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domingo, abril 22, 2012

Sábado: conta-me como foi, mas de outra maneira


Para se fazer a revista Sábado desta semana, alguém viu a Newsweek de 26 de Março passado e teve uma ideia: copiar a ideia que viu.
A propósito de novos episódios da série televisiva Mad Men, a Newsweek dirigida por Tina Brown ( Vanity Fair e New Yorker nos anos noventa e mais umas tantas, incluindo uma Talk que durou pouco tempo-tenho o primeiro número e seria uma espécie de Life com Look anos 2000) elaborou aquele número seguindo um conceito: replicar a revista segundo o formato gráfico e de conteúdo dos ano sessenta, época em que a série se desenvolve.
Assim, aquele número da Newsweek apresenta as suas páginas como saindo direitinhas da gráfica revivalista, com o grafismo, o lettering, a distribuição dos assuntos, o índice e até as publicidades típicas dos anos sessenta que infelizmente não chegaram à edição internacional que comprei. A capa retoma o formato do título antigo e as cores de antanho, com predomínio das fotos a preto e branco. Só visto porque é uma pequena maravilha gráfica e conceptual.
A Sábado deve ter visto e como é tom em Portugal, toca a copiar o conceito, plagiando até a ideia das publicidades retrospectivas.
O que na Newsweek é um trabalho perfeito, uma obra de arte conceptual em forma de revista, na Sábado é um estenderete de pinderiquice que até incomoda.  E é esta revista  “eleita newsmagazine melhor do ano pela Meios & Publicidade”…
E no entanto a ideia até era boa, mesmo copiada. Só que…até para copiar é preciso talento que na Sábado pelos vistos escasseia, como os assuntos com interesse de notícia ou reportagem. Salva-se, no caso deste número, a reportagem sobre um homicídio de  um polícia da PSP, não esclarecido, ocorrido em 30 de Abril de 1974, junto ao aeroporto da Portela e Rotunda do Relógio.
Enquanto na Newsweek a nostalgia não passa da segunda metade dos sessenta, na Sábado a mistela revivalista junta os setenta com os sessenta e porventura os primeiros da década de 2000, altura em que a revista apareceu, numa confusão mental de quem não arquivou bem o tempo que passa.  
Enquanto a Newsweek  tem a noção exacta do respeito pelo aspecto editorial e idioma dos anúncios de época, na Sábado tal efeito nem por sombras se  nota.
Como exemplo mais patético deste falhanço  pode ver-se o arranjo gráfico a imitar os setenta sem nada que se lhe assemelhe em modo exclusivamente característico e a ideia de refazer hipotéticas capas ( “as capas que nós teríamos feito”) alusivas a acontecimentos reais dos anos setenta . Sobre o 25 de Abril, a ideia de prognóstico futurista da revista seria capear com uma foto a preto e branco, numa altura em que a cor se tornava dominante nas capas dos “newsmagazines” da época ( até a revista da PIDE/DGS, Continuidade, já tinha capas a cores) , como a Observador ( que já não existia em 1974, mas que foi muito importante para mostrar o que foram os primeiros anos da década de 70 e o desenvolvimento marcelista), para não mencionar a Flama, o Século Ilustrado ou mesmo a Vida Mundial, relativamente às capas.  A tal capa, com moldura a vermelho teria um título com uma capciosa menção a “Tudo sobre os bastidores da Revolução”.  Supostamente, a revista saindo à Quinta, só na semana seguinte poderia anunciar tal ideia cujo idioma pode ser tudo menos dos setenta. Ninguém nessa época se lembraria de apresentar uma ideia peregrina dos futuristas anos 2000, alusiva aos “bastidores” de qualquer coisa como uma Revolução.  Seria um título tão desfasado como o de anunciar  nessa época a revelação dos ficheiros digitais da DGS.  Ou, para o efeito e como tal é apresentado, titular outro número da revista , alusivo à primeira intervenção do FMI, em 1977, com uma foto de Mário Soares e o título “FMI: como ele se afundou e nos levou atrás”.

