quinta-feira, novembro 30, 2017

Un certain regard...

Sábado de ontem. A crónica de Pacheco Pereira sobre as cheias de 1967 apontam no sentido do costume: os estudantes universitários, filhos de família, católicos de tradição aliados a extremistas da esquerda, acabados de descobrir a Revolução apesar da Censura, foram ajudar os desalojados das cheias e descobriram o Portugal paupérrimo que não conheciam antes: "aquele País de mortos por contar, aquele País de vivos miseráveis, aquele país que deliberadamente se tentou esconder por todos os meios"...

O articulista disse "eu vi". Viu o quê, afinal?



Há no mesmo número da revista quem tenha visto outra coisa e morava perto do sítio das cheias. Nuno Rogeiro sobre as mesmas cheias de 1967:


Nuno Rogeiro é filho de Clemente Rogeiro que foi ministro de Marcelle Caetano.

Pacheco Pereira é filho de alguém da classe média do Porto.

O percurso pessoal, político e intelectual de ambos não difere no essencial: fazem parte da elite nacional dos educados no regime anterior com estudos universitários.

Sobre as cheias de 1967 têm visões diametralmente opostas. Quando Pacheco diz "eu vi", será retórica. Viu a partir do Porto. Quando Rogeiro escreve sobre o que viu percebe-se que viu mesmo o que descreve.

A quem se deve comprar um carro em segunda mão? Ao primeiro ou ao segundo?

A pergunta é apenas retórica porque Pacheco não é de confiança no que relata.

Para memória futura, o anúncio da 4ª bancarrota em menos de 45 anos...

Fica aqui o anúncio da próxima bancarrota, feito por um antigo governante socialista que sabe do que fala e prevê a fatalidade como se fosse matemática:

Daniel Bessa ouviu ontem, quarta-feira, Manuel Caldeira Cabral a congratular-se pelo facto de as empresas privadas estarem a investir mais 15% este ano. Reacção de Bessa sobre as palavras do homem que ocupa, no governo de Costa, o mesmo cargo que ocupou no governo de Guterres: “partindo do ponto a que chegou, se está a subir 15% continua igual“, atira Daniel Bessa. O ex-ministro da Economia e director-geral da COTEC defende que as políticas públicas devem estimular este investimento das empresas — que devem investir “se quiserem, ninguém os pode obrigar” — e avisa o Governo que estimular a economia pela via do consumo “é um erro“, porque há um “longo prazo” que não se pode negligenciar. Qual é o risco? “Nem a moeda única nos salvará de um quarto resgate“.
Bessa reconhece que “há um curto prazo e um longo prazo”, ou seja, não discorda de que a economia tenha necessitado de certos estímulos no curto prazo. “Mas não sei — tenho muitas reservas — que ainda possamos dizer que ainda estejamos a trabalhar no curto prazo“.

Todas as bancarrotas dos últimos 40 anos ocorreram sob a égide da esquerda socialista.

Ainda assim, o PS é o partido com maior número de votantes, para já e no passado. Uma conclusão se impõe: é possível afinal enganar muita gente o tempo todo.

Como? A velha receita: com papas e bolos...e um apelo aos pobrezinhos como aqueles que se defendem sempre, dos ricos e exploradores. Este discurso pega sempre. Sempre.

quarta-feira, novembro 29, 2017

Belmiro de Azevedo e José Sócrates: a tragédia anunciada em 2011 que vinha de 2007...

 Sobre a morte de Belmiro de Azevedo, duas frases:

PCP votou contra o voto de pesar pela morte de Belmiro de Azevedo.

Percebe-se o porquê do voto contra do PCP, com estas frases de Belmiro de Azevedo:

 “Não temos dinheiro para todos os grandes projectos previstos em Portugal e quem não tem dinheiro não tem vícios”. 

 Às vezes dizem que sou exigente, mas só sou exigente para os mandriões
 



Belmiro de Azevedo em 2011, na véspera do pedido de ajuda ao FMI, efectuado pelo governo de José Sócrates, deu uma entrevista à RTP1, com Fátima Campos Ferreira a fazer perguntas. Tal entrevista foi repristinada pela RTP1 hoje à noite.

Sobre o que aconteceu ao país nessa altura, resumiu tudo numa palavra: incompetência. Sobre o que tinha acontecido à SONAE no caso da OPA Belmiro de Azevedo disse então que o primeiro-ministro, grande incompetente, tinha prejudicado o grupo empresarial por ser o chefe de um grupo de interesses.

"não tenho nenhuma confiança no pm Sócrates do ponto de vista da competência e do ponto de vista ético prejudicou a SONAE e tenho esperança que um dia se venha a saber o que aconteceu", disse então.

Algum tempo depois, em 10 de Outubro de 2014 escrevi aqui, assim a propósito de outra entrevista de Belmiro: Belmiro queria comprar a PT. Sócrates, Salgado e Bava não deixaram. Como se averiguou durante a operação Marquês, foi isso que sucedeu e qual foi o processo. Belmiro foi vingado? Veremos, porque já sabemos que foi assim:

"A história da PT há de ser devidamente contada, mas não é por mim, é pelos jornalistas. Se eu nunca disse o que se passou, não é agora que vou dizer, quando os jornalistas têm matéria mais do que suficiente para pegar na história", declarou, à margem do III Congresso das Indústrias de Base Florestal (AIFF).
Entre 2006 e 2007, o antigo homem forte da PT, Zeinal Bava, destacou-se na oposição à Oferta Pública de Aquisição (OPA) lançada pela Sonaecom, arregimentando acionistas e contribuindo para o insucesso da operação. 
Afirmando ironicamente que foi sempre derrotado e sempre ganhou dinheiro, Belmiro de Azevedo recordou que a Sonaecom cumpriu, na altura da OPA, várias condições que lhe foram exigidas e perdeu "por causa de uma coisa" inventada à última hora. 
"Naquela altura, houve uma alteração muito importante, inventou-se uma nova coisa que não estava prevista", destacou. 
No início de março de 2007, após um processo que durou mais de um ano, a maioria dos acionistas da Portugal Telecom votou contra a desblindagem dos estatutos da empresa, fazendo cair a OPA, já que esta era uma condição essencial para a continuação da oferta 
Na noite de terça-feira, a operadora brasileira de telecomunicações Oi anunciou ao mercado que Zeinal Bava, um dos rostos do processo de fusão entre a PT e a Oi, tinha pedido a demissão da presidência da empresa brasileira. 
Zeinal Bava tinha assumido a presidência da Oi em junho de 2013, quatro meses antes do anúncio da fusão das duas operadoras. 
O gestor sai do cargo ainda no rescaldo das aplicações financeiras da PT na Rioforte e numa altura em que existem notícias de que o grupo francês Altice está interessado na compra dos ativos da operadora portuguesa, que atualmente estão incorporados na Oi.  

Em 2006, em plena euforia do governo de José Sócrates, Belmiro oferecia pelas acções da PT qualquer coisa como 11 mil milhões de euros. Ficava em Portugal, apesar da Telefónica espanhola acompanhar o "ticket". Hoje, a PT vale um chavo. De quem a culpa directa? Três nomes: José Sócrates, Ricardo Salgado e Zeinal Bava.
Quem vai pagar a conta? O povo português, como de costume. O BPN ao pé disto é uma brincadeira de putos.
 

Vital Moreira nunca foi esquerdista...

Observador:

Vital Moreira considera que aplicar a contribuição especial de energia ao sector das renováveis — como o PS e o Bloco de Esquerda acordaram, mas que não consta do Orçamento do Estado para 2018 por decisão dos socialistas — seria uma medida de “enorme imprudência política”. No seu blogue Causa Nossa, o constitucionalista e ex-eurodeputado pelo PS acusa o BE de agir por “irresponsável radicalismo anti-negócios”. Mas também deixa críticas ao PS: “Afinal, o esquerdismo pega-se ‘por contacto’!…”

Vital Moreira nunca foi esquerdista e por isso tem toda a autoridade moral para falar de cátedra dos negócios e das empresas privadas, capitalistas.

