O advogado retirado, Proença de Carvalho, associado desde 1998 à firma Uría Menéndez, publicou um livro que intitulou "Justiça, Política e Comunicação Social".
O título prometia e o sumário é este:
Começa por relatar a sua experiência de vida dos primórdios profissionais, no MºPº e Judiciária, de um modo que aparentemente nunca ultrapassou.
O MºP, para ele era um pouco isto que por aqui conta: uma magistratura fortemente hierarquizada em que o superior hierárquico tinha tempo para acompanhar o trabalho diário dos subordinados, dando instruções a preceito, a eito e segundo o próprio jeito. Era assim que Proença ainda queria que fosse:
Portanto, uma magistratura isenta, ora para acusar ora para arquivar. Ainda hoje o é, mas Proença acha que não. E porquê? A razão vai encontrá-la em ódios de estimação, no caso Cunha Rodrigues, o PGR dos anos oitenta e noventa.
Segundo Proença foi ele quem pessoalmente alterou o destino do MºPº e que "num acto de voluntarismo", conduziu a assumir directamente a investigação criminal relevante, com a criação dos DIAP e depois o DCIAP, relegando a PJ para um papel subalterno.
A história de Proença de Carvalho confunde-se com a história das nossas três bancarrotas. Poderia mesmo ser um pequeno roteiro das suas causas, a meu ver.
Em 1974, com 33 anos, era um modesto advogado, depois de ter sido delegado de procurador da República e inspector de polícia, no Estado Novo de Salazar. Segundo um biógrado improvável ( Afonso Praça de O Jornal) Proença tinha um lema: "os fins justificam os meios". Maquiavel no seu melhor, portanto. Proença vinha da Soalheira, no Fundão, pobre como se era na época. Em 1968 passou a funcionário de Champallimaud, no contencioso da empresa Cimentos de Leiria.
Foi nesse tempo que começou o julgamento da herança Sommer de que Champallimaud era interessado. Proença, segundo Praça, teria participado, enquanto inspector da Judiciária na instrução de um processo crime relacionado mas tal não o impediu de tomar a defesa da causa do patrão. Eticamente, estava bem preparado...e quando aparece o 25 de Abril, sendo amigo de José Niza, inscreve-se no...PS, pois claro. Partido que abandonou logo que os ventos começaram a mudar, ou seja por altura da primeira bancarrota ( 1976-77) Proença já era de "direita", no Jornal Novo que então dirigia. Uma direita sui generis, entenda-se.
A história conta-se melhor aqui, no O Jornal de 7 2 1986:
Proença foi então ministro da propaganda ( Sá Carneiro dixit) do VI governo de bloco central, de Mota Pinto, em 1978, quando se preparava já a segunda bancarrota, dali a uns anos. Sá Carneiro no entanto, nomeou-o presidente da propaganda na RTP, em 1980. Em 1983, Vítor Cunha Rego terá mesmo escrito no jornal A Tarde, que " há muito que o sistema político deste País teria desabado se Proença de Carvalho não estivesse onde estava." Em 1983 estávamos noutra bancarrota...
Dali em diante foi sempre somar e encher o bolso, para Proença. Vejam-se os recortes que nos contam tudo ou quase...a partir de 1981 e depois da AD de Sá Carneiro.
Expresso de 3 Janeiro de 1981:
O Jornal de 5 de Junho de 1981:
O Jornal de 11 de Abril de 1986 em que Fernando Dacosta escrevia sobre a "direita" portuguesa a propósito de Freitas do Amaral (!) e de Proença de Carvalho (!!!) supostos representantes da dita cuja...
Em 1986 Proença, foi, naturalmente, mandatário de Freitas do Amaral na corrida presidencial que este perdeu para Mário Soares. Como o Expresso escreveu na época...ficou às portas da terra prometida...
Em 1991, o governador de Macau, Carlos Melancia, indicado pelo vencedor das presidenciais, teve problemas com a Justiça. Corrupção. Quem foi o advogado? O representante da "direita", voilà!
Em 1995 a antiga ministra do PSD, Leonor Beleza, designada futura líder sabe-se lá de quê, foi pronunciada por um juiz de instrução da prática de crimes de homicídio doloso. Quem foi o advogado de defesa da dita? O nosso homem do trio de los dos, voilà!
Expresso revista de 1 de Novembro de 1996:
Aproveitou entretanto todas as entrevistas generosamente concedidas pelos media do sistema da bancarrota, para destilar o ódio particular às instituições judiciárias, particularmente ao MºPº. Proença, nunca o escondeu, preferia um MºPº à maneira do Estado Novo. Era bem mais seguro para os interesses que representa, como se vê agora no caso de Angola...
E por isso mesmo, em 1999 já destilava as habituais catilinárias, desta vez contra o então PGR Cunha Rodrigues ( houve apenas um PGR que agradou a Proença: o seu amigo Pinto Monteiro...).
Expresso de 27 Março 1999:
E actualmente, por onde anda Proença? Ora, ora. Depois de defender José Sócrates dos ataques soezes que lhe fizeram, a esse paladino da transparência pessoal e governativa, anda agora a acompanhar o presidente do BES, Salgado de sua graça, nas deambulações angolanas por causa da maldita Escom que ainda os vai desgraçar...
Como já se escreveu por aqui, citanto o abruti:
Proença de Carvalho é um exemplo típico: advogado de José Sócrates, presidente do Conselho de Curadores da Fundação Champalimaud, presidente do Conselho de Administração da Zon Multimedia, membro da Comissão de Vencimentos do BES – um interessante cargo -, “chairman” da Cimpor, ao todo, só no mundo empresarial, 27 cargos. Proença de Carvalho, como muitos outros neste universo de “sempre os mesmos”, não é “dono”, mas amigo dos “donos”.
Competência? Nalguns casos sim, noutros não. Mas não é a competência o critério fundamental. É a confiança. Estes são confiáveis, são dos “nossos”, são dos “mesmos”. Já foram testados mil e uma vezes, no governo, na banca, na advocacia de negócios, no comentário político nos media, e mostraram que estão lá para defender sem hesitações, os “nossos” interesses. Confiança é a palavra chave nos “sempre os mesmos”.
Proença de Carvalho pode dizer-se que será um dos indivíduos mais qualificados em Portugal para explicar como é que sofremos três bancarrotas em menos de 40 anos. Por uma razão simples: esteve em todas elas, como figura proeminente, parda por vezes, mas sempre presente. E aproveitou bem o regime que as produziu. Seria interessante que alguém revelasse o seu património...
CODA: Este indivíduo mai-lo seu apoderado da época, candidato a presidente da República, seriam os putativos representantes da "direita". Havia outro, ainda. Um certo José Miguel Júdice que até teria sido de extrema-direita, cultor de um tal Primo de Rivera. Veja-se bem a pinderiquice intelectual desta gente. Bastou que os ventos de mudança de regime passassem a soprar um pouco mais a levante, para se postarem a jeito de aproveitarem a maré.
Cedo mudaram para o centro e daí para a esquerda e até se aproximaram do PS, o tal que se diz de esquerda e que teve um esquerdista notório como Sócrates, que todos aqueles louvaram como um grande estadista português.
Lembrar isto é tão deprimente quanto lembrar as bancarrotas que nos provocaram. Até quando esta gente mandará em Portugal?
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