A «Tanga» do Direito Constitucional ou
(mais prosaicamente), de como Berlusconi se enganou no país.
O farisaísmo em que se volveu a paroxística invocação do direito constitucional no nosso país tem dado que pensar ao Mangadalpaca ®.
A pretexto da defesa do bom nome e da honra das pessoas, toda a gente - juristas incluídos -, desatou a clamar pelo «amparo» do direito constitucional, como se outro remédio para os ataques àqueles valores não houvesse (esquecem-se, porventura, que existem normas supra-constitucionais, como as Convenções internacionais e certo direito institucional comunitário).
Para falar verdade, o Mangadalpaca desconfia que esta «febre constitucionalista» tenha intuitos mais que inconfessáveis.
Vem isto a propósito dos últimos desenvolvimentos da novela da (afinal ainda) Presidente da Câmara de Felgueiras, dra. Fátima Felgueiras (doravante designada, por comodidade, FF), na qual, incontroversamente, assume protagonismo o sr. Presidente da República, após ter entrado em diálogo franco com o advogado brasileiro de FF.
Não tanto no que respeita ao teor do acórdão do Tribunal Constitucional (que considerou inconstitucional a suspensão de FF como presidente da Câmara, enquanto medida de coacção decretada no processo em que é arguida), o que nem sequer é dado recente, mas no que respeita ao apelo (carta aberta) que a mesma fez ao Presidente da República (de acordo com a notícia do Expresso de 24/01/04). Isso sim, é digno de reflexão.
Tudo se passa na mesma semana em que o Tribunal Constitucional italiano considerou inconstitucional a lei feita aprovar pela maioria governativa de Itália, no sentido de blindar a responsabilização criminal de titulares de cargos políticos. O que teve o aplauso de largos sectores da opinião pública e da imprensa democrática italianas e europeias.
Berlusconi poderá, pois, por decisão do TC italiano, vir a estar a braços com a justiça do seu país, por factos cometidos antes de ser governante.
Em Portugal, por factos cometidos no exercício de funções políticas (v.g., presidência da Câmara), os responsáveis não podem ver suspenso o mandato (para que foram eleitos).
Mas podem ser presos...(imaginem a dificuldade do Mangadalpaca a explicar isto aos seus filhos). Diz o advogado português de FF que, abstractamente, nada impede a sua cliente de continuar a exercer as suas funções....à distância, com o recurso às novas (novíssimas) tecnologias. Com assinatura digital, p. ex., pode despachar à distância, assinar licenças e alvarás e, sobretudo, receber o seu vencimento e tudo (imagina-se que acrescido de despesas de representação, por deslocação para fora do território nacional).
Bravo país. Magnífico (é certo que Abílio Curto e Cerqueira estão às portas da prisão, após convenientes perdões de penas).
Ora, é aqui que o Mangadalpaca se põe a pensar.
As críticas às disfunções do sistema judicial não podem servir só para os compadres.
E quando se aplicam aos ex-amigos incómodos?
Em termos puramente lógicos, acha o Mangadalpaca que FF terá razão. Porque não intercede o Presidente a favor dela, face a tamanho atentado aos direitos fundamentais e garantias processuais penais de FF?
Em que ficamos, sr. Presidente? O que responde, agora, a FF? Será que não tem razão no apelo lancinante de autocomiseração que lhe fez? Será que há, em rigor diferença entre o caso de FF e o processo da Casa Pia? FF nem sequer está, ainda, formalmente acusada. FF goza da mesma presunção de inocência que Paulo Pedroso.
Vá lá, sr. Presidente, descalce essa bota...
Uma conclusão se impõe ao Mangadalpaca. A «justiça constitucional» não é o mesmo que o direito constitucional.
Porque não podem os cidadãos escrutinar as decisões do TC, quando as mesmas sejam iníquas nas suas consequências ...?
Acha o Mangadalpaca que se entrou na última esfera sagrada do sistema: porque não discutir a justiça constitucional como se discute a outra, a comum? Porque não dizer «o rei vai nu»?
A dessacralização das instituições do poder não pode ter redutos imunes à crítica e ao escrutínio.
Enfim, apetece dizer ao Mangadalpaca:
FF, volta, estás perdoada... Berlusconi é que se enganou no país.
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sábado, janeiro 24, 2004
quinta-feira, janeiro 22, 2004
Graçolas semióticas em círculo de giz ( quem quiser que o desconstrua- apagando-o da memória).
Este texto, escrito por um dalton, algures, é um palimpsesto e como tal, integralmente copiado e modificado, pelo copista em vertigem e furor de escrita. É um texto eventualmente pedântico e asneiroso. É uma brincadeira e aqui fica guardado, porque no sítio onde estava, já não serve. E atrás deste post virá outro, se Deus quiser,... que o porá no seu lugar- de arquivo!
Este trabalho é, assim, algo forçado. Como suspeito que muita gente começa a descobrir as alegrias da escrita no éter e a repensar palavras esquecidas, perceber-se-á que o écran na minha frente é que me obriga; um papel, nunca teria tal força. Mas ainda bem, porque assim a imagem está em segundo plano e a experiência continua.
Ao ler alguns “papers” universitários e disponíveis nestas bibliotecas virtuais, na net, como este de um conhecido de outras paragens – Luís Rocha - suscita-se-me o deslumbre do desconhecido e a perplexidade de uma ignorância.
Li o paper com a acuidade que não tenho: escapam-se algumas coisas, como seja isso do “disembodiment” que para minha conveniência traduzo por despersonalização e que equivale neste caso a desmascarar ( mascara, sendo igual a persona). Começa logo aí um equívoco e outros se seguiriam como num cacho pantagruélico ou, para usar outra imagem, numa wide web .
Estes termos são polissémicos e a nova linguagem cibernética é matreira: como é muito nova, foi beber onde era mais fácil e de repente onde uns falam de alhos, outros percebem bugalhos ou buganvílias. Semântica e semiótica, neste campo, não são bem a mesma coisa que no campo linguístico e se tais palavras se Saussurravam há mais tempo, fizeram um Eco enorme nos meus ouvidos, ao ler O Nome da Rosa.
O problema fundamental aqui é o da comunicação. Aqui, na blogosfera, é necessariamente a transmissão de mensagens escritas; e para mim é o exercitar contínuo de uma habilidade no uso da forma e da sintaxe para compor e decompor a riqueza do léxico e a abertura semântica duma palavra ou conceito.
Quem sabe falar este linguarejar melhor do que ninguém, são os nossos especialistas em eduquês e a mim sempre me afligiram. Quem maneja estes conceitos como o ninja lida com o sabre é o nosso sempre estimado EPC.Raramente percebi patavina do que ele escrevia sobre isso: Derrida, Saussure, et al.
Mas gosto do ECO que essas palavras fazem. Soa-me bem!
Esse paper do Luís Rocha começa com um Abstract, o que me delicia sempre que o vejo: é sinal de conferência, congresso, viagem; David Lodge na bagagem e ver que o Mundo é Pequeno.
Uma frase me capturou a atenção: “ evolving system is that they implement na embodied, evolving semiosis ( ESS) with theirs environments”
Para mim, o que define um sistema evolutivo blogueiro é a susceptibilidade em implementar( aaarrrgh!), digo, em consolidar ( humm..), digo em produzir semioses no seu ambiente acolhedor habitual.
É o que busco muitas vezes nestas paragens: uma experiência literária, com riscos para a imagem do copista.
Gosto de citar o Umberto Eco , sempre que o assunto encarrila por aí. O Eco é uma estação de paragem obrigatória para quem apanhar esse comboio. Estudou a ciência dos signos, ampliou o conceito e divulgou algumas ideias sobre isso. A cibernética veio atrás. Para entrar na carruagem e apanhar um lugarzinho confortável, junto à janela, enquanto se espera nessa estação, indico um link muito interessante de uma cabeça pensadora da Universidade da Beira Interior que também escreve Abstracts.
Para não fazer a figura da imagem da primeira página, fui ver umas coisas:
Mergulhei no site do John McCarthy e saí de lá vivo e com o site nos favoritos; fui ao sítio do Ray Kurzweil - e a música era vertiginosa mas agradável; li uma entrevista com o Jaron Lanier - e fiquei contente e optimista; fui à Wired de Abril 1999 e assustei-me com Bill Joy e penso rever o A.I. do Kubrick/Spielberg, porque é uma fantasia.
Fica-me uma pergunta: será possível algum dia pôr uma máquina a analisar e decidir se é coisa boa para todos nós o que se prepara para o Iraque , neste momento( a pergunta já tem meses...)?! Como a pergunta foi colocada nesse tempo, trasmuda-se em ...o que se prepara na Justiça, após o caso de que se fala?!
Quanto aos blogs e seus animadores, concordo com um certo Difool : não quero ser um estereotipo. Quero a minha liberdade de comunicar ideias, mesmo através de personagens virtuais. Nunca deixará de existir um bonecreiro por detrás e esse está identificado logo que se faz log in...
Assim, o problema dos disembodiments e dos web semantics, aqui não interessará muito( e assim penso safar-me da manápula Goliana de quem domina estas matérias...). O círculo circunscreve-se ao problema linguístico e das significações várias : é um problema de linguagem e não de personagens ou de nicks.
O comboio que está em marcha é o da semântica e semiótica: aliquid stat pro aliquo. Algo que está por algo , para alguém. E tem uma carruagem de carvão, atrelada e chamada método de raciocínio para se alcançar o conhecimento do que é escrito. Se o carvão falha e os passageiros viajam em carruagens de comboio malandro, com bancos de madeira e janelas abertas, bagageiras atafulhadas e cheiros derretidos, com algazarra generalizada, só com muita indulgência a viagem será um prazer. E não há boa comunicação.
Esta, por exemplo, é para a minha leitura de copista e fica aqui guardada.
Para relaxe e descanso das guerras jurídicas.
Este texto, escrito por um dalton, algures, é um palimpsesto e como tal, integralmente copiado e modificado, pelo copista em vertigem e furor de escrita. É um texto eventualmente pedântico e asneiroso. É uma brincadeira e aqui fica guardado, porque no sítio onde estava, já não serve. E atrás deste post virá outro, se Deus quiser,... que o porá no seu lugar- de arquivo!
Este trabalho é, assim, algo forçado. Como suspeito que muita gente começa a descobrir as alegrias da escrita no éter e a repensar palavras esquecidas, perceber-se-á que o écran na minha frente é que me obriga; um papel, nunca teria tal força. Mas ainda bem, porque assim a imagem está em segundo plano e a experiência continua.
Ao ler alguns “papers” universitários e disponíveis nestas bibliotecas virtuais, na net, como este de um conhecido de outras paragens – Luís Rocha - suscita-se-me o deslumbre do desconhecido e a perplexidade de uma ignorância.
Li o paper com a acuidade que não tenho: escapam-se algumas coisas, como seja isso do “disembodiment” que para minha conveniência traduzo por despersonalização e que equivale neste caso a desmascarar ( mascara, sendo igual a persona). Começa logo aí um equívoco e outros se seguiriam como num cacho pantagruélico ou, para usar outra imagem, numa wide web .
Estes termos são polissémicos e a nova linguagem cibernética é matreira: como é muito nova, foi beber onde era mais fácil e de repente onde uns falam de alhos, outros percebem bugalhos ou buganvílias. Semântica e semiótica, neste campo, não são bem a mesma coisa que no campo linguístico e se tais palavras se Saussurravam há mais tempo, fizeram um Eco enorme nos meus ouvidos, ao ler O Nome da Rosa.
O problema fundamental aqui é o da comunicação. Aqui, na blogosfera, é necessariamente a transmissão de mensagens escritas; e para mim é o exercitar contínuo de uma habilidade no uso da forma e da sintaxe para compor e decompor a riqueza do léxico e a abertura semântica duma palavra ou conceito.
Quem sabe falar este linguarejar melhor do que ninguém, são os nossos especialistas em eduquês e a mim sempre me afligiram. Quem maneja estes conceitos como o ninja lida com o sabre é o nosso sempre estimado EPC.Raramente percebi patavina do que ele escrevia sobre isso: Derrida, Saussure, et al.
Mas gosto do ECO que essas palavras fazem. Soa-me bem!
Esse paper do Luís Rocha começa com um Abstract, o que me delicia sempre que o vejo: é sinal de conferência, congresso, viagem; David Lodge na bagagem e ver que o Mundo é Pequeno.
Uma frase me capturou a atenção: “ evolving system is that they implement na embodied, evolving semiosis ( ESS) with theirs environments”
Para mim, o que define um sistema evolutivo blogueiro é a susceptibilidade em implementar( aaarrrgh!), digo, em consolidar ( humm..), digo em produzir semioses no seu ambiente acolhedor habitual.
É o que busco muitas vezes nestas paragens: uma experiência literária, com riscos para a imagem do copista.
Gosto de citar o Umberto Eco , sempre que o assunto encarrila por aí. O Eco é uma estação de paragem obrigatória para quem apanhar esse comboio. Estudou a ciência dos signos, ampliou o conceito e divulgou algumas ideias sobre isso. A cibernética veio atrás. Para entrar na carruagem e apanhar um lugarzinho confortável, junto à janela, enquanto se espera nessa estação, indico um link muito interessante de uma cabeça pensadora da Universidade da Beira Interior que também escreve Abstracts.
Para não fazer a figura da imagem da primeira página, fui ver umas coisas:
Mergulhei no site do John McCarthy e saí de lá vivo e com o site nos favoritos; fui ao sítio do Ray Kurzweil - e a música era vertiginosa mas agradável; li uma entrevista com o Jaron Lanier - e fiquei contente e optimista; fui à Wired de Abril 1999 e assustei-me com Bill Joy e penso rever o A.I. do Kubrick/Spielberg, porque é uma fantasia.
Fica-me uma pergunta: será possível algum dia pôr uma máquina a analisar e decidir se é coisa boa para todos nós o que se prepara para o Iraque , neste momento( a pergunta já tem meses...)?! Como a pergunta foi colocada nesse tempo, trasmuda-se em ...o que se prepara na Justiça, após o caso de que se fala?!
Quanto aos blogs e seus animadores, concordo com um certo Difool : não quero ser um estereotipo. Quero a minha liberdade de comunicar ideias, mesmo através de personagens virtuais. Nunca deixará de existir um bonecreiro por detrás e esse está identificado logo que se faz log in...
Assim, o problema dos disembodiments e dos web semantics, aqui não interessará muito( e assim penso safar-me da manápula Goliana de quem domina estas matérias...). O círculo circunscreve-se ao problema linguístico e das significações várias : é um problema de linguagem e não de personagens ou de nicks.
O comboio que está em marcha é o da semântica e semiótica: aliquid stat pro aliquo. Algo que está por algo , para alguém. E tem uma carruagem de carvão, atrelada e chamada método de raciocínio para se alcançar o conhecimento do que é escrito. Se o carvão falha e os passageiros viajam em carruagens de comboio malandro, com bancos de madeira e janelas abertas, bagageiras atafulhadas e cheiros derretidos, com algazarra generalizada, só com muita indulgência a viagem será um prazer. E não há boa comunicação.
Esta, por exemplo, é para a minha leitura de copista e fica aqui guardada.
Para relaxe e descanso das guerras jurídicas.
Discute-se em blogs de referência – Causa- nossa e Cordoeiros- a dicotomia segredo de justiça-liberdade de informação.
O pontapé de saída foi dado pelo prof. Vital Moreira que em artigo no Público, já glosado nesta portinhola, dizia isto:
Na altura em que escrevo esta crónica desconheço o teor do discurso do Presidente da República na abertura solene do novo ano judicial. Mas, considerando as suas últimas prestações públicas, não custa a admitir que terá analisado e sugerido soluções para as atribulações da justiça entre nós nos tempos mais recentes. Entre elas, avulta a questão da protecção do segredo de justiça e a sua relação com a liberdade de informação. Vale a pena voltar a ela.
De facto, reina a maior indefinição na opinião pública e nos operadores jurídicos sobre se os jornalistas estão obrigados a respeitar o segredo de justiça, incorrendo em crime quando publiquem dados protegidos por ele. Ora o pior que pode suceder no campo da justiça é a insegurança sobre se determinada conduta constitui ou não crime. Trata-se de uma óbvia anomalia num Estado de direito, onde deve haver a maior segurança jurídica quanto a saber que valores estão protegidos pelo direito penal e que condutas podem cair sob a sua alçada.
