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terça-feira, março 23, 2010

O saber académico

Tirado do blog SineDie:

"Andava para aí toda a gente a matutar na solução para as violações do segredo de justiça, colocando-se mesmo a hipótese de proceder a escutas de magistrados, quando afinal a solução é simples e infalível.Vem dos States, pela mão do prof. Nuno Garoupa, da University of Illinois.Diz ele: "Todos sabemos quem está na origem das violações, o procurador responsável pelo processo. Evidentemente que muitas vezes não é o procurador quem directamente viola o segredo de justiça, mas sobre ele cai a responsabilidade processual de o proteger." Portanto, pimba no procurador! (Desculpem esta linguagem pimba, que não é, porém, mais pimba que a solução...)."

De facto, é espantoso que um universitário se proponha falar do que não conhece com a facilidade dos taxistas. Não conhece?! Então não devia conhecer?

Nuno Garoupa é um universitário que ensina Direito nos EUA. Tem Phd´s em várias categorias, incluindo em York; é catedrático na Universidade Nova de Lisboa e participa em várias organizações, de vários países e é certamente aclamado como a great scholar.

Eppure...diz estas coisas sobre assuntos aparentemente tão simples como o modo de processar inquéritos crime em Portugal, no que respeita ao segredo de justiça.

Vejamos: Nuno Garoupa alguma vez terá visto a cor a um inquérito real, acerca de um crime qualquer que ocorra e exija segredo de justiça? Não? Está explicado mas não desculpado, porque a lei processual existe, pode ser lida, até online e torna-se evidente, mesmo a um professor de Direito que é virtualmente impossível e até mesmo estúpido, passe a expressão mas não arranjei outra mais soez, defender aquela ideia peregrina.

Tomemos o caso do Face Oculta. O inquérito começou numa comarca, neste caso de Aveiro. Comarca é um modo de dizer porque o que se trata é do Ministério Público de Aveiro que tem um DIAP, um organismo que centraliza este tipo de investigações e é dirigido por um magistrado, onde outros também trabalham. E na investigação no terreno tem ainda a colaboração da polícia judiciária de Aveiro com vários polícias dirigidos por um coordenador. São várias as pessoas que têm conhecimento do que se passa nesse inquérito entre magistrados, polícias e funcionários. Digamos, no mínimo seis pessoas, incluindo o juiz de instrução que é uma secção separada do DIAP e independente do mesmo. Mas são mais.
Os factos desse inquérito exigiam segredo rigoroso para que fosse profícua a investigação. Um dos modos de investigar e que eventualmente seria proposto pela polícia foi o de colocar telefones dos suspeitos em intercepção para se recolherem elementos de prova indiciária.
Esses elementos são coligidos de quinze em quinze dias e levados ao MP que em 48 horas os têm de apresentar ao juiz de instrução para analisar e validar as intercepções. Todas as pessoas envolvidas tomam conhecimento destes factos, porque tudo está escrito, podendo ser lido.
Nesta fase, quem pode violar o segredo de justiça? Obviamente as pessoas que lidam com o processo dirigido pelo titular do mesmo, do MP. Poderá este magistrado controlar a acção daquelas restantes pessoas? Ou seja, dos polícias, dos funcionários ou do juiz de instrução?
Até um porteiro da universidade do Illinois saberá responder.
Faz algum sentido responsabilizar o titular do processo de inquérito de um modo objectivo, por alguma violação que não lhe é directamente imputável?
Até um estagiário de advocacia saberá dizer.
Nuno Garoupa não sabe, no entanto.

2 comentários:

  1. José:

    O Mundo está completamente louco. Para cada caso, aparece sempre um "louco" com a "solução" pronta a servir. O bom-senso, a educação, os valores conquistados ao longo de séculos civilizacionais são, de uma penada, atirados para o caixote do lixo.

    Porque será que isto acontece?

    A meu ver porque o saber e o conhecimento profundo das coisas foram substituídos pelo "achismo" de qualquer imbecil, tanto mais imbecil quanto tem um curriculum que lhe dá argumentos de autoridade onde a sua prória imbecilidade grassa.

    É a "democracia" segundo a qual todas as opiniões são iguais...

    Ora, em democracia, há SEMPRE, SEMPRE, uma meta-ética a respeitar: a que está consagrada nos valores que a LEI consagra.

    Se há éticas que não estão legalmente consagradas faça-se o combate político para a sua consagração legal.

    Consagradas na LEI, imponham-se através do "jus imperii", segundo os valores do Direito e não à-toa para cada caso concreto, mas com rigor jurídico.

    Julgo eu, ao contrário da citação que o José faz de Orlando de Carvalho, que o Direito não é uma "aldrabice secante" - o que há é aplicadores (ou defensores) do Direito que são uns "aldrabões secantes".

    O resto, é conversa...

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  2. Ora, se eu bem entendi o pensamento do Prof. Garoupa, podemos chegar à seguinte conclusão:
    Se houver um orubo, uma violação ou qq crime em Portugal, o responsa´vel será o Primeiro-Ministro, o Min. da Administração Interna e o Min. da Justiça, pq são eles os responsavéis máximos por garantir a segurança das pessoas...
    Vamos a isso!...

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