sexta-feira, maio 12, 2017

Um Portugal de há 50 anos, desconhecido para muitos

Vou tentar mostrar aqui uma imagem de um Portugal de há 50 anos através de alguns recortes de revistas dessa época.

As publicações periódicas, como jornais e revistas, fixam muitas vezes certos acontecimentos ou mostram determinadas imagens ou ainda relatam aspectos da vida quotidiana que servem de referência para quem viveu esse tempo, lembrar como era e poder contar como foi.

Esse relato, sendo subjectivo permite, se acompanhado de documentos, sindicar o mesmo e permitir a discussão sobre tal. Sendo necessariamente fragmentário o panorama pode desse modo ser manipulado por quem o mostra e é isso que acontece sempre nos relatos que hoje temos nos media em geral, condicionado por décadas de deturpação histórica de factos ou mesmo de acontecimentos relevantes. Estes costumam ser apresentados do ponto de vista, não de quem os viveu, mas de quem agora os relata segundo versões ideologicamente impregnadas de preconceitos ou enviesamentos que deturpam a realidade vivida por quem não se situava politicamente numa esquerda oposicionista do regime vigente.

O Portugal de 1967 não era necessariamente aquele que nos querem mostrar os que chamam fascismo ao regime em que o presidente do Conselho se chamava Salazar.

Nestes recortes, todos do ano de 1967 e um ou outro dos primeiros meses de 1968, das revistas Século Ilustrado e Flama,  que passo a seguir nem uma única vez aparece a referência a Salazar ou até ao Governo, explicitamente. E por uma vez há referência à guerra no Ultramar através de um dos seus aspectos mais emblemáticos: o regresso dos militares das mobilizações e comissões de serviço "lá fora".



Assim, poderia começar esta série de amostragens de "tranches de vie" pela apresentação de uma escola pública da região da grande Lisboa, Sintra, no caso: o Liceu de Sintra que funcionava num edifício adaptado. Os alunos que se mostram poderiam ser os de hoje? Ainda não havia baleias azuis...e por isso eram provavelmente mais alegres, mas pode ser apenas um engano.


A propósito de ensino e educação, um pequeno apontamento sobre os castigos corporais, a violência sobre crianças que era encarada de um modo totalmente diverso do que sucede hoje em dia e permite relativizar e contextualizar o problema da autoridade paternal. No caso, tratava-se de mencionar um estudo que decorria em França acerca dos castigos corporais, ainda em uso nesse país que nem era fassista...


 Do ensino numa zona urbana pode passar-se para o panorama de uma zona remota no Portugal de então: o nordeste transmontano, antes das vias rápidas e ainda no tempo de que "para lá do Marão mandam os que para lá estão"...


O Portugal rural de então ainda estava muito atrasado em desenvolvimento de técnicas agrícolas e o trabalho era mais para subsistência do que para acumulação de capital. Porém, notam-se já alguns sinais de mudança. Por exemplo nos postos de saúde, já modernos e funcionais.
Apesar de tudo, o subdesenvolvimento ( pouco mais de vinte anos depois do fim da II GG, é preciso lembrar)  obrigava a imigração interna e foi por isso que apanhámos depois nas grandes cidades os transmontanos que vinham estudar e que alguns deles deram em Sócrates e Varas e até Proenças e Monteiros, alguns já num período tardio dos anos setenta.

Mesmo às portas da capital havia bolsas de miséria impressionante que se descreviam de um modo natural, ou seja, sem dramatismos de maior. Roma e Pavia não se fizeram num dia e estas cenas de miséria não eram exclusivas do Portugal de então. Por exemplo na Itália do Sul, ou na Espanha galega, também havia disto:


O desenvolvimento que despontava mostrava isto que poucos se lembram: o recrutamento de enfermeiras para o serviço público dos hospitais. É ver as condições de salário e comparar com os dias de hoje...