Comecemos por ver o que dizem as leis. Diz o Código Penal que "quem ilegitimamente der conhecimento, no todo ou em parte, do teor de acto de processo penal que se encontre coberto por segredo de justiça (...) é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias, salvo se outra pena for cominada para o caso pela lei do processo" (art. 371º). Por sua vez, diz a Lei de Imprensa num preceito sobre os crimes de imprensa: "1 - A publicação de textos ou imagens através da imprensa que ofenda bens jurídicos penalmente protegidos é punida nos termos gerais (...). 2 - (...) Os crimes cometidos através da imprensa são punidos com as penas previstas na respectiva norma incriminatória, elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo" (art. 30º).
À primeira vista, nem a lei penal excepciona os jornalistas da obrigação de respeito pelo segredo de justiça, nem a lei de imprensa o faz (antes agrava a punição dos crimes praticados através da imprensa). Nestes termos, os jornalistas cometem portanto uma infracção penal quando divulgam notícias que sabem estar sob segredo de justiça, independentemente da forma como as obtiveram. De resto, o mesmo sucede no caso de violação pela imprensa de outros segredos penalmente protegidos, por exemplo o segredo de Estado. Então por que é que prevalece na prática a irresponsabilidade penal dos jornalistas neste caso?
A meu ver são várias as razões para esse entendimento: (i) a amplitude excessiva do segredo de justiça, quer no tempo, quer na extensão, traduzindo-se portanto numa considerável limitação da liberdade de informação em geral e da liberdade de imprensa em especial; (ii) a duvidosa constitucionalidade de uma limitação tão extensa dessas liberdades, podendo ser um sacrifício desproporcionado face aos valores protegidos pelo segredo de justiça, por importantes que estes sejam também; (iii) a ideia de que o jornalista é quase sempre o elo final da cadeia de violação do segredo de justiça, com a diferença de que é o único fácil de identificar, pelo que ele iria pagar sozinho um crime em que a sua responsabilidade não é única nem geralmente a mais pesada.
Tem prevalecido portanto uma interpretação abrogativa da lei, que na verdade convém a todos: aos jornalistas, que não se vêem constrangidos por ela; ao MP, que não tem de os investigar; e aos tribunais, que não tem de os julgar e punir, com as reacções mediáticas que a condenação de jornalistas normalmente suscita. Essa situação só não convém obviamente aos interesses que o segredo de justiça visa assegurar, ou seja, o poder punitivo do Estado, a liberdade de decisão e a independência dos tribunais e o direito dos arguidos a um processo justo, bem como aos seus direitos pessoais (bom nome e reputação, protecção da vida íntima, etc.).
É tudo menos virtuosa esta situação de ambiguidade. Nos termos amplíssimos em que está definido o segredo de justiça entre nós, a penalização dos jornalistas é difícil (para não dizer impossível) de sustentar. Mas admitir que o segredo de justiça nunca vincula os jornalistas significa inutilizar o efeito do mesmo segredo. Por um lado, parece evidente que segredo de justiça não tem a mínima eficácia se não obrigar os jornalistas. Por outro lado, o segredo de justiça só pode vincular os jornalistas se isso não implicar uma limitação desmesurada da liberdade de informação.
Estamos perante um típico conflito de valores constitucionalmente protegidos. Na verdade, a Constituição protege tanto o segredo de justiça como a liberdade de informação em geral e a liberdade de imprensa em especial. Torna-se por isso necessário compatibilizar ambos os valores, em termos de saber se e em que termos é que um deles prevalece, no todo ou em parte, sobre o outro. Ora, parece lícito afirmar que, tendo em conta a essencialidade da liberdade de informação nas sociedades liberal-democráticas, ela só deve ceder perante o segredo de justiça, se este não a puser em causa de forma desproporcionada. Essa operação de "concordância prática", como dizem os constitucionalistas, deve ser agenciada pela própria lei, mesmo se com devolução de alguma liberdade de apreciação aos juízes em cada caso concreto.
Se se quer que o segredo de justiça vincule também os jornalistas, sem limitações incomportáveis da liberdade de informação, a solução compatibilizadora exige provavelmente duas operações. Primeiro, proceder a uma redução drástica do âmbito temporal e processual do segredo de justiça, de modo a limitá-lo ao mínimo necessário. Depois, admitir uma margem de apreciação judicial em cada caso, ou porque se deixa ao juiz competente, sob proposta do Ministério Público, a própria definição dos elementos que ficam protegidos pelo segredo (sistema britânico do "contempt of court"), ou porque, sendo a âmbito do segredo de justiça definido em abstracto pela lei, se admite porém que o juiz possa determinar excepções quando haja interesses legítimos das partes ou razões de interesse público suficientemente relevantes.
O que não é defensável é a hipócrita lei da selva em que vivemos, em que a uma latitudinária protecção formal do segredo de justiça corresponde uma total impunidade, de que se aproveitam sobretudo os menos escrupulosos, com sérios prejuízos para a autoridade da justiça, para o direito dos arguidos a um julgamento justo (a começar pela presunção de inocência) e ainda para o próprio prestígio do jornalismo.
Agora, no blog causa nossa, diz isto:
Há aqui um equívoco e um preconceito. O segredo de justiça visa garantir que os dados por ele protegidos não sejam de conhecimento público, enquanto ele perdurar. É uma protecção objectiva, sendo irrelevante quem infrinja essa reserva. Logo, tem de impor-se aos jornalistas, por maioria de razão. Não existe nenhuma lógica em ele valer somente para as pessoas em contacto com o processo. Tal como um preso que consegue evadir-se com a cumplicidade dos guardas não ganha com isso alforria, também os dados protegidos pelo segredo de justiça não deixam de o estar mesmo depois de "fugirem" ilicitamente do processo. Aliás, se os dados em segredo de justiça não puderem ser publicados, poucos serão tentados a violá-lo na origem. É evidente nos últimos meses que se o segredo de justiça não vincular os jornalistas ele deixa de ter significado.
O mesmo sucede com os demais segredos. Por exemplo, seria intolerável que um jornal pudesse publicar uma conversa telefónica privada de outrem, só porque não foi o jornalista que efectuou a escuta ilícita e a recebeu de terceiro. Onde ficaria a protecção do sigilo das comunicações privadas, constitucionalmente garantido? Salvo se "valores mais altos" se levantarem em casos concretos, a imprensa não goza de imunidade constitucional nas infracções aos direitos fundamentais das pessoas.
Finalmente, não proponho nenhuma lei para estabelecer um novo limite da liberdade de informação. Na minha interpretação das leis vigentes (e não vejo que outra seja melhor), os jornalistas já estão juridicamene vinculados ao segredo de justiça, em termos até talvez demasiado amplos, como procurei demonstrar. Por isso entendo mesmo que é de limitar o excessivo alcance de uma restrição que já existe (embora não seja "praticada"...).
Vital Moreira
O copista vê uma diferença nestes escritos:
Ali, no Público, dizia: “Tem prevalecido portanto uma interpretação abrogativa da lei”
Sobre este conceito eminentemente jurídico, V. Moreira sabe do que fala, porque evidentemente leu isto: "Interpretação e Aplicação das Leis", traduzido por Manuel de Andrade, 3ª edição, Coimbra, 1978, pág. 193.
Cfr. J. Baptista Machado, "Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador", Coimbra, Almedina, 1983, pág. 170. Mas nem todos o entenderão.
O que significa abrogar?
“ No dizer de FRANCESCO FERRARA, "a vontade abrogativa resulta da nova disciplina jurídica que se vem substituir à anterior, pela incompatibilidade do novo ordenamento com o antigo" Deste conceito parte o autor para uma distinção fundamental, uma vez que a mesma aponta o limite da referida forma de cessação de vigência. Escreve FERRARA que "a abrogação tácita verifica-se na medida da contraditoriedade: a lei precedente é abrogada até onde for incompatível com a lei nova".
Vejamos brevemente quais são os critérios de preferência, no caso de aparecerem normas em conflito. Se tais normas emanarem de fontes de hierarquia diferente, prefere a norma editada pela fonte hierárquica superior (critério da superioridade: "lex superior derogat legi inferiori").No caso da verificação de conflito de leis da mesma hierarquia, prefere a lei mais recente (critério da posteridade: "lex posterior derogat legi priori") com a ressalva, porém, de que a lei especial prevalece sobre a lei geral (critério da especialidade: "lex specialis derogat legi generali"), ainda que esta seja posterior, excepto, neste caso, "se outra for a intenção inequívoca do legislador" – nº 3 do artigo 7º do Código Civil
Essa é a conclusão a que se deve chegar sempre que da lei nova (geral) se possa retirar a pretensão de regular totalmente a matéria, não deixando subsistir leis especiais. Haverá então, como defende Oliveira Ascensão, "circunstâncias relevantes, em termos de interpretação, que nos permitem concluir que a lei geral nova pretende afastar a lei especial antiga. Pode, por exemplo, a lei nova ter por objectivo, justamente, pôr termo a regimes especiais antigos que deixaram de se justificar. Se se puder chegar a esta conclusão, a lei especial 'antiga será revogada pela lei geral"
Acresce que, ainda segundo OLIVEIRA ASCENSÃO, facto de uma matéria ser incluída numa lei que é especial em relação a outra não significa necessariamente que essa lei seja substancialmente especial". Ou seja, a especialidade formal pode não corresponder uma especialidade substancial.
Pode assim, verificar-se a seguinte situação: pode ter sido editada uma solução para um domínio especial, que não seja justificada por necessidades especiais desse sector.
Ora, se não há nenhumas razões de especialidade substancial que justifiquem tal solução, então esse regime é afastado pela alteração da lei geral. "Não há nada nele que imponha resistência à vigência da lei geral"
Esta passagem de um Parecer- PPA19900426009000 - do Conselho Consultivo da PGR, sobre um outro assunto, dá uma ideia ao não especialista de Direito, das subtilezas de conceitos e linguagem que enformam a disciplina.
No entanto, o que importa salientar, é uma interessante faena nesses escritos de Vital Moreira e que por sua vez vão eventualmente influenciar outros juristas:
Ao ler o mestre, vê-se que ele não concorda com a formulação do segredo de justiça, tal como está, definido no artº 86 do C.P.P.
Será particularmente de assinalar o rigor do nº 4 al.b) de tal artigo da lei de processo penal : é expressamente proibida a “divulgação da ocorrência de acto processual ou dos seus termos, independentemente do motivo que presidir a tal divulgação!
Por outro lado, a violação do segredo de justiça é punica nos termos do artº 371 do C.Penal com prisão até dois anos ou multa.
Vital Moreira tem a obrigação de conhecer isto, até porque o citou no seu artigo!
Ao mesmo tempo, afirma que “nos termos amplíssimos em que está definido o segredo de justiça entre nós, a penalização dos jornalistas é difícil (para não dizer impossível) de sustentar”.
Logo, advoga a não penalização do jornalista incriminado! É a única conclusão possível!
Vital Moreira tem também a obrigação de saber que em Portugal vigora o princípio da legalidade quanto à acção penal, o que significa que o MP tem a obrigação de abrir Inquérito quanto a todos os crimes que se conheçam, mormente se forem, como este é, de natureza pública.
Contudo, no texto do blog diz:
“É uma protecção objectiva,( o segredo de justiça) sendo irrelevante quem infrinja essa reserva. Logo, tem de impor-se aos jornalistas, por maioria de razão. Não existe nenhuma lógica em ele valer somente para as pessoas em contacto com o processo”
.
..quando no artigo do Público, também escrevia:
“a amplitude excessiva do segredo de justiça, quer no tempo, quer na extensão, traduzindo-se portanto numa considerável limitação da liberdade de informação em geral e da liberdade de imprensa em especial; (ii) a duvidosa constitucionalidade de uma limitação tão extensa dessas liberdades”
Em que ficamos: a lei ( artº 86 CPP) é inconstitucional, o que justificaria a não acção do MP e ficaria sem base de apoio a "hipocrisia" que denuncia?! Não o será e por isso, a incriminação é de rigor e de lei? E nesse caso, não deve haver penalização( como alguns sugerem, no caso do aborto)?! E como se vencem as dificuldades de não incriminação: pelo jogo mais ou menos discricionário da teoria do conflito de deveres? E será antes ou depois da instauração de auto de notícia, sempre obrigatória por causa do princípio da legalidade?!
O Dr. Vital Moreira meteu-se num vespeiro!
Já não sei onde está a hipocrisia...
O pontapé de saída foi dado pelo prof. Vital Moreira que em artigo no Público, já glosado nesta portinhola, dizia isto:
Na altura em que escrevo esta crónica desconheço o teor do discurso do Presidente da República na abertura solene do novo ano judicial. Mas, considerando as suas últimas prestações públicas, não custa a admitir que terá analisado e sugerido soluções para as atribulações da justiça entre nós nos tempos mais recentes. Entre elas, avulta a questão da protecção do segredo de justiça e a sua relação com a liberdade de informação. Vale a pena voltar a ela.
De facto, reina a maior indefinição na opinião pública e nos operadores jurídicos sobre se os jornalistas estão obrigados a respeitar o segredo de justiça, incorrendo em crime quando publiquem dados protegidos por ele. Ora o pior que pode suceder no campo da justiça é a insegurança sobre se determinada conduta constitui ou não crime. Trata-se de uma óbvia anomalia num Estado de direito, onde deve haver a maior segurança jurídica quanto a saber que valores estão protegidos pelo direito penal e que condutas podem cair sob a sua alçada.
Comecemos por ver o que dizem as leis. Diz o Código Penal que "quem ilegitimamente der conhecimento, no todo ou em parte, do teor de acto de processo penal que se encontre coberto por segredo de justiça (...) é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias, salvo se outra pena for cominada para o caso pela lei do processo" (art. 371º). Por sua vez, diz a Lei de Imprensa num preceito sobre os crimes de imprensa: "1 - A publicação de textos ou imagens através da imprensa que ofenda bens jurídicos penalmente protegidos é punida nos termos gerais (...). 2 - (...) Os crimes cometidos através da imprensa são punidos com as penas previstas na respectiva norma incriminatória, elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo" (art. 30º).
À primeira vista, nem a lei penal excepciona os jornalistas da obrigação de respeito pelo segredo de justiça, nem a lei de imprensa o faz (antes agrava a punição dos crimes praticados através da imprensa). Nestes termos, os jornalistas cometem portanto uma infracção penal quando divulgam notícias que sabem estar sob segredo de justiça, independentemente da forma como as obtiveram. De resto, o mesmo sucede no caso de violação pela imprensa de outros segredos penalmente protegidos, por exemplo o segredo de Estado. Então por que é que prevalece na prática a irresponsabilidade penal dos jornalistas neste caso?
A meu ver são várias as razões para esse entendimento: (i) a amplitude excessiva do segredo de justiça, quer no tempo, quer na extensão, traduzindo-se portanto numa considerável limitação da liberdade de informação em geral e da liberdade de imprensa em especial; (ii) a duvidosa constitucionalidade de uma limitação tão extensa dessas liberdades, podendo ser um sacrifício desproporcionado face aos valores protegidos pelo segredo de justiça, por importantes que estes sejam também; (iii) a ideia de que o jornalista é quase sempre o elo final da cadeia de violação do segredo de justiça, com a diferença de que é o único fácil de identificar, pelo que ele iria pagar sozinho um crime em que a sua responsabilidade não é única nem geralmente a mais pesada.
Tem prevalecido portanto uma interpretação abrogativa da lei, que na verdade convém a todos: aos jornalistas, que não se vêem constrangidos por ela; ao MP, que não tem de os investigar; e aos tribunais, que não tem de os julgar e punir, com as reacções mediáticas que a condenação de jornalistas normalmente suscita. Essa situação só não convém obviamente aos interesses que o segredo de justiça visa assegurar, ou seja, o poder punitivo do Estado, a liberdade de decisão e a independência dos tribunais e o direito dos arguidos a um processo justo, bem como aos seus direitos pessoais (bom nome e reputação, protecção da vida íntima, etc.).
É tudo menos virtuosa esta situação de ambiguidade. Nos termos amplíssimos em que está definido o segredo de justiça entre nós, a penalização dos jornalistas é difícil (para não dizer impossível) de sustentar. Mas admitir que o segredo de justiça nunca vincula os jornalistas significa inutilizar o efeito do mesmo segredo. Por um lado, parece evidente que segredo de justiça não tem a mínima eficácia se não obrigar os jornalistas. Por outro lado, o segredo de justiça só pode vincular os jornalistas se isso não implicar uma limitação desmesurada da liberdade de informação.
