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segunda-feira, abril 26, 2021

Isto anda tudo ligado...

Em Portugal o Ministério Público como instituição considera-se independente do poder político, embora a  PGR tenha a chefiar pessoa que é escolhida e nomeada por esse mesmo poder político. A independência termina aí, antes de chegar ao topo. 

Tal circunstância notou-se com algumas das pessoas que já ocuparam tal lugar: sempre que determinados assuntos se afiguraram como podendo atingir de forma politicamente insustentável determinados responsáveis políticos, mormente presidentes da República ou primeiros-ministros, ganhou sempre a "raison d´État" ou "garantia administrativa".  

As pessoas colocadas nesses lugares pelo poder político responderam sempre em modo consentâneo com as expectativas de quem os colocou nesse lugar. Tais pessoas foram fiéis a quem os nomeou. Isso significa simplesmente que a independência do MºPº é um mito. 

Exemplos concretos? três, embora haja mais: caso Emaudio/Melancia; caso Face Oculta e caso Tancos. Neste último caso, a situação anormal ainda foi mais longe que nos outros anteriores. A PGR emitiu uma directiva que condiciona a autonomia interna de tal magistratura, de modo grave e inaudito. Desse modo, o MºPº para além de perder a independência do poder político torna-se refém de qualquer decisão de quem tem ligação directa a tal poder e que não hesita em o usar para tal efeito, eventualmente com pressões directas e indirectas. Se houvesse um "intercept" qualquer que captasse comunicações entre tais protagonistas nesses momentos de crise, estou certo que seria o maior escândalo que pode haver e muito pior do que o do Moro. 

Para além do Ministério Público, em tempos integrante do poder judicial e agora independente do mesmo, há o poder dos juízes, esse sim independente por força da sua razão de ser e configurado na acção de cada juiz singular que exercer o múnus, nos processos respectivos e julgamentos. 

Essa independência é a mais importante porque garante o paradigma dos "juizes de Berlim", ou seja, a possibilidade de o próprio cume do poder político poder ser questionado e sindicado por tal poder judicial, em modo de separação de poderes. 

Em Portugal tal separação de poderes existe de direito mas com uma subtileza que o inquina: o órgão de gestão dos juízes, titulares desse poder judicial, o CSM, é uma entidade administrativa composta por juízes que não têm nessa qualidade qualquer poder judicial e por membros da sociedade que não são juízes e nesta altura são a componente maioritária de tal Conselho.

Qual o argumento usado para se ter composto tal conselho desse modo? O da legitimidade perante o povo eleitor. Se o CSM fosse composto apenas por juízes tornar-se-ia corporativo e não representaria democraticamente os eleitores. Assim são escolhidos membros de fora da magistratura por quem? Pelos partidos políticos e por entidades de outros poderes políticos, como o presidente da República. 

Qual o resultado disto? A maioria dos membros que são escolhidos para a composição maioritária do CSM provém de indicações partidárias e por isso com a mesma raiz que a que designou a chefia do Ministério Público, mormente os poderes políticos maioritários no momento. 

Como neste caso concreto de Portugal o poder político que é maioritário ou tem influência decisiva e maioritária pertence apenas a um partido, a independência quer do MºPº quer do poder judicial encontra-se gravemente comprometida. E isso atenta contra o Estado de Direito. 

Por isso estas duas páginas do CM de hoje mostram a gravidade do problema exposto e que a maioria das pessoas não se apercebe: 



Porque é que isto é assim e não poderia ser de outro modo? 

No caso das escolhas dos procuradores-coordenadores das comarcas, no MºPº quem procedeu a tal escolha concreta foram duas personalidades do PS, o advogado Magalhães e Silva, fundador do partido e uma jurista que é afecta ao mesmo partido, tendo ainda um outro elemento do MºPº que é notoriamente de esquerda e isso é importante para se entender o contexto ( e só por isso, uma vez que se admite que tal elemento tenha sido ultrapassado pela maioria formada...) . Apesar de ter sido o CSMP a aprovar tais escolhas, aliás com vários votos contrários, o que não deixa de ser significativo, a verdade é que quem escolheu de facto foram aqueles elementos, com destaque para o tal Magalhães e Silva, advogado e raposa velha neste galinheiro político, habituadíssimo a estas subtilezas e presença assídua nas tv´s para os explicar a seguir em conformidade e sem contraditório. 

Magalhães é Silva é por isso o homem de mão deste poder político, no MºPº e actua impunemente quando fala de processos pendentes, coisa que lhe está estatutariamente vedada mas para a qual se está a c. como o colega de partido que toda a gente conhece, como se tendo borrado de medo num certo processo. 

Por estas e por outras este advogado do poder político que está quer que os conselhos superiores sejam todos constituídos por gente da sua igualha e não por magistrados que para ele são sempre corporativos. Ele não é...e até é o modelo da independência e isenção. Enfim.

Partindo daqui, os responsáveis pelos departamentos mais importantes do MºPº, actualmente o DCIAP e os DIAPS e a Coordenação das 24  comarcas, são alvo da atenção inevitável deste poder político, como se tem visto ultimamente. Tal resultou na escolha partidária da PGR; na indicação de um magistrado para o DCIAP consentâneo com tal escolha e agora na escolha de certos magistrados para coordenadores em detrimento de outros. Se fosse apenas um caso isolado ainda poderia dar para esconder o desiderato, mas não, são vários e todos no mesmo sentido. Logo, o que parece, deve mesmo ser. 

Quanto ao TCIC torna-se igualmente evidente a actual opção daquele CSM maioritariamente político e com juízes em alguns casos mais papistas políticos do que os papas dos partidos existentes: escorraçar quanto antes quem os fustigou e voltará a fazê-lo se lhe for permitido porque tem como função aplicar a lei e o direito e sem olhar a quem, porque todos são iguais perante a lei. Como este juiz não conhece a raison d´État nem garante administrativamente impunidades como gostariam que fizesse, tornou-se persona non grata deste poder político que- repito- é apenas um: o do PS. A maior coutada do PS não é na Maçonaria, coisa para jogos florais e exercícios práticos de nepotismos vários; é no poder judicial e judiciário a que se votaram ao assalto, despudoradamente e à vista de todos. Nem antes de 25 de Abril de 1974 havia tão pouca vergonha.

O CSM não legisla mas vai propor legislação ou "medidas" a quem de direito, coisa extraordinária mas que neste contexto de analfabetismo mediático é apresentado como normalíssimo. E como tem maioria política com fome idêntica à vontade de comer de tal poder político, iremos ver concretizado o desiderato que se propuseram há muito tempo: afastar o juiz Carlos Alexandre de processos incómodos para tal poder. 

É isto a democracia e a divisão de poderes e a igualdade de todos os cidadãos perante a lei e a independência dos tribunais? 

Em Portugal é assim. 


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