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domingo, fevereiro 08, 2004
No Pasa Nada!
O problema do combate à corrupção política em Portugal não é simplesmente legislativo, mas de convicção...e de ética!”- Luís Sousa, investigador do Instituto Universitário Europeu de Florença, in Público, 7.10.2001
Leis para combater a corrupção, não faltam! Desde a Lei 34/87 de 16 .7, destinada a enquadrar a responsabilidade dos titulares de cargos políticos, até è legislação de financimanto dos partidos, de 1993 e da Lei 56/98 de 18 de Agosto com as alterações da Lei 23/2000 de 23 de Agosto, passando pelo catálogo do Código Penal, o cardápio é mais do que suficiente para contentar qualquer gosto republicano e laico ou conservador, estendendo-se até às fímbrias passadistas, de leste a oeste.
Apesar disso, os resultados foram sempre...muito pontuais! O exercício venatório particularmente aficionado por antigos directores da PJ, começou na obra faraónica do Centro de Belém, continuou com a desbunda do Fundo Social Europeu, passou pela piolheira da Expo98 e trespassou a rota da JAE. Foi sempre um exercício selectivo, de batida programada e controlada e com o furão amestrado por carta anónima. Como a época era de caça a pato bravo, voador de baixa altitude, o furão ficava a ver navios e os resultados encalhados nas disputas com o chefe da batida. Este, saído da Escola Politécnica, perdido no canavial mas fiado nos binóculos baços e no apito de cana rachada, dava ordens aos caçadores, para escutarem o grasnar e serem lestos no apontar. Porém, fiados na tradição, os perdigueiros seguiam o furão, confundindo apitos com patos e tocas com moitas, apanhando às vezes um marreco sem asa e ficando sempre com as penas na mão.
Nesta actividade venatória tem-se mantido a tradição: o chefe da batida fica em casa, na rua da Escola e à espera da presa; os caçadores batidos, da rua do Freire, vão com o furão. Não fazem equipa, preferindo discussões. Por isso mesmo, apanham pardais e rolas, deixando os faisões.
Esta ave vistosa entoca-se em gabinetes de empresas de obras públicas e às vezes, em sedes partidárias, Apreciam particularmente os edifícios camarários e reproduzem-se aí como cogumelos na humidade. Este fenómeno só é novidade para quem anda a dormir na forma e há casos desses, até nos corredores universitários.
As leis que proíbem o financiamento partidário por determinadas formas, são explícitas e punem com prisão os infractores( em 2005) . Foram feitas pelas potenciais vítimas em nome do povo que os elegeu, para que este os elegesse outra vez. Esse catálogo de crimes, relacionado com o financiamento partidário e a utilização de dinheiros públicos, estão muito bem definidos e têm um âmbito de proibições que é muito bem conhecidos pelos visados, porque foram eles próprios quem os delineou.
Porém, quando algum suspeito dessas más práticas, é apanhado, cai logo o Carmo e a Trindade, mesmo que o caso se passe na Guarda, em Viseu, Marinha Grande, Matosinhos, Felgueiras ou em Lisboa!
Para começar, estão sempre inocentes! E a seguir, vem a imputação cabalística: manobra obscura de inimigos sem rosto, mas de objectivos claros! É sempre isto! Claro que o povo ignaro, apreciador de futebol à manada e telenovela à jantarada, não vai nisto. Mas o povo ignaro só manda de vez em quando e em conjunto...e eles sabem que a memória de quem choram a morte de alguém, num campo de futebol, num Domingo e no seguinte, no mesmo sítio, a envergonha, é necessariamente uma memória curta e se conta por junto.
Assim, aparece agora um político do PS- Abílio Curto, a declarar ao Expresso( 7.2.2004) a sua inocência depois da condenação a 5 anos de cadeia, transitada em julgado, portanto já insusceptível de presunção. Aponta o dedo ao partido: “ Todo o dinheiro foi para o PS”.
Vital Moreira, no seu blog, doeu-se e desmontou brilhantemente a acusação: Não! Para o partido não foi! Se até o próprio denunciante diz que algum dinheiro foi para a Associação Desportiva da Guarda! Como poderá o ingrato dizer que foi todo para o partido? E para a eleição autárquica lá da terra! Que é que o partido tem a ver com isso?! Pergunta o lente.
Custa a ver pessoas inteligentes e sérias a argumentar desta forma e a tentar fazer os outros passar por néscios, para não dizer parvos que é expressão que não engana a massa ignara, do futebol e telenovela. A única justificação para mais esta faena só pode estar numa obnubilação momentânea em tons de rosa. Estou a temer uma futura argumentação em favor da vítima de outra cabala gigante e obscura- porque ainda indefinida no contorno: Fátima Felgueiras. Ou até do Isaltino de Oeiras. Quanto a este, toda a gente compreende a miserável perseguição que lhe andam a mover, a ele e a um seu sobrinho taxista e milionário, ás vezes.