Estamos perante um típico conflito de valores constitucionalmente protegidos. Na verdade, a Constituição protege tanto o segredo de justiça como a liberdade de informação em geral e a liberdade de imprensa em especial. Torna-se por isso necessário compatibilizar ambos os valores, em termos de saber se e em que termos é que um deles prevalece, no todo ou em parte, sobre o outro. Ora, parece lícito afirmar que, tendo em conta a essencialidade da liberdade de informação nas sociedades liberal-democráticas, ela só deve ceder perante o segredo de justiça, se este não a puser em causa de forma desproporcionada. Essa operação de "concordância prática", como dizem os constitucionalistas, deve ser agenciada pela própria lei, mesmo se com devolução de alguma liberdade de apreciação aos juízes em cada caso concreto.
Se se quer que o segredo de justiça vincule também os jornalistas, sem limitações incomportáveis da liberdade de informação, a solução compatibilizadora exige provavelmente duas operações. Primeiro, proceder a uma redução drástica do âmbito temporal e processual do segredo de justiça, de modo a limitá-lo ao mínimo necessário. Depois, admitir uma margem de apreciação judicial em cada caso, ou porque se deixa ao juiz competente, sob proposta do Ministério Público, a própria definição dos elementos que ficam protegidos pelo segredo (sistema britânico do "contempt of court"), ou porque, sendo a âmbito do segredo de justiça definido em abstracto pela lei, se admite porém que o juiz possa determinar excepções quando haja interesses legítimos das partes ou razões de interesse público suficientemente relevantes.
O que não é defensável é a hipócrita lei da selva em que vivemos, em que a uma latitudinária protecção formal do segredo de justiça corresponde uma total impunidade, de que se aproveitam sobretudo os menos escrupulosos, com sérios prejuízos para a autoridade da justiça, para o direito dos arguidos a um julgamento justo (a começar pela presunção de inocência) e ainda para o próprio prestígio do jornalismo.
Agora, no blog causa nossa, diz isto:
Há aqui um equívoco e um preconceito. O segredo de justiça visa garantir que os dados por ele protegidos não sejam de conhecimento público, enquanto ele perdurar. É uma protecção objectiva, sendo irrelevante quem infrinja essa reserva. Logo, tem de impor-se aos jornalistas, por maioria de razão. Não existe nenhuma lógica em ele valer somente para as pessoas em contacto com o processo. Tal como um preso que consegue evadir-se com a cumplicidade dos guardas não ganha com isso alforria, também os dados protegidos pelo segredo de justiça não deixam de o estar mesmo depois de "fugirem" ilicitamente do processo. Aliás, se os dados em segredo de justiça não puderem ser publicados, poucos serão tentados a violá-lo na origem. É evidente nos últimos meses que se o segredo de justiça não vincular os jornalistas ele deixa de ter significado.
O mesmo sucede com os demais segredos. Por exemplo, seria intolerável que um jornal pudesse publicar uma conversa telefónica privada de outrem, só porque não foi o jornalista que efectuou a escuta ilícita e a recebeu de terceiro. Onde ficaria a protecção do sigilo das comunicações privadas, constitucionalmente garantido? Salvo se "valores mais altos" se levantarem em casos concretos, a imprensa não goza de imunidade constitucional nas infracções aos direitos fundamentais das pessoas.
Finalmente, não proponho nenhuma lei para estabelecer um novo limite da liberdade de informação. Na minha interpretação das leis vigentes (e não vejo que outra seja melhor), os jornalistas já estão juridicamene vinculados ao segredo de justiça, em termos até talvez demasiado amplos, como procurei demonstrar. Por isso entendo mesmo que é de limitar o excessivo alcance de uma restrição que já existe (embora não seja "praticada"...).
Vital Moreira
O copista vê uma diferença nestes escritos:
Ali, no Público, dizia: “Tem prevalecido portanto uma interpretação abrogativa da lei”
Sobre este conceito eminentemente jurídico, V. Moreira sabe do que fala, porque evidentemente leu isto: "Interpretação e Aplicação das Leis", traduzido por Manuel de Andrade, 3ª edição, Coimbra, 1978, pág. 193.
Cfr. J. Baptista Machado, "Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador", Coimbra, Almedina, 1983, pág. 170. Mas nem todos o entenderão.
O que significa abrogar?
“ No dizer de FRANCESCO FERRARA, "a vontade abrogativa resulta da nova disciplina jurídica que se vem substituir à anterior, pela incompatibilidade do novo ordenamento com o antigo" Deste conceito parte o autor para uma distinção fundamental, uma vez que a mesma aponta o limite da referida forma de cessação de vigência. Escreve FERRARA que "a abrogação tácita verifica-se na medida da contraditoriedade: a lei precedente é abrogada até onde for incompatível com a lei nova".
Vejamos brevemente quais são os critérios de preferência, no caso de aparecerem normas em conflito. Se tais normas emanarem de fontes de hierarquia diferente, prefere a norma editada pela fonte hierárquica superior (critério da superioridade: "lex superior derogat legi inferiori").No caso da verificação de conflito de leis da mesma hierarquia, prefere a lei mais recente (critério da posteridade: "lex posterior derogat legi priori") com a ressalva, porém, de que a lei especial prevalece sobre a lei geral (critério da especialidade: "lex specialis derogat legi generali"), ainda que esta seja posterior, excepto, neste caso, "se outra for a intenção inequívoca do legislador" – nº 3 do artigo 7º do Código Civil
Essa é a conclusão a que se deve chegar sempre que da lei nova (geral) se possa retirar a pretensão de regular totalmente a matéria, não deixando subsistir leis especiais. Haverá então, como defende Oliveira Ascensão, "circunstâncias relevantes, em termos de interpretação, que nos permitem concluir que a lei geral nova pretende afastar a lei especial antiga. Pode, por exemplo, a lei nova ter por objectivo, justamente, pôr termo a regimes especiais antigos que deixaram de se justificar. Se se puder chegar a esta conclusão, a lei especial 'antiga será revogada pela lei geral"
Acresce que, ainda segundo OLIVEIRA ASCENSÃO, facto de uma matéria ser incluída numa lei que é especial em relação a outra não significa necessariamente que essa lei seja substancialmente especial". Ou seja, a especialidade formal pode não corresponder uma especialidade substancial.
Pode assim, verificar-se a seguinte situação: pode ter sido editada uma solução para um domínio especial, que não seja justificada por necessidades especiais desse sector.
Ora, se não há nenhumas razões de especialidade substancial que justifiquem tal solução, então esse regime é afastado pela alteração da lei geral. "Não há nada nele que imponha resistência à vigência da lei geral"
Esta passagem de um Parecer- PPA19900426009000 - do Conselho Consultivo da PGR, sobre um outro assunto, dá uma ideia ao não especialista de Direito, das subtilezas de conceitos e linguagem que enformam a disciplina.
No entanto, o que importa salientar, é uma interessante faena nesses escritos de Vital Moreira e que por sua vez vão eventualmente influenciar outros juristas:
Ao ler o mestre, vê-se que ele não concorda com a formulação do segredo de justiça, tal como está, definido no artº 86 do C.P.P.
Será particularmente de assinalar o rigor do nº 4 al.b) de tal artigo da lei de processo penal : é expressamente proibida a “divulgação da ocorrência de acto processual ou dos seus termos, independentemente do motivo que presidir a tal divulgação!
Por outro lado, a violação do segredo de justiça é punica nos termos do artº 371 do C.Penal com prisão até dois anos ou multa.
Vital Moreira tem a obrigação de conhecer isto, até porque o citou no seu artigo!
Ao mesmo tempo, afirma que “nos termos amplíssimos em que está definido o segredo de justiça entre nós, a penalização dos jornalistas é difícil (para não dizer impossível) de sustentar”.
Logo, advoga a não penalização do jornalista incriminado! É a única conclusão possível!
Vital Moreira tem também a obrigação de saber que em Portugal vigora o princípio da legalidade quanto à acção penal, o que significa que o MP tem a obrigação de abrir Inquérito quanto a todos os crimes que se conheçam, mormente se forem, como este é, de natureza pública.
Contudo, no texto do blog diz:
“É uma protecção objectiva,( o segredo de justiça) sendo irrelevante quem infrinja essa reserva. Logo, tem de impor-se aos jornalistas, por maioria de razão. Não existe nenhuma lógica em ele valer somente para as pessoas em contacto com o processo”
.
..quando no artigo do Público, também escrevia:
“a amplitude excessiva do segredo de justiça, quer no tempo, quer na extensão, traduzindo-se portanto numa considerável limitação da liberdade de informação em geral e da liberdade de imprensa em especial; (ii) a duvidosa constitucionalidade de uma limitação tão extensa dessas liberdades”
Em que ficamos: a lei ( artº 86 CPP) é inconstitucional, o que justificaria a não acção do MP e ficaria sem base de apoio a "hipocrisia" que denuncia?! Não o será e por isso, a incriminação é de rigor e de lei? E nesse caso, não deve haver penalização( como alguns sugerem, no caso do aborto)?! E como se vencem as dificuldades de não incriminação: pelo jogo mais ou menos discricionário da teoria do conflito de deveres? E será antes ou depois da instauração de auto de notícia, sempre obrigatória por causa do princípio da legalidade?!
O Dr. Vital Moreira meteu-se num vespeiro!
Já não sei onde está a hipocrisia...
quarta-feira, janeiro 21, 2004
O Mangadalpaca® no Salão Nobre do STJ
O post do Copista deixou o Mangadalpaca perplexo.
O Presidente da República, propôs, na Cerimónia de Abertura do Ano Judicial (em 19/01/04), em jeito de desafio – além de outras coisas eventualmente interessantes -, que os despachos de arquivamento do Ministério Público fossem fiscalizados por um juiz, para se certificar a legalidade do mesmos. E isto, segundo o sr. Pesidente, para evitar insinuações sobre o papel insubstituível desta magistratura.
Nem mais.
Em primeiro lugar, o Mangadalpaca acha, modestamente, que essa é mais uma insinuação, alinhando, afinal, com as tais, que tal solução pretenderia esconjurar.
Depois, o Mangadalpaca pensa que, a partir do momento em que um juiz possa certificar a legalidade do arquivamento, essa magistratura deixará de ser tão insubstituível.
Pois é, sr. Presidente! Não deu pelo paradoxo da proposta! A vossa tese prova demais....
O Mangadalpaca pergunta, sr. Presidente, se acaso essa ideia tem algo a ver com um despacho de arquivamento do MP num processo, relativamente a matéria factual que englobava a existência de uma carta anónima que aludia à sua pessoa (Despacho esse que, em rigor, deveria permanecer em segredo de justiça, mesmo depois de a acusação ser pública) ???
O Mangadalpaca não comete a injustiça de pensar que o sr. Presidente não sabe o que é a instrução. Para isso, aliás, terá assessores. E dos bons, presume-se.
Mas...saberá para que serve? Sabe qual a função sistémica da faculdade de requerer essa fase processual? Sabe que é justamente para se poder sindicar da correcção do arquivamento por parte do MP? Sabe que há possibilidade de o assistente requerer essa fase processual para esse fim? E que essa fase é dirigida por um juiz?
Lembra-se, por outro lado, que é justamente ao MP que compete defender a legalidade democrática?
Mas, como democrata que julga ser, o Mangadalpaca acha que não há tabus. Tudo é discutível...
Mas, admitamos que a proposta ia avante. E depois? Se o juiz não certificasse a legalidade do despacho de arquivamento?
Mandava o MP acusar? Mandava o MP fazer mais diligências de prova para tentar acusar alguém? Dava ele a acusação? Mandava fazer o quê?
Ou quer apenas um nihil obstat ou um «concordo» cego, por parte do juiz? (Há que concretizar a proposta, sr. Presidente, há que ser consequente! Não se pode ficar por meias palavras).
Não se assumiu, ainda, que o MP é uma magistratura dotada de autonomia face ao poder executivo, subordinando-se apenas à lei e directivas e instruções determinadas nos termos da lei? Que o MP é composto por magistrados responsáveis (em todos os sentidos semânticos do termo)? Que quando se concebeu o novo Código de Processo Penal, o MP foi pensado como um verdadeiro órgão auxiliar da administração da Justiça penal (por contraposição a um modelo de subalternização, em que o MP era uma magistratura vestibular da magistratura judicial)?
Quem propõe isso é por não ter ouvido (certamente por falta de atenção, nessa altura, a tais matérias) dizer Mireille Delmas Marty, na Assembleia da República, que ela tinha «um sonho, para o processo penal» e que «invejava Portugal, por tê-lo feito já realidade».
Estava o Mangadalpaca posto em sossego quanto a esses princípios, presumindo que o mais alto magistrado os tinha por assimilados, e eis senão quando, vem propor isto...
Sr. Presidente, convém conhecer o terreno. Saber os magistrados que temos. As condições de funcionamento dos Tribunais. Saberá que há juizes de instrução, em algumas comarcas do País, que despacham esses processos (de instrução) a um prazo de 8 meses? E muitas vezes adiam as diligências marcadas há 8 meses, por terem diligências urgentes nesse dia?
Lembrar-se-á do que foi a experiências dos (em boa hora) extintos Tribunais de Instrução Criminal ? Saberá que houve processos de homicídio que prescreveram nesses «Tribunais» (sem que ninguém falasse ou fale disso, mas se apresse a falar de uma ou outra prescrição no MP quando os processos lhe são remetidos quase no fim do prazo prescricional)?
É este o cenário que se pretende recuperar?
Ou quer deixar campo livre às teses do improvável duo Proença de Carvalho/M. Sousa Tavares?
O Mangadalpaca também propõe, prosaicamente, em jeito de desafio, ao Sr. Presidente, como mais alto magistrado, que faça uma Presidência aberta (ou opaca, como lhe aprouver) aos Tribunais.
Deixe de frequentar o Salão Nobre do STJ só nas cerimónias.
Mangadalpaca©
terça-feira, janeiro 20, 2004
O Segredo de Vital
O artigo de Vital Moreira, no Público de 20.1.2004, merece alguma atenção. Apesar de não mostrar soluções, aponta complicações e ajuda a desconstruir o mito do segredo de justiça.
Quote:
“Por um lado, parece evidente que o segredo de justiça não tem a mínima eficácia se não obrigar os jornalistas. Por outro lado, o segredo de justiça só pode vincular os jornalistas se isso não implicar uma limitação desmesurada da liberdade de infromação.”
Aí está o círculo que se pretende quadrado!
Como esticar-lhe o “pi” e arranjar-lhe os vértices que ainda não tem? Vital M. não diz a receita completa. Aponta alguns preparados para a mistura, mas não dá o cardápio constitucional ou legal e ficamos com pena que o mestre de direito constitucional e professor de direito, de cátedra feita, não se aventure para além da taprobana da conversa de café( que o mesmo é dizer, de blog ou artigo de jornal) e descubra o caminho para lá do conflito de valores constitucionais que aponta- e mais além.
Teremos, outra vez, que nos fiar nos suspeitos do costume e clamar pelo inevitável Costa Andrade; pelo incontornável Figueiredo Dias ou até pelo inenarrável Germano?! Give us a break!
Nessas pistas em busca de vértices para a quadratura do círculo de giz, diz Vital que será necessário proceder a duas operações: redução drástica do âmbito temporal e processual do segredo, encolhendo-o ao mínimo necessário, tipo bikini tropical, a tapar só o essencial; e conceder ao juiz ( mas porquê ao juiz?!) poder casuístico e por um lado, discricionário, a la common law, com o temível “contempt of court” ou, por outro, um poder vinculado à lei, concretizando as excepções que esta admitir em abstracto. É esta a proposta do constitucionalista emérito! Parca ração, para tão grande ambição!
Desde logo, a referência ao juiz deixa pano para mangas de alpaca e copistas glosarem: continuamos, nas cátedras de direito constitucional, a insistir em checks and balances a esmo e sem pensar duas vezes, com um medo atávico do... sabe-se lá o quê!
O Ministério Público não é o dominus do Inquérito? Não é magistratura de pleno direito? O segredo de justiça não se destina acima de tudo a preservar a integridade da investigação e dos investigadores? Mais do que o interesse subjectivo dos indiciados em não verem o nome nas páginas dos jornais ou propalados nas conversas de café(ou blogs), não deverá sobrelevar o interesse da investigação?
