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sábado, fevereiro 23, 2019

Os obituários de Arnaldo Matos na imprensa nacional: de Mao a Piao

Os obituários publicados hoje nos principais jornais ( excluo o Correio da Manhã cujo obituário não tem interesse algum porque é apenas o que deveria ser o normal, se a personagem o fosse) são muito curiosos e evidenciam a verdadeira natureza e génese dessa imprensa: a esquerda radicalizada, pró-comunista ou de puro companheirismo de caminho, como o Expresso, o compagnon de route por excelência.  O Expresso é um verdadeiro guia do routard destas aventuras da extrema-esquerda, na medida em que lá foi acoitando ao longo dos anos os trânsfugas dessa viagem de malucos sem remissão.

O primeiro obituário, o mais extenso, significativo e característico é o do Público.

Começa com o de Pacheco Pereira, um antigo extremista de esquerda, concorrente feroz da ideologia doida do maoismo do MRPP, aplicada a Portugal com o afinco dos mentecaptos. Pacheco Pereira nada esqueceu a não ser o que lhe interessa e pouco aprendeu, continuando a pensar com os mesmíssimos esquemas mentais que conduziriam a um totalitarismo, no caso de ter oportunidade para tal.

Pacheco Pereira, na sua idade adulta e esclarecida intelectualmente, defendia para Portugal um modelo de sociedade em que o comunismo pregado no Leste europeu das albânias e roménias ou no extremo-oriente dos maos chuenlai seria a salvação para todos, pobres incluídos. Com ele e outros como ele, a mandar, claro.

Em 1971 quando o MRPP era um movimento clandestino concorrente do de Pacheco Pereira o maoismo estava já completamente desacreditado em França, por denúncia de Simon Leys que estes indivíduos não desconheciam.
Alguns, como José Manuel Fernandes, antigo director do Público só descobriram o logro, nos anos noventa, já na 26ª hora depois da queda do comunismo quando leram "Os Cisnes Selvagens"! Inacreditável!

A denúncia do terror e do totalitarismo, aliás, nunca os afastou da ideologia que professaram e defenderam depois do 25 de Abril de 1974 que "derrubou a ditatura" mas que os mesmos pretendiam substituir por outra sem comparação possível e um imenso gulag para a maioria dos portugueses, nem que para isso fosse preciso eliminar alguns milhares deles. Era isto em que acreditavam e se propunha fazer se tivessem oportunidade.

Quem assim pensou e lutou por isso em movimentos políticos não merece a mínima condescendência intelectual. Zero. Pacheco Pereira foi um deles.

Este palerma nunca assumiu essa loucura e continua a escrever assim, ocultando todos os aspectos perversos da actuação política do finado durante o PREC, com particular destaque para os que foram ontem elencados por Helena Matos ( que foi também extremista mas se arrependeu a sério, tal como Rita Seabra ou José Milhazes e não como os cristãos novos do comunismo/democracia que permanecem essencialmente na mesma, no seu íntimo), no Observador:


O obituário do Público agrega ainda outros esquerdistas antigos que nada aprenderam e pouco esqueceram, sendo pessoas que "ficaram na mesma", no seu interior ideológico.
 O sinistro Vítor Ramalho é um dos melhores exemplos. Nenhum deles se lembra do que o MRPP fez durante o PREC, particularmente o que fizeram no RALIS e a um herói nacional, verdadeiro, chamado Marcelino da Mata, cujo nome nem sequer querem ouvir falar porque os assusta. É por isso que não falam nele, nos jornais e ocultam e censura qualquer ensejo de homenagem. É uma pessoa que sabe o que foi Portugal antes de 25 de Abril de 1974 e aquilo em que se queria tornar por obra e graça dessa canalha, com destaque particular para este finado e os que assinam este obituário.

Não é por acaso que o Público se transformou num cóio de esquerdistas extremados no pensamento e adeptos de causas próprias a esse estado de espírito, como as que proliferam na capa do jornal, todos os dias, desde a sua fundação em 1990:




O Expresso é mais parcimonioso mas não menos consensual naquele entendimento censório.

O artigo de Ramalho Eanes compreende-se porque foi um dos que acompanhou a formação inicial do alferes Arnaldo, militar no Oriente, onde se instruiu acerca das maravilhas do totalitarismo maoista, marxista-leninista e de quem se tornou amigo.  Uma maravilha que queria replicar por aqui sendo ele o "líder" e "educador" de uma classe a que não pertencia.