Esta foto de 1979 é de um tempo em que a esquerda radical era rainha e Vital Moreira, adulto e já professor assistente na faculdade de Direito de Coimbra, co-anotador da CRP publicada em 1976, para a qual contribuiu com um preâmbulo de arromba ( Portugal era um país a caminho da sociedade sem classes) era muito ingénuo e ignorava de todo em todo o que os verdadeiros esquerdistas pretendiam para o país.
Ignorava mesmo o que se passava na União Soviética e países de Leste, porque só dali a dez anos descobriria o logro.
Coitado de Vital Moreira que tarde e a más horas lá percebeu a realidade circundante do pensamento político e geopolítico. Mas, enfim, um enganado deste calibre, descobriu a luz redentora que vinha dos lados do PS e agora é todo da esquerda moderada da social-democracia que execrava nesse tempo.
Há pessoas assim: mudam de camisa como quem muda de ideologia. Ou o contrário, continuando com a mesma credibilidade de sempre porque só os burros nunca mudam, a não ser a duração da zurraria.

Como agora se pode ler, Vital, agora quer uma coisa radicalmente diversa daquela que então queria e vitupera o radicalismo esquerdista que na altura era o pão e vinho sobre a mesa comunista em que se assentava mancomunado com esse radicalismo que entendia como a solução para os problemas do país e defendia com o mesmo denodo com que agora defende...o contrário.

Ao menos outro comensal da mesma confraria, Jerónimo de nome, Sousa de apelido,  continua o afinador de sempre, coerente como só os asnos podem ser e Vital já não é, por opção tardia.

Jerónimo, dantes afinava máquinas, agora afina tácticas e estratégias, coisa semelhante, como se sabe.



Vital é assim o maior desta cantareira! Da sem vergonhice nacional, entenda-se...



terça-feira, novembro 28, 2017

A comissão nacional de protecção política

Este artigo de Xavier Viegas no Público de hoje é a denúncia e uma censura, operada pela CNPD à parte mais importante do relatório elaborado sobre o incêndio de Pedrógão Grande sob a capa da protecção de dados pessoais das vítimas.

Para além de uma explicação, para tal actuação insólita, nas profundezas da mente jacobina ( que interpreta as leis segundo um espírito retorcido, emprestando-lhe uma objectividade aparente e restrita, sempre moldada àquele espírito)  poderá existir outra mais prosaica mas não menos perversa: protecção de políticos que são quem tem o poder de nomeação dos cargos para estas comissões.

A justificação para a ocultação de nomes e circunstâncias pessoais das vítimas dos incêndios, aparentemente integra o elenco dos dados pessoais protegidos. Porém, a própria lei prevê a derrogação desse princípio geral em casos particulares e justificados, como sejam os de interesse público na respectiva divulgação ou da autorização. Esta nem sequer tem de ser manifestamente expressa pelo que poderá mesmo ser tácita, pois a lei fala em consentimento de forma inequívoca, o que permite tal entendimento e acontecerá no caso de já ter sido dado anteriormente, como aconteceu no caso concreto: há relatos públicos com tais dados e sem oposição seja de quem for, mormente dos próprios. A atitude da CNPD neste caso é a do jacobinismo puro em pretender ser mais papista que o papa.
Expurgar os nomes e circunstâncias em que as pessoas que morreram na EN-236-1 significa censurar factos que são desagradáveis, não para as vítimas mas para quem tinha obrigação estrita e legal de as proteger, maxime, o Governo.
Quem interpreta a lei de modo restritivo e maximalista, ocultando tais factos sob o pretexto legalmente previsto de não divulgação de dados pessoais, que  justificação poderá encontrar e que juízo pode esperar?  Um deles, sem dúvida alguma é a de favorecimento das pessoas que na política os nomearam ou podem nomear.

Seja como for,  a censura operada foge dos critérios comuns da sensatez, da razoabilidade e da adequação, mesmo olhando friamente para a lei que a justificou. É por isso uma decisão celerada, a da CNPD, sobre este caso.

A denúncia de Xavier Viegas é muito suave mas a firmeza da mesma não deixa lugar a dúvidas sobre a eventualidade dos propósitos ínvios da CNPD que lhe retiram legitimidade e decência e deveriam obrigar por isso mesmo a demissões, como medida de saneamente básico:






segunda-feira, novembro 27, 2017

Todos muito lá de casa, da RTP

 Vem aí um programa de tv ( na RTP) com Miguel Esteve Cardoso e um tal Bruno Nogueira. agora muito lá da casa televisiva e seguidor assertivo do pensamento único, razão pela qual integra quadros publicitários de imbecilidade estudada e enche os bolsos a preceito .

O Observador apresenta assim:

Como instigador da ideia, Bruno Nogueira entra em casa de Miguel Esteves Cardoso como um realizador que vai filmar as suas conversas. Um pouco à maneira de “Som de Cristal”, uma espécie de pequeno artifício para tornar o início da conversa mais apelativa para o telespectador. Mas do que se fala em “Fugiram de Casa de Seus Pais”? Dos mais variados temas. A conversa é sobre nada, só que, ao contrário de “Seinfeld”, não é treinada, não é escrita: “É descer à condição de humano e falar. A conversa de ocasião é um tipo de conversa muito valioso, porque falas para passar o tempo, até falas sobre o tempo ou sobre as tuas desilusões. Tudo isso surge naturalmente”, diz Miguel Esteves Cardoso.

E os convidados? “Eram pessoas que sabíamos que tinham coisas interessantes para dizer, pessoas que conhecíamos ou que admirávamos e que sabia que iriam fazer a conversa andar. Não queríamos pessoas chatas.” Gisela João, Nuno Markl, Rodrigo Guedes de Carvalho, Capicua, José Avillez, Zé Pedro Gomes, Rita Blanco, Ricardo Ribeiro, Ana Bola, Mário Laginha, Júlia Pinheiro e Miguel Guilherme são os ilustres que tiveram carta branca para entrar nestas conversas.

Pela aragem se prevê quem irá na carruagem: o pensamento único do costume, replicado nas ideias destas pessoas cuja originalidade já se estafou vezes sem conta nas tv´s que temos. São sempre os mesmos e portanto a mesmíssima conversa será o menu do programa.

Há temas que virão à baila das conversas desgarradas: sobre política, o passos, pá, que desgraça, ainda bem que a esquerda se entendeu em exercício de paralelas assimétricas, pá, o fascismo já foi há mais de 40 anos mas ainda há por aí fascistas, alguns em blogs, redes sociais, comentários chungas, maledicência e difamação, uma vergonha pá, mas o 25 de Abril, sim, sempre, senão nem teríamos liberdade para estar aqui a dizer isto. O PC? Um partido da democracia, essencial e que só os fascistas não entendem, a repressão, a censura, a pobreza e miséria que havia dantes, pá! Um analfabetismo inadmissível, o Salazar, pá, não queria que as pessoas soubessem ler e escrever, só o mínimo para tirarem a carta de condução, pá. Se não fosse o 25 de Abril, pá, a guerra colonial era uma tragédia, morriam como tordos e os africanos tinham direito a serem independentes, pá.
Na Palestina também? Ah, isso é que já não é bem assim...pá. Mas isso não interessa nada para a conversa, pá. E a Justiça, pá? Já viste o tempo que demora um processo? Alguém tem que pôr cobro a isso que os juízes são como aquele gajo do Porto, o do adultério e da Bíblia, que vergonha. E o Sócrates? Ó pá, não gosto de dar pontapés em cães mortos, mas o gajo não é cão, mas gato e já provou que pode ter sete vidas. Além disso, foi um bom governante, no início, um tipo determinado e se não fosse o PEC IV, pá, chumbado pelo Passos,  tínhamo-nos safado. O Salgado? Ó pá, esse, é o problema da banca, como o Oliveira e Costa do BPN, sim o BPN essa vergonha nacional. E o Santos Ferreira? Quem? Esse não conheço. Bem, bota lá mais uma caipirinha...e um pastel de Vouzela, diz que em Viana há boas bolas de berlim...já lá foste?

Para este peditório em perspectiva,  deve haver muito acompanhante de reality show a bater palmas gravadas. Por mim, nunca dei e não vai ser agora que darei.

Um completo falhanço em perspectiva, temo. Miguel Esteve Cardoso perdeu o "toque" há décadas. Porque é que estes programas têm agora assento na tv? Pela simples razão que os manda-chuvas na programação  são idiossincraticamente similares aos convidados previsíveis. E são giros estes programas, pá! Os americanos fizeram uma coisa parecida e nós gostamos de imitar, por isso bora lá!