E se não é assim, porque raio de motivos anotou na Constituição, ( pág. 791 da 3ª edição revista da Constituição, Coimbra editora, 1993) que o MP até faz parte dos tribunais enquanto órgãos do Estado?!
Devem os juizes controlar o arquivamento dos Inquéritos?
O Presidente da República, Jorge Sampaio, no discurso de abertura do ano judicial de 2004, em 19 de Janeiro, pronunciou-se abertamente sobre assuntos candentes da justiça.
Entre algumas orientações do magistrado Supremo da Nação, o copista atentou nesta:
“Por outro lado, e deixo a questão em jeito de desafio, não deverá instituir-se o controle judicial do arquivamento de inquéritos, de tal modo que seja o poder judicial a certificar a legalidade da actuação do Ministério Público, e se dissipem insinuações que, aqui e ali, só enfraquecem a insubstituível posição desta magistratura?"
O copista analisou a magistratura de Cunha Rodrigues à frente da PGR, de 1984 até à sua saída, em Outubro de 2000, através de palavras do próprio, registadas em jornais da época e delineou o perfil do PGR enquanto actor no mundo político judicial português.
Eventualmente, a análise contorna-se em termos demasiado duros e porventura injustos para o magistrado. É um risco que o copista correu, embora seja a expressão do que pensa sobre a actuação do mesmo. Fê-lo porém, sem má-fé; sem intenção maldosa e apenas porque está convencido que a leitura do que se passou, é essa. Pode estar enganado, mas até demonstração do contrário, para o copista é essa a expressão da verdade aparente.
Não foi intenção do copista, atingir a honra e consideração da pessoa do Dr. Cunha Rodrigues. E esta nota impõe-se porque a leitura do escrito pode permitir essa leitura, se esta não for guiada pela contextualização: a análise crítica do consulado do PGR Cunha Rodrigues e a indicação daquilo que para o copista, em concreto, foram os erros do mesmo. Erros graves, no entender do copista e a crítica dura que aí transparece, não é recente, como também não o é a defesa daquilo que o PGR Cunha Rodrigues fez de muito positivo.
Essa análise é mais política do que técnico-jurídica, porque a função do PGR também o é. Como alguém já escreveu por aí, grandeza da figura de Cunha Rodrigues suscita ódios e paixões ( como se estas emoçõe não fossem filhas da mesma mãe...). Porém, o copista não odeia ou execra o PGR Cunha Rodrigues. Apenas entende que os factos falam por si e em política o que parece, é, como dizia o outro.
Contudo, sobre o problema concreto agora levantado no discurso do PR, o PGR Cunha Rodrigues sempre teve uma posição de princípio clara e notável. E no entender do copista, correcta.
Na extensa entrevista ao Público, de 9 de Novembro de 1997, os entrevistadores António Arnaldo Mesquita, Ana Sá Lopes, Eduardo Dâmaso( este jornalista, aliás, tem assinado no Público, artigos e editoriais notáveis e que o copista subscreve sem muitas reservas) e Paulo Carriço, perguntaram ao então PGR , fizeram perguntas acerca do Estatuto do MP.
Público- Mas os princípios de auto-governo e auto-inspecção permanecem intocáveis...
PGR Cunha Rodrigues- O procurador-geral da República é escrutinado pelo poder político. Tem uma legitimidade que assenta no Presidente da República, no Governo e indirectamente na AR. Poucos órgãos do Estado têm essa legitimidade. No Conselho Superior, há representantes da Assembleia da República e do Governo. O cidadão pode controlar o MP como assistente, requerendo e acusando. O tribunal controla o MP. Digam-me qual o órgão sujeito a formas tão plurais de controlo?
P- O senhor procurador move-se apenas na leitura puramente formal das instâncias de controlo do MP. A realidade pode ser outra...
R- É a realidade e a prática. Todos os dias acontece que o MP arquiva um processo e o assistente não concorda e requer a instrução. O mesmo se passa com o arguido relativamente à acusação. O MP por regra não tem o poder de levar ninguém a julgamento.
P- Isso não se verifica nos crimes sem vítima...
R- Nos crimes sem vítima são o Estado e a sociedade os lesados e é o Ministério Público que deve representá-los.
P- A cultura do país não é propriamente propícia a esse tipo de atitude...
R- Olhem que é. Por exemplo, a figura do assistente é genuinamente portuguesa e tem uma vitalidade que tem surpreendido muitos observadores de outros países.
P- Não seria melhor um juiz sindicar os despachos de arquivamento?
R- Sindicar porquê? Representa o Estado ou a sociedade? Há alguma exigência de terciaridade no caso? O Minsitério Público não tem estatuto constitucional de magistratura? Deverão os princípios submeter-se a interesses profissionais? Não deveriam os tribunais ocupar-se mais das questões dos direitos e das liberdades? Sabem os senhores que tem causado perplexidade no estrangeiro a frequência ocm que , em Portugal, O Ministério Público recorre no interesse da defesa, por exemplo, sustentando que seja substituida a medida de prisão preventiva aplicada pelo juiz contra o parecer do Ministério Público?
Ainda sobre a dificuldade da investigação da corrupção, área em que o copista entende ter havido grande défice de actuação e claudicação perante poderes, tendo sido colocada pelos jornalistas a eventual culpa do MP, por não estar tecnicamente apetrechado, o PGR de então dizia:
PGR - Não falemos de culpas. Falemos antes de entropias que resultam, ainda aqui, de servidões socioculturais e de uma tradição histórica. Não existe qualquer desconfiança em relação à polícia. Mas subsiste um problema de funcionamento do Estado de Direito. A intervenção das magistraturas, particularmente em certos domínios, potenciaria a eficácia das polícias. Mas se querem que aprofunde as causas, não me escuso a esclarecer que as magistraturas continuam a não ter uma formação específica na área da investigação criminal e que, por seu lado, a polícia Judiciária tem uma enraizada cultura de funcionamento distanciado das magistraturas.”
E mais adiante: “Não sou adepto dos modelos que vigoram na generalidade dos paises da Europa: polícias fragmentadas e destacadas junto das magistraturas. Continuo a pensar que o nosso sistema é, nas suas linhas gerais, correcto.
Para terminar esta saga continuada sobre o papel do magistrado Cunha Rodrigues enquanto PGR, é justo reconhecer sem querer dar uma no cravo e outra na ferradura que sobre estes assuntos, as ideias do homem foram sempre muito claras e, no modesto entender do copista, inteiramente correctas.
Não pode o mesmo ser dito, de toda a gente com responsabilidades nesta área...
domingo, janeiro 18, 2004
Cunha Rodrigues e o MP
Nos termos do Estatuto Judiciário de 1962 o “Ministério Público constitui uma magistratura amovível, responsável e hierarquicamente organizada na dependência do Ministro da Justiça e sob a chefia directa do Procurador-Geral da República.”
Em 1974, Cunha Rodrigues, então com 33 ou 34 anos elaborou uma “pequena monografia” sobre “O Ministério Público na actual Organização Judiciária”.
Tal monografia vem publicada no nº95, Julho/Setembro de 2003 da Revista do Ministério Público.
Por aí se pode ver a extrema importância que as suas ideias tiveram na definição do modelo de Ministério Público que temos em Portugal actualmente. Praticamente, tudo o que de fundamental contém o Estatuto do MP, vem dessa matriz. Problemas como a qualificação do MP como “órgão de justiça” ; a dependência ou não do executivo;
a independência e o princípio da oportunidade e até a estrutura organizacional do modelo e sua articulação com a polícia judiciária, foram pensadas, nessa monografia, por Cunha Rodrigues, enquanto relator da comissão de reforma judiciária que funcionava no Tribunal da Relação do Porto.
Tal papel fundador, aliás, já foi publica e amplamente reconhecido por um outro actor dessa representação juridico constitucional: Almeida Santos disse-o e associou o nome de alguns elementos do Sindicato dos Magistrados do MP , então nascente e florescente.
Em Fevereiro de 1976, Cunha Rodrigues escrevia: “ Os requisitos que defendemos para a reformulação do Ministério Público- autonomia em relação ao poder político e inamovibilidade dos magistrados- foram excluidos da Constituição como princípios programáticos. Mas a Assembleia Constituinte consagrou-o nas suas implicações práticas.” Em 1976, a Constituição só falava que o MP gozava de estatuto próprio, omitindo a indicação expressa sobre a autonomia que só em 1989 apareceu na Consituição, como actualmente se consagra e que está na ordem do dia, para muitos responsáveis políticos ( et pour cause...).
Perante este currículo, delineado numa nota só – a monografia fundadora!- nada de admirar que Cunha Rodrigues, um juiz de direito,em 1984, tenha alcançado o posto de comandante da magistratura do MP.
Que balanço se poderá fazer desse consulado?
Se estivéssemos num país de leitores sedentos de informação útil, e não de livritos dispensáveis, escritos por qualquer um que saiba ler e escrever, há muito que os estudos sobre o tempo de Cunha Rodrigues à frente do MP, teria sido esquadrinhado, até para se avaliar se teria algum fundamento a suspeita, gratuitamente lançada, acerca das cunhas e rodriguinhos.
Assim, neste texto bloguístico e despretensioso, a resenha é cronológica, lacunar, eminentemente subjectiva e por isso eventualmente injusta e incorrecta- mas baseada no que o próprio Cunha Rodrigues foi dizendo à comunicação social de jornal, ao longo do consulado. “Pela boca morre o peixe” e quem o recordou recentemente, foi quem com ele conviveu mais tempo e eventualmente o nomeou ao PR Eanes: Mário Soares, primeiro ministro em 1984, num governo em que era ministro de Estado...Almeida Santos; e ministro da Justiça, Mário Raposo. Mário Soares, foi , aliás, quem conviveu mais tempo com o PGR Cunha Rodrigues, pois foi eleito PR em 1986.
Até aos finais dos anos 80, a PGR ocupava-sa da gestão dos magistrados do MP que instruíam inquérito preliminares e participavam em instruções dirigidas por juizes. Entre os casos graves que apareceram na década de 80, contam-se inevitavelmente os relativos aos processos das FP 25 de Abril e o de Camarate que já tinha barbas...de molho!
Em 1988, o novo Código de Processo Penal veio dar visibilidade e importância fundamental à acção do MP. O papel de C.R. na elaboração deste diploma não deve ser esquecida, apesar de no livro Jornadas de direito Processual Penal( Almedina, Coimbra, 1988) que alberga a colaboração de vários juristas ( incluindo o actual PGR Souto Moura), C.R. ter escrito sobre recursos em processo penal.
No innício dos anos 90 aparece o caso Melancia que envolve vários indivíduos a comissionar em Macau, nomeados por Mário Soares. O processo de investigação de um crime de corrupção denunciado pelo Independente de Paulo Portas e Miguel Esteves Cardoso, é um must para quem queira estudar os métodos de investigação criminal da época e determinadas decisões que condenam uns; inocentam outros e desprezam declarações de um dos protagonistas principais, Rui Mateus, vertidas em livro e que não são atoardas de tolo, como o MP nessa altura, por intermédio de voz responsável, quis fazer crer! Quanto ao copista, esse é o primeiro pecado de Cunha Rodrigues.
Em nome da transparência democrática e do princípio da igualdade dos cidadão perante a lei, podia e devia ter sido feito algo mais e incomodadas outras pessoas que o não chegaram a ser. Era nessa altura que se tornava necessário ter tomates no sítio e incomodar o presidente da República da época, Mário Soares himself! Não o foi e fica a suspeita que houve discriminação negativa e negação desse princípio da igualdade. O povo leitor de jornais nunca chegou a perceber todo o imbróglio jurídico e nunca chegou a entender como é possível condenar o corruptor e absolver o corrompido. A construção jurídica alcançada fere o bom senso comum e contribuiu mais do que muita asneira governativa, para o descrédito da classe política. Cunha Rodrigues não pode lavar as mãos deste estendal de descrédito.
Nessa altura, pôs-se em causa a investigação efectuada e a relação da magistratura do MP com a Polícia Judiciária, tema recorrente em todo o mandato de C.R. à frente da PGR e que este nunca resolveu de modo satisfatório: dando murro na mesa e demintindo-se ou procurando esclarecer por via legislativa o que nunca o foi e continua a ser fonte de problemas, ainda hoje.
Em 1993, numa entrevista ao Público ( 6.5.1993) Cunha Rodrigues dizia, a propósito da intervenção de Maximiano Rodrigues, procurador do MP, na A.R. e que falou sobre o então recente diploma sobre o combate à corrupção: “ A polícia Judiciária não conseguiu vencer a carga genética que trouxe do antigo regime em que tinha poderes majestáticos. A PJ tinha prazos especiais para a prisão preventiva, tinha juizes próprios- os directores da polícia eram ao mesmo tempo juizes que convalidavam as prisões que a polícia fazia. (...)e quando este projecto aparece, a leitura que dele fazem muitos magistrados era a de que se estava perante o prè-inquérito – que aliás é reivindicado por grande parte de elementos da PJ, mesmo por alguns dos seus dirigentes. O que tem sido uma prática nefasta, a meu ver, em termos de aprofundamento democrático.
Na última inspecção que fizemos à PJ ( nessa altura era o MP quem inspeccionava aquela polícia- nota do copista), só num departamento encontrámos mais de mil e duzentas averiguações sumárias que eram nem mais nem menos que investigações encobertas ( isto passava-se no início dos anos noventa- nota do copista).”
A entrevista referida vinha encimada com o subtítulo: “ A polícia deve obedecer à magistratura”.
Este problema de que C.R. tinha plena consciência, nunca foi resolvido a contento, durante os anos que se seguiram. O copista acha que se pode dizer que no final do consulado, a polémica desencadeada pela incrível petulância e arrogância do juiz Fernando Negrão, à frente da PJ, que culminou com a acusação deste pela prática comprovada ( embora com provas julgadas inválidas pela juiza ...Margarida Blasco, segundo agora se diz) do crime de violação de segredo de justiça, foi uma consequência desta incapacidade de separação de águas e definição de competências. C.R. nunca conseguiu impor a sua ideia expressa nesta entrevista. Numa outra entrevista à televisão, chegou a apelidar o tal Negrão, enquanto director da PJ, de “alto funcionário”. Nem assim!
Adiante! No que se refere à corrupção, cancro social diagnosticado por muita gente com responsabilidades em Portugal e citam-se, de memória, João Cravinho; Garcia dos Santos e o economista António Borges, este a dizer abertamente tratar-se de um dos problemas mais graves que o país defronta ( e é ler as declarações, esta semana, por exemplo de Maria José Morgado que mais uma vez apita alto e bom som):
Que fez Cunha Rodrigues enquanto PGR e por isso chefe máximo da estrutra que detém o monopólio da acção penal e com responsabilidade na política criminal, mais que não fosse pelo exercício de magistratura de influência?
Em 1994, perante o caso das facturas falsas que atravessava todo o sector de obras públicas em Portugal, envolvendo empresas ligadas directamente aos partidos políticos, através das contribuições mais ou menos ocultas e na sombra do escândalo que envolvia Duarte Lima, também a propósito de traficâncias de influências; dos processos di Fundo Social Europeu (Partex e UGT), que pensava disso C.R. ?
O Público, em 13.12.1994, escrevia abertamente que o caso das facturas falsas “ representam um crime que serviu para acobertar outras práticas ilícitas, que bem podem estar relacionadas com o financiamento ilegal de partidos políticos, favorecimentos em adjudicações de obras públicas, entre outras.” AS empresas envolvidas directamente eram a Soares da Costa; Construções Técnicas e a Mota & Companhia e o Público adiantava que se “gerou no país uma atmosfera de suspeição em relação à forma como foram adjudicadas as principais obras públicas nos anos de ouro do cavaquismo.”
Nessa altura reuniram-se “ à mesma mesa” Cunha Rodrigues e o então director da PJ, hoje director do CEJ, Mário Mendes, para “constiuir uma equipa de magistrados e de polícias especializados em investigações de corrupção e de crime económico”
Esta super equipa, se alguma vez foi constituida , ninguém deu por nada! E os casos das facturas falsas e da corrupção nos partidos e no seio do próprio Estado ficou mesmo assim: em águas de bacalhau, como todos podem constatar.
Que dizia então Cunha Rodrigues?
