Fernanda Palma - Um discurso corrente
entre nós, mas originário da Europa, associa o sofrimento e o
empobrecimento de Portugal a uma culpa colectiva. Sofremos e
empobrecemos, por sermos culpados. Este discurso está implícito na ideia
de punição e é conhecido no Direito Penal: o sofrimento da pena
justifica-se porque se é culpado. Porém, tal ideia assenta num mito.
Paul Ricoeur mostrou que a associação
que se estabelece entre o sofrimento e a culpa é mítica e inverte os
termos da relação. Onde há sofrimento tem de haver culpa, como se a
culpa pudesse ser a causa do sofrimento. Ora, na realidade, é o
sofrimento que pressupõe a culpa, é ele que a suscita como explicação. A
culpa não antecede o mal do crime, sucede-lhe.
A triste situação portuguesa tem origem
no sistema económico europeu e na divisão de trabalho internacional. Não
se trata de um problema de culpa, mas de irracionalidade económica. O
discurso da culpa como causa não é racional, é mítico e destrói o
respeito pela vontade de superação dos povos de países que enfrentam
dificuldades em financiar-se.
A pena só pressupõe com utilidade a
ideia de culpa, quando esta serve para evitar o sofrimento futuro,
promovendo a reparação do mal do crime e o afastamento da pessoa do
agente relativamente a esse mal. É este o sentido da mensagem do artigo
40º do Código Penal, quando consagra como finalidades das penas a defesa
de bens jurídicos e a reintegração social.
A insistência na ideia de culpa como
causa do crime não produz nada de positivo. A culpa só pode ser vivida
depois do crime e resolve-se pelo distanciamento e pela rejeição desse
crime. A restrição de direitos que atinge o povo português parece-se com
uma pena retributiva que não serve para encontrar um caminho de
libertação do sofrimento e da falta de esperança.
Como notou François Hollande, a
sociedade portuguesa parece, na verdade, estar a cumprir uma pena
retributiva. É necessário que se liberte, definitivamente, da associação
dos problemas económicos a uma ideia de culpa e abandone a "economia do
castigo", para se converter numa economia de conjunção de esforços, de
recuperação e de reintegração.
A colónia penal em que nos querem
colocar está em colapso profundo. A nossa culpa, tal como a culpa penal,
carrega um mito que inverte as raízes do mal. A culpa que nos querem
atribuir não é mais do que um desfasamento entre as metas culturais
europeias e as condições institucionais de países enfraquecidos pela
própria política europeia. O resto é o mito.
Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal | Correio da Manhã | 21-10-2012
Fernanda Palma é professora catedrática de Direito, na área penal. Este escrito da cronista, sobre a culpa, a expiação e o sofrimento redentor associa conceitos diversos do direito penal à psicologia, a sociologia, à economia e até à teologia e caldeia tudo isso no ideário da Esquerda.
"A triste situação portuguesa tem origem
no sistema económico europeu e na divisão de trabalho internacional. Não
se trata de um problema de culpa, mas de irracionalidade económica."
Esta afirmação pede explicações aos princípios. Mas quem diz que a situação portuguesa que é triste, tem origem no sistema económico europeu? Sim, quem é que diz?
Aliás, qual é o sistema económico europeu? Será o mesmo a que estão submetidos os demais países europeus, como a Holanda, a Bélgica, a Espanha e a Itália?
E os problemas destes países são os mesmos que os nossos, igualmente tristes e sem saída à vista?
Será o sistema que tem uma moeda única e que depende de crescimento económico, de investimentos produtivos da iniciativa privada e do Estado?
E quem é que definiu nesse sistema europeu, a nossa quota-parte relativamente a esses investimentos e ao papel do capital? Quem é que determinou que a nossa Economia tivesse uma parte importante ainda dominada pelo sector Estado?
Foi a Esquerda, senhora professora. Desde o 11 de Março, desde a Constituição de 1976, desde a entrada na CEE que a Esquerda domina o ideário e o imaginário social e económico. O capitalismo português é um mito que apenas é desmentido pelos pequenos e médios empresários que são os verdadeiros heróis nacionais do tempo que passa.
Quer ver um pequeno exemplo disso mesmo?
"uma entrevista de Van Zeller terça-feira, à Antena 1, na qual fez algumas
declarações polémicas como, por exemplo, que um dos entraves aos
estaleiros é uma mão-de-obra "muito desactualizada e habituada a maus
hábitos" e outro a existência de "um sindicato comunista violento".
"Tem um passivo gigante e tem um passivo pior do que
tudo: uma mão de obra muito antiga, muito desactualizada, muito habituada
a muitos maus hábitos, portanto, vai demorar muito tempo a pôr aquilo
direito", afirmou.
"Se conseguirem resolver o passivo, que é enormíssimo,
e conseguirem resolver os problemas dos recursos humanos, que também
são enormíssimos, sobretudo tem lá dentro, enquistado, um sindicato
comunista muito violento... Têm de resolver isso primeiro, ao resolver
isso os estaleiros em si são muito bons", acrescentou Van Zeller."