O programa poderia chamar-se "todos lá de casa". Ninguém fugiu da casa dos pais nem tal se revela politicamente correcto nos dias que correm. Se tal acontecesse haveria directos da CMTV em busca dos fugitivos.
Porém, apesar deste cepticismo temperado, deve esperar-se para ver.

domingo, novembro 26, 2017

Um testemunho directo contra a mentira actual do pensamento único

Daqui:

Há precisamente 50 anos, também um sábado, mais ou menos por esta hora (17h00) , caía em Lisboa a popularmente chamada chuva "molha tolos". Persistente num cenário cinzento e normal naquela época do ano. Horas mais tarde, quando me dirigia para o pavilhão desportivo do Campo de Ourique para assistir aos jogos de andebol do campeonato regional da I divisão, já as bátegas eram bastante mais fortes mas ainda longe de algo de anormal. Entrei no pavilhão para junto da claque do Passos Manuel (o liceu tinha equipas de andebol que disputavam as provas oficiais da associação e da federação) e vibrámos com o encontro e o apoiámos fervorosamente o nosso ALPA. 
Findos os jogos da jornada já para lá da meia-noite, eu e uns amigos fomos até uma casa de petiscos perto do pavilhão, "Os Passarinhos", e quando de lá saímos "molhados" com umas canecas de cerveja e uns "piú-piús lá para as 02h00 da madrugada o céu abria-se em cascata e as ruas eram leitos caudalosos que as sargetas não conseguiam sugar e absorver. A corrente intensa da Rua João XXI  desaguava no Largo do Rato com violência e daí seguia impetuosa pela Rua de S.Bento. 
Chegados ao Jardim do Príncipe Real, o temporal dispersou-nos e cada um seguiu para sua casa. Já na cama, no último andar de um prédio na Rua Eduardo Coelho, ouvia a chuvada bater com estrondo nas telhas e nas vidraças das janelas. Ao almoço, recordo-me de umas vagas referências a inundações, mas à tarde saí para ir jogar matraquilhos e bilhar para o Jardim Cinema e não me recordo de grandes comentários às cheias que por essa altura já tinham ceifado a vida a centenas de pessoas. 
Só me apercebi verdadeiramente da dimensão da tragédia na segunda-feira, no Liceu Passos Manuel, onde a rotina das aulas se alterara em função da mortandade na zona da capital. O reitor, professores, alunos e contínuos contavam as suas experiências pessoais abertamente, sem receios dos "bufos" da PIDE que por lá existiam, e que nós sabíamos quem eram, mas não ligávamos muito a esses personagens porque o Liceu Passos Manuel era bastante rebelde no seu comportamento perante as autoridades e tanto andavamos à pedrada com a PSP  no largo anexo à igreja das Mercês como assobiavamos os veículos da GNR que atravessavam a rua em frente ao edifício escolar para entrarem nas traseiras do quartel dos Paulistas. 
Não sei de quem partiu a iniciativa, mas muito rapidamente os professores começaram a solicitar aos alunos voluntários para irem ajudar as autoridades nas zonas afectadas pelas cheias. Penso que quase toda a rapaziada com mais de 14 anos alinhou imediatamente nessa tarefa. Eu tinha, nessa época, 16 anos e fui com o meu grande amigo (precocemente falecido) Castanheira para Algés, onde deparámos com um cenário dantesco. Água, lama, destroços até ao primeiro andar dos prédios na rua da linha dos eléctricos e na avenida marginal. Chafurdámos por ali durante dias em caves imundas, recolhendo animais mortos e ajudando a carregar vítimas embrulhadas em cobertores enlameados para viaturas que seguiam para a morgue do Instituto de Medicina Legal. Por volta do meio-dia apareciam umas senhoras que nos davam uma sandes de "qualquer coisa" e uma gasosa. 
Mais que o silêncio dos mortos incomodava-nos, sobretudo, o pranto do vivos sobreviventes ou os rostos sem expressáo de quem ficara vazio de bens e sentimentos.  
Leio agora, passados todos estes anos, que as autoridades abandonaram as vítimas e quiseram esconder a "maior tragédia em Lisboa desde o terramoto de 1755". É mentira! Eu vi polícias, guardas republicanos, bombeiros, médicos, enfermeiros, soldados, empregados da Carris, da CP, dos CTT, estudantes, professores, anónimos, todos unidos para livrar a zona de Lisboa daquele armagedão inesperado. 
É óbvio que existia a Censura, como existe em todos os países que estão em guerra e Portugal combatia no Ultramar, mas, mesmo com o lápis azul o "Diário de Lisboa" titulava, como se pode ver na foto acima, "centenas de mortos". Muitas zonas da cidade eram precárias. É verdade. Mas o maior bairro de lata da Europa situava-se em Paris, na democrática e evoluída França, e era habitado por centenas de milhar de ... portugueses. 
Como poderia Salazar esconder do Povo semelhante tragédia se este mesmo Povo fazia excursões aos milhares para visitarem as zonas atingidas pelo temporal mortífero. Satisfaziam a curiosidade mas não ajudavam. Nem uma pedrinha afastavam do caminho. Esconder as cheias de 1967 era como os americanos esconderem o ataque às torres gémeas, em Nova Iorque. Impossível.
E naquele tempo não havia o SIRESP nem a imensa frota de veículos dos bombeiros como a que combateu os fogos de Pedrógão Grande, em Junho, ou de todo o centro do país, em Outubro, com os trágicos resultados que se conhecem. Não houve, então, um Presidente da República que, entre lágrimas, beijos e abraços mentiu aos portugueses, referindo que "foi feito tudo o que se podia fazer", houve, sim, um Presidente da República que visitou, de cara fechada, todas as zonas alagadas. Era almirante e chamava-se Thomaz. 
E neste disputa ditadura-democracia em tempos de luto nacional parece que a "censura da liberdade" recusa-se a tornar público o capítulo VI do Relatório dos Incêndios de Pedrógão Grande. Porque será?

O atentado de Helena Matos ao pensamento único...

Helena Matos, no Observador acaba de cometer um atentado grave contra o pensamento único em Portugal.
Veremos o que lhe irá suceder com as ideias subversivas que propaga e qual vai ser o efeito da Censura actual relativamente às mesmas. Dantes, no tempo de Salazar sabemos que não poderiam ser expostas claramente e então os comunistas dos jornais faziam-no à socapa e à espera de a Censura os não topar como aconteceu algumas vezes. Mas escreviam na mesma, mantendo os empregos. Agora não é assim. Quem não se enfileira no pensamento único é ostracizado e perde o emprego. Os exemplos já são muitos...

O texto de Helena Matos é este, mas os comentários também valem a pena ser lidos...

Os incêndios de 2017 foram provavelmente a primeira tragédia em que os portugueses se viram livres de Salazar. E esse vazio causou-nos uma espécie de desconcerto: como era possível acontecer-nos algo de tão medonho, tão cruel e dramático sem termos ali à mão aquela muleta do salazarismo, do Salazar que quis ou não quis, que fez ou não fez, que conseguiu ou não conseguiu?

Na verdade o estereótipo do taxista que perante o trânsito caótico da capital invocava a falta de “um Salazar” (que por sinal não tinha carta de condução) tem o seu reverso no Salazar omnipresente das elites. Tragédias, deficiências do sistema de ensino e de saúde, carências na habitação, costumes que se pretendem alterar tudo remontava a uma vontade de Salazar que a democracia ainda não tivera tempo para resolver.

Esta salarização das nossas vidas levou a tragédias como a acontecida com a fuga dos portugueses de África, subestimada e ignorada durante meses porque aqueles que a referiam caíam logo no espectro do salazarismo. Levou também a ficções como a de uma I República feminista versus um Estado Novo que excluiu as mulheres da vida política. E produz anedotas como a do fado-futebol que de símbolos do salazarismo bafiento, passaram a representar o Portugal moderno e progressista do século XXI.