Como temo seriamente, neste caso, mais uma história de patos e furões, associada às tradicionais discussões com pareceres jurídicos a mostrar alçapões, não ficaria admirado. COmo o jackpot estará na Suíça temo também que o destino se assemelhe ao dos Airbus de 1995 e ao compadre Santos Martins. Quanto a este, porém, há uma certidão de limpeza passada pela PGR de então. COmo se sabe, é difícil viajar entre a Suiça e Portugal e as cartas rogatórias costumam viajar de caracol.
Ainda falta entrar em cena, a este propósito, o inefável maestro de corso, da Madeira. Em 15 de Fevereiro de 2000 escrevia no O Diabo, um artigo sobre as ignominiosas perseguições que o sistema judicial dos respectivos países fizeram a essas vítimas que foram Bettino Craxi e Helmutt Khol! Laudava o rufador de corso, nesse escrito, uma decisão do Parlamento italiano que impunha inquérito raso aos magistrados da “mani pulite” italiana. Escrevia o corsário: “É que se trata de algo positivamente novo na Europa democrática. Depois de um período de covardia e de abdicação nos regimes políticos europeus, onde grandes capitalistas , jornalistas e agentes da justiça se vinham tornando nos principais poderes do Estado, por cima e até através das cedências dos eleitores pela soberania popular, finalmente um parlamento repõe o primado da autoridade dos eleitos e das instituições representativas.
Com efeito, foi precisa a tragédia de Bettino Craxi e mais esta descarada perseguição a Helmut Khol, para que finalmente alguém acordasse. “ E escreve mesmo sobre “ face ao positivismo idiota de leis de finaciamento dos partidos políticos, qual a opção?”
Face a esta análise jurídica e sumária da natureza positivamente idiota da lei de financiamento partidário e das incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, pouco lhe interessava, ao corsário da palavra desbocada, que o Craxi tivesse sido condenado, várias vezes, a prisão perpétua, sendo-o à revelia porque em devido tempo se pirou para a Tunísia; pouco interessava ao corsário desbocado que Helmutt Khol estivesse em vias de ser condenado, como o foi, a pena que no caso particular foi de multa.
Coincidindo no tempo e no estilo, nesta catilinária contra os poderes judiciais, sintonizou nessa altura e no mesmo registo o grande Mário Soares deste Portugal pequenino. Escreveu artigo na Focus 13/2000 que já foi em tempos assinalado nesta porta, a defender a intocabilidade da grandeza do Khol. Os alemães não devem ter ouvido.
Porém, aqui neste cantinho, parece que se dá ouvidos a estas pessoas e a estas ideias e se entendem as leis do financiamento dos partidos como “idiotas” , no solene manifesto do corsário da ilha
Parece, efectivamente que os poderes de investigação criminal da PJ e do Ministério Público hesitam e se assustam com esta confusão deliberadamente lançada por gente de primeira que olha para os outros do alto do seu poder e se considera imune às próprias leis que permitiram e até aprovaram- para empater le bourgeois, segundo tudo indica e a creditar naqueles propósitos.
Parece também que em Portugal, ninguém que esteja minimamente bem informado- e hesito em incluir neste grupo Vital Moreira – terá a mais leve dúvida de que os partidos políticos vivem numa constante mentira ao longo dos anos: mentem nas contas que apresentam ao eleitorado perante quem têm obrigações especias; mente-se ao tribunal Constitucional para esconder dinheiros de proveniência descaradamente ilegal e criminosa e mente-se por consequência ao povo, em nome de quem tudo se faz.
E se é assim, como parece ser, por que razão insondável, as pessoas não se apoquentam e fazem como as avestruzes quando pressentem perigo?
Talvez seja tempo de as pessoas, em suficiente massa crítica, encararem o problema de frente e assumirem que o cancro que mina a sociedade democrática em que vivemos, não se compadece com complacências e tergiversações de tourada. Porque as farpas que fazem sangue no tecido social e o gozo na arena tem sempre uma única vítima: o povo, nele se incluindo a massa ignara que cega com o futebol e sonha com a telenovela!
Há suspeitas generalizadas e solidificadas de que muito dinheiro das obras públicas, desde há dezenas de anos, tem servido para alimentar máquinas partidárias em esforço eleitoral, principalmente em hora de ponta. Tem havido denúncias concretas e definidas ao longo dos anos: desvio astronómico de verbas do Fundo Social Europeu que encheram bolsos a muita gente e eventualmente estarão na origem do boom de capital circulante e algum fixo que medrou desde finais dos oitenta. Verbas importantes dos grandes empreendimentos públicos na construção de estradas serviram para pagar campanhas eleitorais. Há uns anos, Macau esteve no epicentro de dois episódios turvos. Os socialistas Rosado Correia e António Vitorino ( sim! Esse mesmo) e uma história de mala malpartida e o caso do fax para Melancia que ainda hoje serve de mote para se comentar os sistema de justiça que temos. Foram dois casos conhecidos, mas quantos outros passaram da penumbra dos gabinetes, para os cofres seguros do conforto doméstico, com toda a impunidade?
