DN, artigo de João César das Neves:
É espantoso que as elites nacionais andem alheias ao essencial da situação económico-financeira. Assim, elas ficarão tão surpreendidas com a próxima crise como ficaram com a anterior. Por inacreditável que pareça, o país repete um mesmo erro em menos de dez anos. Pela segunda vez numa geração, a sociedade portuguesa será apanhada de surpresa por uma derrocada devastadora, que está latente há muito tempo, sem que ninguém dê por ela. É hoje evidente que, apesar dos terríveis sofrimentos da crise passada, os portugueses não aprenderam as lições de 2008.
O desastre económico que, nas praias lusitanas, deflagrou a seguir à derrocada do subprime norte-americano estava em preparação há mais de 15 anos. O endividamento galopante que, à volta da viragem do milénio, se viveu em todo o Ocidente teve em Portugal uma das suas apoteoses, que vinha muito de trás. A entrada no caminho para o euro, com o Tratado de Maastricht de Fevereiro de 1992, significara uma enorme descida das taxas de juro para um país habituado a crédito caro. A década e meia seguinte foi de embriaguez de crédito, no sector público como no privado. As atenções costumam centrar-se nas auto-estradas da época, mas todo o estilo de vida dos portugueses foi afectado por esses tempos de facilidade. Gastava-se a nível europeu com produtividade portuguesa. O resultado inevitável foi o colapso, que adiámos até 2011, e a dívida esmagadora, que nos assombrará durante décadas.
Apesar de ser um processo longo e patente, as elites na altura foram apanhadas totalmente de surpresa. Não tinham reparado na acumulação dos défices público e externo. Como a Europa era benevolente com o primeiro e o euro financiava o segundo, as luminárias locais convenceram-se de que contas certas era mania de germânicos e nórdicos, ficando mal a intelectuais latinos de pendor social. Por isso, a consciência política nacional andou totalmente alheada da bomba-relógio financeira que, quando rebentou, como tinha de rebentar, os espantou completamente.
Claro que, apanhados a dormir na forma, nunca admitiram a falha. Preferiram congeminar uma explicação que não só justificava a devastação mas escondia a sua incapacidade de a prever. Admitindo alguns excessos pontuais atribuídos à governação de José Sócrates e a Ricardo Salgado, oferecidos em holocausto, os analistas nacionais asseguraram vigorosamente que o trem de vida anterior era perfeitamente razoável e legítimo, e nada tinha que ver com a crise. Afinal, esses gastos eram direitos inalienáveis de cidadãos europeus no século XXI, sem interessar a forma de os pagar. Assim, o terrível sofrimento da recessão de 2011 a 2013 ficou à conta da troika e Passos Coelho, fundamentalistas neoliberais, sem haver nada a corrigir na estrutura nacional. Em consequência, a prioridade política suprema, assim que a economia começou a crescer graças à expansão mundial, tem sido repor a situação que vivíamos antes da crise. Precisamente aquela que nos conduziu à crise e que nos levará à seguinte. Ninguém parece notar a incongruência do propósito.
Se o problema fosse só repetir os erros, era o menos. Mas existe uma diferença decisiva entre a cegueira económica actual e a anterior, que é o mais assustador. Desta vez, devido ao tropeço de 2011, o endividamento externo encontra-se encerrado. É verdade que, como toxicodependentes, as elites celebram entusiasticamente as tímidas aberturas no acesso ao crédito externo, como se empilhar ainda mais dívida fosse boa ideia. No entanto, não será por aí que se conseguem repor os níveis de consumo ruinosos a que nos habituámos. Por isso, desde o encerramento dos mercados em 2009, o meio que tem alimentado a vida nacional, no Estado, empresas e famílias, é o consumo de capital. Portugal vive há dez anos a vender as pratas da casa.
Entregando as grandes companhias nacionais e até casas e terrenos a capitais estrangeiros para financiar consumo, a taxa de poupança das famílias está em mínimos históricos. O investimento público tem sido a rubrica mais cortada, para sustentar as despesas correntes, e as famosas cativações dirigem-se sobretudo aos gastos de funcionamento, degradando serviços. Nas empresas, o investimento e o crédito bancário atingiram mínimos históricos. As tímidas recuperações recentes nada alteram de significativo, pelo que, desde 2013, o investimento se mantém abaixo dos valores de reposição de equipamento. Como a produtividade e a competitividade não param de se degradar, o país encontra-se, realmente, numa lenta decadência, que até é demográfica, pela baixa fertilidade e emigração.
Entretanto, vê-se por todo o lado as pessoas a voltar aos hábitos de vida que tinham antes da crise, perante a bonomia pateta do governo, que se orgulha de baixar impostos, subir salários e pensões, apregoando isto como virtuosismo do senhor ministro das Finanças. Como em 2008, as elites andam satisfeitas, caminhando alegremente para o segundo abismo financeiro da década, no qual, mais uma vez, cairão totalmente de surpresa.