A ditadura salazarista, como todas as ditaduras, cultivou a desresponsabilização do povo: o governo dava, o governo fazia, o governo sabia. Para nossa desgraça a democracia não só não mudou este paradigma da desresponsabilização de cada um de nós como até lhe acrescentou dois outros pilares: o primeiro passa pela identificação entre a bondade dos governantes e aquilo que eles “dão” – Salazar não dava porque era mau e atrasado, nós damos porque somos bons e modernos; o segundo é personificado pela figura do morto sempre presente quando algo corre mal – tragédias, erros, questões de época… tudo leva invariavelmente a Salazar. Ou levava pois, como descobrimos perante os corpos carbonizados pelos incêndios deste ano de 2017, já não faz qualquer sentido invocar Salazar para explicar os nossos falhanços.

Esta constatação tornou-se ainda mais perturbante porque ao mesmo tempo que se procede ao balanço dos incêndios se assinalam cinquenta anos sobre as cheias de 1967.

Invariavelmente apresentadas como um momento de falhanço do regime de então – e são-no de facto – as cheias de 1967 tornaram-se uma espécie de corpo bizarro e incómodo neste ano de 2017 marcado por outra tragédia: afinal os desastres acontecem independentemente da natureza dos regimes e, o que de modo algum esperávamos que viesse a repetir-se, o falhanço das respostas e do socorro imediato aconteceram de novo.

Em 2017, tal como em 1967, quando os portugueses mais precisavam do seu Estado descobriram-no ausente. O que sobrava então: Salazar. Tinha de ser. Sem Salazar tudo era demasiado parecido. E assim Salazar voltou aos títulos. Para todos os efeitos as cheias de 1967 tornaram-se na tragédia que Salazar quis esconder. A imagem é poderosa mas falsa. Porque a tragédia foi mostrada. Na noite de 25 para 26 de Novembro de 1967 e nos dias seguintes, a censura foi claramente ultrapassada pelas circunstâncias: a censura era um exame prévio a notícias enviadas atempadamente para os censores. Perante a dimensão do acontecido nessa noite as redacções começaram a trabalhar a um ritmo frenético: os jornais fazem várias edições por dia. As tiragens com novas informações sucedem-se a um ritmo tal que se chega a escrever a hora a que aquela edição foi para a rua pois já outra se estava a preparar. Para mais as cheias aconteceram na zona de Lisboa – onde estavam as redacções – e não em Trás-os-Montes ou em Moçambique. E as vítimas e a destruição espalham-se por quilómetros. Quilómetros esses percorridos por jornalistas, repórteres e estudantes. Há câmaras de filmar, fotografar e gravadores. Ouvidos e olhos. Canetas e blocos de apontamentos. Que entram no que sobrou das casas, nos quartéis de bombeiros, nas morgues oficiais e improvisadas, nas urgências dos hospitais…

Certamente que o regime gostaria que a tragédia fosse relatada doutro modo (ou quiçá de modo algum) mas na verdade a censura não conseguiu impedir a torrente de informação quer sobre as cheias de 1967, quer sobre as condições de vida nos bairros de barracas que a água e a lama tinham destruído.

A forma quase mântrica como agora se refere a intervenção de Salazar no controlo da informação sobre as cheias de 1967 não trouxe um maior rigor na abordagem ao acontecido em Novembro de 1967 mas mostra à evidência como em 2017 gostaríamos de continuar a ter um papão a quem pudéssemos responsabilizar por tudo o que aconteceu e acontece. E assim como certamente teria agradado à censura da época continuam a ser praticamente ignorados os roubos e pilhagens que tiveram lugar após as cheias de 1967. Mais, a politicamente muito embaraçosa explosão do Forte do Carrascal caiu no esquecimento: na noite de 25 para 26 de Novembro a água entrou num dos paióis desse forte próximo de Linda-a-Velha que explode na manhã de 26. Não houve mortos mas milhares de pessoas entraram em pânico em Oeiras, Paço de Arcos, Algés… e abandonaram as suas casas. No dia seguinte voltarão a fugir porque há indícios de uma nova explosão. Na época os jornais limitaram-se a transcrever os comunicados militares e não deram mais que a versão oficial dos acontecimentos. As fotos são escassas. Os relatos dos fugitivos quase nenhuns. Meio século depois a explosão do Carrascal continua a ter muito para contar.

Igualmente mantém-se a tendência para tratar os números como um reflexo da nossa vontade e não um produto da realidade: os mortos das cheias de 1967 passaram de uns oficialmente subestimados 462 (no próprio dia em que esse número é dado a conhecer apareceram mais dois cadáveres) para um número redondo –700 – mais repetido do que fundamentado.

A catástrofe de 2017 passou finalmente a certidão de óbito a Salazar como argumento-desculpa para os problemas do presente. Mas subitamente desprovidos desse Salazar até agora omnipresente constatamos como as versões simplificadoras são más conselheiras.

Agarrada à caricatura do Salazar que mandava a censura cortar, a sociedade portuguesa continua a apreciar um jornalismo acomodado – “jornalismo de sarjeta” foi a expressão que se tornou quase consensual em 2007 para classificar os jornais que então revelavam alguns dos procedimentos de José Sócrates – e mostra-se perigosamente desatenta em relação à proliferação de poderes censórios entre entidades que ao contrário do poder político não são escrutinadas e não têm rosto como é, por exemplo, o caso da Comissão Nacional De Protecção De Dados que ao mesmo tempo que não levanta entraves à constituição da maior base de dados que Portugal já conheceu – a informação que as finanças detêm sobre nós a partir do e-factura – intervém na divulgação de relatórios como o dos incêndios de Pedrogão. E a lista dos maiores devedores da CGD que não podemos conhecer?

A isto junta-se o espírito do tempo em que tudo é assédio, violação da privacidade e infracção do direito a isto e àquilo que no limite leva a estas paradoxais perguntas: as fotografias das cheias que a censura cortou em 1967, como aconteceu com as dos funerais das crianças levadas pelos seus colegas de escola, seriam publicadas hoje? E as dos mortos que então foram publicadas sê-lo-iam hoje?

Este Salazar que mantemos vivo pode ser psicanaliticamente um caso interessante mas politicamente é um desastre. Os governantes que lhe sucederam, seja na ditadura ou na democracia, demoraram a habituar-se a não o invocar na hora de assumir responsabilidades e fazer opções difíceis.

Muita da nossa mediocridade, da nossa incapacidade de fazer reformas e do nosso constante adiar das escolhas difíceis passam precisamente por fazermos de conta que continua a tutelar o país e a determinar as nossas vidas esse homem enterrado há 47 anos no cemitério de Santa Comba Dão.

Quanto aos comentários respigo alguns, particularmente de um komentador que assina Carlos Quartel e outro que assina com pseudónimo Ética Nicómaco e que cita este blog. Nota-se que as pessoas não embarcam de modo acéfalo como fazem os jornalistas do costume, no embuste nacional e colectivo que pretendem impingir como informação:



Gostei particularmente da sua intervenção supra exarada. Afirmo-o por ser verdade e para que não considere que a minha presente intervenção tem como fito a mera contradição. De outro modo, por curiosidade, onde e quando frequentou a escola?
Dito isto, saliento que, por ironia,  os bairros de lata que no fim da década de 60 proliferaram na coroa envolvente de Lisboa e os bidonville dos subúrbios de Paris, dos quais ficou tristemente célebre o de Champigny-sur-Marne habitado designadamente por portugueses, tiveram como causa imediata a forte migração de rurais para as maiores cidades, fruto por sua vez, da prosperidade relativa que se fazia sentir nestas resultante do grande crescimento económico de 1960 / inícios de 70 (em Portugal, apesar de tudo o que indevidamente se diz da performance económica conseguida no consulado de Salazar e do Estado Novo em geral, as taxas de crescimento de 1961 a 1973 foram sucessivamente as seguintes: 3,58%, 10,53%, 3,84%, 6,05%, 9,41%, 4,55%, 4,15%, 5,07%, 2,43%, 8,47%, 10,49%, 10,38% e 4,92%, do que resulta a média de 6,45% / ano _ vide, PORDATA). Foram dores de crescimento, compare-se com as "loas e aleluias" dos anémicos crescimentos actuais!
 (...) 
Estou a falar de Ribatejo, anos 49/50.Era normal ver gente adulta  descalça, as raparigas traziam as tamancas na mão e só as calçavam à entrada da vila, depois de passarem os pés por água num fontenário. As pessoas comiam feijão com couve e bifes era coisa desconhecida.Uns bocados de toucinho ou fressura, batatas, uma galinha pelo Natal. Remendavam-se calças e camisas e remendos nos traseiros era imagem frequente.Mesmo a gente os escritórios virava os fatos e punha remendos nos cotovelos dos casacos.
A frieza dos números não chega.Voltamos ao frango para dois, onde um come 90% e o outro come uma pelintra asa....