Ainda no domínio do trabalho havia progressos que hoje aparentemente só existem em algumas unidades industriais, mas então eram mostradas como exemplo:


E as condições de trabalho em geral não sendo tão boas como hoje, tinham aspectos que merecem lembrança. Por exemplo, as mulheres ( eram geralmente mulheres cujos maridos trabalhavam no caminho de ferro, na conservação das linhas) sinalizavam os combóios e fechavam as cancelas quando ainda eram manuais...


E nas cidades quando havia problemas nos transportes podia acontecer isto, sem problemas de maior...o que hoje seria impossível.
Não conhecendo isto e não contextualizando isto não é possível falar da realidade de então com o acerto devido. Pergunte-se à Rita Rato o que pensará disto...


 Quanto aos problemas urbanos havia até reuniões ibéricas de arquitectos! E um deles era o pai do Portas...e se um outro, na foto mais acima, não é o Siza Vieira, imita muito bem:


A propósito das aldeias e respectivo desenvolvimento apareceu nessa altura uma iniciativa nacional, assim publicitada. Faça-se as contas ao preço e compare-se com o dos continentes actuais:


E depois do trabalho, o lazer! No Norte,  as festas populares eram assim, em certos sítios. Ainda hoje o são, aliás. Em lugar das vinhas de vinho verde, há agora campos sem cultivar e casas construídas por emigrantes. Quanto aos cestos floridos, continuam a ser as moças novas que os carregam, mas têm menos força hoje que naquele tempo. As raparigas de então trabalhavam muito mais na lavoura...:


Nos divertimentos, o futebol, claro, era rei e Eusébio a figura mais destacada, tal como Ronaldo o é hoje:



Mas em Coimbra que agora se diz ( na A1) que é "a cidade do conhecimento" , os estudantes que jogavam na Académica eram...amadores, mesmo. E estudavam, antes de serem jogadores:


E mais para o Sul os divertimentos tinham outro estilo que ainda se manterá, mas mais discreto e ameaçado pelos defensores dos direitos dos animais de agora que conseguiram tirar os ditos do reino das coisas:


De resto havia corridas de carros:


Via-se televisão com alguns programas de muito boa qualidade.


Podia ir-se ao teatro ver algumas das actrizes que despontavam para o género  que não seria confundível com a revista:


E, claro, por esta altura havia o festival da Eurovisão. Nesse ano de 1967, o participante nacional era Eduardo Nascimento.

E quem quisesse podia ir ao Cais de Sodré, como hoje:


De resto as autoridades, no caso a temível PVT, ( Polícia de Viação e Trânsito), um reflexo do fassismo, também fazia a sua festa, com a colaboração de antifassistas do teatro de revista e da televisão, dos Zips e assim...



Portanto, sempre que alguns democratas queiram dizer mal do Estado Novo do tempo de Salazar lembrem-se que é preciso falar nestas coisas também...

45 comentários:

Floribundus disse...

era um país infeliz porque:
não tinha baleia azul
monhés a fingir que governam
sobrais na Eurovisão
beijoqueiros
claques violentas no fute
sem abrigos
sem dívida pública elevada e sempre a crescer

era um país triste

agora o estado social vai dar pleno emprego como na falecida urss

Vivendi disse...

No tempo do Estado Novo lutava-se por levantar um país do litoral ao interior e procurava-se manter um império.

Agora com a obra abrileira, que deixou o país entalado até ao tutano e com uma crise identitária, restou transformar este país a uns meros serviçais do globalismo (via turismo).
Um grande albergue espanhol, o futuro que nos espera.



Vivendi disse...

Isto agora governa-se à circolândia:

https://www.publico.pt/2017/05/12/politica/noticia/e-nao-e-que-antonio-costa-tomou-mesmo-conta-dos-filhos-de-joao-miguel-tavares-1771996

Zephyrus disse...

A morte do interior e antiga e vem dos tempos dos Descobrimentos e da Inquisicao. O Sa de Miranda ja se queixava do despovoamento no seculo XVI e a Inquisicao deu cabo das elites comerciais e intelectuais a nivel local. O centralismo de Lisboa tambem ajudou.