Se as coisas correrem mal já há culpados: a crise internacional e um qualquer Passos que tenha que aplicar medidas de austeridade. Logo a seguir, se tudo correr bem, virá outra vez o PS fazer o que sabe melhor, de há quarenta anos a esta parte: outra bancarrota.
Os portugueses, mesmo os letrados, nada aprenderam nas últimas quatro décadas. Os pobrezinhos são obra do capitalismo e o socialismo aparece sempre para os salvar, embora os empobreça ainda mais...
A Despesa do Estado fixou-se em 2017 em 45% do pib. Isto já não acontecia desde 2002.
ResponderEliminarO ano com um peso maior da despesa no pib foi o de 2014 com 51,4%.
Rb
A Dívida Externa Líquida esta em 2017 em 92%.
ResponderEliminarO ano com a dívida externa líquida mais elevado foi o ano de 2014 com 104%.
Rb
Fonte: pordata
ResponderEliminartenho em casa duas marquises envidraçadas
ResponderEliminar«Povo que lavas no rio
Que talhas com o teu machado
As tábuas do meu caixão
Pode haver quem te defenda
Quem compre o teu chão sagrado
Mas a tua vida não»
wikipedia
«Orçamento de Estado para 2014, perto de 7,2 mil milhões de euros apenas em juros da dívida pública. Esse valor que representa cerca de 4,3% do PIB, é muito próximo daquele que o Estado gasta com o Serviço Nacional de Saúde ou com a educação, as maiores rúbricas do Orçamento de Estado.[11] Os juros da dívida em termos financeiros, consomem o equivalente aos custos de um resgate de um BPN por ano.»
com os bancos já gastaram o «equivalente aos custos de 23 pontes Vasco da Gama»
No futuro, em data incerta, estamos todos mortos.
ResponderEliminarHaverá nova crise internacional que nos arraste novamente para complicações de financiamento?
Sem duvida. Um dia havera outra versão do subprime. Não é preciso ser economista para poder afirmar isso com toda a autoridade. O Zandinga no entanto é um tipo mais corajoso do que o Neves. Não se fica por generalidades acerca do devir. Nada disso, o zandiguinha especifica uma data concreta.
Se não o fizer perde credibilidade adivinhatoria.
O Neves e o Zandinga diferem nisso. Ambos prognosticiam, mas só um o faz concretamente.
As previsões do Neves estão tão certas hoje como estarão daqui a cem anos. É o bem de escrever cenas e não dizer nada de concreto.
Rb
ResponderEliminar«
À porta da Brasileira
Dois tipos encontram dois
Juntam-se os quatro e depois
Lá começa a cavaqueira
Agrava-se a chinfrineira
Vai aumentando o zum-zum
Vem bomba, rebenta pum
Depois agora vereis
24... 26... 29... e 31
Ai... Ólarilólela
Como este não há nenhum
Tudo bate em Portugal o fado do 31
Um homem que quer sarilhos
Por um motivo qualquer
Discute com a mulher
E dá porrada nos filhos
A sogra nos mesmos trilhos
P'ra não ficar em jejum
Leva também um fartum
Desata tudo ao biscoito»
'Eu dou vinho aos meus cavalos
Mas sou eu que vou borracho'
O Neves é um especialista que saberá amanhã por que as coisas que previu ontem não aconteceram hoje.
ResponderEliminarRb
ResponderEliminar« As ciências que se instauraram no mundo Ocidental têm
tendido a classificar a religião como uma forma de falsa consciência
e como uma fôrça conservadora. "A religião é a
consciência-de-si e o como-sentir-se do homem que ou ainda
não se encontrou ou que voltou a perder-se" ( 1 ) nos diz Marx.
Ela é a flor com que o homem cobre a corrente que o aprisiona
de forma que, não mais vendo a corrente, êle se imagina num
jardim. E jardins não devem ser destruidos. Jardins devem
ser cultivados, preservados, defendidos. Em decorrência disto,
a religião teria uma função permanentemente conservadora:
os homens "devem reconhecer e aceitar como uma concessão
aos céus o próprio fato de serem êles dominados, controlados, possuídos". »
Uma dívida, seja ela qual for, é sempre um garrote sobre o devedor.
ResponderEliminarPor isso este deve ponderar muito bem a forma e o destino a dar ao dinheiro para não ser subjugado pelo credor.
Sim, não aprendemos e poucos parecem querer aprender. Vivemos do impulso. Peço emprestado, pode ser que entretanto se morra...A dívida fica para os restantes; que se lixem - Hedonismo no seu melhor e alienação galopante.
