ele. Há outro persogem: o vice-procurador geral.