Quando Salazar chega ao poder o PIB per capita de Portugal era para ai 50% da media da Europa rica. Nos anos 30 houve a Grande Depressao e depois seguiu-se a Segunda Guerra Mundial. O Ocidente so volta a crescer depois de 1945 e a Inglaterra passou mal e so com a Tatcher decadas depois e que descola. Nos anos 70 a pobreza em Inglaterra era vergonhosamente alta. Portugal a partir dos anos 50 comeca a convergir ate 1974. Ora o que importa aqui ter em conta e o ponto de partida. O atraso vinha de tras, vinha do seculo XIX e isto os Rosas da vida nao contam.

Eu gostaria era de saber se Africa estava a dar lucro. Entre o que exportavamos para la, o que exploravamos, e depois o que se gastava na guerra, mais os impactos negativos na Metropole, entre emigracao ou dinheiro gasto em infra-estruturas em Angola ou Mocambique. Os ingleses, por exemplo, acharam a seu tempo que seria mais lucrativo abandonar e meter a empresas inglesas a extrair materias primas ou a explorar as terras.

Zephyrus disse...

Por isso caro Vivendi sou muito ceptico em relacao a essa tentativa de manter um Imperio.

Nos tempos um defeito enorme chamado casmurrice e ate o Salazar o disse numa entrevista nos anos 60. Estamos cheios de casmurros sem qualquer pragmatismo e por isso outros povos acabam por ser superiores a nos, como os ingleses, que sao mais pragmaticos, ou ate mesmo os espanhois. E para mim Africa nos anos 60 era casmurrice.

A coisa mais lucrativa que tivemos olhando para tras foi o Brasil. A casmurrice com as pracas africanas custou-nos uma fortuna e um rei. A casmurrice com a India acabou por contribuir para a Inquisicao. Comprava-se a pimenta com dinheiro emprestado e os juros eram altos... e Africa nos anos 60 era uma colonizacao fora do tempo... para aquilo funcionar os portugueses teriam de estar em maioria, e nao estavam, eram menos de 5% da populacao... so se no seculo XIX se tivessem expulsado todos os nativos para os territorios vizinhos... era uma colonizacao fora do tempo e penso que naquele momento a coisa mais pragmatica a fazer seria um processo gradual de transferencia de soberania que assegurasse os nossos interesses economicos e militares e os direitos dos emigrantes portugueses.

josé disse...

Estou de acordo com os comentários de Zephyrus.

Bic Laranja disse...

Li quase tudo. Boa escrita nos recortes. Como se hoje não acha. Tudo cheio de interêsse.
Com o José referiu, nem uma vez se fala no govêrno ou em Salazar, nem no artigo dos mocitos no concurso da ponte. Hoje há 365 dias de folhetim televisivo, todos eles com o mandarete-mor e o seu cata-vento em scena, apanhamos de três ângulos, que não passam do mesmo plano: propaganda.
Muito bom verbete.

Bic Laranja disse...

O Zephyro diz coisa que parece ter nexo sobre África. Mas esquece o propósito multirracial e de elevação dos territórios do Ultramar ao patamar da civilização que nos daria escala política e económica pluricontinental — nos anos 60 e apesar da guerra, Portugal era uma potência regional a ter em conta e a convergir em termos de desenvolvimento económico com África do Sul e a Rodésia. Na Europa, igual, A escala que viríamos a conseguir, soberanamente, não sei dizer. O que conseguimos ainda assim, quase do nada e apenas com recursos próprios, só os do fassismo o negam. Moralmente a nossa posição é inatacável. Todavia o zelo pelo herdado e a obra dos portugueses polo deixar enriquecido aos vindouros é maldito...
O modo dos ingleses e dos belgas foi pura rapina.
O multirracialismo que nos era e foi interdito dirigir em prol da civilização, viemos a sofrê-lo muito por redenção da debandada em 75. E é-nos imposto mais modernamente cá para as mais desvairadas raças e costumes que historicamente nada nos dizem — o que por outra parte é demonstrado na rapidez com esses refugiaditos se põem a cavar daqui. Tornamos à cepa torta do que somos e poderíamos ter sido e acabamos nisto: uma grande obra desfeita por um levantamento de rancho caucionado por uma burguesia volúvel e parasitado desde o primeiro dia por comunistas.
Cumpts.

josé disse...