Sabe como é que essa Esquerda que nos desgraçou reagiu a isto? Foi assim.
E que fez a tutela? Acolheu essa reacção e demitiu ou aceitou a demissão de alguém que foi politicamente incorrecto. Disse apenas o que tem que ser dito: quem nos desgraçou foi a Esquerda.
E Fernanda Palma tem sido uma espécie de ideóloga dessa Esquerda que nos desgraçou.
É essa a sua culpa porque é subsidiária de uma completa irracionalidade económica. E nisso Fernanda Palma está de acordo. Mas é um acordo equívoco porque irracionalidade económica, como conceito não é unívoco. Mais uma culpa.
na minha juventude dizia-se
ResponderEliminar'se tenho dez, gasto cinco; se tenho cinco gasto dois'.
hoje se têm um, gastam 10.
o rectângulo, enquanto monstro, vai continuar a endividar-se 10% ao ano.
os tovaritches continuam a dominar os sovietes. ganham muito bem os que fazem greves. os politicos são incapazes de ir para 'requisição civil'. borram-se.
não há tecnologia nas empresas. os milhões gastos em actualizações dos operários foram pura perda.
os custos sociais da mão-de-obra são incomportáveis para produção do tipo 3º mundo.
'os malucos tomaram conta do manicómio' e o governo assiste
a realidade é feia e vai envelhecer.
há 'luz ao fundo do tonel'
O Floribundus tocou no ponto chave, a não existencia de poupança em Portugal.
ResponderEliminarSegundo o BP a poupança é negativa, logo todo o investimento realizado (a nível macro) é via crédito, logo como estamos hoje a experienciar é insustentável.
Quando se houve pedir mais tempo, para ficarmos a baixo dos 3%, é pedir mais divida, como divida não é mais que impostos por cobrar acrescidos de juros, pedir mais tempo é pedir mais impostos.
O objectivo nem é o Estado parar de se endividar é continuar a um ritmo mais controlado.
A culpa não foi nossa? A culpa é de continuarmos a apostar no planeamento central, que o Estado tem capacidade para fazer crescer a economia, com as famosas politicas activas de crescimento, de emprego etc...
Idiotice pegada.
A cronista de economia não percebe nada, a esquerda pode latir o que quiser a realidade é que desde 1920 que se já demonstrou a impossibilidade económica do que defendem, mas como burros que são continua a dar na mesma tecla.
O calculo económico realizado por burocratas é impossível, é necessário o empreendedor..
Parabens pelo novo lay out do blog, esta muito bonito
Parece-me que se, como muito se costuma tentar fazer, limpar o passado esta crónica poderia ter algum acerto; aliás, mesmo não expoliando o passado, tem sempre algum fundo de verdade quando pensamos que a crise por que passamos não é apenas endógena.
ResponderEliminarO problema, e aqui é que a porca torce o rabo, em 30 anos já fizemos o sinal de entrada ao FMI por 3 vezes, de entre as quais só esta última dentro da moeda única.
O problema é mais fundo do que esta vitimização, as raízes são muitas e apenas uma delas cresceu dentro desta conjuntura com que nos deparamos agora.
Isto de salvar o planeta tem custos.Numa de dar a outra face.Ao estilo nós colonizamos mas não nos importamos de ser agora colonizados.Sempre com o respeito pelas kulturas.Casa,pão,educação,saúde para um milhão foram sempre minudências.E se desembarcassem ilegais viajavam pelo país em autocarro com ar condicionado. Assim como os gordos vencimentos dos respectivos salvadores e respectivos papagaios.Isto tudo enquanto o zé povinho era ordenhado até ao tutano pelo fisco.Para não vir a ter ideias.E ser mais fácil misturar-se lá no bairro social multicultural...para fazer o império de novo tipo agora só cá dentro e claro por nossa conta como está...
ResponderEliminarEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarCapitalismo é um termo usado por Marx e, não sendo marxista, não utilizo.
ResponderEliminarSe por "capitalismo" quer dizer economia de mercado, fica a dúvida se Portugal o é, tal a dimensão da intervenção do estado.
Tal dúvida não é nova: nos anos 30, um economista inglês interrogava-se sobre a possibilidade de classificar Portugal do Estado Novo entre os países de economia livre ou "capitalistas"...
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarP.S. «A triste situação portuguesa tem origem no sistema económico europeu e na divisão de trabalho internacional.»
ResponderEliminarÉ interessante este anúncio de uma explicação última (de que, sem mais explicações o texto parte - e sem perturbação apesar de ocorrerem contrafactuais quase intuitivos e que josé refere). É uma ideia com o seu quê de infantil, redencionista (a nomeação da "razão" do mal extirpa-o ou ou atenua-o...). A esquerda, que tanto bebeu em Freud nunca compreendeu, afinal, a "infelicidade natural" (embora, no caso português, o processo - pelo menos a primeira parte dele, tenha sido querido).
Tem razão quanto à expressão "capitalismo". Vou deixar de a usar neste contexto.
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