Começou o Prós & Contras. Com Marinho e Pinto, Ricardo Cardoso, Paulo Pinto de Albuquerque e Germano Marques da Silva.
O tema é a Justiça, mas centra-se no processo penal. A Justiça é mais do que isso, mas é isso que fica no retrato da Justiça. A Face oculta é o tema do mote do programa de hoje, como se verifica logo pela introdução.
Marinho e Pinto dá o pontapé de saída. Diz que o cidadão comum, não pode pensar bem das instituições, dos tribunais e da investigação, por causa das divergências. Marinho acha que a lei é clara ao atribuir competência para autorizar e destruir as "cassetes" em causa. Mas diz que não conhece os fundamentos dos magistrados de Aveiro, sobre as "cassetes" . Mas parece-lhe que o presidente do STJ tem razão. E acrescenta que as escutas são válidas, mas...para Marinho acha que os magistrados de Aveiro deveriam remeter o suporte dessas escutas para o presidente do STJ.
É esta a posição de Marinho e Pinto. Ouçamos os outros. Paulo Pinto de Albuquerque, por exemplo.
Diz este antigo magistrado ( que escapou a tempo de ter a seu cargo o processo Casa Pia) que entende ser o juiz de instrução de Aveiro obrigado a cumprir a decisão do presidente do STJ, porque a mesma...transitou em julgado.
E explica a génese da lei que surgiu em 2007 como a criação de um foro especial para três figuras do Estado, atribuindo ao presidente do STJ, em crimes cometidos fora do exercício de funções. A novidade reside na criação de foro especial, nos crimes fora do exercício das funções.
Portanto, o presidente do STJ não terá competência para esse acto. Mas como cumpriu e o MP se conformou com o despacho, está transitado e por isso torna-se obrigatório.
[Será que Paulo Pinto de Albuquerque sabe se o despacho do pSTJ foi proferido num processo regularmente organizado, num inquérito ou num processo administrativo? Parece que não sabe...]
O professor Germano Marques da Silva tem uma "oposição radical" ao que disse PPA. Diz que em 2007 foi criado um sistema diferente excepcional, incluindo todos os crimes ( sejam crimes nas funções, sejam fora delas). Diz que não há uma hierarquia entre o juiz de Aveiro e o pSTJ. Ambos são competentes, para os actos. O presidente do STJ é o competente por norma excepcional. Só que...acontece isto, diz GMS: se no processo foi determinada uma escuta validamente autorizada e se detecta uma escuta com alguém do género, "parou a escuta", diz GMS. O mesmo que se passaria se fosse detectado que o arguido falaria com o seu defensor...
Para GMS se se detectar uma conversa com alguém que seja uma das pessoas indicadas ( um dos três titulares dos órgãos de soberania) a escuta deve parar imediatamente e nem sequer deve ser escutado seja o que for.
Portanto, GMS acha agora que ao ser levada a escuta ao juiz de Aveiro e este indicar ao presidente do STJ que a detectou, GMS acha que o juiz de Aveiro a deveria ter destruido imediatamente. [esta interpretação de GMS é fantástica. É pena o penalista Costa Andrade não estar ali, porque isto é incrível, vindo de GMS um penalista-advogado-legislador de processo penal].
E GMS acha mesmo que fosse qual fosse o crime ( mesmo matar alguém) o juiz deveria destruir a escuta. [ É este o absurdo de GMS e também Fernanda Palma, o não entenderem o valor do conhecimento fortuito].
Sobre a atitude do juiz de Aveiro em recusar a destruir as escutas, GMS diz que o juiz do STJ não dá ordens ao juiz de Aveiro e nisto discorda de PPA. GMS acha que esta escuta é uma proibição de prova desde o início e por isso deveria ser logo destruída.
PPA, indica o facto de que nos trabalhos preparatórios consta a sua oposição da criação do foro especial, nos trabalhos da Unidade de MIssão. E os membros da unidade rejeitaram a solução de excepção, mas na 26º reunião, o governo por decisão política, tinha decidido afastar a opinião da Unidade de Missão e colocar novamente o foro especial.
PPA perguntou então, na Unidade de Missão qual o sentido útil da criação de um foro especial?
E inicia uma explicação sobre o artº 11º do CPP.
