"Nunca aparece um nome ou a descrição exacta ( com data a
pormenores) da "corrupção" que tanto se apregoa e retrospectivamente se
lamenta", escreve Vasco Pulido Valente na crónica de hoje, no Público.
VPV
fala em "corrupção" que se apregoa no caso do BES e
"retrospectivamente se lamenta". Mas...que corrupção será essa?
Enumera antes os corpos de delito: " O BES foi o banco do regime";
"existia uma promiscuidade absoluta entre o poder económico e o poder
político"; "uma circulação permanente entre o pessoal do Governo e o
pessoal do BES"; "O BES fez negócios leoninos com o Estado, à nossa
custa" "Ricardo Salgado encorajou os desvarios despesistas de Sócrates".
Há corrupção nestas andanças? E será passível de punição criminal?
Crime, em sentido estrito e legalmente simplista será toda e qualquer infracção prevista e declarada punível pelas leis penais.
Portanto,
em primeiro lugar teremos que analisar se qualquer uma daquelas
actuações de alguém integra qualquer infracção a alguma lei. Um banco
ser banco de um regime constitui alguma infracção legal? Não me parece. E
muito menos penal que a não considera de todo. A promiscuidade entre
pessoal político e dos bancos constitui infracção legal? Depende, mas
antes de chegar ao âmbito criminal, passa por outros, como os das
incompatibilidades, o que corta cerce a extensão à noção de crime. Os
negócios leoninos com o Estado serão crime? Depende mas há o direito
civil e o administrativo que os elimina do número dos crimes de
catálogo. E por aí fora.
Mas haverá mesmo crimes nestas actuações
concretas dos nomes de quem VPP procura saber a identidade? Provavelmente.
Há pessoas que participaram naqueles negócios e naqueles conúbios entre o
Estado e os bancos, mormente o BES que poderão ter pisado o risco legal
criminal. Basta pensar nas palavras " favor", "prenda", "vantagem
patrimonial" ou não em troca de algo.
O Código Penal cataloga assim esses crimes mais típicos e uma lei avulsa relativa a titulares de cargos políticos também os enumera com penas mais pesadas:
Artigo 16.º
Recebimento indevido de vantagem 1 - O titular de cargo político ou de
alto cargo público que, no exercício das suas funções ou por causa
delas, por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou
ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem
patrimonial ou não patrimonial, que não lhe seja devida, é punido com
pena de prisão de 1 a 5 anos.
2 - Quem, por si ou por interposta
pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a
titular de cargo político ou alto cargo público, ou a terceiro por
indicação ou conhecimento deste, vantagem patrimonial ou não patrimonial
que não lhe seja devida, no exercício das suas funções ou por causa
delas, é punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até
600 dias.
3 - Excluem-se dos números anteriores as condutas socialmente adequadas e conformes aos usos e costumes.
Artigo 17.º
Corrupção passiva 1 - O titular de cargo político ou de alto cargo
público que no exercício das suas funções ou por causa delas, por si ou
por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar
ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não
patrimonial, ou a sua promessa, para a prática de um qualquer acto ou
omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela
solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.
2 - Se o ato ou omissão não forem contrários aos deveres do cargo e
vantagem não lhe for devida, o titular de cargo político ou de alto
cargo público é punido com pena de prisão de 2 a 5 anos.
Artigo 23.º
Participação económica em negócio
1 - O titular de cargo político que, com intenção de obter para si ou
para terceiro participação económica ilícita, lesar em negócio jurídico
os interesses patrimoniais que, no todo ou em parte, lhe cumpra, em
razão das suas funções, administrar, fiscalizar, defender ou realizar
será punido com prisão até cinco anos e multa de 50 a 100 dias.
2 -
O titular de cargo político que, por qualquer forma, receber vantagem
patrimonial por efeito de um acto jurídico-civil relativo a interesses
de que tenha, por força das suas funções, no momento do acto, total ou
parcialmente, a disposição, a administração ou a fiscalização, ainda que
sem os lesar, será punido com multa de 50 a 150 dias.
3 - A pena
prevista no número anterior é também aplicável ao titular de cargo
político que receber, por qualquer forma, vantagem económica por efeito
de cobrança, arrecadação, liquidação ou pagamento de que, em razão das
suas funções, total ou parcialmente, esteja encarregado de ordenar ou
fazer, posto que se não verifique prejuízo económico para a Fazenda
Pública ou para os interesses que assim efectiva.
