Crónica no Público de hoje, copiada daqui:
O comendador sem comenda
Por Pedro Lomba
As duas enormidades que passo a enunciar envolvem verbas diferentes e pessoas diferentes em peso e estatuto. Mas são ambas um impiedoso retrato de como o Estado português é, no limite, apropriável por pessoas particulares.
A primeira, que ainda não está inteiramente fechada, é o aumento da verba que o município de Lisboa – entidade, como sabemos, numa robusta situação financeira – se prepara para votar em benefício da Fundação Mário Soares. Além dos 50 mil euros anuais que resultam do protocolo assinado em 1995, a vereadora da Cultura da câmara propõe uma contribuição adicional de perto de 15 mil euros (Correio da Manhã, 28-9). Aparentemente, ninguém percebe a razão para esta súbita e crescente generosidade do executivo de António Costa. Trata-se de um problema simbólico. Sempre supus que, em época de cortes e contracção, seríamos todos obrigados a viver com menos. Manifestamente, há quem vá acabar por viver com mais. A oeste nada de novo.
O segundo caso é, obviamente, bem mais grave. Fundações privadas financiadas, no essencial, pelo Estado tornaram-se a última e promíscua moda do regime. O caso mais espantoso de desvergonha é o da Fundação Arte Moderna e Contemporânea – Colecção Berardo, mais conhecido como o Museu Colecção Berardo, que se instalou no Centro Cultural de Belém em Lisboa, em 2006, através da ocupação total do seu centro de exposições.
O negócio da Fundação Berardo foi inconcebível, relembre-se. Num processo em que se envolveu directamente o primeiro-ministro Sócrates, o Estado português albergou na Fundação do CCB a famosa colecção do Sr. Joe Berardo, uma figura que, em Portugal, passa estranhamente por “empresário”, a troco de condições ruinosas para o interesse público. Muita gente protestou na altura. O Presidente da República promulgou contrariado, tornando públicas as suas objecções (e vê-se agora como tinha razão). O deputado João Semedo, do Bloco, chegou a classificar o negócio como um “mecenato ao contrário”: era o Estado que financiava a fundação de Berardo e não o “benemérito” que nos oferecia a sua filantropia.
E, na verdade, analisados os estatutos da fundação, era o horror. Além das despesas de funcionamento da fundação, a contribuição financeira a que o Estado se obrigou envolvia a transferência, através do Ministério da Cultura, de uma verba anual avultada para um fundo de aquisição de obras de arte que só terminará em 2015.
Claro que, depois deste incrível favor, deu-se a troca de poder pelo poder, porque, quando foi preciso que Berardo, através de um financiamento especial que lhe foi concedido pela Caixa Geral de Depósitos, entrasse no golpe da tomada do BCP – hoje um assunto mais do que público -, o especulador declarou-se mais do que presente.
Tudo isto só podia ter um mau epílogo. Hoje, o Sr. Berardo tornou-se um dos mais célebres devedores do banco público. Está com a corda na garganta. Em Janeiro de 2009, o Diário Económico noticiava que Berardo entregou a colecção como garantia aos bancos que o ajudaram na compra de acções do BCP. A mes-ma colecção cujo fundo de aquisição o Estado todos os anos financia. Se pensarmos duas vezes, percebemos a absoluta imoralidade de tudo.
Parece agora que o Sr. Berardo, que volta e meia enxovalha pessoas a quem acusa de crimes e torpezas, não consegue pagar os salários deste mês da sua fundação, pelo que decidiu acusar ontem a fundação do CCB de ter um “saco azul” no estrangeiro, dardejando os membros do conselho de administra-ção do centro com várias “honrarias”. A fundação já respondeu e, é preciso dizer, é bem feito para Mega Ferreira, que ficou mudo em 2006 e agora está a ser atacado com brutalidade..
Porque aquilo que interessa ao Sr. Berardo é isto que ele diz: “Se querem poupar nas despesas das fundações, era melhor a Fundação Berardo e o CCB se juntarem”. Nada mais oportuno. Resolvia-se de uma vez o seu problema. Infelizmente, não se resolvia o nosso, nem o dos bancos, que, numa manobra irresponsável, lhe emprestaram há anos o que agora não têm.
Para além disto e que já é muito porque ninguém se atreve a escrever assim ou a falar assim nos media em geral, há uma petite histoire que Pedro Lomba talvez nem conheça.
O Comendador da Bacalhôa, em 2005 era pessoa afastada nos meandros políticos continentais. Empresário de sucesso, por vezes falado e entrevistado ( Mário Crespo costuma dar-lhe imensa corda, vá lá saber-se porquê...) nessa altura do dealbar do primeiro governo de José Sócrates, o comendador da Bacalhôa esforçava-se por penetrar literalmente nos meandros da governação e do novo poder político socialista. E como fazer, perguntaria o comendador para os seus botões pretos?
Não conhecendo ninguém da área do novo poder xuxa, arquitectou um plano clássico e que porventura deu frutos noutras paragens: abordar um ministro. A primeira vítima desta estratégia de aranha foi...Jaime Silva, então ministro da Agricultura e pouco dado a conúbios espúrios . O que fez o comendador para captar as boas graças de um qualquer influente membro do governod e então? Convidou Jaime Silva para um "evento" na dita Bacalhôa, uma quinta de prestígio que é um activo de valor no património do comendador. Os vinhos de lá são baratos e são bons ( JP, por exemplo e que se vende em hipermerdado).
Uma inauguração qualquer de uma exposição qualquer de figuras esparsar em escultura de jardim ou coisa assim, serviu para o comendador abordar o ministo. Que estranhou e não entranhou. Desprezou, de facto.
Que fez então o comendador despeitado pela carência de atenção? Tudo indica que foi abordar outro influente. E quem?! Tudo indica também que poderá ter sido o ex-bancário, político de distrital, protestante de pagamento de portagens em Fiat utilitário, governante, patrocinador de fundações extintas por interferência directa do presidente da República, político de proximidade, acusado de tráfico de influências por causa de uns robalos, de seu nome Armando. Especializado no salto à vara da influência e que se licenciou na Independente na véspera de ser administrador com título de dr. com lugar assegurado de professor universitário (!)
Tanta especialização logrou-lhe um currículo que culminou na administração de um banco público e depois de um privado, do qual foi obrigado a sair como tinha saído da tal fundação.
Entretanto, o comendador da Bacalhôa lá conseguiu entrar no círculo do poder e foi apanhado na crise financeira. Coisas da vida.
Quanto à petite histoire do fulgurante Armando merecia ser contada pela exemplaridade do que foram os anos de governação socialista. Para memória futura, porque esta gente nada esquece e nada aprende.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarJardim Gonçalves era um bandido com acção a 4 €
ResponderEliminaragora valem 20 vezes menos
Tem razão José!
ResponderEliminarIsto é uma Choldra.