O resto do obituário é a sensaboria típica do jornal. Repare- se no título inacreditável:



O Sol é a mesma coisa: verbo de encher. Os mínimos para assegurar que comparecem ao panegírico. Mariana Madrinha? É familiar do Madrinha do Expresso? Deve ser. E ainda falam do Governo...


 Enfim, esta  resenha cheira a mofo, não vai ao ponto e deixa de fora todo o panorama em que se moveu este desgraçado.
Quem ler estes obituários fica a pensar que estamos perante uma figura de relevo nacional digna de toda a admiração e é exactamente o contrário.

Repare-se neste obituário avant la lettre, feito aqui há um pouco mais de um ano, sobre esta cambada de doidos que se levaram a sério e foram seguidos por inúmeros palermas, alguns dos que agora escrevem os obituários acima elencados:

                                                                             ***

  Nas semanas e meses que se seguiram ao 25 de Abril de 1974 o país transformou-se numa exposição a céu aberto do grafitismo político, tantas as pichagens e inscrições murais de carácter político que então surgiram.
Virtualmente nenhuma aldeia do país ficou isenta de tais apresentações gráficas de cariz propagandístico.
Um dos movimentos políticos que mais se destacaram na pintura de paredes foi o MRPP, cujas duas últimas letras da sigla chegaram a estar associadas a tal actividade: pintores de paredes. O mais célebre slogan pintado: "Nem mais um soldado para as colónias!"  Grande obra a dos notáveis do MRPP !, hoje situados em lugares de relevo no panorama social e que nunca pagaram o devido preço dessas parvoíces que escreveram e que nos trouxeram desgraças sociais várias.

Esse fenómeno político, daqueles anos, tinha aparecido originariamente no início dos anos setenta, em Lisboa e nos meios estudantis, segundo reza a história, no caso escrita por Miguel Cardina.

Entre os seus mentores da época estavam estudantes que mais tarde se notabilizaram em lugares de destaque político e jornalístico e ainda intelectual que ficaram para sempre conhecidos como ex-maoístas: Durão Barroso,  José Lamego, Jorge Coelho, Maria João Rodrigues  Nuno Ribeiro da Silva,  Ana Gomes, Pedro Bacelar de Vasconcelos, Maria José Morgado e Saldanha Sanches,  bem como os jornalistas José Manuel Fernandes,   Manuel Falcão  e João Mesquita, antigo presidente do sindicato dos jornalistas, a dirigente da comunidade israelita de Lisboa, Esther Mucznik, e o académico António Costa Pinto.
Quem os ouve, hoje em dia, parece que foi tudo a reinar. Coisas de juventude, natural e perfeitamente aceitável. Só que a juventude não é desculpa para a estupidez ou a ignorância relapsa de quem não procurou informar-se podendo e devendo fazê-lo. Daí que as razões dessas opções políticas residam muito mais na personalidade sui generis dos militantes do maoísmo serôdio e sem eira nem beira, neste canto à beira-mar plantado há muitos séculos.

Uma coisa que sempre me espantou foi a circunstância de essas pessoas, na época, serem estudantes que liam e pelos vistos "liam tudo", como diria mais tarde um deles, anotado pelo  Público, em 15.8.2004:

Terão eles mais em comum do que esta incursão pela extrema-esquerda? Pois é aqui que regressamos às preferências do patrão do "Expresso" e da SIC pelos maoístas. "Devido à nossa enorme capacidade de trabalho", justifica José Manuel Fernandes. Ainda mais fundo: ninguém que tenha sido formado em jovem nas organizações de extrema-esquerda pode sair igual aos outros que não tiveram esta experiência. Estavam lá a tempo inteiro, pertenciam a uma minoria activa, o que acarretava riscos vários, extremavam-se em aperfeiçoar a arte de transmitir convicções. Como tinham lido quase tudo, eram a seu modo, um grupo de iluminados.Jorge Coelho: "Características deste gente? Grande nível de preparação política, grande capacidade de trabalho e disciplina, de determinação". Ana Gomes: "Foi uma escola política que marca no tipo de raciocínio, de análise e até de linguagem". O que justificará em parte, o ainda discurso inflamado da dirigente socialista: "Talvez ainda não esteja formatada de modo adequado". A ruptura, para a maior parte deles, começou pela constatação que o ambiente nas suas organizações se tornara "insuportável", concentracionário. E também pelo que dizem ser a "falta de sentido" que de repente encontraram na sua militância. Foi esta a experiência de Maria José Morgado e de Ana Gomes. Tinha acontecido o 25 de Abril, existia liberdade, mas eles continuavam a actuar como se ainda fosse o fascismo. Este desapego da realidade sentiu-o Ana Gomes com toda a força quando foi obrigada a isolar-se em casa com a sua filha, de seis meses, que apanhara uma pneumonia durante as suas constantes andanças com a mãe

Todas estas pessoas se formaram com estudos de universidade e encarreiraram de diversas formas.  Como foi possível passarem esses anos todos sem que se dessem conta do logro, do embuste politico-ideológico que depois vieram a reconhecer  com toda a candura décadas mais tarde?
 Como é que tais evidências agora reconhecidas não o foram na época em que poderiam ter sido e muitos reconheciam?  Que estranha cegueira os atingiu de modo fulminante nesse tempo?

