Segundo vai sendo notícia, na França de Sarkozy corre um escândalo político de contornos difuos e ao mesmo tempo paradigmáticos.
Um ministro de grande prestígio e confiança do presidente, Eric Woerth, é suspeito de encobrir uma fraude fiscal atribuida à maior ricaça do hexágono, Liliane Bettencourt, cabeça de casal da L´Oréal. Como isso? A mulher de Woerth é conselheira financeira e fiscal da milionária, numa forma que gere a fortuna desta. A firma, de aconselhamento e consultadoria, da qual é directora, esqueceu-se de aconselhar a declaração às finanças gaulesas, de dinheiros e uma ilha que aquela detém no Pacífico.
Esse pequeno esquecimento não devia ter sucedido e a mulher de Woerth é suspeita de ter dito qualquer coisa sobre o assunto ao marido, em conversas particulares, está bom de ver, eventualmente de pé-de-orelha.
O ministro nega tudo, apresenta-se como incorruptivel e de honestidade a toda a prova e acima de suspeitas de conversas de pé-de-orelha.
Como é que tudo isto se soube e resultou em escândalo? Por causa de umas malfadadas escutas de conversas particulares, gravadas por um mordomo e divulgadas na imprensa. Nas escutas gravadas, Woerth é apresentado como "um amigo" de confiança da milionária e portanto garantia de tranquilidade na putativa ilegalidade fiscal.
E porquê, se a Justiça gaulesa é independente do poder político? Ora aí está um ponto em que os portugueses se podem interrogar com alguma perplexidade. Mas explica-se rapidamente: o Ministério Público francês, o Parquet, depende todinho do Executivo. E o Guardador dos selos é amigo de quem? De quem o nomeia, está bom de ver e de quem depende pessoal e institucionalmente. E que tem a ver com isso? É que parece mesmo ser amigo, segundo as tais escutas ilegais...
Quem é que pretende para Portugal um sistema assim como este? Um tal Proença anda sempre a reclamá-lo e vai-se percebendo porquê.
Esta leve suspeita sustentada nas malfadadas escutas, eventualmente criminais e com uso extenso nos media gauleses, como prova plausível, suscita novamente o problema da privacidade dos políticos e dos meios de prova para redundar as suspeitas de más práticas e de ofensa à ética, mesmo a republicana, laica e pouco socialista como é a francesa dos tempos que passam.
Por cá, o que sucederia a um caso destes? Nada. Já teria aparecido meia dúzia de constitucionalistas a declarar solenemente que esse tipo publicidadede denuncidadora de uma invasão da privacidade, para além de horroroso, seria de inconstitucionalidade incontestável, porque derivada de um crime nefando- o de gravações ilícitas que o nosso Código Penal ( artº 199º) pune com pena de prisão até um ano e multa até 240 dias ( o mesmo que conduzir uma motorizada sem carão da câmara).
Por cá já teriam sido publicados vários artigos em jornais, da autoria provável de um Germano Marques da Silva e de uma Fernanda Palma, com o apoio, desta vez, de Costa Andrade, a jurar por escrito que o Código de Processo Penal não permitia o uso dessas gravações, nem sequer num processo penal.
E perante estes abalizados pareceres jurídico-constitucionais, o facto desaparecia do mundo da realidade, passando a uma ocorrência virtual sem significado algum que se visse, porque "nulo e de nenhum efeito".
Por cá, os culpados nunca são os mordomos porque essa classe profissional não existe.
Mas existem mordomias até dizer chega...o que é pelo menos incongruente.
Elementar meu caro José ;-)
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