Ainda no Correio da Manhã de hoje, Laborinho Lúcio diz algumas coisas com interesse. Sobre a corrupção continua o seu habitual discurso deletério, já com décadas ( nos anos oitenta e noventa quando foi ministro, era o mesmo). Para Laborinho, essencialmente a corrupção é um fenómeno social que só se resolve com...educação. É uma questão cultural, portanto. O que Laborinho esquece desde sempre é que o problema é sentido de igual modo noutros países, mais educados, digamos assim. Na Alemanha, por exemplo. A diferença e que explica essa explicação reside precisamente naquilo que Laborinho e outros obliteram: o sistema de Justiça. Lá funciona. Cá, não. É assim. E é isso que explica que alguns trutas gordos escapem nas redes de malha distendida do nosso sistema. Condescendente, complacente e displicente.
Sobre o PGR não poderia ser mais explícito: tem os poderes todos de intervenção processual. O único que não tem é o que não pode ter: o de mudar uma magistratura num serviço do PGR. Obviamente, Pinto Monteiro não percebeu tal coisa e nunca perceberá, penso eu de que.
Não obstante, os entrevistadores, neste aspecto, falham a pergunta essencial e divisora de águas: o que faria Laborinho, no caso concreto da certidão do processo Face Oculta, se fosse PGR e três magistrados lha entregassem para instaurar um inquérito criminal contra o primeiro-ministro?
A resposta concreta e sem tergiversações a essa pergunta pode constituir o critério aferidor da noção que Laborinho tem do cargo de PGR.
Curiosamente, sobre este assunto, nenhum conselheiro do STJ alguma vez se pronunciou publicamente. Embora o tenham feito ampla e sobejamente em privado. E posso garantir: nenhum admitiu que Pinto Monteiro fez bem. Será que Henriques Gaspar o admite? É dever dos jornalistas perguntar-lhe expressamente, porque é um candidato a futuro PGR.
Sobre outro assunto polémico, o da criação de um Conselho Superior de Justiça que substitua os actuais conselhos superiores das magistraturas, Laborinho tem uma posição antiga mas aggiornata. O tal conselho único congregaria o presidente da República, integrando por inerência os presidentes dos Supremos ( STJ e STA), o PGR, o bastonário da Ordem dos Advogados, a ministra da Justiça " e depois um conjunto de personalidades designadas pela Assembleia da República, constituindo a maioria, mas também designadas pelo PR e pelo Governo."
De magistrados de função jurisdicional normal ou sem cargos dirigentes, escolhidos directa ou indirectamente pelo poder político, nem fumo. Só me resta comentar esta proposta de Conselho: seria uma maná para as diversas maçonarias.
Em Portugal, a realidade é o que é e não o que gostaríamos que fosse e Laborinho nesse aspecto ou está fora dela ou pelo contrário demasiado dentro da mesma. Aposto nesta última hipótese.
O que é um conselho superior de uma magistratura? Um órgão colectivo de gestão e disciplina de magistrados. Que por natureza não são funcionários e detêm, no caso dos juízes, individualmente uma parcela do poder judicial sempre que julgam e sentenciam. Os presidentes dos supremos não julgam nem sentenciam nem investigam criminalmente em modo habitual ( tirando o caso espúrio do presidente do STJ no caso de escutas precisamente a titulares de órgãos de soberania específicos). O PGR, sendo independente do poder político, por ele é nomeado e por muito que seja sério ou beirão, não pode cindir o seu pensamento e idiossincrasia e esquecer quem o nomeou. Tal como o mesmo disse a propósito dos magistrados que saem para trabalhar na "privada"...
Quando se discute seriamente a possibilidade de conferir maior poder disciplinador processual aos magistrados para acabar com o desequilíbrio que se evidencia actualmente em relação aos advogados, Laborinho sugere um Conselho disciplinador e de gestão da magistratura que submete os mesmos magistrados a uma espécie de mini-parlamento da Justiça.
O Presidente da República é eleito por sufrágio universal,mas evidentemente escolhido previamente pelos partidos que o apoiam. Os partidos com vocação de poder em Portugal são dois. Nem sequer três são... Os presidentes dos supremos são eleitos pelos pares, mediante listas e campanhas eleitorais. O bastonário da OA idem. Os ministros da Justiça idem aspas, indirectamente. As personalidades escolhidas pela A.R. fatalmente acabariam por ser individualidades ligadas aos partidos e aos votos.
Portanto, o que Laborinho defende é uma pan-democracia partidocrática num conselho destinado a gerir e disciplinar magistrados.
Só para dar um exemplo do que isto significaria, atente-se nos casos recentes que envolveram magistrados em processos que envolviam eleitos e políticos de relevo: o que julgam que sucederia a um Rui Teixeira, juiz de instrução do Casa Pia; a uns Vítor Magalhães e Paes Faria, magistrados que instruíam um processo de contornos evidentemente politizados ou num Face Oculta em que os assuntos poderiam atingir o cerne do topo do Estado executivo?
Atente-se ainda noutro facto: no caso Rui Teixeira, Laborinho teve uma actuação no mínimo dúbia. Típica de quem não se quer comprometer com o poder e também não pretende que o contrário transpire para a imagem pública. Laborinho, nesse caso concreto não foi corajoso, não defendeu a independência e autonomia da magistratura simbolizada nesse juiz e arruinou a sua imagem de magistrado que ensinou magistrados. E os magistrados sabem-no.
A proposta de Laborinho, de criação de um conselho único para gerir magistrados sem que os magistrados possam lá estar, é, por isso mesmo, um logro. Perigoso. Sob a aparência enganadora de uma maior representação democrática, significaria tão só um meio expedito de o poder político alargado dominar a magistratura. Seria o modo de o poder político do momento condicionar a magistratura que se quer precisamente independente desse poder político.
Seria a consagração plena do contrário ao paradigma desejável em qualquer regime e sistema de poder, o de que "ainda há juizes em Berlim".
Para tal efeito já basta o que há.
lúcio é peixe predador com dentes afiados, de água doce, que dá luta aos pescadores.
ResponderEliminarhá 20 anos era 'muita parra, pouca uva'. tal como os familiares nazarenos.
os politícos defendem-se dos resultados da magistratura. esta deve existir para fazer de conta que esta porra é um estado de direito
necessita ir ao 'endireita'