Isto é chover no molhado mas cá vai:

A nossa quixotesca ambição de constituir uma sociedade multi-racial só funcionaria se fôssemos maioria, ou seja, se nos séculos anteriores tivéssemos feito o que os colonos americanos fizeram: dizimar as populações autóctones até se tornarem relativamente inofensivas.

Como isso não aconteceu, os indígenas dos territórios nunca permitiriam uma sociedade multirracial em que fossem os brancos a mandar....

E parece-me isso de tal modo indiscutível que há precisamente o exemplo da Rodésia de Ian Smith e a África do Sul de Botha para o comprovar.

Bic Laranja disse...

Pode ser. Pode ser. Mas diga-o aos multirracialistas que nos enfiam hoje «refugiados» casa dentro à hora do jantar.
A doutrina é boa agora porque a propõem, a nós e a todos, do estrangeiro. Quando eram os portugueses a propô-la, apenas e só para si, era colonialismo.
Na Rodésia e na África do Sul havia racismo branco. Agora há-o negro, mas isso não é racismo. Deve ser outra coisa... Como o pan-arabismo.
Cumpts.

Bic Laranja disse...

E sim, multi-racial, como escreveu, não multirracial.
Melhor ainda, pluri-racial.
Cumpts.

Vivendi disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Vivendi disse...

Pois. Mais vale fazer experiências fora de portas do que dentro.
A Europa pelo caminho que vai qualquer dia os europeus também passarão a ser uma minoria.


Isto foi uma realidade não uma fantasia:

https://www.youtube.com/watch?v=SKbS-_9bjPI

https://www.youtube.com/watch?v=kiheHNbUpmA

E quem a destruiu foram os americanos e russos não os autóctones.

Há pouco tempo "descobriu-se" que Portugal tem a 3a estrada mais extensa do mundo, a N2. Uma estrada que rasga o interior, projectada pelos obscuros fassistas.

No Estado Novo havia uma ideia civilizacional e existia uma estratégia para dentro e fora de portas.

Nos dias de hoje a ideia passa por destruição e circo.

Miguel Dias disse...

A ideia de Portugal, no tempo do Estado Novo, abandonar os territórios africanos à sua sorte, como sugere o Zephyrus, é muito bonita de falar em teoria mas de aplicabilidade zero, a não ser que desejássemos uma luta fratricida, violência, caos político, social e económico, em suma um banho de sangue, que foi o que aconteceu após descolonização. Certamente que Salazar, Marcello Caetano e as elites políticas de então sabiam perfeitamente que perder a soberania de Angola, Moçambique - em suma de África - era necessária, simplesmente isso não podia ser feito na altura nem abruptamente, senão seria o caos. Seria indispensável criar instituições políticas capazes de assegurar países estáveis, com um Estado de Direito em pleno funcionamento, e este facto não aconteceria em meia-dúzia de anos, levaria décadas e gerações, não seria possível nem nos anos 60, nem nos 70, e nem nos 80, talvez no dealbar do século XXI. Enquanto existisse uma União Soviética a armar e financiar um partido-fantoche como o MPLA em Angola, qualquer tentativa de criar instituições políticas estáveis era mera quimera. O partido pró-soviético tentaria ininterruptamente derrubar o Estado de Direito e apoderar-se dos órgãos estatais para criar a sua ditadura e instaurar um monopólio. Portanto logo por esta análise se conclui que antes dos anos 90 seria dificílimo uma Angola dotada de instituições estatais com serviços económicos e militares capazes de resistir a ataques planeados, e duradouros, de facções estalinistas pró-soviéticas dentro do País a conspirar para alcançar o Poder. Idem para Moçambique com o caso da Frelimo.

