Páginas

quinta-feira, fevereiro 03, 2011

Os deputados juristas esquecidos das leis

Do Público de hoje:

"Luís Campos Ferreira, do PSD, quer saber por que motivo Souto Moura nada fez com as conclusões da oitava comissão de inquérito, que concluiu pela tese de atentado na queda do CEssna em que morreram Francisco Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa, a 4 de Dezembro de 1980."

"Por que leu as conclusões da oitava comissão e as guardou na gaveta?"- perguntou Campos Ferrira, jurista e deputado. E refere que em 2004 o processo ainda não estava prescrito.

Como Campos Ferreira é jurista, e alguns deputados do CDS que prontamente aprovaram a proposta também são, importa que leiam e interpretem o seguinte que já tem vários anos e dá uma perspectiva jurídico-criminal dos factos, porque é disso que se trata quando se fala em MºPº e crime e assuntos similares.
Trata-se de um comunicado extenso da PGR, de 6.7.1999, da autoria do então PGR, Cunha Rodrigues. Aí se diz, entre outras coisas, que o Ministério Público não tem poderes de investigação, no processo em causa, desde 15 de Julho de 1983, competindo exclusivamente ao juiz de instrução criminal, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou da parte acusadora, determinar a realização de diligências;

Para além disso, ficou esclarecido o seguinte :

Em 9 de Janeiro de 1996, o juiz de instrução criminal, divergindo do parecer do Ministério Público, considerou prescrito o procedimento criminal contra três arguidos;
O Ministério Público recorreu deste despacho, em 22 de Janeiro de 1996, tendo o Tribunal da Relação negado provimento ao recurso;
Do acórdão do Tribunal da Relação, o Ministério Público recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça que não conheceu do recurso (10 de Julho de 1997);
Encerrada a instrução contraditória (15 de Novembro de 1996), o Ministério Público, manteve a posição anterior, no sentido de que os autos deveriam aguardar a produção de melhor prova;
Em 13 de Dezembro de 1996, os assistentes deduziram acusação definitiva;
Remetido o processo ao juiz competente para a pronúncia, este, em despacho circunstanciado (mais de 700 páginas), rejeitou a acusação dos assistentes, por considerar não haver nenhum indício de crime, e ordenou o arquivamento do processo (16 de Abril de 1998);
Os assistentes interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, para onde os autos subiram em 28 de Setembro de 1998.

No final desse comunicado o então PGR Cunha Rodrigues dizia e agora poderia retomar-se:

É lamentável que, por ignorância da lei, má fé ou desconhecimento dos factos, se produzam afirmações que, atingindo o Ministério Público, mais não visam, consciente ou inconscientemente, que exercer uma intolerável pressão sobre os tribunais; "
Campos Ferreira é jurista e deputado. Alguns deputados do CDS também. Deviam saber que a PGR de Pinto Monteiro, de Souto Mouta ou de Cunha Rodrigues, não tem poderes para mudar as leis do país que os deputados aprovaram. O processo não é da PGR e o MºPº junto do tribunal de instrução criminal onde o processo se encontra é o competente para analisar os factos, de acordo com o que já foi analisado.
Dizer que o processo em 2004 ainda não se encontrava prescrito é esquecer o que foi escrito em 1996 pelo juiz de instrução. E que ficou irremediavelmente decidido. Para sempre.
Para além disso, no processo há assistentes constituidos que até deduziram acusação particular, porque na altura as leis permitiam-no ( tal como permitiram no caso do padre Max, da Cumieira).
Porque é que Campos Ferreira e os deputados do CDS não interpelam os assistentes que em 2004 nada fizeram e- esses sim!- poderiam fazer?

Que sejam jornalistas a escrever enormidades sobre assuntos judiciários, ainda se compreende, pela pressa, pela falta de conhecimento e pela natureza intrínseca da informação mediática.
Que sejam deputados a fazê-lo, já é estranho e incompreensível porque as regras democráticas obrigam à ponderação das leis que temos.
E a triste figura que por vezes fazem, como é agora o caso, raramente passa para os media com o retrato por inteiro...
PS: é uma habilidade pouco recomendável num jurista, pelo menos, dizer que em 2004 o processo ainda não estava prescrito. Por isto: em 2006, o STJ decidiu definitivamente que estava. Em 2000 já a Relação de Lisboa o dissera.

3 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderEliminar
  2. José, está a ser demasiado exigente.
    Os rapazes da AR não estão habituados a pensar: dá muito trabalho e além disso têm muito mai$ com que se preocupar.

    ResponderEliminar
  3. O José Esteves até se dá ao luxo de explicar que colocou a bomba, sim senhor. E até põe a namorada de um senhor muito conhecido ao barulho, num enredo cabalístico típico de filme de acção.

    http://www.youtube.com/watch?v=YC5aMLy09lE&playnext=1&list=PL656FCC69E0C174A3

    Como mostra o passado recente, Camarate na AR é sinónimo de moção de confiança chumbada e queda de governo.

    ResponderEliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.