Há dezenas de anos que o tempo do Estado Novo é identificado como o "anterior regime", deposto em 25 de Abril de 1974 e vilipendiado como fascista, obscurantista e causa primeira de um atraso endémico que assolou o país durante 48 anos, com altíssima taxa de analfabetismo e uma economia atrasada, condicionada pelo Estado.
A wikipedia classifica o regime do Estado Novo deste modo:
Estado Novo foi o regime político ditatorial, autoritário, autocrata e corporativista de Estado que vigorou em Portugal durante 41 anos ininterruptos, desde a aprovação da Constituição portuguesa de 1933 até ao seu derrube pela Revolução de 25 de Abril de 1974.
Não perguntei mas se o ChatGPT for questionado não será muito diferente a resposta obtida com os algoritmos inclusos, o que deixa muito a desejar tanto da wikipedia como local referencial de saber e do sítio americano de A.I.Assim, praticamente não há distinção clara entre o regime em que Salazar foi chefe de Governo e se denominou Estado Novo que começou em 1933 e que insistem em dizer que durou até 1974 e o regime que vigorou desde 1968, depois da reconhecida incapacidade física em mental de Salazar em governar que originou cinco anos de governos de Marcello Caetano, até ao 25 de Abril de 1974.
Porém, esses cinco anos de governo de Marcello Caetano não se identificam exclusivamente com o salazarismo ou o Estado Novo senão em "evolução na continuidade" que foi mais uma evolução em descontinuidade após uma ruptura ideológica em 1968, passando a denominar-se Estado Social, para marcar diferenças de vulto que advieram de uma "Primavera marcelista", reconhecida mesmo por historiadores.
Esse anacronismo interessa a uma esquerda sempre presente no panorama mediático e ultra-dominadora no discurso corrente.
Tal anacronismo que replica uma censura na medida em que esconde a realidade e inventa uma alternativa, é mais uma vez evidenciado num número especial da revista Visão, herdeira de uma esquerda que começou no O Jornal, em 1975 mas que vinha de trás, do tempo do Estado Social e que aliás dominava já os meios académicos e jornalísticos.
Esta esquerda sempre foi compagnon de route do comunismo e nem os acontecimentos de finais dos anos oitenta serviram para mostrar a equivalência do comunismo ao verdadeira fascismo, o que obrigaria a uma necessária revisão de consciência ideológica que nunca fizeram.
Por isso os anacronismos continuam a medrar como cogumelos na humidade quente de tal caldo de cultura, sem fungicida que valha. A podridão ressequida ideologicamente marcada está incrustrada na mentalidade vigente e mediática e não há volta a dar para recuperar qualquer brilho de realidade capaz de mostrar cabalmente como foi para se saber como é.
Os lugares comuns estão quase todos nas linhas editoriais que tentam explicar como era Portugal antes de 25 de Abril de 1974: "muita gente presa e torturada por se opor ao regime"; censura prévia à imprensa; filmes "escortaçados", um neologismo curioso e sem paralelo em nenhum dicionário; televisão controlada pelo regime; mobilização militar geral para defesa das "colónias africanas"; governos ao serviços de "grandes grupos económicos".
Quanto à censura prévia e à prisão de indivíduos suspeitos de actividades subversivas relativamente ao regime, torna-se sempre necessário distinguir e esclarecer que o fenómeno censório em Portugal era apenas um pouco mais apertado e rigoroso do que o existente noutros países europeus, como a França ou a Inglaterra no que se referia a costumes sociais.
Quanto a ideologia e política, mormente de esquerda comunista, a censura era efectiva porque o regime não admitia a propaganda aberta ao comunismo ou marxismo radical. Mesmo estupidamente, o sistema de censura prévia à maioria de órgãos de informação, pautava-se por regras conhecidas de todos: era proibida a propaganda marxista veiculada pelo PCP ou pela extrema-esquerda e tudo o que cheirasse a tal odor pestilento e revolucionário pró-comunista era cortado a lápis azul. Pode agora questionar-se quem tinha razão relativamente a tais opções ideológicas, mas a verdade é que havia tal censura.
De resto, havia vários jornais e revistas que eram defensores de tal esquerda e tinham apesar disso curso livre porque não escreviam de modo aberto e panfletário, percebendo que seriam censurados se o fizessem. Mas não deixavam de veicular as respectivas opções ideológicas, bem assumidas e concretas. Um exemplo:
A prisão de opositores ocorria, sendo as principais vítimas os comunistas clandestinos que pretendiam para Portugal o mesmo regime que existia nos países do Leste europeu, então conhecidos como países para lá da Cortina de Ferro. O epíteto óbvio tinha a ver com a opacidade, a ilusão, a mentira e a demagogia espalhada no ocidente a propósito de tais regimes totalitários e que se veio a tornar aparente a todos os que quiseram ver, no final dos anos oitenta.