(...)

a) Desde o séc. XIX até aos anos 60-70, em Portugal como em quase toda a Europa, houve uma afluência de pessoas vindas da província para as Capitais e grandes cidades, e havia bairros da lata em França, Inglaterra, e em quase todo o lado.

Portugal não era caso único.

b) Salazar mandou construir muitos bairros sociais, casas de renda limitada, etc. (o actual Bairro de Alvalade era quase todo habitação social, mais a Encarnação, os Olivais, Santa Cruz de Benfica, Alvito, etc., tem aqui uma lista parcial e mais informações:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Bairros_de_Lisboa

c) As zonas onde houve inundações mortais em 1967 eram zonas de baixios e leitos de cheias, onde nunca devia ter sido autorizada construção. Já em 1967 se falou nisso.

Mas acontece que a maior parte dessas construções não eram legais, e nem quem lá vivia, nem as autoridades, alguma vez imaginaram que essa catástrofe pudesse acontecer.

Exactamente como em Pedrógão!!!

Portanto, deixem-se das ladaínhas contra Salazar, porque ele foi tão culpado das cheias, quanto o Costa dos incêndios.

E quanto à censura, as partes do relatório que não são divulgadas e o "segredo de justiça", são o quê?
(...)

Salazar tentou minimizar a tragédia e tinha razões para isso. A tragédia não foi a chuva, a tragédia eram os bairros da lata, a miséria, a pobreza em que viviam muitos milhares de portugueses. E Salazar sabia-o. Os estudantes que  foram ajudar as populações ficaram abismados com tanta miséria, mas  Salazar sabia-o e não queria mostrar o atraso e o fracasso.
Mas Salazar não tinha a imprensa controlada, tinha a censura, mas não tinha os jornalistas, que furaram o que puderam furar, que informaram muito mais do que o ditador gostaria.
Costa tentou controlar, esconder e minimizar os fogos, os mortos e o roubo de armamento. Costa não tem censura, mas tem os jornalistas, não precisa de lápis azul, são as redacções que tratam do assunto, fugindo às primeiras páginas e deixando arrefecer as matérias menos convenientes. 
Comparem resultados e verão que o sistema Costa é melhor. Os actores contratados para fazer perguntas são um bom exemplo do que se pode fazer, sem que o alarme  toque nas redacções.....

Lembro-me perfeitamente das cheias de 1967, das notícias na televisão e nos jornais que duraram vários dias, do avolumar da catástrofe à medida que se descobriam mais corpos, e do choque que isso provocou em todas as pessoas. Pouca diferença faz se as vítimas foram 200 ou 700.

Em 1967, não existiam os conceitos de liberdade de expressão que hoje conhecemos, nem aqui nem em nenhum outro lado.

A França nunca falou abertamente do que aconteceu na guerra da Argélia, os EUA encobriam muito do que se passava no Vietname, a Irlanda decidiu nesse mesmo ano acabar com a lei da censura, sempre houve censura sobre o que se passava na Irlanda do Norte, havia os países de Leste e a RDA, a lista é longa e quase inesgotável.

A França só conheceu os conceitos de liberdade que hoje vigoram após Maio de 1968... e os outros países só a pouco e pouco seguiram esse processo.

Portanto em 1º lugar é preciso colocar as coisas no seu tempo.

Em 2º lugar, a censura continua a existir, em todo o lado: desde o Google e o Facebook mais as caixas de comentários onde existe um botão "denunciar", até à censura de materiais pedófilos ou nazis, passando pela censura de imagens chocantes ou sexuais, de tortura etc., e também censura por razões políticas, por exemplo nos jornais de esquerda em relação à direita e vice-versa, e pelos governos - todos eles - em relação aos terroristas, aos extremistas, ou a países e regimes com os quais existem tensões ou desacordos.

Qualquer código de conduta, em qualquer contexto, é uma forma de censura.

E o contraponto da censura é obviamente a propaganda.

Helena Matos tem absolutamente razão: em 1967 a censura foi ultrapassada pelas circunstâncias.

Falta acrescentar que hoje, as cheias de 1967 estão a ser usadas como propaganda...!

(...)


Há imensas diferenças entre 1967 e 2017:

1. Opções pessoais Vs Opções de baixa política.

1967: Tragédia causada por milhares de decisões individuais de milhares de pessoas (ao longo de décadas milhares de pessoas foram construindo, mal e a maioria das vezes de forma clandestina, em locais onde não se devia construir).

Incêndios 2017: tragédia causada por uma decisão do poder político: a decapitação da proteção civil a três meses da época dos fogos! Pessoas competentes e com know how (algumas vindas do tempo de Sócrates)  foram substituídas  por boys do PS sem competência nem conhecimentos na matéria.

2.  Subsidiariedade Vs Estado Social

1967: a sociedade, sensibilizada e horrorizada pelas notícias, reagiu como um todo para ajudar as famílias e populações atingidas, milhares de sermões em milhares de paróquias, mobilizaram o país, sendo que o quadro mental do tempo era o da subsidiariedade, ie, o Estado apenas ia onde a sociedade civil não conseguia. O Estado, mesmo tendo de suportar uma guerra em 3 frentes ativas e mais umas quantas latentes, a maior movimentação de tropas desde a 2ª guerra mundial, comia menos de 22% do PIB e a sociedade civil sabia que toda a solidariedade social era responsabildiade  das redes de proximidade. 

2017: a sociedade reagiu com migalhas (uns poucos milhões de euros de donativos que o Estado fez desaparecer) porque o quadro mental do socialismo que nos governa desde 74 é: "Tudo pelo Estado, nada fora do Estado" o que leva o Estado a comer mais de 50% do PIB, irrita imenso cada contribuinte e desresponsabiliza todas as pessoas porque "Eu já pago para um Estado rapace muito mais do que devia; eles agora que vão acudir a quem precisa".

Além disso o Estado tem paulatinamente mas de forma segura destruído as teias de relações de proximidade (também conhecidas por família) pelo que cada pessoas é relevante para muito poucas pessoas. E assim quando há uma tragédia, quando há uma perda de emprego, ou um vidro partido,  o que antes era resolvido pela rede familiar, agora é chutado para o Estado, os envolvidos exigem indemnizações e demissões e responsabilizações e milhões do Estado, que nomeia comissões , psicólogos, grupos de missão, e mais quantos taxas e tachos conseguirem inventar. 

3. Esperança Vs Desilusão

Em 1967 as pessoas estavam felizes, tinham estabilidade familiar e segurança laboral, muita esperança no futuro pois o crescimento económico era enorme (o 2º maior a nível mundial, logo depois e Taiwan), sabiam que os seus filhos teriam uma vida muito melhor que eles, o que fazia com que 9 milhões de portugueses tivessem 200 mil filhos por ano, tanto nos campos como nas cidades, onde as ruas eram povoadas de manadas de crianças a jogar à bola o dia todo e sem outra preocupação que não aparecer em casa à hora de comer. Havia mais filhos quando as pessoas saíram dos campos, do que havia nas décadas anteriores onde um novo filho eram mais dois braços para a lavoura.  

As pessoas sabiam que havia a PIDE e censura, mas quem não fosse comunista pouco tinha a temer, e em Angola e Moçambique a PIDE era o anjo protetor de quem sentia a vida verdadeiramente em perigo.