Ao mesmo número do Público, falava da “necessidade de ser conferida prioridade à repressão das fraudes , da corrupção e da criminalidade económica”. Laborinho Lúcio, ao lado, na mesm página do jornal dizia o mesmo. Cunha Rodrigues fazia pela enésima vez o discurso da falta de meios e elencava uma série de exemplos da falta desses meios: “Em Lisboa há uma carrinha para transporte de processos e dois automóveis que servem 76 magistrados e 208 funcionários do Diap e do TIC. No Porto, para 112 pessoas, não há nenhum veículo pessoal e apenas uma viatura mista para o transporte de processos: em Coimbra, nada e no resto do país, nada tembém.
Laborinho, refutava os números da penúria e falava na “extraordinária” recuperação na PJ, em três anos e falava no aumento de...funcionários e na reorganização do Departamento de Combate à Corrupção na PJ...
Na mesma altura, ao Público de 28 de Outubro de 1998, Laborinho Lúcio dizia expressamente “ Não se diga que não há meios!” Em recado directo a Cunha Rodrigues. Laborinho Lúcio, nessa entrevista, perguntado sobre “o que pensa dos níveis de corrupção em Portugal?” dizia: “A minha ideia é de que não somos um país de corrupção generalizada, mas somos um país onde há fenómenos de corrupção que vão bastante para lá da leitura estatística.”
Numa entrevista ao Expresso Revista, de 8 de Outubro de 1994, para comemorar os dez anos à frente do MP, C.R., disse sobre o mesmo assunto:
“Os níveis de corrupção no nosso país não têm nada a ver com aquilo que acontece na Itália. Mas não podemos adormecer sobre os nossos brandos costumes. Nós temos corrupção, as pessoas sentem que há corrupção. E aí está uma área que não posso silenciar. Neste momento aguardo que o director geral da PJ responda às questões que formulei no relatório da inspecção que fiz à PJ, no fim de Abril, sobre a ausência de investigação da maioria dos crimes de corrupção e fraude.” (...) creio que os meios qye estão ao dispor do MP, e em particluar da PJ não são suficientes. Estamos ainda a investigar factos que ocorreram há seis, sete, e mesmo oito anos: desvios de milhões de contos que eram destinados à reestruturação e à converegência económica do país. Já não é só o dinheiro que está em causa, são as próprias regras do jogo democrático que estão a ser falseadas- o que não podemos calar.”
E atente-se numa referência que contrasta com declarações recentes:
“Nos crimes de colarinho branco, as pessoas nunca se defendem como o delinquente comum- defendem-se com armas de arremesso contra os magistrados. Começam logo pelo segredo de justiça, como se houvesse segredos que valem mais que outros.”
Neste discurso recorrente da “falta de meios”, o problema real que revelava nunca foi resolvido: a criação dos departamentos na PGR, como o NAT e outros DCIAPS nunca resolveu a questão da proficuidade da investigação da corrupção.
Em 1999, ainda se dava conta no Público, de 23 de Março de 1999, do “nó górdio da guerra entre o MP e a Judiciária”, a propósito da investigação criminal do crime económico. E nesse artigo dá-se conta de “um clima de autêntica guerrilha institucional entre C.R. e Laborinho, em torno da questão dos meios da DCICFIEF. À semelhança do conflito ocorrido antes, com Marques Vidal, a propósito da investigação dos processos do FSE de 1987 e 88.
A prova está nas denúncias de Garcia dos Santos que foi ouvido por C.R. a propósito da corrpução na JAE e em entrevista ao Independente de 18.5.2001, disse: O dr. Cunha Rodrigues disse-me, taxativamente, ipsis verbis, ´se o senhor não tem provas não vale a pena dizer`”
Nunca foi desmentido...e as denúncias graves que Garcia dos Santos apresentou nessa altura foram acompanhadas de uma descrição pormenoizada do modus operandi dos corruptos: “ Quem financia os partidos políticos são os empreiteiros. Agora, como é que o dinheiro vai para os empreiteiros? Pelas obras que os empreiteiros fazem. Mas não é por obras que estejam correctamente planeadas. É por trabalhos a mais, é por alterações nos projectos, é por erros nos projectos. Isso é que é muitas vezes empolado, para que o dinheiro seja mais do que aquilo que devia ser.”
Estas afirmações cairam em saco roto, aparentemente, uma vez que não se conhece um único caso de empreiteiro financiador ilegal de partido político que tenha sido processado. Isso apesar da existência de uma sindicância á JAE, realizada por outro magistrado do MP, Pinto dos Santos, na qual se dava conta de muita porcaria oculta e que teve algum resultado.
Por outro lado, Maximiano Rodrigues, actual Inspector na IGAI, magistrado do MP, em entrevista à revista Factos, de 4.3.1998, dizia: “ A polícia Judiciária faz alguma investigação criminal, mas pouca. É excelente a resolver homicídios e é boa no combate ao crime organizado e banditismo”. Subentendido: corrupção, pouco ou nada.
Por isso, o copista, neste aspecto da investigação da corrupção, entende que no que diz respeito ao PGR Cunha Rodrigues o balanço é de rotundo falhanço! Pouco ou nada se aproveita, porque o sistema não só não melhorou como está bem pior do que estava! Não se pretende assacar aqui responsabilidades exclusivas, note-se! Quer-se apenas dar conta de que o PGR Cunha Rodrigues, neste campo não teve qualquer sucesso e esperava-se que tivesse.
Em 1998, outro facto relevante que envolveu a investigação criminal de uma juiza – Fátima Galante, casada com outro juiz, Rui Rangel, irmão do outro, então na SIC – e em que interveio o então director da PJ- Fernando Negrão – e o MP, como investigador. Aparentemente, a investigação redundou num flop humilhante para o MP e que originou um acórdão ignominioso para o MP e a PJ. Para além de um editorial na SIC e um artigo no DN de 10.10.98 da autoria do outro Rangel em que falava despudoradamente de “ A honra de um juiz”! A culpa de C.R. nisto?! Lá iremos! E é para já.
Uma boa parte dos problemas insitucionais teve e tem a ver com as pessoas nomeadas para os cargos.
Em 1999, na sequência da demissão de Fernando Negrão da PJ , foi nomeado para a mesma direcção um magistrado do MP que toda a gente apontou como próximo de C.R. Luís Bonina. Tinha sido este magistrado quem fora encarregado do processo das facturas falsas.
Sem pôr em causa a valia intelectual e técnica desse magistrado, o falhanço dessa investigação não pode ficar sem paternidade. Os métodos e os meios, se faltaram, não podem servir sempre de álibi para os parcos resultados e para a sensação permanente de que a montanha inicial acaba sempre por parir ratinhos e a responsabilidade parece óbvia.
Em departamentos tão sensíveis como são os DIAPS e a articulação com a DCICFIEF da PJ e a que lhe sucedeu, a escolha de responsáveis tem de ser imputada ao PGR . E portanto, a Cunha Rodrigues.
Por outro lado, os imediatos responsáveis pela hierarquia do MP, a seguir ao PGR são os procuradores gerais distritais. Os actuais, independentemente do mérito e valia inerente, estão no cargo há demasiado tempo: a dúzia de anos em comissões sucessivamente renovadas já lá vai há muito e ninguém tem coragem de lhes dizer que fariam um favor a toda a gente se dessem o lugar a outros. E a responsabilidae última por tal facto deve imputar-se ao PGR.
Por último, o copista tem a realçar um aspecto pouco ventilado dentro e fora da magistratura do MP:
A liberdade de expressão dos magistrados! Sendo o MP uma estrutura hierarquizada em que os procuradores mais graduados tratam os magistrados de escalões inferiores pelo termo paternalista de “colega”, tal modo de tratamento tem sentido único – de cima para baixo, como é de boa educação. Porém, não é apenas um fenómeno de boa educação.
O escalonamento hierárquico e a dependência vertical significam muitas vezes um apagamento voluntário dos magistrados dos escalões inferiores nem sempre explicável pelo temor reverencial.
Poucos magistrados do MP se atrevem a um discurso, mesmo comezinho ou meramente explicativo, nos meios de comunicação social.
Mesmo agora, neste meio de comunicação novo, o receio da apreciação negativa e do xiste incomodativo ou jesuítico sobreleva por vezes a vontade de exprimir o pensamento que não encontra refúgio noutro lugar.
Apesar de na entrevista ao Expresso, de 8 de Outubro de 1984, C.R. ter dito que “ os magistrados têm o direito e o dever de falar quando houver questões relacionadas com os direitos do Homem, com a Justiça, com as liberdades ou com a independência dos tribunais”, o que se viu desde então foi um silêncio ensurdecedor só entrecortado aqui e ali, pelos membros da corte que estão sempre autorizados a falar em público e perante plateia se for preciso. Criou-se e generalizou-se a ideia que o magistrado deve ser recatado ao ponto de não ter voz...sobre nada, a não ser no processo.
O copista desconhece de onde proveio esta ideia peregrina, mas desconfia que o PGR Cunha Rodrigues, apesar do que disse, pouco ou nada fez para inverter esta tendência que ele sabia existir.
Por outro lado, nunca se viu ou leu uma entrevista de nenhum procurador geral distrital, figura cimeira da PGR e representante do PGR e do MP, nos distritos judiciais. Aliás, o público em geral deconhece tal figura e qual a sua importância que obviamente é grande. Quanto ao que pensam sobre os assuntos da respectiva circunscrição, porém, nada!
E parece-me tabém aqui que a responsabilidade por este silêncio de anos é também imputável directamente ao PGR Cunha Rodrigues.
A terminar, um episódio ocorrido em 1995, numa campanha eleitoral para a Presidência:
O Independente de 22 de Dezembro desse ano, fez manchete com a notícia que um administrador da TAP, Santos Martins, insinuando que dinheiros desviados da TAP teriam revertido a favor da candidatura do ex-primeiro ministro Cavaco Silva. Os elementos da candidatura , onde se incluiam os nomes de Dias Loureiro;Proença de Carvalho;Ruio Machete;José António Barreiros;Marcelo Rebelo de Sousa e outros, exigiram da PJ e do PGR um desmentido formal. Segundo o Público de 23 de Dezembro de 1995, Cavaco telefonou a Guterres, foi a Belém falar com Mário Soares; falou ao país e ameaçou renunciar.
O PGR Cunha Rodrigues, para desmentir e fazer a vontade ao candidato chantageador, tinha que violar o segredo de justiça, pois nessa altura não se admitia a explicação pública que hoje consta do artº 86 nº9 do Código de Processo Penal. E fê-lo! Cedeu à pressão política e assinou comunicado que foi tornado público onde se dizia que no processo de inquérito à compra de quatro Airbus pela TAP, em que era suspeito Santos Martins, não se estava a investigar o finaciamento do PSD e da candidatura presidencial de Cavaco Silva.
Para o copista, esse dia, foi o mais triste de todo o consulado do PGR Cunha Rodrigues. O copista continua a pensar que devia ter sido nesse dia que Cunha Rodrigues deveria ter deixado a PGR. Eventualmente com proveito para todos. COmo se viu depois, aquando da substituição, penosa e com toda a gente a desejar ver o PGR Cunha Rodrigues pelas costas.
Pode dizer-se que o magistrado que delineou a estrutura e definiu a espinha dorsal do moderno MP, pós 25 de Abril permaneceu no cargo demasiado tempo e isso penalizou-o, porque se calhar e medindo tudo, não o merecia. Porém, sibi imputet.
sexta-feira, janeiro 16, 2004
MIZÉ A INSPECTORA, JÁ
(propõe o Mangadalpaca)
O Mangadalpaca queria comentar a desassombrada posição da magistrada Maria José Morgado (MJM) numa intervenção recente – de que o Público de 12/01/04 deu eco – em Sever do Vouga.
MJM sempre dignificou a magistratura do MP, que integra. Mesmo quando esteve em Comissão de Serviço na PJ, onde desempenhou um trabalho que o Mangadalpaca acha, humildemente, ter sido muito meritório e ter ficado incompleto. O Mangadalpaca entende mesmo que o seu livro «Fraude e Corrupção em Portugal» dá pistas muito valiosas e fecundas para o tratamento e abordagem das problemáticas do crime económico e financeiro, ultimamente tão esquecidas e obnubiladas pela paranóia dos processos de pedofilia.
Porém, o que MJM disse na sessão da Anta, em Sever do Vouga, a acreditar no teor do artigo do Público, peca por excessiva generalização.
É sabido que os défices de investigação criminal em Portugal já fazem mossa há muito tempo.
É sabido que, de uma realidade sócio-judiciária de matriz eminentemente agrária, o País confronta-se, agora, com realidades como as decorrentes da crise de valores, de consumismo e de um certo amoralismo triunfante, da explosão dos delitos de massa (decorrente do Estado de Direito em abundância), do crime organizado transnacional, das Mafias do Leste, em suma, da complexificação e sofisticação dos processos e modus operandi criminosos.
E no sistema judiciário? Mudou algo? Houve algum investimento de formação de quadros na magistratura tendente a adequar o aparelho à situação referida? Há preocupação séria de criar equipas multidisciplinares que afrontem capazmente essas realidades? Alguém se preocupou em alterar seriamente o relacionamento entre magistraturas e a PJ? Mexeu-se consequentemente no regime do sigilo bancário e fiscal? Dotaram-se os serviços de pessoal de investigação e apoio necessários?
Para não falar no caos instalado nas equipas de investigação dos crimes tributários e na incapacidade da própria Administração Fiscal em cruzar dados introduzidos nas suas bases estanques; para não falar no amadorismo de tantas e tantas investigações criminais ( a começar, desde logo, nos crimes rodoviários, mas algumas da própria PJ); para não falar na ausência de um verdadeiro plano de formação contínua de magistrados (porventura mais importante e necessária que a inicial); para não falar de uma real política de gestão racional de quadros das magistraturas; para não falar na falta de um sistema de incentivo real à auto-formação (a progressão na carreira faz-se de forma «natural», sem outros requisitos), entre muitas outras.
A crer no que se relatou no dito artigo de jornal, MJM é redutora e generalizou demais, acha o Mangadalpaca. MJM ainda nada desmentiu, pelo que se presume que é verdade.
Muitas das observações de MJM são exactas.
Aplicam-se a muitos magistrados. O Mangadalpaca sempre achou – e já o escreveu nesta PORTADALOJA – que, nas magistraturas, há ausência de critérios racionais de gestão de quadros, há desmotivação, há desânimo, há desresponsabilização, há laxismo, há falta de brio e empenhamento, há certamente algum incompetência.
Mas há causas para isso.
MJM parte do princípio que os magistrados se devem desmultiplicar em funções, que são efectivamente suas, mas para as quais ou não têm preparação adequada e actualizada ou, pura e simplesmente, não têm disponibilidade de tempo e de meios para as concretizar capazmente.
Ora, a solução para estas questões não pode passar por elementos voluntaristas ou de «carolice». Como, em certa medida, é o caso de MJM.Todas essas questões devem ter solução institucional, para que, então sim, se possa exigir responsabilidades a quem as tem, porque dotado dos meios e do Know-how.
Em todo o caso, quer o Mangadalpaca referir que conhece casos – de bastantes magistrados judiciais e do MP – que não revê no retrato feito por MJM.
Há casos manifestos de extrema dedicação e brio profissional de muitos e muitos magistrados, na verdade raramente reconhecido (dir-se-à que são ossos do ofício). Há situações de grande esforço pessoal, físico até, com repercussões na saúde e vida familiar de muitos magistrados efectivamente empenhados nas suas actividades funcionais (situações de acumulação de serviço, condições de trabalho extremamente precárias, falta de meios de apoio, quer de polícias, quer de funcionários próprios, casos de cumulação de serviço de comarcas, etc, etc).
Não queira MJM, com as suas críticas, desmotivar também estes!
Foi, pois, um exagero de MJM, que, certamente, conhece alguma realidade judiciária, mas não o suficiente para lhe permitir fazer as observações que fez, com o grau de generalização que lhes conferiu.
Por isso, o Mangadalpaca, modestamente, propõe: MIZÉ A INSPECTORA, JÁ.
©Mangadalpaca
(propõe o Mangadalpaca)
O Mangadalpaca queria comentar a desassombrada posição da magistrada Maria José Morgado (MJM) numa intervenção recente – de que o Público de 12/01/04 deu eco – em Sever do Vouga.
