Hoje no Observador, este artigo de Luís Cabral de Moncada, familiar directo de um outro Luís que foi professor em Coimbra, contemporâneo de Salazar e deixou um livrinho de memórias, uma espécie de biografia muito interessante de ler para quem quiser perceber o contexto português, social e académico nesse tempo do "antigamente", o que definitivamente poucos apreendem devidamente fora dos parâmetros da linguagem de esquerda que foram aprendendo segundo o método gramsciano, meticulosamente usado de há 50 anos, ou mais, a esta parte.
Por isso se torna interessante o artigo porque toca no essencial: no uso da linguagem por banda da esquerda que o autor apelida de radical mas nem tanto assim. Toda a esquerda comunga nas concepções gizadas pelo marxismo-leninismo, seguindo a cartilha actualizada em modo semântico e linguístico pelos intelectuais das tretas filosóficas, vindas particularmente de França, durante o séc. XX. Sobre isso é que o autor deveria escrever mais demoradamente porque é esse o problema cultural em que se vive: o busca incessante do domínio político através das tretas ideológicas de sempre, com destaque entre nós para o conceito de "fassismo", um neologismo que para muitos explica tudo do passado do tempo de Salazar. E como tal passado só se modificou radicalmente em 1974 nem lhes interessa saber se depois de 1968 Salazar ainda vivia politicamente ou se o regime e a sociedade já eram diversos. Para o marxismo-leninismo-trotskismo era o mesmo de sempre e daí a amálgama e confusão propositadas. A diferença real e vivida, por quem se lembra, é-lhes perigosa para os conceitos e por isso os obliteram e omitem permanentemente, continuando as tretas de sempre para convencer quem não quer saber melhor.
Os jovens e uma certa camada social desfavorecida pelo sistema político-governativo que tem Estado, não se interessam por tal coisa uma vez que vivem na pele os efeitos das tretas e sabem por isso que algo está errado entre a realidade e tais tretas. E pelos vistos votam contra os que as defendem...
O académico leu Husserl e Wittgenstein e conhece a "linguistic turn", de raiz saxónica e que explicam o fenómeno exposto.
Se ler o que o seu familiar escreveu no livrinho de memórias conhecerá e explicará ainda melhor o que falta entender a tal gente das tretas ideológicas de esquerda: confrontá-la com um termo que conhecem bem ou o usam bem sem saber: o "pathos". A forma de convencer muita gente que as ideias que defendem são as certas...e basta apelar ou mesmo cantar aos lugares comuns da "paz, o pão, habitação, saúde, educação" e agora até "justiça" segundo o mesmo cantor da lenga-lenga pós-revolucionária do abrilismo marxista.
A esquerda pretende sempre uma autoridade moral e social através da defesa do óbvio que todos pretendem, escondendo os métodos horrorosos que escolhem para o efeito, conduzindo multidões ao logro. Foi assim no Leste europeu e continua a sê-lo nos poucos sítios onde ainda domina com tal ideologia. A principal arma para a manutenção de tal poder político é simplesmente a da violência e repressão social a todos os níveis possíveis e imaginários, começando na lavagem cerebral e ideológica. Daí o "fassismo" assimilado a tais métodos que usam como nem sequer o verdadeiro fascismo o consegue fazer. Portanto, um logro, um embuste, como em tempos um desiludido chamado Mário Soares proclamou. Mas como se encontrava em posição de maior força social tolerou os embusteiros e ao contrário do que eles lhe fariam, defendeu a sua manutenção no convívio democrático, para não adulterar os princípios que partilhava com os mesmos.
As contradições e linguagem continuaram, aproveitando aliás a quem convive nesse limbo que nem é de esquerda nem de direita sempre que a economia toca a rebate. Daí as denúncias que o PCP sempre fez perante as opções de "direita" de um PS que se reclama sempre de "esquerda".
O PCP, agora reduzido parlamentarmente a um partido de táxi, mas com uma influência social enorme entre o sindicalismo controlado pelo mesmo, bem como o meio mediático, controlado pela esquerda um pouco mais radical, sabem perfeitamente onde está a esquerda: no radicalismo económico e social. E daí a manutenção da linguagem, tal como estudado e agora explicado brevemente no artigo de Cabral de Moncada.
Não vejo aliás escritos por aí que desafiem tal poder hegemónico, por uma simples razão: medo do anátema que surge sempre do lado de tal esquerda radical quando confrontados com as suas tretas habituais.
O que vejo, escuto e leio é sempre o mesmo discurso mediaticamente repetido ad nauseam, com as mesmas personagens, sem contraponto ou contraditório.
Em Portugal, a esquerda, incluindo a moderada, tem todas as armas das tretas que defendem. E usam-nas. Sem contraditório ou confronto. Por medo dos contestantes, parece-me.
Há 50 anos que vivemos nisto e parece-me aliás ser esse o fenómeno mais relevante socialmente determinante da realidade em que vivemos. Essa é outra prova dos nove para o artigo do postal anterior.
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