Artigo de Pacheco Pereira no Público de hoje, de doutrinação política sobre a essência do PSD:
Lendo fica a ideia de que o PSD pode deixar de ser o que sempre foi, um partido social-democrata seja lá isso o que for e que Pacheco Pereira insiste em definir através de ideias simples e com três chavões: o liberalismo político da tradição prè-republicana, dos Garrets e Herculano; a doutrina social da Igreja e o personalismo cristão associado à social-democracia.
Para explicar os chavões apresenta os exemplos do ambiente liberal no Porto, a figura do bispo do Porto exilado no tempo de Salazar por se opor ao regime e o "personalismo" simplificado por este escriba licenciado em Filosofia como "o homem e a mulher são ´pessoas` e não podem ser reduzidos à qualidade de cidadão". E até cita o programa do PSD sobre tal conceito em que se afirma ser a pessoa humana um valor anterior à sociedade e ao Estado.
Sobre o "liberalismo" distingue a liberdade política e a económica, como factor diferenciador e rejeita a redução ao "liberalismo" que define como sendo a redução dessa liberdade económica ao estado mínimo. Abanca no conceito de lassez-faire, laissez passer o tal neoliberalismo, como inimigo do socialismo que surgiu como reacção à luta de classes que é consequência do "fosso cada vez maior entre os burgueses e os que nada tinham, os proletários". O socialismo dividiu-se entre a versão russa e a alemã e nórdica, com a social-democracia. Ou seja, um neo-marxismo reciclado no politicamente correcto.
Em apoio da tese de que o PSD sempre foi social-democrata pró-socialista, até apresenta Sá Carneiro como exemplo! Em 1975 e 1978...
Qual o objectivo da catilinária contra o fantasma do "neoliberalismo" que o aflige por assolar o PSD actual numa tentação putativa de se definir mais à direita? Atacar os próceres dos tempos do "governo Passos-Portas-troika". Nada mais.
É este caldo de cultura que borbulha na mente escrita de Pacheco Pereira que se esforça por aparecer como ideólogo do partido e conservador do seu imaginado ideário original.
Uma forma de indagar se lhe assiste alguma razão seria por exemplo catar no "neoliberalismo" de Passos Coelho qualquer vestígio de veneno anti social-democrata ou apurar se Sá Carneiro foi assim como Pacheco Pereira gosta de o apresentar, contextualizando o tempo em foram proferidas as afirmações citadas, incluindo o tempo da famigerada "troika" e dos seus efeitos e causas.
Para este efeito, o jornal Semanário- um órgão informativo dos anos oitenta, de que fez parte redactorial Marcelo Rebelo de Sousa e inequivocamente um jornal de direita onde até Paulo Portas escreveu- de 3 e 10 de Dezembro de 1983, no qual se compilaram várias declarações e escritos de Sá Carneiro com vista a mostrar o seu pensamento político, numa curiosa análise de prognose póstuma.
Para o efeito há mais recortes a apresentar, para além das escolhas selectivas do artigo de Pacheco Pereira:
O pensamento económico de Sá Carneiro aparece definido num certo contexto que Portugal atravessava no momento, nos anos setenta, de predomínio socialista e comunista, com a nacionalização das principais indústrias portuguesas e a consagração constitucional da irreversibilidade de tal política económica e de regime.
A ideia de Sá Carneiro, claríssima, em 1978, era de que Portugal tinha que retomar a preponderância da "sociedade civil" em confronto com a estatização de índole socialista e comunista. O que significa tal opção pela preponderância da "sociedade civil" do que mais "liberalismo" e menos estatismo?
A noção ressequida e já serôdia acerca do pretenso "neoliberalismo" do tempo do governo de Passos Coelho-Portas- troika" é um mito, construído e repetido por Pacheco Pereira eventualmente por razões que a razão não explica.
Alguma vez, porventura, Passos Coelho ou mesmo Portas foram neoliberais ou quiseram aplicar receitas neoliberais em Portugal à semelhança do que eventualmente se tentou fazer noutros países, mormente nos EUA do tempo de Reagan?
A fantasia de Pacheco Pereira ainda é mais perversa porque nem dá atenção à principal preocupação do então Sá Carneiro, expressa também claramente: transformar Portugal num "país verdadeiramente europeu, democrático, moderno, com um nível económico e cultural semelhante aos demais".
Os países europeus dos anos setenta e oitenta foram constituídos por governos "neoliberais", ou sequer mais à esquerda do que o do "Passos-Portas-troika"? Portugal era um caso à margem da Europa de então, dominado por uma Constituição esquerdista e pró-comunista.
Enfim, a obsessão pessoal com aquele grupo que faz parte do PSD e é tão social-democrata como os demais, é fantasia recorrente e ideológica de Pacheco Pereira e de uma esquerda ressequida por mitos e lêndias que já não deveriam ter curso.
Nos artigos em causa, Sá Carneiro é apresentado como tendo uma ideia clara dos partidos em causa: "o que é o PS? E o CDS? E o PSD? Aquilo que em cada momento, militantes e dirigentes quiserem fazer deles".
Aliás na altura da AD, em 1980, Sá Carneiro era apresentado como um sinistro representante, não do neoliberalismo, conceito que surgiria logo a seguir, mas da direita mais reaccionária:
A guerra ideológica que a esquerda manteve então contra Sá Carneiro visava o quê, afinal? Afastar o neoliberalismo ou o reaccionarismo de direita do dito?
Enfim, onde estava então Pacheco Pereira?
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