MJM sempre dignificou a magistratura do MP, que integra. Mesmo quando esteve em Comissão de Serviço na PJ, onde desempenhou um trabalho que o Mangadalpaca acha, humildemente, ter sido muito meritório e ter ficado incompleto. O Mangadalpaca entende mesmo que o seu livro «Fraude e Corrupção em Portugal» dá pistas muito valiosas e fecundas para o tratamento e abordagem das problemáticas do crime económico e financeiro, ultimamente tão esquecidas e obnubiladas pela paranóia dos processos de pedofilia.
Porém, o que MJM disse na sessão da Anta, em Sever do Vouga, a acreditar no teor do artigo do Público, peca por excessiva generalização.
É sabido que os défices de investigação criminal em Portugal já fazem mossa há muito tempo.
É sabido que, de uma realidade sócio-judiciária de matriz eminentemente agrária, o País confronta-se, agora, com realidades como as decorrentes da crise de valores, de consumismo e de um certo amoralismo triunfante, da explosão dos delitos de massa (decorrente do Estado de Direito em abundância), do crime organizado transnacional, das Mafias do Leste, em suma, da complexificação e sofisticação dos processos e modus operandi criminosos.
E no sistema judiciário? Mudou algo? Houve algum investimento de formação de quadros na magistratura tendente a adequar o aparelho à situação referida? Há preocupação séria de criar equipas multidisciplinares que afrontem capazmente essas realidades? Alguém se preocupou em alterar seriamente o relacionamento entre magistraturas e a PJ? Mexeu-se consequentemente no regime do sigilo bancário e fiscal? Dotaram-se os serviços de pessoal de investigação e apoio necessários?
Para não falar no caos instalado nas equipas de investigação dos crimes tributários e na incapacidade da própria Administração Fiscal em cruzar dados introduzidos nas suas bases estanques; para não falar no amadorismo de tantas e tantas investigações criminais ( a começar, desde logo, nos crimes rodoviários, mas algumas da própria PJ); para não falar na ausência de um verdadeiro plano de formação contínua de magistrados (porventura mais importante e necessária que a inicial); para não falar de uma real política de gestão racional de quadros das magistraturas; para não falar na falta de um sistema de incentivo real à auto-formação (a progressão na carreira faz-se de forma «natural», sem outros requisitos), entre muitas outras.
A crer no que se relatou no dito artigo de jornal, MJM é redutora e generalizou demais, acha o Mangadalpaca. MJM ainda nada desmentiu, pelo que se presume que é verdade.
Muitas das observações de MJM são exactas.
Aplicam-se a muitos magistrados. O Mangadalpaca sempre achou – e já o escreveu nesta PORTADALOJA – que, nas magistraturas, há ausência de critérios racionais de gestão de quadros, há desmotivação, há desânimo, há desresponsabilização, há laxismo, há falta de brio e empenhamento, há certamente algum incompetência.
Mas há causas para isso.
MJM parte do princípio que os magistrados se devem desmultiplicar em funções, que são efectivamente suas, mas para as quais ou não têm preparação adequada e actualizada ou, pura e simplesmente, não têm disponibilidade de tempo e de meios para as concretizar capazmente.
Ora, a solução para estas questões não pode passar por elementos voluntaristas ou de «carolice». Como, em certa medida, é o caso de MJM.Todas essas questões devem ter solução institucional, para que, então sim, se possa exigir responsabilidades a quem as tem, porque dotado dos meios e do Know-how.
Em todo o caso, quer o Mangadalpaca referir que conhece casos – de bastantes magistrados judiciais e do MP – que não revê no retrato feito por MJM.
Há casos manifestos de extrema dedicação e brio profissional de muitos e muitos magistrados, na verdade raramente reconhecido (dir-se-à que são ossos do ofício). Há situações de grande esforço pessoal, físico até, com repercussões na saúde e vida familiar de muitos magistrados efectivamente empenhados nas suas actividades funcionais (situações de acumulação de serviço, condições de trabalho extremamente precárias, falta de meios de apoio, quer de polícias, quer de funcionários próprios, casos de cumulação de serviço de comarcas, etc, etc).
Não queira MJM, com as suas críticas, desmotivar também estes!
Foi, pois, um exagero de MJM, que, certamente, conhece alguma realidade judiciária, mas não o suficiente para lhe permitir fazer as observações que fez, com o grau de generalização que lhes conferiu.
Por isso, o Mangadalpaca, modestamente, propõe: MIZÉ A INSPECTORA, JÁ.
©Mangadalpaca
quinta-feira, janeiro 15, 2004
Perplexidades de Mangadalpaca
O Mangadalpaca queria, desta feita, manifestar a sua perplexidade relativamente a uma questão que, recorrentemente, tem sido subliminarmente injectada em alguns círculos e, também, tido eco na comunicação social.
Tem a ver com o mandato passado pelo ministro Bagão Félix, que tutela a Casa Pia, a uma equipa de advogados liderada pelo causídico Daniel Proença de Carvalho, para representar os interesses das vítimas dos alegados abusos sexuais de que terão sido vítimas aquando da sua permanência na Casa Pia.
Ao que o Mangadalpaca julga ter sido admitido, a dita equipa pondera – com a aparente confiança e anuência do ministro mandante – demandar o próprio Estado.
Pasme-se!
O Mangadalpaca, no seu humilde entendimento, julga haver aí um grande equívoco:
Então, o representante do Estado constitui uma equipa de advogados para demandar o Estado?
Quais as repercussões processuais e político-jurídicas de tal atitude, caso se venha a verificar o efectivo accionamento do Estado no chamado Processo Casa Pia?
O Ministério Público que, por um lado acusa, teria que passar a defender o demandado Estado, podendo, em tal caso, nos termos estatutários do MP, ser constituído advogado, por se poder descortinar aí um caso de incompatibilidade de posições. Tal advogado teria que ser constituído pelo Governo.
O Mangadalpaca não percebe, afinal, por que razão, se o pressuroso ministro da Segurança Social entende que o Estado deve algo às alegadas vítimas da Casa Pia (e pode, efectivamente, dever muito), não lhes propõe o pagamento directo de uma indemnização, por acordo com os representantes daqueles ou, alternativamente, através da constituição de uma Comissão ou Tribunal arbitral.
Pensa o Mangadalpaca que há, aqui, algo de errado ou precipitado. Ou, então, algo de muito inconfessável....
Já viram o gerente da firma nomear um advogado para fazer um pedido de indemnização à sociedade? Nem o Vale e Azevedo...
Aguarda-se esclarecimento.
MANGADALPACA
Tem a ver com o mandato passado pelo ministro Bagão Félix, que tutela a Casa Pia, a uma equipa de advogados liderada pelo causídico Daniel Proença de Carvalho, para representar os interesses das vítimas dos alegados abusos sexuais de que terão sido vítimas aquando da sua permanência na Casa Pia.
Ao que o Mangadalpaca julga ter sido admitido, a dita equipa pondera – com a aparente confiança e anuência do ministro mandante – demandar o próprio Estado.
Pasme-se!
O Mangadalpaca, no seu humilde entendimento, julga haver aí um grande equívoco:
Então, o representante do Estado constitui uma equipa de advogados para demandar o Estado?
Quais as repercussões processuais e político-jurídicas de tal atitude, caso se venha a verificar o efectivo accionamento do Estado no chamado Processo Casa Pia?
O Ministério Público que, por um lado acusa, teria que passar a defender o demandado Estado, podendo, em tal caso, nos termos estatutários do MP, ser constituído advogado, por se poder descortinar aí um caso de incompatibilidade de posições. Tal advogado teria que ser constituído pelo Governo.
O Mangadalpaca não percebe, afinal, por que razão, se o pressuroso ministro da Segurança Social entende que o Estado deve algo às alegadas vítimas da Casa Pia (e pode, efectivamente, dever muito), não lhes propõe o pagamento directo de uma indemnização, por acordo com os representantes daqueles ou, alternativamente, através da constituição de uma Comissão ou Tribunal arbitral.
Pensa o Mangadalpaca que há, aqui, algo de errado ou precipitado. Ou, então, algo de muito inconfessável....
Já viram o gerente da firma nomear um advogado para fazer um pedido de indemnização à sociedade? Nem o Vale e Azevedo...
Aguarda-se esclarecimento.
MANGADALPACA
quarta-feira, janeiro 14, 2004
A dúvida do copista, em assuntos externos.
Deste sítio, tirei isto:
The Awful Truth
By PAUL KRUGMAN
Published: January 13, 2004
O'Neill, Paul
Bush, George W
Suskind, Ron
Army War College
People are saying terrible things about George Bush. They say that his officials weren't sincere about pledges to balance the budget. They say that the planning for an invasion of Iraq began seven months before 9/11, that there was never any good evidence that Iraq was a threat and that the war actually undermined the fight against terrorism.
But these irrational Bush haters are body-piercing, Hollywood-loving, left-wing freaks who should go back where they came from: the executive offices of Alcoa, and the halls of the Army War College.
I was one of the few commentators who didn't celebrate Paul O'Neill's appointment as Treasury secretary. And I couldn't understand why, if Mr. O'Neill was the principled man his friends described, he didn't resign early from an administration that was clearly anything but honest.
But now he's showing the courage I missed back then, by giving us an invaluable, scathing insider's picture of the Bush administration.
Ron Suskind's new book "The Price of Loyalty" is based largely on interviews with and materials supplied by Mr. O'Neill. It portrays an administration in which political considerations — satisfying "the base" — trump policy analysis on every issue, from tax cuts to international trade policy and global warming. The money quote may be Dick Cheney's blithe declaration that "Reagan proved deficits don't matter." But there are many other revelations.
One is that Mr. O'Neill and Alan Greenspan knew that it was a mistake to lock in huge tax cuts based on questionable projections of future surpluses. In May 2001 Mr. Greenspan gloomily told Mr. O'Neill that because the first Bush tax cut didn't include triggers — it went forward regardless of how the budget turned out — it was "irresponsible fiscal policy." This was a time when critics of the tax cut were ridiculed for saying exactly the same thing.
Another is that Mr. Bush, who declared in the 2000 campaign that "the vast majority of my tax cuts go to the bottom end of the spectrum," knew that this wasn't true. He worried that eliminating taxes on dividends would benefit only "top-rate people," asking his advisers, "Didn't we already give them a break at the top?"
Most startling of all, Donald Rumsfeld pushed the idea of regime change in Iraq as a way to transform the Middle East at a National Security Council meeting in February 2001.
There's much more in Mr. Suskind's book. All of it will dismay those who still want to believe that our leaders are wise and good.
The question is whether this book will open the eyes of those who think that anyone who criticizes the tax cuts is a wild-eyed leftist, and that anyone who says the administration hyped the threat from Iraq is a conspiracy theorist.
The point is that the credentials of the critics just keep getting better. How can Howard Dean's assertion that the capture of Saddam hasn't made us safer be dismissed as bizarre, when a report published by the Army War College says that the war in Iraq was a "detour" that undermined the fight against terror? How can charges by Wesley Clark and others that the administration was looking for an excuse to invade Iraq be dismissed as paranoid in the light of Mr. O'Neill's revelations?
So far administration officials have attacked Mr. O'Neill's character but haven't refuted any of his facts. They have, however, already opened an investigation into how a picture of a possibly classified document appeared during Mr. O'Neill's TV interview. This alacrity stands in sharp contrast with their evident lack of concern when a senior administration official, still unknown, blew the cover of a C.I.A. operative because her husband had revealed some politically inconvenient facts.
Some will say that none of this matters because Saddam is in custody, and the economy is growing. Even in the short run, however, these successes may not be all they're cracked up to be. More Americans were killed and wounded in the four weeks after Saddam's capture than in the four weeks before. The drop in the unemployment rate since its peak last summer doesn't reflect a greater availability of jobs, but rather a decline in the share of the population that is even looking for work.
More important, having a few months of good news doesn't excuse a consistent pattern of dishonest, irresponsible leadership. And that pattern keeps getting harder to deny.
Daqui tirei isto:
Paul O'Neill's Lies About Iraq
By John H. Hinderaker
PowerLineBlog.com | January 13, 2004
Laurie Mylroie sent out an email about Paul O'Neill's appearance on 60 Minutes last night; she notes what appears to be a major error in Ron Suskind's book, which casts doubt on the credibility of both Suskind and O'Neill. Here is the key portion of Mylroie's email:
"In his appearance this evening on '60 Minutes,' Ron Suskind, author of The Price of Loyalty, based to a large extent on information from former Secretary of the Treasury Paul O'Neill, made an astonishing, very serious misstatement.
"Suskind claimed he has documents showing that preparations for the Iraq war were well underway before 9-11. He cited--and even showed--what he said was a Pentagon document, entitled, 'Foreign Suitors for Iraq Oilfield Contracts.' He claimed the document was about planning for post-war Iraq oil (CBS's promotional story also contained that claim): http://www.cbsnews.com/stories/2004/01/09/60minutes/printable592330.shtml
"But that is not a Pentagon document. It's from the Vice-President's Office. It was part of the Energy Project that was the focus of Dick Cheney's attention before the 9/11 strikes.
"And the document has nothing to do with post-war Iraq. It was part of a study of global oil supplies. Judicial Watch obtained it in a law suit and posted it, along with related documents, on its website at: http://www.judicialwatch.org/071703.c_.shtml Indeed, when this story first broke yesterday, the Drudge Report had the Judicial Watch document linked (no one at CBS News saw that, so they could correct the error, when the show aired?)"
What Mylroie says about the "Foreign Suitors" document is correct. The Judicial Watch link still works as of this morning, and as you can easily see, the document, dated March 5, 2001, has nothing to do with post-war planning. It is merely a list of existing and proposed "Iraqi Oil & Gas Projects" as of that date. And it includes projects in Iraq by countries that obviously would not have been part of any "post-war" plans of the Bush administration, such as, for example, Vietnam.
So Suskind (and apparently O'Neill) misrepresented this document, which appears to be a significant part of their case, given that Suskind displayed in on 60 Minutes. It would not be possible for anyone operating in good faith to represent the document as Suskind did.
But the truth is even worse than Mylroie pointed out in her email. The CBS promo linked to above says that this document "includes a map of potential areas for exploration. 'It talks about contractors around the world from, you know, 30-40 countries. And which ones have what intentions,' says Suskind. 'On oil in Iraq.'"
True enough; there is a "map of potential areas for exploration" in Iraq here. But what Paul O'Neill and Ron Suskind don't tell you is that the very same set of documents that contain the Iraq map and the list of Iraqi oil projects contain the same maps and similar lists of projects for the United Arab Emirates and Saudi Arabia! When documents are produced in litigation (in this case, the Judicial Watch lawsuit relating to Cheney's energy task force), they are numbered sequentially. The two-page "Iraqi Oil Suitors" document that Suskind breathlessly touts is numbered DOC044-0006 through DOC044-0007. The Iraq oil map comes right before the list of Iraqi projects; it is numbered DOC044-0005.
DOC044-0001 is a map of oil fields in the United Arab Emirates. DOC044-0002 is a list of oil and gas development projects then going on in the United Arab Emirates. DOC044-0003 is a map of oil fields in Saudi Arabia. DOC044-0004 is a list of oil and gas projects in Saudi Arabia. So the "smoking gun" documents that Suskind and O'Neill claim prove that the administration was planning to invade Iraq in March 2001 are part of a package that includes identical documents relating to the United Arab Emirates and Saudi Arabia. Does Paul O'Neill claim the administration was planning on invading them, too? Or, as Mylroie says, was this merely part of the administration's analysis of sources of energy in the 21st century?
There is only one possible conclusion: Paul O'Neill and Ron Suskind are attempting to perpetrate a massive hoax on the American people.
UPDATE: Paul Krugman is ecstatic about O'Neill's allegations, and views them as vindicating his three years of over-the-top Bush hatred. Needless to say, Krugman has nothing to say about O'Neill's and Suskind's fraudulent misrepresentation of the documents on which their claims are based. The battle is joined: the New York Times propagates lies, the blogosphere points out undeniable facts that are inconvenient for the left. Spread the word."
Onde está a objectividade?!
The Awful Truth
By PAUL KRUGMAN
Published: January 13, 2004
O'Neill, Paul
Bush, George W
Suskind, Ron
Army War College
People are saying terrible things about George Bush. They say that his officials weren't sincere about pledges to balance the budget. They say that the planning for an invasion of Iraq began seven months before 9/11, that there was never any good evidence that Iraq was a threat and that the war actually undermined the fight against terrorism.