Miguel Dias disse...

Obviamente que a colonização de África nos anos 60, era uma prática fora de tempo, mas o abandono dos territórios africanos na altura era contribuir para o caos político, e consequentemente para a mais que certa violência e guerra tribal que se registaria. Salazar e Marcello Caetano disso tinham consciência. E não, não foi a “casmurrice” das elites de então que não levaram ao abandono –e portanto à descolonização pré-1974 – de África, como sugere a visão limitada e redutora do Zephyrus. Foram o escrúpulo moral, o respeito pela vida dos habitantes desses territórios, e a ideia de que eram necessárias instituições políticas e militares estáveis – administradas por populações autóctones – para resistir aos ataques de grupos armados para alcançar o Poder e instaurar uma ditadura, e tal levaria décadas a construir. Poderíamos simplesmente deixar essas populações - nativas e as que foram de Portugal para lá - à sua sorte e não ter remorsos com as mortes e violência que se geraria com uma descolonização abrupta e sem criar meios de defesa. Mas não, não fizemos comos os ingleses, os alemães ou outros, esse “pragmatismo”, como o define o Zephyrus, não foi tido em consideração por Salazar, nem por Marcello Caetano. Também considero, ao contrário do Zephyrus, que não foi a falta desse “pragmatismo” que nos tornou inferiores aos outros povos, seja a nível económico, social ou educacional. As razões para o nosso atraso serão outras.

Miguel Dias disse...

Zephyrus disse “A casmurrice com a India acabou por contribuir para a Inquisicao”
Tenho ouvido/lido muitas asneiras nos últimos tempos, e esta entra para a lista. Não sei onde o Zephyrus foi estabelecer uma relação causal – uma causalidade – do comércio de especiarias na Índia com a criação e existência da Inquisição. Aliás Espanha não tinha qualquer relação com a Índia e teve uma Inquisição incomparavelmente mais violenta do que a nossa.

“Comprava-se a pimenta com dinheiro emprestado e os juros eram altos…” Desconheço que obras de historiadores o Zephyrus leu, ou anda a ler, mas existe muita ignorância nos seus comentários. Portugal não comprava especiarias – entre elas a pimenta – na Índia a dinheiro, estávamos nos séculos XVI/XVII e não século XX ou XXI. Devia ser de muita utilidade, e de grande valor comercial, moeda europeia –e portanto forasteira - para os nativos onde íamos buscar as especiarias!!!!!!!!!!!

“A coisa mais lucrativa que tivemos olhando para tras foi o Brasil” Sim, ao contrário da Índia, o território brasileiro era possessão nossa, exercíamos soberania no Brasil, naturalmente era de esperar que desse mais lucro. Já relativamente a África convêm ter em consideração que também extraímos muito ouro africano e, mais importante, ter a ideia que sem a mão-de-obra escrava africana que levamos para trabalhar nas minas brasileiras ou nas plantações de cana-de-açúcar, e o ouro africano que nos permitiu ter “capital” para investir em fortalezas e infra-estruturas criadas no território brasileiro nunca conseguíamos obter o lucro que tivemos no Brasil. Aqui sim, existe uma relação causal, sem África anteriormente nunca teríamos o lucro no Brasil.

Miguel Dias disse...

“Eu gostaria era de saber se Africa estava a dar lucro” Se o petróleo valesse no século XVI o que vale nos dias de hoje o que poderíamos ter feito com o “ouro negro” angolano? África, e a sua colonização, nos anos 60 século passado era práctica fora de tempo e uma possessão a transferir soberania para os nativos, mas a sua posse não foi desnecessária nem custosa, no sentido de dar prejuízo económico-financeiro, até então. Se as elites portuguesas se movessem unicamente por considerações económicas nunca teria havido Descobrimentos, e sem estes – que não surgiram inicialmente por ponderações económicas - possivelmente não teríamos assegurado posses e meios para nos defender enquanto Nação Soberana, teríamos perdido a soberania perante os Filipes, e seríamos hoje uma província espanhola.