 Nem o O Jornal que nessa altura se dedicava ao assunto se lembraria de titular uma coisa dessas de uma forma assim.
A linguagem, os conceitos e os termos escritos ganham por vezes especificidades próprias consoante as épocas e a semântica do tempo encarrega-se de situar  a meta-linguagem num domínio próprio ao entendimento geral.
Transportar para os anos setenta conceitos e linguagem das décadas vindouras só lembra a quem não tem a noção do que significa o “ar do tempo” e a importância dos sinais e símbolos  bem situados e muito menos entende as características da linguagem de cada época.
Para mostrar a gravidade dessa pinderiquice associada a uma carência cultural gritante que é apanágio da Sábado, replico aqui um artigo magistral publicado no jornal diário Diário Popular, de 7.12.1971, num suplemento- Volta ao Mundo- de terça-feira ( o jornal tinha suplementos em vários dias da semana, incluindo um cultural dedicado a livros à Quinta-Feira e um mais ligeiro ao Sábado, intitulado Sábado Popular, com imagens sugestivas e a cores, com cartoons  e desenhos( por exemplo os do  O Fotógrafo estava lá).


 Este artigo que publico, da autoria de Costa Júnior ( também filatelista no jornal e aqui lembrado ) é um exemplo do jornalismo de outrora e que alguns jornalistas ainda vivos podem testemunhar mas que não ensinaram a ninguém e se ensinaram ninguém aprendeu devidamente. No modo como se escrevia e nos termos usados; no modo como se descreviam acontecimentos, mesmo passados ( no caso com mais de cem anos) e no modo como se respeitava o leitor que percebia instantaneamente o que se dizia por escrito porque era escrito para se entender plenamente e com prazer de leitura.Algumas das palavras usadas estão esquecidas e são de genuíno português que nenhum acordo ortográfico fará ressuscitar porque o jornalismo actual assassina palavras por não saber que existem.
É uma lição para todos os jornalistas da Sábado e principalmente  para a jornalista Rita Garcia a quem incumbiram de fazer uma redacção sobre “A vida nos anos setenta era assim” e escreveu o que escreveu em meia dúzia de páginas que fazem lembrar um "conta-me como foi" por quem leu em terceira mão os relatos de acontecimentos que não viveu nem compreendeu.
Se não foi à internet copiar factos e ideias, poderia ter ido porque o resultado seria o mesmo.
Que desperdício!

13 comentários:

  1. devia abrir a época de caça a politicos e jornalistas
    tenho cada dia mais vergonha de viver nesta pocilga
    misturado com a 'porca da politica'

    não perco o meu precioso tempo a ler e ver porcarias

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  2. http://josepaulofafe.blogspot.pt/2012/04/desculpa-la-manecas.html

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  3. José precisava de consultar o seu Arquivo de Janeiro e o mesmo, só deixa até ao dia 23, como faço para consultar os artigos anteriores?
    Abraço
    Nuno

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  4. É um problema porque este template não permite ir para posts antigos e recentes, tal como o meu.

    Deve haver qualquer erro no arquivo porque, em princípio, devia mostrar todos por mês.

    Mas há maneira de controlar o problema. Edite um post desse mês que aparece em baixo "Entradas Anteriores" com links de outros tantos. Depois faz o mesmo, no último e assim por diante.
    ...........
    ex:
    http://portadaloja.blogspot.pt/2012/04/sabado-conta-me-como-foi-mas-de-outra.html

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  5. Obrigado, Zazie, porque eu mesmo tenho dificuldade, por vezes, em aceder a entradas antigas.
    Às vezes lá consigo, nem sei como.

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  6. Mas, José, no seu caso é mais fácil. Faz login e procura no índice das mensagens por alguma palavra que conste no post.

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  7. Pois, mas refiro-me a buscas diacrónicas no próprio blog.

    E essas por vezes falham quanto ao elenco de todos os postais do mês.

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  8. Pois José o meu rapaz diz que foi o template que você usou, o meu que é mais novo que o seu não tem esse problema!

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  9. É bem capaz. O meu é antiguinho e sou conservador...

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  10. Pois é. O do Cocanha também é antigo e não tem essa possibilidade de recuar ou avançar páginas.

    Mas aqui o problema há-de estar no índice dos arquivos. No meu dá para ver tudo.

    Mas estes templates antigos eram mil vezes mais bonitos que a porcaria dos novos.

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  11. Pois José
    Se o meu rapaz me ligar de novo eu pergunto.
    Lembra-se do Jornal das sextas da MMG'
    Quando entrevistou o tio do ZEZITO e foi um escangalhar na net?
    Você já tinha o blog eu não!
    E só o que posso fazer se quiser ajuda, o rapaz programa e deu em economista, mas sabe de Hard e Sfot!

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