But these irrational Bush haters are body-piercing, Hollywood-loving, left-wing freaks who should go back where they came from: the executive offices of Alcoa, and the halls of the Army War College.
I was one of the few commentators who didn't celebrate Paul O'Neill's appointment as Treasury secretary. And I couldn't understand why, if Mr. O'Neill was the principled man his friends described, he didn't resign early from an administration that was clearly anything but honest.
But now he's showing the courage I missed back then, by giving us an invaluable, scathing insider's picture of the Bush administration.
Ron Suskind's new book "The Price of Loyalty" is based largely on interviews with and materials supplied by Mr. O'Neill. It portrays an administration in which political considerations — satisfying "the base" — trump policy analysis on every issue, from tax cuts to international trade policy and global warming. The money quote may be Dick Cheney's blithe declaration that "Reagan proved deficits don't matter." But there are many other revelations.
One is that Mr. O'Neill and Alan Greenspan knew that it was a mistake to lock in huge tax cuts based on questionable projections of future surpluses. In May 2001 Mr. Greenspan gloomily told Mr. O'Neill that because the first Bush tax cut didn't include triggers — it went forward regardless of how the budget turned out — it was "irresponsible fiscal policy." This was a time when critics of the tax cut were ridiculed for saying exactly the same thing.
Another is that Mr. Bush, who declared in the 2000 campaign that "the vast majority of my tax cuts go to the bottom end of the spectrum," knew that this wasn't true. He worried that eliminating taxes on dividends would benefit only "top-rate people," asking his advisers, "Didn't we already give them a break at the top?"
Most startling of all, Donald Rumsfeld pushed the idea of regime change in Iraq as a way to transform the Middle East at a National Security Council meeting in February 2001.
There's much more in Mr. Suskind's book. All of it will dismay those who still want to believe that our leaders are wise and good.
The question is whether this book will open the eyes of those who think that anyone who criticizes the tax cuts is a wild-eyed leftist, and that anyone who says the administration hyped the threat from Iraq is a conspiracy theorist.
The point is that the credentials of the critics just keep getting better. How can Howard Dean's assertion that the capture of Saddam hasn't made us safer be dismissed as bizarre, when a report published by the Army War College says that the war in Iraq was a "detour" that undermined the fight against terror? How can charges by Wesley Clark and others that the administration was looking for an excuse to invade Iraq be dismissed as paranoid in the light of Mr. O'Neill's revelations?
So far administration officials have attacked Mr. O'Neill's character but haven't refuted any of his facts. They have, however, already opened an investigation into how a picture of a possibly classified document appeared during Mr. O'Neill's TV interview. This alacrity stands in sharp contrast with their evident lack of concern when a senior administration official, still unknown, blew the cover of a C.I.A. operative because her husband had revealed some politically inconvenient facts.
Some will say that none of this matters because Saddam is in custody, and the economy is growing. Even in the short run, however, these successes may not be all they're cracked up to be. More Americans were killed and wounded in the four weeks after Saddam's capture than in the four weeks before. The drop in the unemployment rate since its peak last summer doesn't reflect a greater availability of jobs, but rather a decline in the share of the population that is even looking for work.
More important, having a few months of good news doesn't excuse a consistent pattern of dishonest, irresponsible leadership. And that pattern keeps getting harder to deny.
Daqui tirei isto:
Paul O'Neill's Lies About Iraq
By John H. Hinderaker
PowerLineBlog.com | January 13, 2004
Laurie Mylroie sent out an email about Paul O'Neill's appearance on 60 Minutes last night; she notes what appears to be a major error in Ron Suskind's book, which casts doubt on the credibility of both Suskind and O'Neill. Here is the key portion of Mylroie's email:
"In his appearance this evening on '60 Minutes,' Ron Suskind, author of The Price of Loyalty, based to a large extent on information from former Secretary of the Treasury Paul O'Neill, made an astonishing, very serious misstatement.
"Suskind claimed he has documents showing that preparations for the Iraq war were well underway before 9-11. He cited--and even showed--what he said was a Pentagon document, entitled, 'Foreign Suitors for Iraq Oilfield Contracts.' He claimed the document was about planning for post-war Iraq oil (CBS's promotional story also contained that claim): http://www.cbsnews.com/stories/2004/01/09/60minutes/printable592330.shtml
"But that is not a Pentagon document. It's from the Vice-President's Office. It was part of the Energy Project that was the focus of Dick Cheney's attention before the 9/11 strikes.
"And the document has nothing to do with post-war Iraq. It was part of a study of global oil supplies. Judicial Watch obtained it in a law suit and posted it, along with related documents, on its website at: http://www.judicialwatch.org/071703.c_.shtml Indeed, when this story first broke yesterday, the Drudge Report had the Judicial Watch document linked (no one at CBS News saw that, so they could correct the error, when the show aired?)"
What Mylroie says about the "Foreign Suitors" document is correct. The Judicial Watch link still works as of this morning, and as you can easily see, the document, dated March 5, 2001, has nothing to do with post-war planning. It is merely a list of existing and proposed "Iraqi Oil & Gas Projects" as of that date. And it includes projects in Iraq by countries that obviously would not have been part of any "post-war" plans of the Bush administration, such as, for example, Vietnam.
So Suskind (and apparently O'Neill) misrepresented this document, which appears to be a significant part of their case, given that Suskind displayed in on 60 Minutes. It would not be possible for anyone operating in good faith to represent the document as Suskind did.
But the truth is even worse than Mylroie pointed out in her email. The CBS promo linked to above says that this document "includes a map of potential areas for exploration. 'It talks about contractors around the world from, you know, 30-40 countries. And which ones have what intentions,' says Suskind. 'On oil in Iraq.'"
True enough; there is a "map of potential areas for exploration" in Iraq here. But what Paul O'Neill and Ron Suskind don't tell you is that the very same set of documents that contain the Iraq map and the list of Iraqi oil projects contain the same maps and similar lists of projects for the United Arab Emirates and Saudi Arabia! When documents are produced in litigation (in this case, the Judicial Watch lawsuit relating to Cheney's energy task force), they are numbered sequentially. The two-page "Iraqi Oil Suitors" document that Suskind breathlessly touts is numbered DOC044-0006 through DOC044-0007. The Iraq oil map comes right before the list of Iraqi projects; it is numbered DOC044-0005.
DOC044-0001 is a map of oil fields in the United Arab Emirates. DOC044-0002 is a list of oil and gas development projects then going on in the United Arab Emirates. DOC044-0003 is a map of oil fields in Saudi Arabia. DOC044-0004 is a list of oil and gas projects in Saudi Arabia. So the "smoking gun" documents that Suskind and O'Neill claim prove that the administration was planning to invade Iraq in March 2001 are part of a package that includes identical documents relating to the United Arab Emirates and Saudi Arabia. Does Paul O'Neill claim the administration was planning on invading them, too? Or, as Mylroie says, was this merely part of the administration's analysis of sources of energy in the 21st century?
There is only one possible conclusion: Paul O'Neill and Ron Suskind are attempting to perpetrate a massive hoax on the American people.
UPDATE: Paul Krugman is ecstatic about O'Neill's allegations, and views them as vindicating his three years of over-the-top Bush hatred. Needless to say, Krugman has nothing to say about O'Neill's and Suskind's fraudulent misrepresentation of the documents on which their claims are based. The battle is joined: the New York Times propagates lies, the blogosphere points out undeniable facts that are inconvenient for the left. Spread the word."
Onde está a objectividade?!
domingo, janeiro 11, 2004
O copista errou forte e feio.
No post que antecede, foi indicado como estando presente no debate da TSF o jornalista António José Teixeira. Não é verdade! Quem lá esteve e pode ser ouvido ainda no respectivo site, foi José Leite Pereira, director editorial do JN; Estrela Serrano, provedora do leitor do D.N.; João Marcelino, director do Correio da Manhã e José Rodrigues dos Santos, director de informação da RTP.
COmo o copista tem poucos mas presumivelmente bem informados leitores, as desculpas são de rigor. E desculpas ao visado também se impõem, porque o mesmo nunca disse o que lhe é imputado.
Assim o copista penitente, vai corrigir o post que antecede e penar durante uns dias a negligência grave de não confirmar a fonte das notícias.
Segredos de polichinelo.
Na TSF, hoje ao meio dia, Carlos Pinto Coelho animou um debate muito interessante em que participaram jornalistas: José Leite Pereira, pelo JN; José Rodrigues dos Santos, pelo jornal da RTP; o director do Correio da Manhã; a provedora do leitor do DN e um outro cujo nome escapou e que permanece anónimo para o copista.
O tema foi o segredo de justiça e o pretexto, uma carta anónima junta no processo Casa Pia e que foi assunto de notícia em primeira mão, pelo Jornal de Notícias, a 2 de Janeiro do ano corrente.
Único argumento, do responsável pelo JN, para justificar a divulgação da existência da tal carta: denunciar o procedimento dos magistrados do Ministério Público responsáveis pelo processo! O jornalista José Leite Pereiraafirma que foi esse o único objectivo da notícia, e assim também o diz a direcção do jornal que emitiu declaração editorial,! E agora aquele jornalista repetiu-o no programa, com toda a calma que um argumento desse peso permite.
Em apoio da decisão de publicação, apontam a opinião de juristas que ouviram e que afirmaram ser a inclusão de tal carta no processo, uma ilegalidade flagrante.
A notícia a que a carta se referia, foi publicada no JN de 2.1.04. Tal notícia, inequivocamente saída do processo, teve como fonte uma entidade anónima e que toda a gente, mesmo a mais distraída destas coisas, aponta como tendo sido alguém ligado à defesa dos arguidos. E sendo assim, foi alguém que teve acesso aos autos, viu lá a carta e a respectiva denúncia nela contida e soprou a informação ao jornalista do JN.
Vamos supor que o jornalista do JN é isento e que só pretende a notícia para divulgação, atendendo ao seu critério sobre o que é relevante ou não publicar.
Desde logo, verifica-se aqui uma divergência de tomo, entre profissionais do ramo: o também jornalista José Rodrigues dos Santos disse no programa que a notícia seria susceptível de publicação, mas adiantou que faz triagem de notícias! Porquê?! Pela simples razão de que a divulgação do conteúdo da carta anónima e particularmente do assunto referido ao presidente da República ( o mais alto magistrado da Nação) não tinha qualquer relevância! Tal como foi a conclusão do titular do processo, o que, aliás, se veio a saber depois.
Então o profissional do JN não pensou nisso?! Admitindo que consultou juristas, como afirma e que estes lhe disseram que a inclusão de tal carta no processo era uma patente ilegalidade, nunca lhe terá passado pela cabeça, naquelas “small hours” antes do “imprimatur” que a divulgação da notícia iria provocar mais confusão do que esclarecimento; mais perturbação do que a serenidade pedida pelo presidente pouco tempo antes e principalmente que seria um meio pouco adequado de denunciar pretensas ilegalidades do MºPº no processo? E mesmo neste caso, onde buscar a legitimidade prática para essa denúncia?! Aos advogados de defesa dos arguidos, certamente. Nunca à objectividade jornalística ou ao interesse público
Sobre esta “ilegalidade”, seria fácil de perceber e o jornalista do JN tinha a estrita obrigação de confirmar isso mesmo: que a questão não era pacífica entre os pretensos especialistas de direito penal ouvidos. Contudo, se o jornalista do JN tivesse o cuidado de conferir a pretensa ilegalidade com qualquer profissional do MP habituado a instruir Inquéritos e não qualquer especialista de gabintete de consultadoria jurídica, como parece ter sido o caso, ficaria logo a saber a distinção entre uma denúncia anónima e a inclusão num processo de um documento anónimo.E ficaria logo esclarecido de outros pormenores legais que o afastariam da cacha em mente. E isso, - é legítimo supor..., -ele não queria, de certeza.
Vamos por isso fazer justiça è inteligência do jornalista que remete inevitavelmente para a sua má fé, neste processo todo e vamos principalmente analisar a atitude do leitor médio, ao ler a notícia:
O que pensa o passante, diante da capa do JN de 2.1.04, um dos poucos jornais diários publicados nesse dia?
Pensará aquilo que o jornalista José Leite Pereirae a direcção do JN confessadamente quiseram que pensasse, ou seja, “Olha o MP a fazer asneiras...”
Ou pensará: “ O quê?! O presidente da República também está metido nisto?!”
Tendo em conta o contexto do processo e a estúpida declaração da Catalina sobre abalos sísmicos, é fácil de prever qual a reacção do leitor anónimo. E isso , o jornalista José Leite Pereiratem a obrigação de saber- porque o jornalista José Rodrigues dos Santos também o sabe e este teria o bom senso de não publicar infâmias, antes de confirmar minimamente o assunto.
Aliás, o JN já tem antecedentes nestas andanças e a saga continua: ainda hoje, pela pena de um duo, escrevem asneiras jurídicas e que pretendem lançar o descrédito na acusação e por extensão, no processo. Neste caso, sobre o direito de queixa.
Eppure...bastar-lhes-ia ler o artigo 178º nº 2 do Código Penal que diz: " ...quando a vítima for menor de 12 anos, pode o Ministério Público dar início ao processo se especiais razões de interesse público o impuserem".
Por outro lado, como já se escreveu num post abaixo, todos os crimes que estão em causa no processo da Casa Pia, dependem de queixa, o que significa que os titulares podem livremente dispor desse direito. Daí que não seja de admirar que alguns tenham sido ouvidos, agora: poderiam desisitr, se quisessem. Aparentemente não o quiseram. Et pour cause...
Resta saber se há algum objectivo inconfessado neste procedimento jornalístico reiterado ou é mais um caso de patente e eloquente icompetência. A juntar ao caso perdido do Independente que há muitos meses faz jornalismo militante contra o Ministério Público. A razão, aparentemente, também é fácil de perceber e nada tem a ver com o interesse público ou jornalístico de informar. Tem actualmente, a função específica de desinformar e enxundiar a opinião pública que lê primeiras páginas nas bancas.
O copista tem pena dos jornalistas que aí trabalham e se esforçam por dar o melhor do seu trabalho.
Contudo e para terminar, o programa de rádio também focou um aspecto do problema que é importante: criticou-se abertamente a Procuradoria Geral da República por não ter feito uma conferência de imprensa "moderna", na expressão feliz de João Marcelino, esclarecendo algumas coisa que poderiam ter ficado bem esclarecidas e evitariam estas manobras predadoras de abutres da comunicação social.
O copista considera que infelizmente assiste toda a razão a quem assim pensa: a procuradoria geral da República precisa efectivamente de uma atitude diferente, perante fenómenos como este, intensamente mediatizados.
Não pode nem deve fechar-se na torre de marfim e julgar que lá por se ter cumprido a estrita legalidade, o povo irá perceber e dar razão a quem a tem, a seu tempo.
Não percebe, se não for explicado, ó Sara!
A explicação em que ser dada em termos simples! Não em comunicados incrivelmente densos e impenetráveis mesmo para jornalistas de meia tijela.
Aprendam com os americanos, pelo menos isso! Não tenham medo de fazer figura de explicadores de escola básica. A maior parte dos jornalistas não se afasta muito do padrão...e ignorar o fenómeno é permitir a desinformação. E a injustiça!
sábado, janeiro 10, 2004
O PGR não é descartável.
(Acha o Mangadalpaca)
O Mangadalpaca anda deveras confuso e perplexo com tantos e tão desvairados comentários, notícias e análises que dão como «natural», «banal», «necessário», «insustentável», «inevitável» a demissão do Procurador-Geral da República, a propósito do que tem sido a condução do «Processo Casa Pia» e as suas implicações sócio-políticas. Tal ocorreria por acordo do poder político: leia-se, por concordância entre o Governo e o Presidente da República (dado já como consumado, após «os partidos de direita» terem decidido deixar cair o PGR, segundo, pelo menos, um semanário de 09/01/04 e de outro, o Expresso de 10/01/04, o PGR estaria «a prazo»).
A concretizar-se tal cenário – facto sem precedentes e com as mais graves repercussões no tecido e contexto político-judiciário -, duas conclusões se poderão tirar: 1) o poder político enganou-se na pessoa que escolheu para a função, concluindo ter-se tornado incómodo por não evitar os salpicos dos desenvolvimentos do «Processo Casa Pia» para alguns membros da classe política, e 2) o poder político tem uma concepção desfocada e profundamente anti-democrática da natureza, estrutura e conformação do equilíbrio e paridade dos poderes do Estado.