Actualmente existe em Portugal muito “liberal” que não nasceu “de per si” e com uma filosofia própria, mas apenas – numa linguagem hegeliana – em mera antítese à tirania intelectual dos marxistas, ou seja só existe por mera contraposição à existência da tese comunista, portanto conserva uma parte da tese original, que se vê neste pormenor: são os factos económicos que determinam – e devem determinar - a existência humana e a sociedade. Marx defendia que era a infraestrutura económica que determinava as ideias e a existência dos seres humanos, a tese do Materialismo Dialéctico. Muitos liberais são marxistas sem o saber e inconscientemente defendem a mesma ideia filosófica. Qual David Hume, qual Adam Smith (com a sua obra «Teoria dos Sentimentos Morais»), qual John Locke o verdadeiro inspirador deles é Karl Marx: sem a ideia lucro económico não existe acção humana, sem mais delongas é abandonada uma parte da tradição intelectual que veio da Antiguidade Clássica, com um axioma clássico escrito na Bíblia “nem só de Pão vive o Homem”, portanto não só de considerações materiais ou de mera subsistência, senão não nos distinguiríamos dos outros animais nem nos libertaríamos das contingências naturais.

Vivendi disse...

Miguel Dias, muito bem!

A visão de Salazar era preparar o ultramar para uma verdadeira independência tendo como exemplo o Brasil.

Já li algures um escrito de Salazar que apontava nesse sentido mas infelizmente já não sei onde.

josé disse...

A casmurrice foi um factor. Salazar era mesmo casmurro, parece-me. E isso não deslustra as restantes qualidade porque poderia ser uma vantagem se os tempos fossem outros.

Porém, nos anos sessenta, Salazar já estava velho, como aliás é dito pelo seu biógrafo Franco Nogueira. Já tinha escolhido a pedra do túmulo.


O ilusão da sociedade multi-racial era isso mesmo. E não se tratava de abandonar as populações brancas à sua sorte, mas de preparar, desde os anos cinquenta, a transição. Não se fez tal coisa e depois o resultado foi a tragédia que se conhece.

Em 1974 a alternativa seria continuar a guerra, o que a meu ver seria preferível e garantiria, talvez, sublinho talvez, aquele destino mais favorável aos brancos que estavam em Angola e Moçambique.

Nem todos tiveram a oportunidade de Almeida Santos. E nem todos fizeram o que esse indivíduo fez depois, na descolonização.

Portanto, a responsabilidade do desastre deve ser repartida: Salazar e Caetano e depois os abrileiros, comunistas, socialistas e social-democratas. Todos.

Tivemos o que merecemos? Talvez.

Miguel Dias disse...

José,

o objectivo seria criar Países estáveis, com instituições políticas duradouras baseadas num Estado de Direito seguro, não era apenas e exclusivamente assegurar um "destino mais favorável aos brancos que estavam em Angola e Moçambique." Países com futuro, não só para os brancos que lá estavam mas também para os nativos da região, e isso levaria décadas. Talvez tenha existido alguma casmurrice de Salazar em abandonar imediatamente, mas a alternativa era um "banho de sangue" mais que certo, concordo que a transição se deveria ter começado a fazer mais cedo... mas Portugal tinha outras prioridades nos anos 30, 40 e 50 do século passado, não nos devemos esquecer da difícil situação económica, financeira, e consequentemente social, que o Estado Novo herdou no início dos anos 30.

josé disse...

"o objectivo seria criar Países estáveis, com instituições políticas duradouras baseadas num Estado de Direito seguro,"

Uma utopia. Basta lembrar o que aconteceu na Rodésia de Ian Smith, já com tudo isso em andamento acelerado. E que adiantou? Um Kaunda.

E na África do Sul?

A África portuguesa era um mito. Infelizmente, mas era.

josé disse...

