É raro concordar com uma coisa escrita sobre as matérias de direito penal aplicado. Este texto de Teresa Pizarro Beleza, académica do Direito, exala uma inteligência rara e um conhecimento que me parece profundo, de tudo e não só de direito penal.
O perfil auto-biográfico da autora está aqui e revela um despojo de ademanes que poucos enjeitam. O perfil alheio revela que é feminista e do MDM, ou seja esquerdista.
Contudo este texto de página no Público de hoje, mesmo com a catilinária contra o Chega, é suficiente para dar a perceber o problema que temos hoje no direito penal nacional: uma ausência de verdadeira discussão sobre aspectos fundamentais do que é o substracto do actual Código Penal e da idiossincrasia que o aprovou e legislou.
Muitas das dificuldades e perplexidades que se revelam nas decisões judiciais vêm daqui, de uma terra de ninguém que muitos juristas e magistrados julgam dominar e lavram a eito.
É ler para se acompanharem algumas questões: "Qual é o real efeito de agravação das penas para certos crimes? Ninguém sabe"; "qual a potencialidade da criação de novas penas para certos crimes? Resposta: ninguém sabe"; "qual é a razão pela qual existe a convicção generalizada de que as leis, e em especial as de natureza proibitiva ( a penal, por antonomásia), resolvem os problemas sociais, económicos, políticos? Resposta: sabemos alguma coisa, sobretudo da ciência política, da sociologia, da criminologia" .
Nesta última questão é que reside a vexata, ou seja a espinhosa pergunta: se não sabe, porque o afirma?
A resposta, aliás, é dada pela autora: " no limite, a compreensão séria, funda, completa destes fenómenos é potencialmente "subversiva", porque embate de frente com muitas certezas, muitas crenças e muitas convicções políticas e de bom senso".
Ou seja, citando Frank Zappa: "Informação não é conhecimento; conhecimento não é sabedoria; sabedoria não é a verdade; verdade não é a beleza; beleza não é amor; amor não é música...música é o melhor que há“
Lembrei-me disto a propósito das apavs dos movimentos anti-racistas que vivem disso mesmo, das comissões de análise póstuma de crimes de género, etc etc.
A resposta a todas as perguntas está dada pela penalista: ninguém sabe. Pelo que a humildade seria a principal atitude de quem se arvora especialista e conhecedor, acima dos outros.
No jornal O Diabo de 21 de Fevereiro passado encontra-se uma espécie de resposta a algumas interrogações de Tereza Beleza, porque afinal o que redunda da escola de Direito de Coimbra que inspirou o Código Penal é um pouco isto: o culto de um valor acima do que deveria ser o real:
A aristocracia do Direito da Universidade de Coimbra que inspirou e criou o Código Penal e outras leis, deixou-se conquistar pelo dinheiro.
Em vez da corrupção de costumes adoptou uma forma mais perversa do vício: a corrupção das ideias vertidas nos instrumentos fiduciários que à míngua de outros adequaram ao efeito, impressos nos pareceres avulsos vendidos a preceito.
Tal prática corrente trouxe os devidos frutos: alguém se questionou já acerca dos lugares que alguns dos rebentos destes catedráticos ocupam na sociedade portuguesa actual e como lá chegaram?
Podiam começar pelos responsáveis directos do Código Penal. Para ser mais explícito, Figueiredo Dias que tem dois filhos bem colocados nas andanças jurídicas. Onde estão?
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