(...)

 Mas foi preciso esperar pelos anos 90 para que a José Manuel Fernandes lhe caísse em cima "o lado negro e trágico da Revolução Cultural chinesa". Aconteceu com a leitura de "Cisnes Selvagens", o livro de Jung Chang que está para a China como o "Arquipélago de Gulag" esteve para a URSS. Devastador. Um arrepio: "Quando li este livro uma das coisas que me impressionou naquele tipo de vida, na dedicação que era exigida, é que aquilo era muito parecido com o que tinha vivido nas organizações a que pertenci".Alguns curaram as feridas no chamado Clube da Esquerda Liberal, já nos anos 80. Ficaram vacinados. É o que assumem, pelo menos. "Quando se acredita numa verdade absoluta e depois acontece o descalabro fica-se a perceber melhor o relativismo das coisas. Tornei-me assim uma pessoa muito anti-dogma", descreve Maria José Morgado. "Ter sido maoísta faz-me sentir muito mais vigilante, ter muito mais cuidado com as tomadas de posição, ter um muito maior apego às instituições e à democracia liberal. É preciso não forçar demasiado o sistema porque a democracia é um bem frágil", diz Costa Pinto, que precisamente elegeu como sua área privilegiada de estudo a democracia e o autoritarismo. O que são então eles hoje? José Lamego propõe uma grelha: "Há duas camadas geracionais: a dos militantes esquerdistas contra a ditadura e que está à esquerda. E a experiência esquerdista em afrontamento com o PC e que está à direita. Foram formados na luta contra o PC". É o caso, entre outros, de Durão Barroso.

 É essa tentativa de compreensão  que procuro fazer aqui com algumas indicações do tempo e que parece terem sido completamente ignoradas por esses indivíduos, em prol de fézadas que se revelaram enganos ledos e cegos que a fortuna, apesar de tudo ainda deixou durar muitos anos.

Antes de 25 de Abril de 1974 o maoísmo era a China de Mao e a política externa que alguns países então desenvolveram de aproximação à China, porque era assim que se apresentava nos media existentes. A visita de Nixon à China foi um acontecimento de relevo mundial.

A revista Observador de 3.12.1971 mostrava em duas páginas "o pensamento de Mao"...




Em 25 de Fevereiro a mesma revista apresentava a visita de Nixon apenas como um "grande negócio"...





Em12.11.1971 a revista Vida Mundial mostrava quase a mesma coisa: uma China irreal e desconhecida que aparecia filtrada pelos media, em que não se falava de comunismo, maoismo, Revolução Cultural ou outros temas claros e elucidativos do que realmente se passava nesse país.


Essas revistas pareciam versões em reader´s digest da Foreign Affairs americana. A realidade chinesa pura e simplesmente não existia como facto noticioso.

E quem elucidava verdadeiramente o que se passava no país de mais de um bilião de pessoas, em pleno refluxo de uma Revolução Cultural muito aplaudida pelos maoistas serôdios de cá?

Pois, quem lá viveu o tempo suficiente para perceber o que se passava. E escreveu um livro publicado em França, em finais de 1971 que por cá passou completa e incompreensivelmente ignorado, eventualmente até hoje.

Simon Leys era o autor, mas um pseudónimo de um indivíduo belga, Pierre Ryckmans, então refugiado na Austrália e que ninguém conhecia.
Nas revistas francesas de esquerda , na época, em finais de 1971 ( Tel Quel, bíblia do esquerdismo nacional e Le Nouvel Observateur, do socialismo democrático francês de Jean Daniel) a demolição do livro e do seu autor foi de preceito.

Por cá, nem se falou no livro, quanto mais nas ideias que lá vinham e que eventualmente teriam demovido de muita parvoíce os então maoistas em gestação acelerada.
Nenhuma revista falou ou recenseou a obra que eventualmente nunca foi traduzida em Portugal até hoje.

O livro retomava a célebre historieta infantil dos trajes novos do imperador...que afinal ia nu, para denunciar as manobras criminosas de Mao e da sua clique para se amparar do poder, através de uma fantasiosa Revolução Cultural, como de facto aconteceu.


