O jornal i faz hoje cem números e comemora a efeméride com uma entrevista ao seu director, realizada por Mário Crespo, jornalista que assentaria no i como uma luva de pelica. Um jornalismo com uma densidade específica e sem substracto profundo que surfa a realidade como quem escolhe fruta: pelo aspecto e sem saber o gosto.
Compro o jornal há cem números pelo que estou autorizado a emitir opinião, na qualidade de accionista principal do mais importante activo do i: aqueles que compram e lêem e ainda por cima não desgostam.
O i tornou-se o meu jornal de referência, porque o Público não presta. Perdeu interesse e um dia destes deixo de comprar. Esteve mesmo para ser hoje, mas vou adiando.
O i, segundo o seu director Martim Avillez, vende 9 700 exemplares em banca e deveria vender 12 mil. Venderam 10 900 no primeiro mês; 7200 no segundo, 7400 no terceiro e 9100, no último.
Em termos de circulação paga e que se cifra em 12 753 exemplares.
Isto é ordinário e mostra o país que somos. Com 10 milhões de habitantes, o melhor jornal português da actualdiade, vende 12 mil exemplares por dia!
Quanto vende a Bola, o Record e o Jogo? Mais do que isso, certamente. E por que razão específica, o Jornal de Notícias e o Correio da Manhã vendem cem mil exemplares?
É difícil de dizer, mas palpites é o que nada custa, nestes casos. Por isso lá vai:
Portugal ainda é um país de analfabetos e semi-analfabetos. O sistema educativo que temos só pode gerar destas coisas. Um país em que a maioria dos leitores de jornais é adepta de títulos desportivos ou de jornais de notícias feitas por agências ou rabiscadas de factos simples e sem subtilezas de maior, é um país necessariamente mal informado.
O i é um jornal bem feito cujo único defeito é a falta de ambição contra o poder. Seja ele qual for. Parece um jornal conformado e formatado para não fazer ondas de grande porte.
Com 12 mil euros por dia de encaixe directo dos leitores, se calhar não se pode dar a esse luxo. E no entanto, é esse o defeito que o vai deitar a perder.
A ambição de informar com profundidade o que é a realidade portuguesa da política e políticos que temos, fica pelo caminho da ambiguidade, típica de um Mário Crespo. Martim Avillez diz na entrevista que quer fazer um jornal "para pessoas interessadas que querem saber mais sobre os assuntos."
Pois para isso, é preciso ser honesto. Perceber os assuntos em primeiro lugar e mostrar o que eles são na realidade. A partir do momento em que essa realidade é mascarada e passa a ser um ersatz jornalístico, como aconteceu com alguns jornais em casos de impacto mediático evidente, o jornal perde interesse.
Por exemplo, na edição de hoje há uma entrevista a Edmundo Pedro, o histórico do PS que continua a referir-se ao seu passado de modo pouco esclarecido. O O Jornal da época, a esse propósito, fazia um jornalismo melhor, porque dava conta do que se sabia nas redacções e era voz corrente. O seu director na altura, José Carlos Vasconcelos, nunca se retractou ( que eu saiba) desse episódio...
O que falta ao i, portanto, no aspecto das notícias de grande fôlego, é a capacidade de aprofundar e suster a respiração quando cheiram mal. Mas, ao regressar á superfície, mostrar o que se encontrou...
O i ainda não faz desse jornalismo e provavelmente não fará. O que será uma grande pena.
Para já, no entanto, contento-me com as primeiras quatro páginas de cada dia. Já não é mau.
Ah! E já esquecia de dizer que o Diário de Notícias tem melhorado muito. Comprei alguns números neste mês de Agosto ( os que traziam as histórias de Sherlock Holmes, uma iniciativa e valor do jornal) e fiquei agradavelmente surpreendido. Não confio muito na isenção jornalística do periódico por causa de ser de quem é, mas ainda assim...
O i é um jornal bem feito cujo único defeito é a falta de ambição contra o poder. Seja ele qual for. Parece um jornal conformado e formatado para não fazer ondas de grande porte. - José
ResponderEliminarLeio o Público e, ocasionalmente, o "I".
Concordo com a análise que faz do primeiro: o melhor projecto jornalístico desde os anos 90 até hoje é hoje pior que a sombra de si mesmo. Irreconhecível.
Quanto ao segundo, discordo parcialmente: o "I" não só não afronta minimamente o "status quo" (os artigos sobre os escândalos são pífios, os artigos de opinião "redondos", o jornalismo de investigação inexistente, à excepção do caso da PT), como, de resto, o estilo jornalístico me parece um exercício de superficialidade. Penso que a ideia na base do "I" era fazer um jornal "maneirinho" que fosse para a imprensa o que a literatura de aeroporto é para a literatura. E é por isso que ou mudam muito ou não me apanham a comprar o jornal muitas mais vezes.
Seguidora que sou dos seus escritos há quase quatro anos consecutivos, não pude deixar de constatar que inverteu de certa forma posição quanto à sua opinião sobre o "i", cuja primeira edição lhe mereceu crítica assertiva, bem ao seu estilo inconfundível.
ResponderEliminarOs meus parabéns, só as pessoas muito inteligentes mudam de ideias ao reconhecer um erro.
O erro não reconhecido é um escolho na consciência de um homem recto.
Pelo que mais uma vez louvo a sua posição.