Começando pela primeira. Será triste constatar que, afinal, a pessoa designada por acordo entre o Governo (então PS, e que foi confirmada pelo actual, PSD-CDS/PP) e o então (e ainda) PR, foi a escolha errada. Será reconhecer um logro, uma fraude, um embuste, que, de resto, não será explicável, tratando-se, como é o caso, de uma das mais elevadas funções institucionais de um Estado de Direito. Mas, mais grave, será verificar a razão pela qual se chegaria a esse ponto: a afronta, num dado processo, a determinadas pessoas com repercussão e notabilidade social e política. Afinal, no dito processo – com erros ou equívocos ou sem eles –, nada de substancialmente extraordinário se passa, para além da efectiva indiciação por certos crimes, de pessoas com estatuto sócio-profissional relevante. De resto, apenas duas dessas pessoas eram notáveis, antes da instauração do processo. Todos os demais nomes envolvidos, de forma infundada, vil e torpe, apenas foram alvo de curiosidade ávida e boçal por motivos de um canibalismo jornalístico de obediência a estratégias editoriais e de share de audiências. Deixarmo-nos influenciar por isso, teria consequências gravíssimas. Se o poder político embarcar nessa corrente, poderá encontrar dissabores na próxima esquina.
O processo deve ter o palco – o único palco – , em que pode e deve ser decidido: os Tribunais. Só os Tribunais poderão apreciar as consequências jurídicas dos erros, absolver inocentes, condenar culpados, porventura declarar nulo o processo, enfim, decidir sobre quaisquer questões que a acusação e a defesa lhes apresentem.
Quanto à segunda inferência; mesmo que seja explícita nos termos dos artigos 220.º, n.º 3 e 133.º, al. m) da Constituição, a possibilidade de exoneração do PGR, tal eventualidade deve colocar-se por razões de ordem excepcional, como a da insanidade ou incapacidade da pessoa que desempenhe o cargo. O PGR deve gozar de um estatuto de inamovibilidade (idêntica à do Presidente do STJ) durante o seu mandato, sob pena de ser refém de quem o nomeou. A fonte de legitimação política do PGR não deve funcionar como critério de dependência do PGR, face a quem o nomeia.
Simplesmente, ainda que assim se não entendesse– e se admitisse a viabilidade de exoneração do PGR por razões de mera discordância quanto ao desempenho do cargo e devido a certas implicações sócio-políticas –, a situação vertente nada tem de semelhante com essa hipótese. Não se trataria de uma discordância estrutural sobre a condução da política criminal, no seu todo, por exemplo, ou devido às prioridades assumidas na gestão e funcionamento do Ministério Público. O que ficava, era o estigma de o PGR ter sido derrubado por um processo incómodo para certos políticos, sem sombra de dúvida.
Pensar-se – como o fazem certos jornalistas e comentadores (alguns mesmo com responsabilidades e créditos firmados, que aconselhariam a que não fizessem certas «figuras») – que o PGR é descartável, como qualquer gestor de empresa pública é erro demasiado severo para não merecer uma censura.
Por outro lado, o poder político evidenciaria uma visão de subalternização do poder judicial. A pretexto de lhe não reconhecer fonte de legitimação – problema que nunca verdadeiramente foi afrontado pelo poder político, porventura por inconfessáveis e convenientes motivos (como se vê agora) – arrogar-se-ia a prerrogativa de exonerar o PGR, como forma de «pôr nos eixos» o Ministério Público. Daí à interferência na definição do estatuto de autonomia desta magistratura e à alteração dos regimes de investigação de certos crimes graves e de grande danosidade social seria um passo. Curto. Será isso, o que subliminarmente, alguns pretenderão?
Se forem por aí, então sim, poderá dizer-se que começou a derrocada do regime.
É tempo de pensar em algo diferente
P. S.:
O Expresso, na edição de 10/01/04 diz que o PGR está a prazo, devendo o PR exigir a sua demissão no fim do «Processo Casa Pia». Notícia já desmentida pela Presidência da República. O clima adensa-se. O mesmo é dizer, o PGR pode terminar tranquilamente o seu mandato....
@mangadalpaca
(Acha o Mangadalpaca)
O Mangadalpaca anda deveras confuso e perplexo com tantos e tão desvairados comentários, notícias e análises que dão como «natural», «banal», «necessário», «insustentável», «inevitável» a demissão do Procurador-Geral da República, a propósito do que tem sido a condução do «Processo Casa Pia» e as suas implicações sócio-políticas. Tal ocorreria por acordo do poder político: leia-se, por concordância entre o Governo e o Presidente da República (dado já como consumado, após «os partidos de direita» terem decidido deixar cair o PGR, segundo, pelo menos, um semanário de 09/01/04 e de outro, o Expresso de 10/01/04, o PGR estaria «a prazo»).
A concretizar-se tal cenário – facto sem precedentes e com as mais graves repercussões no tecido e contexto político-judiciário -, duas conclusões se poderão tirar: 1) o poder político enganou-se na pessoa que escolheu para a função, concluindo ter-se tornado incómodo por não evitar os salpicos dos desenvolvimentos do «Processo Casa Pia» para alguns membros da classe política, e 2) o poder político tem uma concepção desfocada e profundamente anti-democrática da natureza, estrutura e conformação do equilíbrio e paridade dos poderes do Estado.
Começando pela primeira. Será triste constatar que, afinal, a pessoa designada por acordo entre o Governo (então PS, e que foi confirmada pelo actual, PSD-CDS/PP) e o então (e ainda) PR, foi a escolha errada. Será reconhecer um logro, uma fraude, um embuste, que, de resto, não será explicável, tratando-se, como é o caso, de uma das mais elevadas funções institucionais de um Estado de Direito. Mas, mais grave, será verificar a razão pela qual se chegaria a esse ponto: a afronta, num dado processo, a determinadas pessoas com repercussão e notabilidade social e política. Afinal, no dito processo – com erros ou equívocos ou sem eles –, nada de substancialmente extraordinário se passa, para além da efectiva indiciação por certos crimes, de pessoas com estatuto sócio-profissional relevante. De resto, apenas duas dessas pessoas eram notáveis, antes da instauração do processo. Todos os demais nomes envolvidos, de forma infundada, vil e torpe, apenas foram alvo de curiosidade ávida e boçal por motivos de um canibalismo jornalístico de obediência a estratégias editoriais e de share de audiências. Deixarmo-nos influenciar por isso, teria consequências gravíssimas. Se o poder político embarcar nessa corrente, poderá encontrar dissabores na próxima esquina.
O processo deve ter o palco – o único palco – , em que pode e deve ser decidido: os Tribunais. Só os Tribunais poderão apreciar as consequências jurídicas dos erros, absolver inocentes, condenar culpados, porventura declarar nulo o processo, enfim, decidir sobre quaisquer questões que a acusação e a defesa lhes apresentem.
Quanto à segunda inferência; mesmo que seja explícita nos termos dos artigos 220.º, n.º 3 e 133.º, al. m) da Constituição, a possibilidade de exoneração do PGR, tal eventualidade deve colocar-se por razões de ordem excepcional, como a da insanidade ou incapacidade da pessoa que desempenhe o cargo. O PGR deve gozar de um estatuto de inamovibilidade (idêntica à do Presidente do STJ) durante o seu mandato, sob pena de ser refém de quem o nomeou. A fonte de legitimação política do PGR não deve funcionar como critério de dependência do PGR, face a quem o nomeia.
Simplesmente, ainda que assim se não entendesse– e se admitisse a viabilidade de exoneração do PGR por razões de mera discordância quanto ao desempenho do cargo e devido a certas implicações sócio-políticas –, a situação vertente nada tem de semelhante com essa hipótese. Não se trataria de uma discordância estrutural sobre a condução da política criminal, no seu todo, por exemplo, ou devido às prioridades assumidas na gestão e funcionamento do Ministério Público. O que ficava, era o estigma de o PGR ter sido derrubado por um processo incómodo para certos políticos, sem sombra de dúvida.
Pensar-se – como o fazem certos jornalistas e comentadores (alguns mesmo com responsabilidades e créditos firmados, que aconselhariam a que não fizessem certas «figuras») – que o PGR é descartável, como qualquer gestor de empresa pública é erro demasiado severo para não merecer uma censura.
Por outro lado, o poder político evidenciaria uma visão de subalternização do poder judicial. A pretexto de lhe não reconhecer fonte de legitimação – problema que nunca verdadeiramente foi afrontado pelo poder político, porventura por inconfessáveis e convenientes motivos (como se vê agora) – arrogar-se-ia a prerrogativa de exonerar o PGR, como forma de «pôr nos eixos» o Ministério Público. Daí à interferência na definição do estatuto de autonomia desta magistratura e à alteração dos regimes de investigação de certos crimes graves e de grande danosidade social seria um passo. Curto. Será isso, o que subliminarmente, alguns pretenderão?
Se forem por aí, então sim, poderá dizer-se que começou a derrocada do regime.
É tempo de pensar em algo diferente
P. S.:
O Expresso, na edição de 10/01/04 diz que o PGR está a prazo, devendo o PR exigir a sua demissão no fim do «Processo Casa Pia». Notícia já desmentida pela Presidência da República. O clima adensa-se. O mesmo é dizer, o PGR pode terminar tranquilamente o seu mandato....
@mangadalpaca
sábado, janeiro 03, 2004
Delenda Cartago!
A recente polémica sobre as cartas anónimas juntas ao processo da Casa Pia, e as enormidades que a esse propósito têm sido vociferadas por quem deveria ter mais tento e senso, como são os casos notórios do bastonário da Ordem dos Advogados e até alguns professores de Direito ( Costa Andrade e Vital Moreira, ambos catedráticos da Fac. Direito de Coimbra) suscitam alguma reflexão recapituladora dos princípios fudadores e da legislação penal em vigor.
O que é e para que serve um Inquérito penal?
Seguindo de perto as lições de Adriano Souto Moura( sim! Esse mesmo!), no CEJ, em meados dos anos oitenta, o processo penal serve essencialmente para punir todos os criminosos, mas só os criminosos. Para isso, o que se faz, é:
-reconstituir um facto.
-indagar a culpa- artigos 16º nº 2; 280;281 e 182, todos do Código de Processo Penal.
-tomarem-se providências cautelares, por quem tiver o dever de o fazer, nomedamente as polícias- 248 e seguintes do C.P.P.
-fazer-se um eventual pedido de indemnização cível.
Quem faz o Inquérito?
-A direcção pertence exclusivamente ao MºPº, assistido pelos órgãos de polícia criminal- artº 263º do C.P.P.
Ou seja, mais ninguém, em Portugal, pode organizar e dirigir um Inquérito criminal.Mesmo que seja outra entidade a tomar conhecimento do facto criminoso, tem a obrigação de transmitir ao MºPº, nomais curto espaço de tempo, esse conhecimento. É o que se retira do artigo 245º do C.P.P.
Isso tem uma importância fundamental, porque é num Inquérito que se investigam os crimes e vigora em Portugal o princípio da legalidade que segundo o artº 262º nº2, C.P.P. “ a notícia de um crime dá sempre lugar à abertura de Inquérito”, ressalvando-se algumas excepções que têm a ver com a actuação cautelar das polícias, ainda antes do Inquérito estar formalmente organizado e classificado, mas que obrigam estas entidades a dar conta do que fizeram, em relatório ( 253º C.P.P.).
Não há oportunidade legalmente consagrada para a actuação do MºPº.
A única afloração desta oportunidade de actuação do MºPº, ou seja, o de prosseguir ou não com a acção penal, vê-se precisamente num instituto que tem sido alvo do espanto generalizado, compreensível também pelo generalizado desconhecimento destas matérias: o da suspensão provisória do processo( artº 281 C.P.P.) que permite a “negociação” do MºPº com ofendido e arguido, em relação a delitos corriqueiros.
Perante este quadro, que fazer quando aparece nos serviços da polícia ou do MºPº uma denúncia anónima?
Deita-se fora, só porque não vem assinada? E com que critério de legalidade?! Poderá legitmimar-se tal comportamentop apenas com base no do 164 nº 2 do C.P.P.?! Vejamos:
Da prova documental
Artigo 164.
Admissibilidade
1 - É admissível prova por documento, entendendo-se por tal a declaração, sinal ou notação corporizada em escrito ou qualquer outro meio técnico, nos termos da lei penal.
2 - A junção da prova documental é feita oficiosamente ou a requerimento, não podendo juntar-se documento que contiver declaração anónima, salvo se for, ele mesmo, objecto ou elemento do crime.
Basta ler a epígrafe do artigo para perceber logo que se refere à “prova documental” e que tal nunca pode contender com um auto de denúncia. Senão vejamos:
Como começa um Inquérito?
Vejamos o que diz a lei processual penal:
CAPÍTULO I
Da notícia do crime
Artigo 241.
Aquisição da notícia do crime
O Ministério Público adquire notícia do crime por conhecimento próprio, por intermédio dos órgãos de polícia criminal ou mediante denúncia, nos termos dos artigos seguintes.
Agora, atente-se neste artigo do C.P.P.:
Artigo 247.
Registo e certificado da denúncia
1 - O Ministério Público procede ou manda proceder ao registo de todas as denúncias que lhe forem transmitidas.
Assim, o MºPº adquire notícia do crime por conhecimento próprio, podendo, seguindo ainda o teor daquelas lições de Souto Moura, lavrar auto de ocorrência quanto a:
-rumores públicos.
-delacção.
-constatação de flagrante pelo próprio MºPº, caso em que deverá mesmo escreveu auto de notícia.
É por isto que uma notícia de jornal ou um comunicado anónimo ou uma carta anónima pode efectivamente ser registada como auto de ocorrência e iniciar um Inquérito crime, dentro da mais perfeita legalidade. E tem sido assim desde 1.1.1988. Isto não é novidade recente. A maior parte dos crimes de “colarinho branco” , ou seja e dito de forma mais prosaica, de corrupção , têm sido investigados em Inquéritos desta forma e com este início: a denúncia anónima!
O que pode e tem originado confusão é o entendimento que uma carta anónima denunciadora de comportamentos criminosos é um documento de prova, nos termos do artº 164 do C.P.P. que diz assim:
CAPÍTULO VII
Da prova documental
Artigo 164.
Admissibilidade
1 - É admissível prova por documento, entendendo-se por tal a declaração, sinal ou notação corporizada em escrito ou qualquer outro meio técnico, nos termos da lei penal.
2 - A junção da prova documental é feita oficiosamente ou a requerimento, não podendo juntar-se documento que contiver declaração anónima, salvo se for, ele mesmo, objecto ou elemento do crime.
Tomando aqui uma anotação de Costa Pimenta no seu Código de Processo Penal anotado, de 1988( logo quando saiu o diploma), o mesmo considera que podem ser juntos ao processo os documentos que contenham declaração anónima e esse documento seja elemento do crime que está em causa. Por exemplo, “a carta ameaçadora, o artigo difamatório, ou a notação técnica falsificada”
Assim, tudo está em saber se a(s) carta(s) anónima(s) juntas aos autos do processo da Casa Pia configuram uma denúncia, anónima é certo, mas legítima e legitimadora da acção penal ou se configuram um documento de prova de um facto.
A impressão que fica é que não pode tratar-se de documento para prova de coisa nenhuma e sim a tal denúncia de contorno obscuro e que foi devidamente apreciada pelo MºPº, dentro dos poderes que lhe são próprios.
Sendo assim, como parece ser, não se compreende a indignação dos escribas e de alguns professores catedráticos, como é o caso do professor Costa Andrade, uma das maiores autoridades em processo penal em Portugal e por isso ainda mais lamentável a sua atitude se torna.
Por outro lado, é público que este professor deu parecer escrito no processo , presumivelmente pago, a contrariar uma pretensão do MºPº e/ou do Juiz de Instrução e mesmo assim não se coibe de comentar depreciativa e publicamente as decisões tomadas em processo em segredo de justiça que ele próprio, porque interveniente, está obrigado a respeitar. Por isso, o lamento ainda é maior.
Aos poucos quem teria obrigação de fazer a diferença pela positiva, vai acicatando e atirando achas para uma fogueira cuja dimensão se começa a ver: Delenda Cartago! Era com esta frase que Catão, todos os dias pela manhã, convidava o Senado Romano a destruir Cartago. Ponha-se PGR no lugar de Cartago e percebe-se a intenção. Mesmo sem processo.E sem cabalas à vista.