Os nacionalismos não são mais que o apego das pessoas às suas raízes.

Os brancos não tinham raízes em África, pelo menos nos milénios mais próximos.

Os pretos são os donos de África e sempre foram. E assim é que está bem.

Miguel Dias disse...

José,

"Os brancos não tinham raízes em África, pelo menos nos milénios mais próximos.

Os pretos são os donos de África e sempre foram."

Não questiono esta posição, nem discordo dela, sou a favor dela. Sei que em Portugal, nos anos 60 do século passado, havia muita gente que defendia que a nossa posse dos territórios africanos não podia ser colocada em causa, e para manter tal posse teríamos de guerrear. Penso que as elites num determinado momento compreenderam que tal posse seria impossível, e procuravam sobretudo assegurar uma transição pacífica, tardia é certo, mas com o menos sangue derramado.

"Uma utopia... criar Países estáveis, com instituições políticas duradouras baseadas num Estado de Direito seguro..." Talvez, mas não custava tentar, a alternativa era a tragédia que conhecemos com a descolonização exemplar feito pós-25 de Abril.

josé disse...

Não. A alternativa era o que Marcello Caetano estava a tentar fazer e Salazar não quis, por casmurrice: sair de África com dignidade.

Bic Laranja disse...

O José está equivocado.
Na Rodésia sucedeu o Mugabe. Smith só começou a tombar com a debandada portuguesa. Kaunda é doutra Rodésia, que se tornou independente mais cedo e foi logo reconhecida por isso mesmo. Rodesias negras e a perseguir brancos nunca afligiram o Mundo. O Ian Smith sim...
Caetano não fez nada diferente de Salazar relativamente ao Ultramar, salvo fazer vista grossa às manobras do Spinola com o P.A.I.G.C. E comprovou nelas o que se sempre soube: não havia negociação possível com aquela gente, porque eles queriam tudo. E na prática o que havia fazer era perseverar? E sem mostras de fraquejar, como apregoavam e apregoam da Guiné, mas antes mostrando força, como de facto se via melhor em Angola. No momento em que o Mundo percebesse que a ideia era largar de lá, desabaria tudo, como desabou, com a nossa tropa no primeiro lugar do baixar de braços. O Muja tem explicado isso muito bem.
Realmente tudo isto é chover no molhado.
Cumpts.

Bic Laranja disse...

Mas nada disto importa. O Sobralinho ganhou o eurofestival. Temos o reconhecimento pleno do Mundo. Depois do adeus, finalmente.
Aguarde-se em jubiloso júbilo a condecoração lá de Belém.
Palhaçada!

josé disse...

"E na prática o que havia fazer era perseverar? E sem mostras de fraquejar, como apregoavam e apregoam da Guiné, mas antes mostrando força, como de facto se via melhor em Angola."

Sim, estou de acordo, mas até quando? Era esse o dilema de Caetano.

Quanto à Rodésia e a Kaunda, os factos estão ligados e é por isso que não se separam como exemplo.

Era uma perfeita ilusão e parece-me um erro, pensar que se nós aguentássemos e continuássemos tudo se resolveria a contento...e não haveria Rodésia sem Smith nem África do Sul sem Botha.

Utopias, quanto a mim.

Victor Nogueira disse...

Uma amostra interessante, mas mais interessante seria se cada "recorte" fosse acompanhado da identificação da fonte: título do órgão de informação e data da publicação.

josé disse...

Se clicar na imagem e a abrir tem a identificação de origem e data. Basta ver com um pouco mais de atenção nas características da imagem...

josé disse...

De qualquer modo indiquei que eram todas de 1967 e dos primeiros meses de 1968, do Século Ilustrado e Flama.

muja disse...

Obrigado ao José pelo postal. Gosto muito destes que dão um panorama assim alargado.

Já todos conhecem a minha opinião mas, como o assunto é interessante e, cada vez me parece mais, actual, cá vão mais umas palavras.