Em 2017 debaixo da pata socialista as pessoas vivem angustiadas, sabem que os filhos terão uma vida muito pior que elas, ganharão menos de 900 euros por mês, terão muito mais dificuldades em formar e manter a família, sabem que para alimentar as clientelas xuxa a pressão do Estado sobre as empresas e pessoas é sufocante segundo o velho lema "se dá lucro taxa; se continua, regula e taxa ainda mais; se faliu subsidia", pelo que só um doido masoquista se mete a criar novas empresas e emprego aqui (vai criar lá fora);  além disso a PIDE está por todo o lado a policiar ideias, palavras, a fazer julgamentos e linchamentos públicos (qualquer pessoa acusada de ser homem=violador, ou branco=racista, ou homofóbico, ou islamofóbico, ou hetroprtriaca, etc.) é imediatamente assassinado nas redes sociais, na praça pública, sem sequer ser ouvido, os jornais fazem verdadeiro bullying a políticos, a figuras públicas, cidadãos anónimos, etc., o Estado controla a vida das pessoas e das instituições a um nível que Salazar nem sequer sonhou possível, a maioria da sociedade é trabalhador do Estado ou por conta de outrem numa das poucas mega-empresas que sobrevive pelo concubinato com o Estado, o que leva as pessoas a uma existência cinzenta, sem chama, sem nada pelo que lutar e viver, o funcionalismo público (mais bem pagas que o privado) é afinal uma imensa fábrica de pessoas infelizes e deprimidas, pelo que o caldo de 2017 faz as pessoas achar que não-existir é preferível à existência, não viver é preferível à vida, e no verdadeiro teste à esperança no futuro os 10 milhões de portugueses respondem com 80 mil nascimentos por ano, o que só agrava ainda mais o quadro descrito acima.

Os Galambas da oligarquia podem dizer milhares de coisas sobre o futuro radioso, e a claque xuxa aplaude,  mas quando se confrontam com a pergunta "acreditas mesmo nisso?" a maioria responde "não, não acredito e é por isso que  não tenho filhos".  
O que acima fica exposto em itálico é extraído dos comentários ao texto de Helena Matos. 

Dito isto pouco mais tenho a acrescentar, senão recortes e mais recortes da época. Gosto de mostrar uma opinião, mas ainda mais se fundamentada em factos que todos podem reconhecer, ao contrário destas gente que agora escreve sobre o regime de Salazar que fala de cor e salteado o que lhe ensinaram nas madrassas do jornalismo nacional.

A reinvenção de memórias jornalísticas

O Correio da Manhã de hoje dá voz numa coluninha, a um tal João Vaz que assina como "jornalista" um pequeno apontamento de natureza politico-ideológica, de pendor cripto-comunista.


Neste pequeno texto cheio de esterco ideológico inventa-se que o "Estado ditatorial" de 1967  não preveniu a catástrofe que terá sido a maior a seguir à do terramoto de 1755. E também não acudiu á mesma.
O que é prevenir uma catástrofe deste género, por exemplo a dos incêndios deste Verão que o articulista eventualmente atribui às condições meteorológicas adversas?
É isso mesmo: prevendo uma alteração súbita dessas condições organizar publicamente meios de defesa das populações contra os efeitos devastadores.

Em 1967 os serviços meteorológicos previram a catástrofe? Para o palerma do articulista parece que sim. Ainda assim, se tal fosse possível, deveriam ter evitado os efeitos através de deslocação de pessoas no dia anterior? Só um palerma acabado dirá que sim.

A prevenção deveria ter sido no sentido de se evitar a construção de casas e barracas nas regiões potencialmente afectadas por uma catástrofe destas, imprevisível mas possível?  Pois sim, evidentemente. Tal significaria uma imposição administrativa para com os mais pobres que vinham para as grandes metrópoles fugidos a outras situações ainda piores.
E quando é que chegou a regulamentação dessa planificação de urbanização que evitaria tais desastres? Depois do 25 de Abril de 1974? Então porque é que ainda havia barracas à entrada de Lisboa, muito depois de termos entrado para a CEE? 
 O Estado Novo de 1967 tinha todos os recursos para acudir a todas as situações de miséria e subdesenvolvimento que então ainda existiam? Portugal seria nessa altura um dos países mais atrasados da Europa, mas os índices de crescimento económico rapidamente nos fariam ultrapassar tal fasquia negativa.  E tal não resulta de um wishfull thinking desmiolado mas é atestado pelas estatísticas.
Resta dizer que Portugal continua, passados 43 anos sobre o golpe de 25 de Abril que afastou o antigo regime agora vilipendiado, um dos mais pobres da Europa. O problema será insolúvel ou a democracia falhou mais que o antigo regime, uma vez que se considera moral e tecnicamente superior?

Estes articulistas de tretas ideológicas continuam a desinformar sistematicamente insiste que nessa altura " a preocupação de Salazar era manter a sociedade adormecida". Não era nada disso. Era apenas manter a sociedade livre destes percevejos ideológicos. E tal implicava censura aos media que apesar disso estava infestada deles.

Nisso, o regime de Salazar falhou: em mostrar ao povo que os ideológos do comunismo, como o articulista,  acoitados nos media,  só trariam maior pobreza do que a que criticavam ao regime.

É por isso aliás que continuam, passados 43 anos a vituperar esse regime por razões desfasadas recorrendo a mentiras permanentes que tomam uma parte por um todo para demonstrar uma razão que inventam.
Como se mostra em imagens e documentos da época, não foram os estudantes quem ajudou mais. Não foi o IST, na altura, cóio de esquerdistas que se tornaram revolucionários dali a meia dúzia de anos quem ajudou as populações de modo determinante.
Esses estudantes fizeram apenas o que depois repetiram: propaganda político-ideológica contra o regime.
Como estes continuam a fazer e pelos mesmíssimos motivos.

No Público de hoje a jornalista artsy, antiga directora do Público Bábara Reis publica um estudo extenso que fez de correspondência que Salazar e uma família inglesa mantiveram durante décadas.
Publica excertos de 33 cartas inéditas  entre Salazar e  uma certa Cristiana Garton.
A jornalista terá lido as mesmas mas duvido que tenha apreendido o significado ou a essência de quem as escreveu.
Como prova esta última página com considerações acerca de Salazar:


Diz que uma das correspondentes costumava levar orquídias que cultivava, a Salazar. Este "nunca as aceitava sem dar alguma coisa em troca. Não queria que aceitar as flores pudesse ser visto como uma cunha ou um suborno", diz um dos familiares daquela.  E então o que fazia Salazar para retribuir?  Dava ovos ou alguma coisa caseira feita com ovos da quinta de Salazar".

Esta passagem é bem exemplificativa do equívoco que estas pessoas artsy alimentam acerca do "ditador".
Não percebem a natureza do costume de trocar este género de prendas e da essência rural que lhe subjaz. Os ovos, aliás nem seriam da quinta de Salazar. Seriam antes do quintal que a dona Maria, governanta de Salazar, tinha, das suas galinhas.

Esta falha epistemológica é exemplar do que falta a esta gente: cultura, no fim de contas.  São tão cultas que nem cultivadas chegam a ser. Uma miséria intelectual é o resultado pontual  quando analisam o que não compreendem.

Ah! Li agora este escrito muito interessante de Helena Matos que merece uma atenção mais cuidadosa mais tarde.

Entre as ideias que conto analisar e debater aqui, com exemplos e imagens, discordo profundamente desta análise de Helena Matos:

 A ditadura salazarista, como todas as ditaduras, cultivou a desresponsabilização do povo: o governo dava, o governo fazia, o governo sabia.

É precisamente o contrário, o que aconteceu: Salazar e o regime deram a maior liberdade às pessoas, na sua vida privada, o que hoje não acontece. Não deram por julgarem que deveriam dar, mas porque era assim, naquele tempo. Salazar era um homem do seu tempo e não contrariava as tradições e costumes.
O povo, então, era dependente de si mesmo porque o Estado era mesmo exíguo, excepto numa coisa: no controlo da liberdade de fazer abertamente a propaganda de regimes que o queriam subverter e substituir, ou seja o comunismo. É preciso que isto seja dito claramente porque era mesmo disto que se tratava e Salazar fez muito bem, excepto noutra coisa: foi contraproducente na Censura e na repressão. Foi isso que produziu os "revolucionários de vão de escada" do 25 de Abril de 74, por causa de um ditado bem antigo: o fruto proibido é sempre o mais desejado...

sábado, novembro 25, 2017

Imagens ilustradas do tempo de Salazar

Estes recortes são todos do ano de 1967 e mostram  alguns aspectos da vida quotidiana dos portugueses de então:

O primeiro é do Século Ilustrado de  30 de Dezembro de 1967, cerca de um mês depois da catástrofe das cheias e mostra o movimento de solidariedade dos trabalhadores da Carris, para com os seus colegas que ficaram sem abrigo. Não foram apenas os estudantes que descobriram então o activismo da solidariedade interessada em promover a oposição ao regime em modo perverso.
 Houve muitas outras ajudas. Aliás, os tais estudantes, por esta altura já deviam estar cansados, na sua maior parte...