No tempo do Estado Novo de Salazar e no Estado Social de Marcello Caetano a denúncia de tais regimes era firme, clara e inequívoca, mas pouco eficaz porque a censura não permitia que os crédulos deixassem de o ser por não perceberem o logro e a mentira que o PCP e a extrema-esquerda lhes incutia, clandestinamente. Assim se alimentou o equívoco durante décadas que aliás perduram.
Portanto, é um anacronismo generalizar e aplicar a medida censória dos regime anterior- o de Salazar e o de Caetano, já modificado e que se lhe seguiu- a toda e qualquer manifestação de oposição a tais regimes. As provas são irrefutáveis mas nunca se aceitam como tal, generalizando-se sempre para distorcer a realidade dos factos.
A Visão dá em duas páginas o quadro sintético e imperfeito do regime constitucional, anterior:
O sistema eleitoral não era "democratizado" no sentido de universal e multipartidário, existindo apenas um movimento nacional que apoiava o regime, em União Nacional e a oposição em geral, em C.D.E. , Comissão Democrática Eleitoral.
A Oposição era controlada de algum modo pelo regime que pretendia evitar a entrada pela janela quando tinha fechado a porta aos comunistas e extrema-esquerda. Ainda assim, havia manifestações eleitorais e congressos da Oposição em geral, mesmo com as dificuldades decorrentes de um estatuto mal definido e com manifestações clandestinas como estas:
A esmagadora maioria da Oposição era de índole revolucionária, activista e de extrema-esquerda, incluindo um PCP ultra ortodoxo e totalmente alinhado pelo sovietismo, tendo ainda no programa os resquícios da "ditadura do proletariado".
A população em geral não era informada deste fenómeno que crescia, nem muito, apesar disso, nas catacumbas das universidades e lugares de sindicalismo revolucionário. Os presos do regime, os tais que eram submetidos a tortura, vinham desta extracção clandestina e é estulto dizer ou escrever que assim não era, o que hoje se faz ao omitir tal circunstância e deixando pairar a ideia e lugar-comum que os presos e torturados eram pessoas da oposição "democrática" e não revolucionária, comunista ou de extrema-esquerda.
Basta ver quem eram os presos políticos libertados no dia a seguir ao 25 de Abril de 1974 para reconhecer tal facto.
Em 2020, o Polígrafo de um destes jornalistas formados no esquerdismo de madrassa, publicou um desmentido de no dia 25 de Abril de 1974 haver cerca de 88 presos políticos em Portugal, contrapondo a versão autorizada pela independência, isenção e total ausência de sectarismo de um Fernando Rosas que apresentava o número redondo de 30 mil presos durante os 48 anos de fassismo! Mais: quem afirmava tal número insignificante era José Hermano Saraiva, um antigo ministro de Salazar que acrescentava terem as prisões a seguir enchido com 3000 presos políticos, no novo regime, três meses depois da Revolução. A aldrabice do esquerdista Rosas, acolitada pelo jornalista de madrassa reside na circunstância de nem quererem saber quantos presos políticos foram libertados no dia 25 de Abril de 1974 e prestarem-se logo a contabilizar quantos presos políticos teria havido durante os 48 anos, apesar de reconhecerem a dificuldade inerente a tal contabilidade apressada.
Nesse mesmo episódico Polígrafo fala-se ainda noutra coisa: um auto-de-fé, protagonizado por um adjunto do ministro da Educação do tempo PS. Rui Grácio, o mesmo que aboliu a divisão entre ensino técnico e liceal, mandou destruir, ou seja queimar livros fassistas. O critério, naturalmente era simples: os que tinham sido publicados pelo governos e regime anterior. Uma moralidade diferente daquela que acusavam o regime anterior de praticar...porque este apenas proibia a publicação e apreendia os que violavam tais regras.
Quem eram os presos políticos no dia 25 de Abril de 1974 sabe-se...e com algum rigor até de identidade política. Quantos eram ao certo é muito difícil, o que é estranhíssimo e revelador da manhosice do novo regime. E no entanto havia presos políticos em dois locais: Caxias e Peniche. Quantos eram, ao certo? 88? Mais? Menos? Alguém diga...o que é importante porque do modo como escrevem estes articulistas de madrassa antifassista, meio Portugal estava amordaçado e muitos milhares estariam presos e submetidos a torturas infindas, no dia 25 de Abril de 1974.