Essa impunidade de facto que não de direito, permite as indignações de quem é apanhado, por azelhice, por azar ou pelo despeito de parceiras traídas ou invejas recalcadas: Os casos dos Belezas; dos Curtos; dos Judas; dos Isaltinos; dos Mirandas; dos Melancias; das Felgueiras e de outros, escondem a verdade oculta de outros casos com o mesmo contorno e com a mesma base de podridão: o aproveitamento pessoal de dinheiros que não lhes pertencem, misturado com as doações ao partido, também ilegais e ocultas. Nessa mistela espúria entre pertenças ilegítimas, aparece a defesa dos visados, sempre de indignação e de protesto de inocência: acontece no caso de Abílio Curto como no de Fátima Felgueiras. E bebem todos na mesma fonte daquela apontada pelo corsário da ilha: a legalidade e a legitimidade, como o próprio teve a distinta lata de intitular o escrito! Todos eles acham legítimo apoderarem-se de dinheiros para o partido, mesmo à revelia das regras que instituiram e contra a lei que o considera como crime. É uma suprema hipocrisia, que pode compreender-se e comparar-se a outra: a da violação do segredo de justiça pelos jornalistas. Todos acham que é crime, mas não assumem a consequência lógica de tal facto, porque seria socialmente insuportável.
A melhor explicação para se ultrapassar o paradoxo deu-a o próprio Mario Soares que sobre o assunto deve perceber o suficiente para ensinar: no caso de Kohl ele entendia que era uma ignomínia o que lhe estavam a fazer, devido á grandeza natural do homem e do estadista. Só por esse facto, estava fora da alçada da leui! Contudo, confrontado com a incoerência, adiantou candidamente: “ Não digo que não se assinalasse o facto uma vez que surgiu" .
Pois...já que se falou no assunto, haveria que fazer alguma coisa. Essa coisa, porém, nunca poderia ser a incriminação do indivíduo numa lei que era clara e não excluía ninguém.
Não encontro melhor escrito de Mário Soares para definir uma hipocrisia e no fundo uma atitude tão antidemocrárica e desrespeitadora do princípio da legalidade. Venha alguém rebater a afirmação!
Até 2000, as empresas podiam dedicar-se livremente à actividade filantrópica de ajudar máquinas partidárias, com registo de valores. Não o podendo fazer desde então, o problema confinou-se a critérios de honestidade e ética porque na realidade nada o impede: o que é que lhes acontece, se o fizerem?! Apanham uma multa( coima)! Ou então, se não quiserem ter a maçada, socorrem-se da consultadoria política. Isto pelo menos até 2005. Vamos a ver se nessa altura entra em vigor a lei prevista e que configura penas de prisão, para essas condutas.
Não vale a pena malhar no ceguinho que não quer ver a corrupção a irromper por esta via. Já em diversas alturas e circunstâncias, pessoas que conheciam esquemas concretos de corrupção a denunciaram: Garcia dos Santos; Pedro Ferraz da Costa; Sladanha Sanches e a mulher Maria José Morgado; António Borges; um responsável antigo das Finanças até denunciou em concreto como era o esquema: rasganço de papéis, antes da informatização das Finanças e falsificação a seguir.
Não deve existir um único agente da PJ do departamento de fraudes financeias e fiscais que não saiba isto e muito mais. Não deve haver um único deputado que não saiba que isto é assim. Não deve haver um único responsável por grandes empresas de construção civil e obras públicas que não conheça o esquema e o caminho que conduz à vitória em concursos públicos. Pois bem! No pasa nada!
Toda a gente faz de conta e embarca na grande resposta de Cunha Rodrigues ao General que presidiu à JAE e denunciou esquemas concretos de corrupção e financiamento oculto de partidos através de empresas de construção civil e obras públicas – e até explicou o esquema concreto: “ O Senhor tem provas?! Se não as tem não vale a pena dizer porque não me interesso por situações em que não haja provas.”Tem sido esta a cultura de anos e anos de inépcia e desleixo. Que vem associada à falta de meios na polícia e no MP ( numa determinada altura a investigção da Moderna, sob a batuta de um empertigado Negrão, tinha dois agentes, segundo denunciou o próprio Cunha Rodrigues) e à notória e deficiente organização do MP. Há pelo menos vinte anos que a situação se arrasta e não há melhorias à vista, conforme se pode concluir pela entrevista de Cândida de Almeida ao Expresso da semana passada.
Aparentemente tudo vai continuar assim, porque de contrário surgem as Cassandras a anunciar a vinda eminente da República de Juizes! E isso, para eles, é pior do que a gripe das galinhas. E como os juizes, magistrados e advogados também não querem tal coisa, cá vamos, cantando e rindo!
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