A explicação de PPA é no sentido de demonstrar que a norma (artº 11º) não é clara e não reflecte o espírito do legislador. Para PPA é possível escutar as figuras de Estado nos termos do artº 11. E entende que a diferença reside nos crimes dentro e fora das funções. Dentro das funções, deve ser um juiz da secção criminal do STJ, o que não aconteceu.
E a ordem do presidente do STJ em mandar destruir as gravações será contrária á jurisprudência do tribunal europeu dos Direitos do Homem. Que manda manter no processo.
E acha ainda que o privilégio do defensor não é idêntico ao privilégio da figura de Estado. GMS acha que tem por causa do prestígio. E GMS acha que a coisa não é muito clara e diz que o "legislador nem sempre é competente"...E por vezes o legislador na AR estraga os projectos. E isso já lhe aconteceu "várias vezes". Daí que as leis sejam difíceis de interpretar, diz GMS.
PPA ainda adianta um outro absurdo: os crimes cometidos fora do exercício das funções são julgados pela instância inferior, a primeira embora as escutas sejam autorizadas pelo presidente do STJ... [brilhante solução da Unidade de Missão].
GMS acha que não há absurdo nenhum, e acha que só o presidente do STJ ouça a escuta . [o resto não é absurdo...]
Ricardo Cardoso, agora. Diz que dois professores trocaram ideias que afinal nem são concordantes. E indica que estes professores podem pronunciar-se sobre isto e os juizes não podem pronunciar-se por dever de reserva. Por isso, acha que não deve comentar as escutas. Porque os despachos concretos ninguém os conhece.
Vinca o facto de as leis serem deficientemente feitas e chegou-se ao limiar de criticar as decisões dos tribunais. O juiz cala-se mas ..."se alguém me acusar de fazer espionagem", "o juiz pode reagir".
O juiz tem de ser independente e autónomo em relação ao poder político..."mas é o que não se passa hoje". Por quem? Pelos outros...
As violações de segredo de justiça tem impressões digitais, diz Ricardo Cardoso. E aponta um exemplo: " há uma escuta que é noticiada sobre um suspeito ter recebido dinheiro e depois do suspeito ter acesso ao processo aparece o mesmo a dizer que afinal não há nada nas escutas." Pergunta Ricardo Cardoso: quem foi que violou neste caso, o segredo de justiça?
E continua a discussão sobre quem viola o segredo de justiça...
PPA acha que em 2007 a unidade quis acabar com a regra do segredo de justiça mas agora, apraz-lhe ver que o bastonário quer voltar à matriz do CPP de Figueiredo Dias...
PPA retoma o facto de alguém ter dirigido ao MP e juizes a circunstância de estarem a fazer "espionagem política", uma afirmação desta gravidade, como de gravidade extrema tanto mais que são os magistrados quem procura fazer maior esforço para se distanciar.
Ricardo Cardoso, sobre o que diz o bastonário, acerca da ilegitimidade do sindicalismo judiciário diz que o sindicalismo é uma garantia de independência. Marinho e Pinto diz o contrário...e que o sindicalismo é atentatório da mesma independência.
GMS acha que o CPP de 2007 tem regras sobre a publicidade que não tem jeito algum. E PPA concorda.
Intervalo. O debate sabe a pouco. Ainda ninguém referiu se o despacho de Noronha do Nascimento foi proferido num expediente qualquer e que valor terá nesse caso...
Segunda parte:
Começa GMS. Fala sobre o segredo de justiça. Diz que é importante para assegurar a investigação e para defesa da honra.
Ricardo Cardoso, diz que neste processo parece não ter havido violação do segredo de justiça...
E fala da actual composição do CSM que mudou a maioria dos juizes no CSM, para ampliar a representação dos outros poderes. Ricardo Cardoso entende que a maioria deve ser de juízes.
PPA entende, sobre as escutas da Face Oculta que uma vez que existem referências públicas de crime de atentado ao Estado de Direito e dois magistrados o disseram, quanto à matéria criminal a decisão do PGR acaba com esta matéria. No entanto, haverá outra - a relevância social das escutas. E isso interessa a toda a comunidade.
E PPA acaba por dizer que afinal Pinto Monteiro nem sequer abriu um inquérito. [ Mas então, se não abriu inquérito qual o tipo de despacho do presidente do STJ? Sobre esta questão não vejo resposta à altura...].