Quanto à subserviência do regime de Salazar e depois de Marcello Caetano relativamente aos "interesses dos grandes grupos económicos", o melhor seria a revista escrever "monopólios" porque essa é a linguagem corrente do PCP que inspirou aquela.
Para ver quem eram e quantos eram tais grupos em duas páginas ficou esclarecido o assunto, assim:
Como é sabido estes grupos económicos foram os que produziram riqueza nacional, com capitais nacionais e com investimento em Portugal durante os anos do regime de Salazar e Marcello Caetano, particularmente este último em que a economia crescia a taxas nunca mais vistas posteriormente.
No entanto tudo isto é obliterado em nome do pecado de serem tais grupos afinal e apenas geradores de "grandes fortunas", o que remete inelutavelmente para a última palavra dos Lusíadas que é "inveja". A escriba que assim se exprime é uma tal Clara Teixeira, certamente muito bem formada na madrassa respectiva. É esta formada em sociologia na Universidade Autónoma de Lisboa que lhe conferiu o grau para escrever estes dislates, de acordo aliás com a cartilha vigente. O professor de Sociologia de tal estabelecimento formou-se onde, já agora? No ISCTE...é preciso acrescentar mais?!
Estas pessoas que foram industriais de grande gabarito internacional, com capacidade de criação de riqueza que nunca mais se viu em Portugal são tratadas abaixo de cão, como apenas detentores de grandes fortunas, como se estas proviessem de heranças ancestrais ou de uma sorte macaca condicionada pelo regime.
As citações para os definirem partem sempre de figuras de isenção, independência, saber e competência do calibre de um Fernando Rosas e quejandos e o maior argumento de arremesso contra os mesmos é sempre este: foram protegidos pelo regime, que lhes condicionou a actividade em modo favorável. Isso como se houvesse espaço em Portugal para uma concorrência que aliás é típica de um capitalismo que condenam a priori. Ou seja, defendem algo que intrinsecamente nem toleram ideologicamente, servindo-se do argumento para mostrarem algo que não se percebe o que seja a não ser do ponto de vista de sempre: a inveja, mesquinhez e tacanhez política derivada do sectarismo ideológico esquerdista.
Quanto ao que produziram em prol da riqueza nacional nem uma palavra. É tudo condicionado pelo regime fassista.
Por outro lado os exemplos das "grandes fortunas" com relato feito por jornalistas sociólogas deixa muito a desejar porque falta muita gente para explicar como é que economicamente Portugal evoluía até 25 de Abril de 1974. E em Setembro de 1974 era assim indicado por um jornal de propaganda do comunismo que se preparava para tomar conta da economia, com as nacionalizações do ano seguinte. O Sempre Fixe:
Como se lê, o problema não eram só as "grandes fortunas", mas também os "grandes patrões", como o sociólogo do ISCTE deveria ter ensinado.
Como exemplo último do atraso endémico do país apresentam as barracas que foram construídas pelos migrantes vindos do interior do país para a grande Lisboa, nos anos do regime de Salazar e Caetano. Em artigos profusamente ilustrados com miséria ambiente, tentam mostrar que o regime gerou tal situação devido à sua intrínseca natureza maléfica e que é acompanhada com retratos dos imigrantes que iam para França viver em barracas semelhantes, tudo culpa em extensão de tal regime.
Não explicam é quando foram eliminadas tais barracas e construídas casas decentes para quem nelas morava e que nível de vida se conseguiu depois e principalmente com que dinheiro: se daqueles "grandes patrões" ou se dos impostos que estão actualmente ao nível superior a 36% do rendimento de cada um daqueles que trabalha e paga impostos. Nem explicam onde se gastou a fortuna superior a 150 mil milhões de euros que nos emprestaram para investir e deu no resultado que temos: o país mais atrasado da Europa.
Tudo isso contrasta com o "dia inicial inteiro e limpo" que surgiu em 25 de Abril de 1974 e permitiu nos meses e anos a seguir exemplos fantásticos de uma revolução que afinal trouxe a prosperidade e felicidade esperadas e desejadas.
Por exemplo nos costumes e na liberdade informativa tornou-se possível ver nos escaparates quiosques e no chão das ruas de Lisboa, antes de haver bancas, publicações de grande qualidade moral, ética e instrutiva, como estas que dantes eram proibidas pela temível censura prévia e a posteriori.
Esta capa do nº 2, de Junho de 1974, de uma nova revista de referência nacional podia ser publicada e eventualmente apreciada pelo novo regime:
A do nº 1 é que já tinha sido um problema que o próprio autor, coitado, dava conta para lamentar o ocorrido:
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