A ideia básica é esta: a Igreja beneficia da mesma excepção a regras que a Intersindical beneficiou. Implícita e patente a mensagem é essa. E é falsa, pelos seguintes motivos:
Para a autorização da realização da manifestação do 1º de Maio foi necessário torcer a lei que estabeleceu o estado de emergência e que era restritiva e impeditiva de qualquer manifestação do teor daquele que foi realizado.
Tal lei vigorou até às 23:59 de 2 de Maio e portanto não havia modo de dar a volta a um texto claro e explícito que era este e até agravava as condições anteriores de limitação de direitos, liberdades e garantias. Como aqui se escreve, na sua última versão, o art.o 4.o do decreto 20-A/2020 suspendia parcialmente os direitos de deslocação e fixação dos cidadãos, os direitos de propriedade e iniciativa económica privada, os direitos dos trabalhadores, o direito de deslocação internacional, os direitos de reunião e manifestação, a liberdade de culto na sua dimensão colectiva, a liberdade de aprender e ensinar e o direito à protecção de dados pessoais, ao mesmo tempo que interditava todo e qualquer acto de resistência activa e passiva às ordens das autoridades.
Para se permitir a excepção a esta lei que abrangia toda a gente e todas as organizações, incluindo igreja e associações mais colectividades, foi necessária a intervenção do governo e em acto oficial, anunciar uma autorização expressa e inequívoca para a pouca-vergonha que foi a manifestação do 1º de maio na Alameda. Aqui está explicada a polémica.
O que agora está em causa é muito diverso, relativamente a autorizações para o que se poderá realizar.
O que diz a nova lei que substituiu o estado de emergência pelo de calamidade?
Como aqui se escreve, a lei ordinária, da Protecção Civil já confere poderes de limitação de actividades, meramente administrativos e sem intervenção de órgãos de soberania. Ou seja, as "autoridades" podem autorizar coisas que antes não podiam. Administrativamente e sem necessidade de recurso a "excepções" graves e significativas como foi o caso da manifestação do 1º de Maio.
Tal levanta aliás problemas de constitucionalidade sempre que as autoridades administrativas se atrevam a negar autorizações ou a impedir actividades que não estão compreendidas no âmbito da "protecção civil" tout court e para além daquelas que eram explícitas no estado de emergência.
É assim que pensam muitos juristas, incluindo Menezes Leitão:
Lei de Bases de Protecção Civil. É verdade que, nos termos do art.o 21.o, n.o 2 dessa lei é possível decretar a fixação de limites ou condicionamentos à circulação ou permanência de pessoas e a fixação de cercas sanitárias e de segurança, mas não é permitida, com base nesta lei, uma suspensão parcial generalizada de direitos fundamentais, como ocorre no estado de emergência. Acresce que a Lei de Bases de Protecção Civil atribui ao Governo toda a competência para declarar o estado de calamidade, sendo o mesmo efectuado por simples resolução do Conselho de Ministros (art.o 19.o), sem qualquer intervenção do Parlamento ou do Presidente da República. Se esta solução for adoptada, veremos assim os direitos dos cidadãos a ser restringidos indefinidamente, apenas por intervenção das autoridades administrativas, sem a adequada cobertura constitucional e fora do controlo dos outros órgãos de soberania.
Portanto, o que a Igreja, a do cardeal Patriarca de Lisboa andou a negociar, se foi isso, foi algo simples: um tiro no pé.
Como se mostra pela primeira página do Público, o principal órgão de propaganda governamental em nome da Geringonça e da "luta" permanente desta esquerda pelo poder político, a Igreja já foi comida com cebolada.
Triste.
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