No artigo semanal do Público, Pacheco Pereira dá largas à sua conhecida veia de articulista sabe tudo. Ou quase. Há muito tempo que escreve sobre fenómenos da Justiça e teve mais que tempo para se informar, perceber e informar correctamente os leitores. Nunca o fez porque os preconceitos continuam a ser os mesmos de há imensos anos para cá e a ignorância patenteada avoluma-se com o passar dos anos.
Hoje escreve mais uma vez contra o "justicialismo" do MºPº declarando-se confortado com a sua assinatura no abaixo-assinado dos 50 que já são mais de cem e que entende ser algo contra "a forma de abuso de poder no aparelho de justiça" que comunica com a sua habitual bête noire do populismo que o indivíduo defininu já do mesmo modo: subjectivo e por "impressões".
Para não carregar nas tintas do sarcasmo que desviam a atenção de quem poderá ler, vou responder ao artigo apontando o que considero ignorância de Pacheco Pereira, sem intuito ofensivo.
JPP não tem dúvidas que os desenvolvimentos processuais no caso das "gémeas" são uma "palhaçada" termo repetido e assumido pelo mesmo como se fosse um entendedor do assunto- e daí e epíteto de ignorante que já teve muito tempo para aprender e não o fez até agora.
Segundo o mesmo as buscas a Marta Temido são um abuso de poder, uma ilegalidade e que denotam claramente o que os "responsáveis do Ministério Público" não se cansam de mostrar que é a "mera exibição de poder".
Será assim?
Vejamos:
O inquérito ao caso das gémeas começou com a participação para efeitos criminais e isso faz toda a diferença porque a partir daí as regras aplicadas são as do código de processo penal e legislação adjacente, com o código penal à ilharga.
O que faz um departamento de investigação de acção penal neste caso apoiado pelo órgão de polícia criminal Polícia Judiciária, perante uma participação deste teor que envolve pessoas do governo anterior e outras de fora das estruturas governamentais? Tem obrigatoriamente que investigar e neste caso contra os suspeitos e a favor dos mesmos. Tem que recolher indícios da prática dos factos que podem consistir em crimes previstos na lei, definidos como tal e para tal não sobram muitos meios ao dispor e que estão definidos na lei processual. As buscas num caso como este podem ser essenciais porque a prática dos crimes em causa passam por comunicações internas entre serviços do Estado, mormente no seio do próprio Governo. Como é que se faz uma coisa dessas sem invadir o espaço físico dos serviços governamentais? Não é possível fazê-lo com um grau de eficácia mínimo porque não se vai pedir a suspeitos que dêem a conhecer o que os pode incriminar e quando muito darão o contrário. Mas o MºPº investiga à charge e à décharge. Logo...
O timing é importante e não deveria fazer-se agora a diligência? Depende, porque atrás de um acto eleitoral vem outro e outro ainda ou outra coisa qualquer e o MºPº não pode nem deve sujeitar-se a esses critérios de oportunidade que são meramente políticos para actuar. Quem assim pensa, tem da respectiva função uma visão distorcida em prol do campo político como parece ser o caso de JPP, privilegiando os cidadãos que se submetem a eleições em nome do povo para governar ou para serem escolhidos para uma função política. Não é assim que a Constituição diz nem é assim que se deve encarar o assunto. Ponto. Final.
Avulta no escrito de JPP a ideia de que parecendo-lhe todo este processo crime uma "palhaçada" que poderia evitar-se se o presidente da República tivesse dito que meteu uma cunha mas todos metem cunhas ( não há outro modo de interpretar o que diz sobre isso...) o que é uma ideia errada porque o que está em jogo é saber se alguém no circuito do governo ou de quem tem responsabilidades para definir situações como a dos autos em causa o fez indevidamente e em modo criminal quanto aos procedimentos de autorização para que uma criança estrangeira acedesse a serviços públicos nacionais, para beneficiar do SNS por causa de um medicamento muito caro. Parece-me ser isso o essencial e nada mais. Ao MºPº não é lícito arquivar as participações com meras impressões casuísticas, como JPP faz.
Sendo a lei igual para todos não deveria estranhar-se que os métodos de investigação sejam comuns aos demais.
O MºPº actua neste como noutros casos, mormente com a realização de diligências, de forma típica, sem qualquer abuso à vista e sem os vícios que JPP aponta de abuso de poder e "justicialismo" seja lá isso o que for.
Pode criticar-se o modelo processual penal que obriga a instaurar inquéritos por factos denunciados como crime desde que haja indícios fundados do mesmo e neste caso há outra divergência de entendimento: JPP entende logo que não existe crime algum porque se trata de uma simples cunha, igual a tantas outras que existem, existiram e existirão. Será assim? Se formos por aí, o MºPº deveria ter arquivado liminarmente o inquérito justificando-se nas notícias que se conhecem ou até nos factos já apurados noutras sedes. Deveria assim fazer um juízo de valor para evitar a "palhaçada".
Mas não foi assim entendido porque isso significaria fazer o mesmo que o antigo PGR Pinto Monteiro e o então pSTJ Noronha de Nascimento fizeram com a participação criminal que alguns magistrados competentes lhes apresentaram para validação de escutas e instauração de inquérito a um Primeiro-Ministro em funções. Como sabemos não fizeram nada disso e o antigo PGR autuou o expediente apresentado como uma "extensão procedimental", figura inexistente, inventada a preceito pelo mesmo para evitar a investigação proposta e arquivar os autos liminarmente, com apoio do pSTJ, como sucedeu e sem clamor público como agora se vê, porque os (de)clamadores são sempre os mesmos e nesse caso servia-lhes os intuitos. Náo fui ver aos arquivos mas suspeito que JPP aplaudiu a actuação daqueles ambos os dois...
É disto que JPP quer? Parece que sim. Mas não é nada recomendável, porque não é isso que a Constituição diz nem a lei diz nem sequer o senso comum e é por isso que o Chega cresce. As pessoas sabem que há algo podre neste reino de uma dinamarca mediática e para-política de que JPP faz parte há longos, longos anos. Vive bem, é preciso dizer. Quem lhe paga sabe que o mesmo presta o serviço devido, também é preciso dizer. Ser isento custa muito e rende muito pouco.
Quanto ao modo de actuação do MºPº é o típico nestes casos e nada há a dizer. As buscas são um mal necessário para recolher indícios da prática de um crime. E pode haver crime ou não. Se não houver, isso não significa abuso de poder algum do MºPº, apenas a lei que se cumpre e sem qualquer sofisma ou cinismo. Se houver, estão justificadíssimas.
Os artigos do CPP que JPP não conhece, manifestamente, apesar de até o Jornal de Negócios dizer como se fazem, são estes:
E a jurisprudência comum é cognoscível com alguns toques nas teclas do Google e é esta, firmada aqui por um juiz de Matosinhos, podendo até dar-se o caso de ser o mesmo que já nem o é e era um bom juiz de direito naquilo que fazia tecnicamente, tendo sido demitido da função por suspeitas de práticas criminais graves.
As buscas domiciliárias não consentidas, enquadram-se no âmbito da proibição de prova, passíveis de nulidade absoluta e insanável, não podendo ser validadas, exceptuando nos casos previstos no nº 3 do artigo 177º ou no nº 5 do artigo 174º, ambos do CPP, e mesmo nestes casos dependem sempre de apreciação do juiz de instrução em ordem à sua validação, aferindo se a busca domiciliária é necessária, adequada ou proporcional, tal como o exige a lei processual penal ao nível dos pressupostos da sua determinação. |
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