D.N.:
O Estado gastou mais de cinco milhões de euros, sem concurso público, com serviços contratados a escritórios de advogados. Empresas, Governo e outros organismos públicos contratam as maiores sociedades de advogados para pareceres e outros serviços jurídicos. Metade dos cinco milhões de euros gastos em ajustes directos em 2011 foram entregues a quatro escritórios.
A Sérvulo Correia, que lidera a lista dos ajustes directos, recebeu no ano passado quase 800 mil euros. O bastonário da Ordem dos Advogado, Marinho e Pinto, defende que a norma seja o concurso público “com regras e cadernos de encargos transparentes” e estranha que o Estado nunca reclame dos honorários pagos às sociedades de advogados. A actual lei estabelece limites: o primeiro-ministro pode utilizar 7,5 milhões de euros num ajuste directo, um ministro pode gastar até 3,7 milhões, enquanto um director-geral pode ir até aos 750 mil euros.
Um contrato com o Banco de Portugal (BdP) rendeu este ano à sociedade de advogados Vieira de Almeida 650 mil euros. O mesmo organismo, no ano passado e também por ajuste directo, celebrou um contrato com a Sérvulo Correia de 650 mil euros. Genericamente, ambos foram descritos por “prestação de serviços jurídicos”. O universo dos ajustes directos continua a ser uma boa fonte de rendimento para os escritórios de advogados. Até ao presente mês, os organismos públicos (administração central, local e empresas públicas) já gastaram mais de cinco milhões de euros com advogados.
Que serviços, em concreto, é que ambas as sociedades de advogados contratadas pelo BdP prestaram? Segundo informação enviada pelo BdP ao DN, os 650 mil euros pagos à Vieira de Almeida foram para representação da entidade supervisora “nos processos judiciais instaurados por diversas entidades, em litígios relacionados com o Banco Privado Português”. Já o montante pago à Sérvulo Correia tem a ver com a representação judicial nos processos de contraordenação contra a antiga administração do Millennium BCP. O BdP referiu ainda que, apesar do valor de 650 mil euros inscrito no ajuste directo, o valor final “varia em função do tempo efectivo neles utilizado”. Questionado pelo DN se antes do ajuste, consultou outros escritórios de advogados, o BdP respondeu negativamente, justificando que se trata de serviços de representação forense “que envolvem prazos curtos de primeira intervenção judicial”. Ainda este ano, a Sérvulo Correia, que lidera o top dos ajustes directos a escritórios de advogados (ver Protagonistas), ganhou ainda um contrato de 320 mil euros da Estradas de Portugal (EP) para assessoria jurídica. O DN também questionou a EP sobre os serviços prestados, mas não obteve qualquer resposta.
A questão essencial a colocar a esta gente é esta: isto tem que ser assim? Precisa de ser assim?
Quando se pedem sacrifícios às pessoas comuns que pagam impostos, estes indivíduos que lograram assento permanente à mesa do Orçamento, ainda que atrás de resposteiros a soprar linhas da peça em representação permanente, quais pontos de um teatro improvável, recebem sem cortes, por inteiro e por vezes à hora.
Até quando se vai permitir o Estado este esportular de dinheiro público, aos milhões e sem controlo algum, mormente de tribunais de contas?
Nem se trata de arranjar uns concursos públicos para mascarar estas coisas. Trata-se pura e simplesmente de acabar com isto, de uma vez. Voltar ao antigamente e recrutar quem sabe dos assuntos.
Aliás, nessas firmas, quem trabalha não são os sócios de capital, como é bem sabido. São os assalariados por quase tuta e meia. E para isso podem muito bem ser pagos directamente pelo Estado, em organismos adequados, como dantes havia.
Ninguém discute isto. Porque não interessa, porque não sabem e portanto nem perguntam ou porque é o habitual "para quem é, bacalhau basta"?
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