António Cluny, antigo sindicalista do MP, tornado jubilado e que nos últimos vinte anos ocupou cargos em tribunais superiores ( Constitucional e Contas) e em organismos internacionais, escreve amiúde sobre os problemas actuais do Ministério Público.
Desta vez, o artigo é relativamente extenso mas merece comentário. Refere-se a duas entrevistas, uma dele mesmo, à Advocatus e outra da actual Conselheira ( desde Abril 2022) do STJ, Teresa Almeida que fez toda a carreira no Ministério Público ( e também no referido TC) e cuja cacha jornalística após a referida entrevista se resume a uma frase: Ex-procuradora Teresa Almeida defende que MP só deve investir num processo quando é possível obter condenação.
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O primeiro comentário a fazer é o que autoriza particularmente estes dois magistrados a pronunciarem-se sobre problemas concretos do funcionamento da magistratura do MºPº, em sede de inquéritos, mormente no DCIAP, uma estrutura que conhecem como os demais magistrados conhecem: por ouvirem falar, uma vez que nunca lá trabalharam.
O que é que os torna particularmente aptos a falarem sobre processos que por aí passaram, aí foram instruídos e de lá saíram para os juizes de instrução e julgamento? Sinceramente, não sei se conhecem o suficiente para produzirem afirmações que revelam um conhecimento no mínimo duvidoso.
No caso de Teresa Almeida, esteve alguns anos no DIAP ( até 2014, depois foi para Évora para um cargo de coordenação de comarca) e fala em processos de corrupção, com o "colapso de dois bancos, violação de segredos de Estado, o caso das "secretas", e afirma que foram coisas que apareceram pela primeira vez pelo que "tínhamos muito que estudar e discutir em conjunto com uma equipa que assegura ter sido "espectacular". Não estive a procurar muito, mas tais processos parece-me que foram tiros de pólvora seca e que se enquadram, alguns deles, precisamente no âmbito da frase que o Expresso destacou...porque é disso mesmo que se trata: nem todos os processos podem dar condenações. Estatisticamente julgo que até são menos que o contrário, pelo que o problema é mais complexo do que dizer simplesmente que só se deve acusar quanto há condenações subjectivamente garantidas.
Na verdade, o que os move a falar sobre os problemas do MºPº são apenas os processos mediáticos que por aí passaram...e o que dizem afinal sobre tais processos? Pouco e de interesse muito relativo.
Em primeiro lugar a relação da magistratura com a política não tem que ser equacionada deste modo, conspiratório, mesmo para afastar a sua eventualidade, porque as únicas entidades que a tal se reportam e referem são os entalados cuja credibilidade anda pelas ruas da amargura, como José Sócrates. Portanto, isso não é e nunca foi um problema, em Portugal e falar no mesmo é espúrio e contra-producente.
Teresa Almeida foi da extrema-esquerda; Cluny do partido comunista e como muito boa gente acaparou-se no socialismo vigente. Será que alguma vez alguém pensou que tal influenciou as decisões que tomaram nos processos?
Estas frases supra mencionadas pressupõem os últimos casos, como o do Influencer, obviamente, embora no melhor estilo de hipocrisia de quem fala dizendo que não quer falar disso.
Investigar actuações de políticos, como no caso Influencer, que envolve governantes e até o primeiro-ministro, conluiado com amigos que escolheu e colocou em lugares-chave, como é o caso de Lacerda Machado, envolve necessariamente suspeitas de comportamento criminoso, a partir do momento em que se descobre que alguns deles andam a traficar claramente influências e de modo criminoso.
Qualquer magistrado que se preze, esteja ou não no DCIAP ou no EUROJUST devia saber disto e não escrever algo como o que acima se transcreve que soa mais a branqueamento do que outra coisa, mesmo travestida de grandes princípios.
É óbvio que a investigação a políticos como os indicados ocorre apenas porque o são e não por causa de outra qualidade qualquer. É perfeitamente natural, e no EUROJUST estão carecas de o saber que as suspeitas sobre determinados políticos implicam a investigação apenas por se tratar de políticos. Não há qualquer volta hipócrita a dar ao assunto, só para ficar bem num retrato a fotomaton da isenção.
O caso particular de Rui Rio, com as buscas a sua casa e por causa de atribuições de verbas partidárias a assessores que podem não ter direito a tais benefícios, gerou obviamente celeuma por causa do impacto mediático das buscas e da reacção intempestiva e intemperada do visado que não suporta ser investigado por ser político e por causa de acções políticas que podem constituir crimes, mesmo menores. A celeuma só acontece porque determinados eleitos se julgam acima dos eleitores por causa disso mesmo, apesar de a Constituição que aprovaram o denegar expressamente, dizendo que ninguém está acima ou abaixo da lei.
Isso justifica este tipo de reacções de magistrados que deveriam saber melhor? Onde está a defesa dos colegas, mesmo corporativa se assim se justificar, como aliás justifica? Da parte deles, nada. Só críticas e nem sequer bem fundamentadas, pelo que sobra a suspeita acerca das razões porque o fazem, aqui e agora.
Então, para quê, borrar e limpar logo a seguir, com estes parágrafos que seguem?
Torna-se óbvia a insinuação com insistência em casos que só encontram eco nos recentes e mencionados e por isso lança o articulista um manto de suspeição sobre os magistrados de tais processos que aliás têm nome e fazem parte do DCIAP. Para mim é uma afronta, pura e simplesmente. Uma ignomínia, com a acrescento de uma acusação directa para os visados que assim põem em causa o Estado de Direito.
A insinuação aqui é mais perversa e concreta: os magistrados do Influencer são de "direita", como aliás já vi dito e escrito algures. Logo, são alvos a abater porque se o forem estão excluídos do gotha da bempensância democrática destes antigos comunistas.
E até é citada a actuação dos magistrados do antigamente que se portaram sempre de modo impecável neste aspecto. Por exemplo, no caso FP25, quando alguém em violação flagrante de segredo de justiça falou num nome concreto de suspeito e tal chegou aos ouvidos de um Mário Soares, a confusão de nomes com um destacado dirigente do PCP, fez acreditar aquele na conspiração e houve efectivamente uma manipulação política da investigação criminal, num curto período de tempo. Portanto, os antigos não têm lições a dar aos novos e muito menos nisto...
É certo que tal episódio ocorreu no domínio da antiga legislação, vinda do fassismo, mas isso não afasta o problema exposto que o articulista julga relevante enunciar e insistir, como se isso fosse o problema do MºPº actual que temos em Portugal...e não se percebe onde o mesmo pretende chegar a não ser naquele contexto de insinuação perversa e ignominiosa.
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