Ninguém ganha eleições a falar em trabalhar e sacrifícios...
Li algures, que a primeira bancarrota aconteceu no século 14 ou 15.
ResponderEliminarSerá que não conseguimos viver de outra maneiras.
Povozeco triste.
2010 173.062,5
ResponderEliminar2011 196.231,4
2012 212.556,0
2013 219.714,8
2014 (R)226.040,5
2015 (R)231.512,6
2016 Pro240.882,5
2017 Pro242.620,3
2018 f246.144,1
Divida pública bruta... Pordata
No bom caminho portanto...
Acho que o espírito é mesmo esse: vamos todos morrer um dia, portanto, que se lixe.
(Desculpe José... por alimentar...)
O João César das Neves não consegue ter uma percepção básica que eventualmente responderia a muitas das suas questões: Mas quais elites? E insiste pelo texto fora. O que são as elites? O PS? Uma elite de gatunos. Até aos filhos e netos roubam.
ResponderEliminarEntretanto, no BPI reparo hoje que as transferências subiram de zero para 1,00€ + 0,04€ de imposto de selo — nos impostos as elites não se importam de ser salazaristas. A 1,04€ cada transferência, só hoje dei a ganhar uma fortuna ao BPI e ao estado.
Constâncio dizia que a Europa nunca nos deixaria cair.
ResponderEliminarJá dizia o outro: "insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes".
ResponderEliminarAlguém foi ao Júlio de Matos e perguntou a um doente o que estava ali a fazer.
ResponderEliminar- Eu dizia que o mundo estava maluco e o mundo dizia que era
eu quem estava maluco.
Ganhou a maioria.
O "grupo de gatunos" é em si mesmo uma elite. Não é preciso um portfolio de virtudes para se fazer parte de uma elite.
ResponderEliminarA Mafia é uma elite.
Assim, elite seria reduzida ao poder de um grupo. Poder executivo, de fazer ou de influenciar.
ResponderEliminaro que assusta ainda assim, a mediocridade de um povo.
ResponderEliminarReclama o juiz que por direito tem a reclamar por razao A B ou C. Reclama melhor para Tribunais por razao A B C. Param os Medicos porque tambem tem razao pra reclamar, param os Professores pk tem tambem razao pra reclamar.
No final esquecem se todos que fazem parte de um so.
Um casal que vive bem, tem boa casa bons carros, trabalham no hospital, um era farmaceutico sabe la Deus como conseguiu introduzir a mulher a trabalhar no hospital. Nao lhes falta nada, o sonho de um qualquer normal pobre casal.
Pois bem, hoje ela reclama, tem tudo mas inda reclama, tem direito a reclamar.
José se é uma elite do mal, não se pode esperar que governe bem um país. Julgo que o significado de elite aqui não seja esse. O argumento do João César das Neves reduz-se a zero, se a elite é a máfia. A máfia não quer saber do "essencial da situação económico-financeira".
ResponderEliminarEu gostava de saber onde anda a elite que vai dar a volta a este estado de coisas. Porque desta elite de gatunos, já só um palonço pode esperar alguma coisa, alguém da elite dos palonços.
" É hoje evidente que, apesar dos terríveis sofrimentos da crise passada, os portugueses não aprenderam as lições de 2008."
ResponderEliminarTerriveis? Algum dos milhares de funcionarios, que são quem elege governos, perdeu o emprego ou sequer deixou de receber salario?
Enquanto esse gigantesco sector improdutivo não sofrer a minima consequencia do seu comodismo e incompetencia, nada muda.
Sei lá, se formamos 4 ou 5 professores para cada aluno como é que nao temos os melhores professores do mundo e os melhores formandos?
Na justiça ja foi condenado algum corrupto? E está preso? Ou o crime continua a compensar muitissimo? Para que raio quero eu uma justiça que me faz perder 2 anos em diligencias para nao conseguir recuperar uma multa de mais de 100 euros por nao pagamento de 1 euro num portico de auto-estrada automatico que falhou a leitura do aparelho, enquanto qualquer um que rouba 1, 20 ou 10 mil milhoes continua a passear alegremente na rua e nas tvs?
São só 2 exemplos e haverá com certeza magistrados e professores esforçadissimos e competentissimos, mas é bom que mesmo esses entendam que a guerra está a ser perdida em toda a linha, não é o mérito que é promovido, não é quem faz mais e melhor com menos recursos que é valorizado, depois admirem-se se um qualquer algoritmo manhoso lhes fica com o emprego com larguissima vantagem para o utilizador da administraçao publica. Nesse gigante sector, o que arrisca um incompetente, um corrupto ou um simples desmotivado ou preguiçoso? Uma promoçao?
Cumps