Estes
crimes estão catalogados no Código Penal e em legislação avulsa e os
factos que os integram têm que ser investigados e comprovados em
julgamento, segundo as regras processuais penais que temos. Parece
consensual dizer que estas leis se ajustam a uma impunidade reinante na
vida pública portuguesa de tal modo que se torna possível dizer que em
Portugal os fenómenos de corrupção são residuais. Já o disseram o antigo
PGR Pinto Monteiro e directores do DCIAP . E fazem-no com o
conhecimento de causa da inexistência de processos penais relativos a
factos deste tipo.
Portanto, se não é possível ou se
torna extremamente difícil e com resultados quase nulos, combater a
corrupção catalogada como é que será possível combater a que nem sequer
vem no catálogo e VPV enumera?
Não me parece que haja
grandes hipóteses de sucesso. Por outro lado, o jacobinismo republicano
vigente serve às mil-maravilhas para denegar o sentimento geral de
impunidade relativa à "corrupção". O jacobinismo, neste aspecto é deletério e em nome de ideias de Liberdade. Imagine-se!
Fazendo corresponder a ética à
lei, numa tergiversação diabólica, safa quase todos os aspectos mais
escandalosos da actuação que parecendo, só pode ser, como antigamente
alguém ( Salazar) dizia.
Foram os socialistas jacobinos quem descrobiu o truque, mas é usado por todos os interessados.
Daí
a impunidade vigente e a prosápia de culpados excelentíssimos que por
não terem sido julgados são eternamente inocentes do que toda a gente
pressente como crimes de corrupção, até de catálogo. Tal como VPV que agora quer,
ingenuamente, que lhe apresentem "nomes".
Nomes de
quem? Dos que se integraram neste esquema legal e jacobino que exime da
prática de crime quem não viola em modo flagrante as leis penais? Dos
que nunca cometem crimes puníveis pela lei penal e que passeiam a
corrupção sistémica como uma albarda de luxo carregada de pedras preciosas?
Dou-lhe
um que não é nem pode ser o de um criminoso, a priori. É o de um
profissional do sistema. Se o que faz é corrupção? Não sei e seria
incapaz de lhe imputar qualquer malfeitoria penal. Mas imputo-lhe a
proximidade permanente ao poder político e económico, de há mais de 40
anos a esta parte. E por isso será provavelmente a pessoa que em
Portugal está melhor colocada para responder às perguntas de VPV sobre
"os nomes" desta rosa encarnada em tons laranja.
Deveria
o mesmo servir de bode expiatório desta choldra? Nem tanto. Se tem
poder, foi porque lho permitiram e é apenas um dos maiores serventuários do
sistema, o que, repito, não é crime. Mas é outra coisa: o sinal de que
este regime apodreceu socialmente pela cabeça, como sempre.
Até sobre o caso BES o mesmo indivíduo poderia esclarecer muita coisa. Se quisesse. Ou pudesse...
Para resolver este problema e limpar este clima é preciso refundar um país. E não creio ser possível
fazê-lo numa geração. Salazar conseguiu qualquer coisa, mas bastaram alguns meses em 1974 para voltar tudo ao mesmo.
Assim,
vamo-nos entretendo com Isaltinos que tiveram a desdita de cair no
catálogo enquanto outros, bem mais aleivosos, sairam do catálogo, com
leis à medida. Feitas por quem e sob pressão de quem?
Isso seria
entrar no catálogo, mas ninguém no DCIAP está disposto a tal tarefa.
Preferem coleccionar informação inútil que não passam a ninguém e
morrerá com ele(s).
Não percebem o que há anos está em jogo na
nossa pátria que é de todos e não apenas dessa gente que se aproveitou à
grande e à francesa de um regime permissivo. Temos há longos anos,
perante todos e à vista de quem quer ver, um fenómeno que nos pode
destruir: a corrupção moral. Impunível por catálogo, mas que é a pior de
todas, porque leva à anomia, ao sentimento de impunidade geral. E no
entanto, poderia ser
revertida com a investigação profícua dos temas do catálogo.
Precisamos de outro MºPº? Provavelmente.
8 comentários:
Mais um bug de risca amarela?
Não. Foi um link que ficou pendurado e não consigo tirar.
ah é? mais uma vez
ehehehe
Mas já está.
Boa!
Sem uma polícia dedicada e sem tribunal plenário tudo como dantes, quartel general em Abrantes...
Não percebem o que há anos está em jogo na nossa pátria que é de todos e não apenas dessa gente que se aproveitou à grande e à francesa de um regime permissivo.
Essa gente não tem pátria. Não precisam disso. É como suspensórios: já não se usa.
Precisam, isso sim, é de fazer pela vidinha. Para o resto há a "seleção".
Enquanto se discutir Portugal, não há solução.
Para uns, cumpre-se a lei, para outros, interpreta-se a lei.
Assim " ad infitum "
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