No Público de hoje, o relator de obituários residente, António Araújo, "jurista historiador" ( sic), apresenta assim o perfil de um artista dos anos dourados da esquerda nacional, os do tempo do fassismo e que feneceu no tempo de Abril no activismo equívoco do esquerdismo de sempre.
O perfil do esquerdista Mário Dionísio, intelectual activista no pós-25 de Abril e co-autor das reformas fantásticas que conduziram o ensino ao estado em que se encontra, putativo ministro da Educação falhada no tempo de Vasco Gonçalves, já foi apresentado por Vasco Pulido Valente.
Mário Dionísio, segundo o obituarista, foi o autor de uma apreciação pessoal de Freitas do Amaral, no tempo da AD: um "novo Salazar em formação, o sábio, calmo e sorridente Freitas do Amaral". Perspicaz, este indivíduo. E também quem o cita, perfeito similis que emparelha cum similibus.
Aqui fica em reprise parte do postal de 2016 sobre Dionísio, acrescentado da citação completa de VPV, no Observador. Porque é que isto tem interesse, pelo menos para mim? Porque dá a conhecer o que foi a esquerda em Portugal, durante o fassismo e após tal período de obscurantismo e repressão apregoados por tal gente como sinal distintivo.
Por outro lado, este tipo de artigos, como o do obituarista residente no Público, exalam sempre o perfume da esquerda patente ou latente, como é o caso do similis Araújo. Participam alegremente naquilo que Gramsci defendia: aculturar o povo com as ideias certas, obliterando outras que as denegam, triturando assim a realidade e a memória:
Vasco Pulido Valente gasta o melhor da sua crónica de hoje,no Observador a desbastar a efeméride do centenário de nascimento de um crítico e escritor português, Mário Dionísio.
"É celebrado este ano o centenário de uma pessoa de que hoje ninguém se lembra e que ninguém lê, Mário Dionísio. Foi um mau poeta, um mau romancista, um mau pintor de fim-de-semana e, principalmente, um mau crítico. Mas no cume do antifascismo, logo a seguir à guerra, foi também o “controleiro” do PC para o “sector intelectual”. Quando Cunhal, já preso, exigiu aos pobres literatos portugueses o estrito acatamento do “realismo socialista” de Jdanov, Mário Dionísio saiu do partido, mas ficou até ao fim da vida um “simpatizante” convicto. Conheci muito bem o indivíduo. Primeiro, como professor de literatura portuguesa no Colégio Moderno de João Soares (avô) e, depois, porque os meus pais, igualmente devotos da seita, eram amigos dele.
À sexta-feira, havia sempre uma reunião em casa de Mário Dionísio, cuja função era discutir a “linha correcta” para o PC, os “desvios” ideológicos da “inteligência” indígena e, lateralmente, as malfeitorias da Ditadura. Faziam parte deste grupo João Cochofel e a mulher, a pianista Maria da Graça Amado da Cunha e o marido (Roger de Avelar), o erudito excêntrico Huertas Lobo e uma ou outra figura de passeio. A partir dos doze, treze anos, comecei a ser arrastado para esta catequese e passei muitas noites – calado e quieto – a ouvir aquela gente perorar.
Mário Dionísio, como é evidente, presidia. Os meus pais mal abriam a boca: a minha mãe não tinha qualquer qualificação formal e o meu pai não passava de um engenheiro químico, ainda por cima director de uma empresa. Mas, calados que estivessem, não escapavam à crítica do seu estilo de vida. Tiveram de prometer não gastar mais do que ganhava um funcionário de Estado médio, não usar o carro em viagens de prazer e não me vestir luxuosamente. O povo passava fome e um bom comunista não devia viver como um milionário. Foi assim que, com muita raiva minha, usei calça curta e casacos voltados durante o liceu inteiro, ou quase.
Este artigo vitriólico e ajustado ao tempo do tal Dionísio contrasta com o perfil que a Wikipedia lhe traça, no qual nem uma vez aparece a menção a PCP...o que é curioso para quem foi um comunista de gema. É por isso bem vindo o artigo de VPV para mostrar outra verdade escondida, na alheira da Wiki.
Andei à procura nos catálogos que tenho, antigos, da editora do tal Dionísio e descobri que era na Europa-América.
Nada de especial, de facto, a não ser o tratamento ditirâmbico que lhe era dado, em 1971, no referido catálogo.
Mário Dionísio era ainda conhecido do suplemento Quinta-Feira à Tarde, no Diário Popular, como mostra este de 21 de Fevereiro de 1974.
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