Há dias, em 26 de Agosto, a revista Le Figaro Magazine recordou o que se passou com a publicação desse livro em França e a perseguição pessoal movida ao autor pela intelligentsia de esquerda francesa que dava cartas aos intelectuais de cá. Aos pachecos pereiras e afins prados coelhos, para além dos maoistas nascentes.




 É algo estranho que no Portugal da época tenha passado completamente ignorada esta obra, de denúncia de um maoismo criminoso, tal como tinha sido o estalinismo denunciado pelos sucessores ( Krutschev). Porém ainda é mais estranho que os maoistas nascentes não tenham dado importância a um livro que certamente conheciam pelas leituras francesas que então faziam ( "liam tudo"...)

Alguém explicará esta ignorância estratégica?

Por isso mesmo e por outras razões em 1974 os maoistas portugueses estavam virgens de tais ideias e factos. Ou faziam de conta. E por isso deram em reproduzir as parvoíces que imaginavam aplicáveis a uma sociedade como a portuguesa.

Nos muros de 1974 e 75 apareciam cartazes como estes, publicados no livro A guerra dos cartazes.



E se não conheciam o livro de Simon Leys conheciam muito bem as parvoíces perigosas que aqui se escreviam e foram logo publicadas em Junho de 1974.



Coisas como estas que Saldanha Sanches, Maria José Morgado e outros comiam ao pequeno almoço...coisas sobre a guerra, a luta de classes, as armas para liquidar a burguesia e outras parvoíces que não tenho bem a certeza que alguns tenham abandonado, como tal. Pessoas muito inteligentes, estas...


E afinal o que era o MRPP? Um antro de doidos políticos como continua a ser e que vivem ainda à custa do Estado português que os subsidia emquanto a Constituição proíbe as "organizações fascistas" e permite estas "maoistas", muito mais civilizadas e democráticas...

Em Novembro/Dezembro de 1974 não faziam segredo algum dessa loucura colectiva que até denunciavam os outros malucos do asilo ( os do PCP) como inimigos irredutíveis:



 Em Abril de 1975 até concorreram a eleições, apesar do boicote dos demais partidos esquerdistas cujas revistas de propaganda nem os conheciam...

Porém, a Vida Mundial de10.12.1974 apresentava assim o MRPP e as suas "bases programáticas", com que se apresentava ao eleitorado, já como partido:


A Flama de então ( fora do Patriarcado e estava nas mãos dos comunistas, um tal Alexandre Manuel e outros)  nem sabia quem era o MRPP, mas dava o destaque principal a Soares e Cunhal.


Na época a proliferação de grupelhos "m-l" ( que os pachecos pereiras afeiçoavam ideologicamente) era pior que a dos cogumelos na humidade, como mostra este gráfico do blog mencionado, de Miguel Cardina:


E como é que os demais "m-l" lidavam com o "líder da classe operária" e sus muchachos n o MRPP? Na revista Manifesto, de Fevereiro de 1975, então dirigida por Guerra Madaleno ( um advogado agora na berra...) foi publicada a posição desses malucos, em "mesa-redonda" sobre vários assuntos:




Segundo se noticia, o finado, à semelhança de outros como ele, não teve paz em vida e na morte também não. É portanto um desgraçado completo. Viveu de ódio e morre no ódio. Paz à alma deste desgraçado e que Deus tenha compaixão deste maluco.


Um dos filhos de Arnaldo Matos, Pedro Matos, acusou este sábado o PCTP/MRPP de ter “montado” um velório e “funeral-sequestro” ao seu pai, recusando participar nas cerimónias fúnebres do político. Arnaldo Matos morreu esta sexta-feira aos 79 anos.

Numa nota enviada à Agência Lusa, Pedro Gonçalves Matos, refere que o seu pai “morreu em casa alheia”, explicando que depois de “tardiamente avisado” e quando foi ao local para resgatar o corpo, a dirigente Maria Adelaide Teixeira, “do alto dos seus quase 80 anos, injetada de ódio e envergando pose de guarda de campo de concentração”, informou-o da vontade de Arnaldo Matos de ter as cerimónias fúnebres totalmente controladas pelo partido.

Segundo Pedro Gonçalves Matos, as palavras que a camarada lhe terá dirigido foram as seguintes: “Temos pena que tenha chegado a isto, mas então é assim: o velório e o funeral são do partido; as cinzas são da família”.


Nota: o acrescento Mao a Piao foi depois de ter lido um comentário no Observador, embora a expressão seja antiga.

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