O komentador-mor televisivo Marques Mendes é alvo da atenção de João Miguel Tavares, no Público de hoje, assim:
Este duende da política portuguesa é um fenómeno cujo estudo biográfico nos ajudaria, a par de outros, a compreender como estamos, social, económica e culturalmente. Falta-nos um romancista para traçar o retrato escrito e pintar o quadro social. É pena porque só desse modo seria plenamente entendido o substrato de que estas pessoas são feitas e que no fundo são a elite dos portugueses que compõem este regime.
Marques Mendes é filho de um advogado de Fafe, figura importante no PPD local e desde novo abancou em círculos políticos de social-democracia partidária. Não foi comunista ou socialista, mesmo nos tempos de PREC e acabou um curso de Direito em Coimbra sem grande história curricular. Terá sido mesmo um aluno voluntário, apartado por isso dos "ordinários". Estudava em casa e fazia exames na hora. Lia as sebentas que então havia, publicadas pelos mestres, lá faria os testes policopiados a stencil azul ou preto do senhor Machado, já velhinho para a idade dos estudantes e que vivia junto aos Grilos e os vendia por poucos tostões aos que o procuravam para ajudar na reforma que se calhar nem teria. Ainda tratava os professores por "mestres" e vestia sempre de escuro.
O tempo de Salazar, para ele, não tinha sido muito há muito e o lugar em que habitava era dele um retrato perfeito: antigo, modesto, simples, espartano, mas arrumado e limpo. Os modos, solícitos de educação esmerada e de simpatia no trato sem delongas de besuntas conversas.
Marques Mendes não era já desse tempo, como aliás a maioria dos frequentadores que compravam as cópias dos stencils arrumadas em pequenas pilhas de papel na estante espartilhada conforme as matérias e os anos lectivos.
Marques Mendes, no tempo em que poucos estudantes parqueavam carro dentro e fora da "porta férrea" da Universidade de Coimbra, já tinha carrito, modesto ainda mas já a prometer maior cilindrada futura. Em Braga, muito perto de Fafe, em 1975, já estava no Governo Civil um certo Eurico de Melo e depois outro certo Parcídio Summavielle e ainda um mais certo Ribeiro da Silva que acabaram por integrar o nosso Marques Mendes, todo pimpão, nas assessorias políticas dos governos civis da época. Ganhando o pecúlio merecido, pela certa.
Por força destas frequências extra-curriculares o curso de Coimbra terminado e o futuro à frente, o nosso duende lá terá estagiado junto de tais mestres da advocacia bracarense e as portas da política estavam naturalmente abertas para mais frequências e exames voluntários.
Resumindo, em 1977 já era autarca em Fafe e depois foi deputado em várias legislaturas em que se discutiram leis e mais leis, acabando depois por integrar governos do PSD, em cargos de algum relevo político.
Em 1995 o socialista Guterres, amoroso da educação que acabou por estragar de mimos, tomou conta do poder e os social-democratas da têmpera de Marques Mendes tomaram posição em empresas de jeito. Marques Mendes ainda não estava a jeito, mas conhece-os a todos de ginjeira.
Em 2002, em pleno pântano nacional, ocupou lugar no governo de Durão Barroso, o desistente que deu lugar a Santana Lopes e depois a Sócrates. Marques Mendes saiu desses governos e passou para "a privada", aparente e estranhamente sem o destino preferido daquela primeira fornada de "boys".
Nessa altura já o duende era advogado inscrito lá por Fafe e quando saiu do Governo, impressionou-me particularmente uma frase proferida em modo avulso quando lhe perguntaram o que iria fazer: advogar...
Estranhei tão singelo propósito porque advocacia é uma profissão a tempo inteiro e não um hobby e Marques Mendes foi político durante demasiado tempo para se cingir então ao universo dos tribunais, pleitos e consultadoria de gabinete que exige conhecimentos jurídicos apurados, aturados e sólidos, coisa que duvido muitíssimo Marques Mendes tenha, no âmbito jurídico. E já em tempos reparei nisso e dei conta.
Mas já não estranhei tanto depois de ver o que se passou nesse universo da advocacia a partir de meados dos anos 2000: certos gabinetes de advogados de consultadoria tomaram o regime e fizeram o regime, as leis do regime e os códigos de conduta do regime.
Naturalmente, Marques Mendes tomou lugar num deles.
Não satisfeito com este género de advocacia sui generis, o nosso duende imitou uns outros komentadores de televisão e arranjou lugar na TVI e depois na SIC, a debitar opinião paga sobre o momento político e largando umas larachas sobre o ambiente político geral. As televisões privadas e a pública adoram esta fauna e patinham nela alegremente aduzindo argumentos de share. O público é amorfo e encolhe os ombros metafóricos.
Marques Mendes é assim um dos apaniguados do regime e é por isso que concordo com João Miguel Tavares: fique lá este duende como komentador e que quem o quiser ouvir que ouça, mas presidente da República nem por sombras ou sequer intenções.
Pelos motivos apontados no escrito e mais alguns, o menor dos quais é o de ser simplesmente medíocre. E um povo é também fraco se quem o lidera é da mesma estirpe.
Quando vejo este duende nas tv´s sinto saudados do senhor Machado que vivia junto aos Grilos em Coimbra...e do modo como se encarava a vida, a política, a honra, a honestidade e até a inteligência.
E que ninguém se esqueça de uma coisa de que será preciso apurar a razão de ciência:
Belmiro de Azevedo quando Marques Mendes saiu dos governos disse claramente que nem o queria sequer para porteiro dos seus supermercados...
E ainda outra: provavelmente não será apenas da sua responsabilidade, mas o ensino que temos, a nível superior com as facilidades privadas suscitadas pelo sistema público começou algures em Fafe com cursos de fim de semana para licenciar a mascoto certos indivíduos que nem a quarta classe teriam...
Em tempos o Eng. Belmiro de Azevedo disse que o Marques Mendes na Sonae nem para porteiro serviria
ResponderEliminarExcelente artigo, gostei mesmo muito! O que não escreveriam acerca desta figurinha Eça de Queiroz ou até mesmo Joaquim Paço d'Arcos, se porventura a tivessem conhecido!..
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