 A solidariedade privada que os comunistas ( o tal José Barata Moura) apelidavam de "caridadezinha" funcionava melhor que hoje em que se espera tudo do Estado:



 Tal fenómeno tinha precedentes, como mostra esta imagem do Século Ilustrado de 12 de Maio de 1967, da altura em que o Papa Paulo VI esteve cá em Portugal:



Em Maio desse ano tinha ocorrido um assalto ao banco de Portugal, da autoria de uns piratas que deixaram descendência que agora fala nas tv´s, do alto da burra, como é apanágio delas.




Tais rebentos não tiveram a educação que em França se discutia, em Dezembro desse ano,  como método educativo eficaz para impedir futuros terroristas: chicote no lombo era opção em aberto ...


Em Portugal começava então ( Abril de 1967) a era do consumo corrente e em massa, para as pessoas das aldeias:



E na mesma altura dava-se conta do surgimento de novas enfermeiras em imagens sugestivas:



Os cursos universitários, aliás, estavam em franca progressão:

Em 1967,  quando os alunos faziam queima das fitas as pessoas vinham para a rua, ver os cortejos. Tudo acabou em 1969, com os estudantes contestatários do regime. Um tal Alberto Martins que ainda hoje se gaba do feito, foi apenas o começo dos que quiseram imitar a França do ano de 1968 em que lhes pareceu que "tudo era possível":




Em Coimbra os estudantes tinham uma equipa de futebol e em Janeiro de 1967 estavam tão bem classificados que ameaçavam a hegemonia do  Benfica. Um dos jogadores chamava-se Maló e já formado em Medicina,  tirava uma especialidade em estomatologia.  Actualmente tem várias clínicas espalhadas pelo país.


O Sol a brilhar

A edição do Sol, de hoje, publica estas duas páginas sobre a efeméride dos 50 anos das cheias de Lisboa.




Isto é a prova de que é possível fazer bom jornalismo, contar a verdade, incluindo a acção da Censura da época e não fazer propaganda ideológica sob a capa de jornalismo. Não há aqui Alices Vieiras a contarem como descobriram a pobreza nesse dia...e que o malvado regime fascista escondia e censurava.

Esta a seguir é a prova da inclinação ideológica do jornalismo nacional em geral e que está na falência porque não contam a realidade e inventam uma outra, paralela. Imagem do sítio do Sapo, hoje:

sexta-feira, novembro 24, 2017

Factos diversos do tempo de Marcello Caetano

 Em 1969-70 a vida em Portugal decorria ainda sob o regime anterior, com Marcello Caetano a governar.
Marcello Caetano entrou após a doença de Salazar, em Setembro de 1968 e tentou abrir um pouco a  tradicional rigidez que vinha das décadas anteriores. Os tempos eram outros e notou-se uma maior tolerância na Censura e no modo como o regime se defendia dos seus inimigos de sempre: os comunistas.

Ao acaso folheei algumas revistas dessa época e dei com estas notícias e reportagens:

Uma de 6 de Junho de 1969 na revista Flama sobre o que se chamava então "os ursos", estudantes que  obtinham a melhor classificação nos liceus ( o melhor da turma) e nas universidades ( o melhor do curso).

Torna-se interessante ler o que diziam alguns deles e comparar com os da actualidade. Haverá assim tanta diferença?



Depois, uma reportagem de 11 de Setembro de 1970 sobre o nordeste transmontano. Seria interessante comparar o estilo de escrita de então, com o de agora e o modo de tratar o tema.  Está aí tudo e a Censura não tinha nada a cortar ou alguém a acrescentar se fosse escrito hoje em dia. A diferença é que este jornalismo não se aprendia em madrassas, como hoje. E era melhor...






Outro assunto: notícias diversas sobre coisas diversas que davam um retrato de Portugal na época. Segundo alguns madrasseiros estas notícias não poderiam ter sido publicadas...Flama 4.12.1970:



E esta foto da Flama de 11.9.1970 mostra um dos "baladeiros" comunistas, José Barata Moura e a notícia do seu doutoramento em tretas filosóficas.  Porquê? Porque a esquerda comunista dominava a imprensa e como tal promovia as suas figuras. A assistência de estudantes ouvia, embevecida,  o futuro autor de Joana come a papa ...



E na Assembleia Nacional um dos actuais mollahs do jornalismo nacional, patrocinador de madrassas, era deputado e queria mudar o regime. Tivesse tempo e fatalmente teria conseguido, sem a bandalheira que foi o 25 de Abril de 74 e o que se lhe seguiu. Esta notícia de 4.12.1970 não foi censurada na essência e continha em si a noção de mudança do regime:




Os pontos do i: 700 mortos em vez de 500...

O jornal i deste fim de semana "trata" o caso das cheias de 1967 de um modo alargado e ilustrado a condizer.
Desta vez foram, aparentemente, mas nunca se sabe,  consultar as revistas da época, não dizendo de onde tiraram as fotos, sendo suspeito que as imagens de capa da Flama e Século Ilustrado não tenham os carimbos das bibliotecas públicas, mas enfim...

Os textos são escolhidos e redigidos por  jornalistas como um fantástico António Ribeiro Ferreira que logo nos primeiros parágrafos vitupera o antigo regime como o responsável pela catástrofe: "o regime falhou antes e falhou depois. Restavam-lhe a censura e a repressão."  Nem era preciso escrever mais nada, depois destas aleivosias intencionalmente expelidas no escrito.
Portanto, o que se depreende é que havendo censura prévia, os jornais foram publicando nos primeiros dias notícias e fotos sobre a tragédia e até publicaram  imagens de urnas e pessoas a chorar, para além de números de mortos, aproximados da realidade comprovável mas impossível de contabilizar com rigor que agora se exige retroactivamente, sob pena de tal significar o falhanço do regime.
O que não se compreende muito bem, segundo esta lógica é o facto de as revistas mostradas terem sido publicadas alguns dia depois da catástrofe ( no caso do Século Ilustrado em 5.12.1967) e portanto com tempo mais que suficiente para a Censura censurar e...não censurou. Azar destes flibusteiros da versão conveniente ao regime que corre e que mesmo assim não desistem da apresentação das contradições, mesmo evidentes e escarrapachadas. Tomam os demais por esterco intelectual? É o que parece, a não ser que afinal o sejam eles próprios e portanto, similis cum similibus.. 
Como se sabe, este efeito deletério da Censura da época, o de proibir manifestações de miséria física ou moral é coisa do passado e hoje, os jornais, mesmo o Correio da Manhã e outros publicam livremente qualquer imagem de urnas em cemitérios, cadáveres a boiar nas águas ou de queimados vivos, sem qualquer censura interna de quem manda nos jornais.
É por isso politicamente correcto vituperar o antigo regime que tal não permitia e agora é possível ver livremente.
As imagens e textos da época dizem precisamente o contrário? Não importa porque a ideia básica há muito que está assente: o antigo regime tinha um sistema repressor e censório que o caracterizava como fascista e portanto fica tudo dito com tal palavra. E quem disser o contrário é...fascista ou pior ainda.

A isenção ou objectividade deste tipo de jornalistas, neste caso muito bem tratado pela esquerda, está próxima do zero neste escrito, tal como a de outros que embarcam neste raciocínio simplista, decorado nas madrassas do politicamente correcto e assumido por uma esquerda vicejante que não perde oportunidade de malhar na "direita" e na sua melhor expressão, o salazarismo de antanho.

As contradições não os incomodam, as subtilezas nunca foram o prato do dia e a objectividade estudiosa de uma época e um regime não lhes interessa para nada. A História neste caso está feita, pelos Rosas&Flunser, para citar os mais pindéricos com mania de catedráticos. Podia citar-se o Pacheco, outro Pereira sem eira nem beira, que já foi tudo politicamente e agora é apenas outro zero em comportamento político, regressado à casa de origem porque não atingiu a glória.

