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sexta-feira, novembro 25, 2022

Gestão autárquica dos pareceres póstumos: ler e pasmar!

 Público de hoje:


A propósito dos inenarráveis de Caminha que contrataram em nome da autarquia e do erário público a fantástica construção futura de um "barracão" de luxo mais uns adereços a condizer, há, infelizemente mais a dizer. 

A promessa de construção, sem garantias de boa execução e apenas com o crédito num empresário que juntava acções mirabolantes em empresas fantásticas como a "Nordstream" e em dezenas de aeroportos, para além de participações em 500 empresas espalhadas "por aí", temos mais esta notícia a compor o ramalhete de uma grande, grande pouca vergonha. 

Repare-se: antes do negócio mirabolante, a autarquia gerida pelo tal Miguel Alves, destituído agora de funções, solicitou um parecer jurídico a um professor universitário de Coimbra, membro do CSM, que o deu a troco de milhares de euros, presume-se. 

Tal parecer destinava-se a assegurar algo que o negócio em causa não assegurava: que era legal prometer algo mirabolante, como era o caso, satisfazendo as garantias negociais. O parecer sossegou o inenarrável autarca, servindo para justificar o contrato e entregar 300 mil euros mais IVA ao mirabolante empresário. 

 Não satisfeitos com tal garantia universitária do saber do jurista de Coimbra, os autarcas que sucederam ao politicamente finado Miguel Alves, solicitaram agora mais um parecer, desta vez a um jurista de Lisboa, por coincidência advogado associado no escritório Sérvulo& Associados. Preço: quase vinte mil euros mais IVA. Justificação chã e inacreditável: como o de Coimbra pertence a uma "escola jurídica" diversa, seria melhor pedir outro a alguém de escola jurídica diversa...e o preço total dos pareceres, supondo que o preço será idêntico, arredonda-se em  50 mil euros, mais coisa menos coisa, para um negócio de 300 mil euros, menos coisa mais coisa. 

Note-se que o  dinheiro foi logo entregue ao empresário mirabolante, segundo foi noticiado, não sendo necessário esperar pelo parecer da outra "escola jurídica".

Mais: este segundo parecer, segundo a notícia, é solicitado já depois de a autarquia ter resolvido o contrato por terem concluído que o negócio era afinal destinado a um incumprimento. Portanto é um parecer póstumo destinado a saber se o jurista de Coimbra teria ou não razão...

É este o modelo de gestão autárquica que vigora em muitas autarquias: pagar pareceres jurídicos, em milhares e milhares de euros,  sempre solicitados a determinados juristas, para saberem o que em princípio qualquer cidadão minimamente esclarecido sabe de ginjeira quando está em causa o dinheiro que lhe pertence: que um contrato promessa carece de garantias e que a lei civil contempla a regulamentação de tais negócios pelo menos desde o Código Civil de 1966, o que qualquer jurista de meia-tijela sabe sem necessidade de pareceres catedráticos. 

Mais ainda: o ex-autarca da localidade é jurista, formado em leis e até colaborou no escritório de um advogado que trabalha para o Governo, a saber, um certo Lacerda. Perante os factos é legítimo suspeitar acerca da sua competência técnico-jurídica. 

Ainda mais: qualquer autarquia que se preze alberga vários juristas capazes de emitirem pareceres sobre tais assuntos, bastando-lhes consultar a lei do Código Civil. Se não servirem para isso, servem para quê, afinal? 

Para caucionar burlas, como esta aparentemente poderá bem ser? 

Finalmente, seria extremamente útil o público em geral saber quantos pareceres se pagam por ano a certos escritórios de advocacia, solicitados por entidades autárquicas do nosso pobre país. E sobre que assuntos versam, assim como os valores expendidos. 

Deve ser uma coisa de meter medo a um susto!

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