GMS está a ferver... por causa do que disse PPA. O PGR exerceu uma competência: disse que não havia matéria para abrir um processo.
GMS diz que só o presidente do STJ poderia pronunciar-se sobre o conteúdo das escutas e por isso não admite legitimidade dos magistrados de Aveiro, para se pronunciarem sobre as suspeitas. E o magistrado do MP de Aveiro mandou ao PGR para este remeter ao STJ. [Mas então se o PGR não o fez, porque é que o presidente do STJ despachou? Responda lá a esta...GMS].
PPA cita agora o caso de Helmutt Khol, sobre um caso de financiamento de partidos em que os alemães tiveram o direito de saber o conteúdo do processo. E pergunta PPA: porque é que os portugueses não tem esse direito?
Marinho e Pinto discorda porque acha que estas escutas só servem interesses políticos. E acrescenta que isto é oportunismo político.
E Ricardo Cardoso cita a história do moleiro de Berlim. Com sentido de demonstrar a legitimidade dos juizes, em resposta à observação de Marinho e Pinto de que os juizes não são um poder democrático e que desde antes do 25 de Abril não houve transição entre os juizes do plenário e os actuais...
PPA continua a insistir na ideia de que interessa a todos os portugueses saber a razão porque dois magistrados de Aveiro entenderam que há indícios acerca de um crime de atentado ao Estado de Direito.
E GMS vem desconversar atirando o assunto para a chicana das conversetas de treta ao que PPA lhe retorquiu que se trata de assuntos de atentados ao estado de Direito.
GMS acha que os juizes falam de mais e até o PGR falou de mais.
E a discussão continua, com os prós divulgação e os contras à mesma.
PPA resume o assunto: houve dois magistrados que entenderam haver indícios de um crime e outros dois que não.
E para além do crime, também interessa saber se existe nesse processo matéria de interesse criminal. E volta a citar o caso Kohl. Com as comparações devidas.
E refere PPA que o ministério Público na Alemanha divulgou ao público o que se passou. E aqui não o querem fazer. E cita o artº 86 do CPP que permite a divulgação de factos de um processo.
A discussão está quase a terminar, sem a resposta à pergunta fatal:
Que vale o despacho de Noronha do Nascimento num expediente qualquer?
Fátima Campos Ferreira depois deste tempo todo, só agora percebeu uma coisa:
Que o único aspecto que importa perceber nisto tudo são os factos que motivaram a que os magistrados de Aveiro entenderam integrar o crime de atentado ao estado de direito. Foi PPA que explicou.
Custou, mas lá acabou por entender.
O bastonário acaba por dizer a maior atoarda da noite: acha que o magistrado que entendeu haver indícios sobre o "atentado ao Estado de Direito", teve a noção do impacto público da decisão e portanto agiu com base nisso.
PPA disse-lhe que o bastonário entende por isso que os juizes têm agenda política. E Marinho e Pinto diz que não. Pois não...as palavras valem o que valem.
E Ricardo Cardoso atira ao bastonário que as afirmações que fez são uma tristeza no Estado democrático e que são as afirmações do tipo das que o bastonário fez que descredibilizam a Justiça.
Acabou.
Balanço: o que vale o despacho de Noronha do Nascimento? Nada jurídico? É o que parece, embora ninguém o tenha dito.
Outro balanço mais expressivo, foi dado há mais de dez anos, por Orlando de Carvalho, professor na Universidade de Coimbra. Disse numa entrevista ao Público que "o direito, [por vezes], é uma aldrabice secante".
Ouvir Germano Marques da Silva defender teoricamente coisas que Costa Andrade entende absolutamente indefensáveis e que não há ninguém na terra e no céu capazes de contradizer pode muito bem ser uma delas.
A descredibilização da justiça passará por aqui, por estas faenas que no fundo redundam em reflexos pessoais de interesses políticos e profissionais?
Germano Marques da Silva, professor de direito penal, desde quando defende o que defende? E Costa Andrade? Este sabemos que desde sempre. E aquele?
PS. O caso de Helmutt Khol foi dos primeiros a ser comentado neste mesmo blog, em 2003.
Aqui.É pena o link explicativo do caso em italiano, já não funcionar. Mas
este funciona.