As imagens do i que contêm nelas mesmo a demonstração da contradição dos escritos:





A cereja no topo deste bolo de lama sobre o regime de Salazar é esta pequena entrevista a Joaquim Letria, um figurão do jornalismo nacional que está vivo para contar como contou os mortos, na altura da tragédia, mas afinal acaba por não contar e apenas dá um número redondo: 700 mortos.  O regime teria contado algo que nem chegaria aos 500, embora andasse lá perto, mas este jornalista juntamente com mais outros - Pedro Alvim, Afonso Praça, Manuel Beça Múrias e Fernando Assis Pacheco- desconfiaram e deram em gatos-pingados.
Na época  eram jornalistas do Diário de Lisboa, esse bastião da  luta contra o fascismo de Salazar e Caetano, pela mente ideologicamente avisada do seu director, Ruella Ramos. O regime feroz e fascista deixou que os mesmos deambulassem por onde bem queriam, mormente morgues e necrotérios ou lugares similares e contaram, contaram, fartaram-se de contar e chegaram ao número mágico que o regime queria à viva força esconder, porque já admitira quase 500 mortos.
 Esta questão dos números certos, para estas vivalmas é um dado certo e inquestionável do carácter vicioso do regime que queria esconder a dimensão da tragédia. 500 mortos, vá que não vá...agora 700?  Quem é que eles queriam enganar? Os bravos jornalistas armados em gatos-pingados não, com certeza.
E por isso contaram a história e reconta-se agora com um dos protagonistas que os demais já foram fazer companhia àqueles que contaram e devem agora saber a verdade acerca das contas certas.

Portanto, pá, não foram 500. Foram 700, percebem a diferença da tragédia que o regime tentou esconder e até censurou imagens de crianças em urnas e de cadáveres em rigidez post-mortem cobertos de lama? É clara não é?
Um regime destes era uma coisa medonha, não era? Devemos esquecer tal regime fascista e tremendo para a liberdade do povo? Nem pensar! Liberdade, sempre. Fascismo nunca mais!





Este mesmo antifassista que fora comunista e depois passou a apoiar o "grupo dos nove" na altura do 25 de Novembro, mas de 1975, era nessa altura director de um O Jornal.
O qual, na efeméride dos dez anos passados sobre a tragédia nem uma linha publicou acerca da mesma...


Preferiu outros assuntos, designadamente o da tragédia da Madeira, sobre um avião da TAP nacionalizada pelos amigos do antifassista, comunistas e socialistas que se despenhou, "por erro humano" uma vez que o piloto era inexperiente e nunca tinha voado naquele local. talvez por isso se deu a tragédia que neste caso nada teve a ver com o regime que nacionalizou a empresa, abandalhou o seu funcionamento e, enfim, as causas devem ter sido bem apuradas no inquérito intenso.
Aposto que amanhã, já que não o fez até agora, algum jornal de referência vai referir a tragédia, as suas causas e a responsabilidade do regime...democrático e que nacionalizou a TAP deixando-a, na altura desta tragédia,  à gerência de uma comissão de trabalhadores que entre outras coisas obrigou o então arcebispo de Braga a baixar as calças no aeroporto para mostrar as divisas escondidas...

Já agora anote-se que a imagem inserta no recorte é de uma criança morta. Hoje seria possível, com esta liberdade de publicação que não se compara com a do antigo regime? Não faz soar nenhuma campainha na mente capta desta gente que agora escreve aleivosias?


Por outro lado, no mesmo número um crítico de cinema dava-nos a sua noção sobre fascismo: o über fascismo de que falava Eco. Salazar e o regime eram assim?




O Observador de agora, pelas teclas de uma jornalista que terá aprendido a profissão nas madrassas, também escreve assim:

 Mais de 20 mil casas ficaram destruídas. Em alguns locais do distrito de Lisboa, a água chegou a concentrar-se num volume de 170 litros por metro quadrado. Apenas um grupo de pessoas não se calou perante o lápis azul de Salazar: os estudantes. Jorge Simões e José Brazão estavam com Zeca Afonso numa viagem entre Coimbra e Lisboa quando souberam do que estava a acontecer através da rádio. Os dois juntaram-se a António Alves Redol, que já não estudava mas continuava ligado à associação de estudantes, no Instituto Superior Técnico para engendrarem um plano para ajudar a população: à Rádio Renascença, Danilo Matos, um dos estudantes que participou na iniciativa, disse que “a causa de tanta desgraça não foi a chuva, foi a miséria. “Foram postas a nu as condições sociais em que muitas pessoas viviam nesta cidade, mas também a inoperância do governo”: “O governo atrasou-se, paralisou, só conseguiu mandar para o terreno o Movimento Nacional Feminino, que só ia atrapalhar, e a GNR, que era uma polícia preparada para reprimir e não para salvar gente. Essa inoperância gerou uma enorme revolta na população”. Aos estudantes ninguém calou: o jornal “Solidariedade Estudantil”, que surgiu depois das inundações, era o único que fugia à censura. Vendia 10 mil exemplares por número.
As cheias foram de tal modo catastróficas que também mereceram a atenção internacional: o fotógrafo inglês Terence Spencer, vencedor de um World Press Photo em 1968, veio a Portugal para fotografar sem filtros ditatoriais os cadáveres, a lama e os escombros pelas ruas lisboetas. Terence Spencer vendeu as fotografias à revista LIFE e a notícia sobre as cheias de 1967 foram publicadas a 8 de dezembro. O artigo não tinha mais do que um parágrafo e, embora sublinhasse a falta de ordenamento urbanístico em Lisboa, ficou-se pelo número oficial de mortos, muito inferior ao real, que só foi desvendado depois do 25 de Abril.


Ora o trabalho desta jornalista formada em madrassa, eventualmente estagiária, Marta Leite Ferreira no que se refere ao mote principal-malhar no regime de Salazar/Caetano está feito. O restante poderia ter feito bem melhor.

As fotos da Life são uma e só  uma publicada na edição de 8.12.1967 da revista e pode ser vista aqui.

Quanto ao "número oficial de mortos, muito inferior ao real" a revista ficou-se pelos 427 mas acrescentou que  na altura da contagem "more people were still missing".

Esta realidade que explica a contagem de mais mortos posteriormente é perfeitamente natural: havia muitas pessoas desaparecidas e não sei como aqueles jornalistas feitos gatos-pingados atingiram o número de 700 quando as contas posteriores não ultrapassariam os 500, facto reconhecido por outro feito gato-pingado que foi ver às conservatórias os certificados de óbito a anotou o número.

Que quer isto dizer afinal? Que os mortos de Pedrógão, mesmo mal contados, são poucos comparados com estes?

Estou em crer que sim, que é esse  o objectivo. Um jornalismo de madrassa dá no que dá...

Não obstante, a contagem dos mortos de há 50 anos seria sempre mais difícil do que hoje, não?!




Então por que no te callas?


ADITAMENTO:

Estive a ver o programa que a RTP1 apresentou sobre a efeméride. Um programa com objectividade qb, imagens ilustrativas e no final a ponta efectiva do discurso repetido ad nauseam sobre o Estado Novo e a Censura que não deixou publicar o que os jornalistas queriam: mortos às centenas e imagens horríveis.
Os jornalistas encarregados de dar fogo à peça convidaram uma testemunho de peso muito pequeno: Alice Vieira, a então futura namorada de Mário Castrim que no Diário de Lisboa tentava dar forma à propaganda comunista contra o regime e tal ensinou à futura namorada, dali a dois ou três anos.  Alice Vieira repetiu o mantra: a censura não deixou publicar nada e o regime procurou esconder a catástrofe.Se fosse o comunismo que então defendiam, a mandar,  em primeiro lugar não teria havido catástrofe e se houvesse toda a gente saberia logo o que se passara. Como em Chernobyl e outras catástrofes mais graves e que toda a gente soube logo, logo...

Enfim, jornalistas muito bem educados no politicamente correcto, estes da RTP1. Se o não fossem não estavam lá. Nem se dão conta que as imagens que mostraram das várias páginas dos jornais, desmentem objectivamente o que afirmaram momentos antes.

Quem redige estas notícias, desde modo?

Na SIC do dono da Impresa, o  jornaleiro do telejornal entrevistou Joaquim Letria. Mote: a censura e o regime, esses malvados que não deixaram publicar nada.  Letria, esse, como se mostra acima, nos dez anos da ocorrência nem se lembrou de uma linha, uma só que fosse, sobre a catástrofe. Porém, agora mostra-se muito emocionado com o assunto.

Hipócritas.