Primeiro, há que notar a ironia de referir-se a defesa ultramarina, sua a estratégia e os objectivos que a informavam como utopias. Pois haverá ele maior utopia do que contar com que, submetendo-se Portugal aos ditames de um organismo estrangeiro que, apesar das pretensões supra-nacionais, é na prática dominado por potências que, elas próprias, nunca deixaram de ser, pelo menos na prossecução dos seus interesses específicos, tão nacionais como sempre o foram; que submetendo-se assim o país aos ditames dessas potências, estas houvessem de lhe proteger os seus interesses específicos? Nunca o fizeram antes, porque razão haveriam de o fazer agora?

O facto de se considerar hoje em dia, aparentemente pelo menos, esgotarem-se os ditos interesses nos planos económico e financeiro, nada muda.

muja disse...

Os pretos são os donos de África e sempre foram

Cá eu não posso discordar mais. Isto parece-me, tal e qual, aquilo que o cavernícola das nacionalismos pagãos andava por aqui a pregar. Por essa ordem de ideias, os donos da Península Ibérica haveriam ainda de ser os Iberos, os do Norte de África os Cartagineses e Egípcios e os da Rússia os Mongóis. E os homens e as culturas haveriam de estar condenados a permancer onde quer que calhassem nascer. Sabemos que não é assim.

Mas o erro é mais profundo ainda. "Os pretos" não são uma massa humana homogénea. Referimo-nos assim a eles por conveniência, mas a aplicabilidade da designação é de utilidade limitada, e tanto mais limitada quanto mais perto de África se esteja. Aliás, está à vista o resultado de fazer política com base em conceitos de tão rasa profundidade. Se fosse possível tomar cada chamado país africano e cada povo que os habita, e se fosse possível baralhar e tornar a dar, completamente ao calhas, alguém poderá afirmar que o resultado seria melhor ou pior? O resultado havia de ser, parece-me, mais arrátel menos arroba, o mesmo.

"Os pretos" não são nem uma civilização, nem uma cultura, nem uma religião, nem uma raça. E só muito ao longe são uma cor de pele. São um conjunto de gentes, de povos, cuja organização varia entre alguns, poucos, reinos e inúmeras tribos e clãs com infinita variedade entre as formas concretas. Muito poucos terão conceito e consciência do que significa ser dono de uma terra no sentido que nós lhe damos. E nós não lhe podemos dar outro mais consentâneo com o que eles eventualmente possuam - seria hipócrita, desonesto, imoral. Quantos de nós estariam dispostos a abandonar as leis e o direito da propriedade com que regemos a nossa, e trocá-los pelas noções que as várias tribos africanas possam usar para reger a deles?

Portanto, desde logo, estamos a comparar alhos com bugalhos.

Além disso, ainda que pudéssemos respeitar absolutamente as inúmeras noções de propriedade de todas as tribos, clãs, etc; e pudéssemos ainda, sem nada mudar, resolver os inúmeros conflitos a que dariam azo, já nem digo connosco, portugueses ou europeus, mas entre os próprios; ainda que o pudéssemos fazer, a África é um continente tão vasto, de proporções tão gigantescas que a maior parte da terra ficaria - como ainda está - desocupada, vaga, por desbravar e colonizar seja por quem for. Terra onde nenhum homem pôs ainda pé.

E quem são os donos da Amazónia? O Brasil está mais colonizado que África, mas não o suficiente que não descubram, ainda hoje, tribos que nunca contactaram com outras gentes. Esses não têm direito a ser donos de toda a América do Sul como se quer fazer crêr que "os pretos" são de toda a África?

A verdade é que a cor de pele não é critério aproveitável para organizar sociedades modernas e muito menos países novos em folha. E, em África, nem na cor de pele nos podemos fundar. Aquilo que nos parece semelhante é por vezes tão diferente que bem poderiam uns ser azuis e os outros encarnados. Qualquer veterano das lides de África poderá confirmar isto.

De maneira que afirmar que os pretos são os donos de África não adianta nada, não explica nada, não resolve nada. O mais que faz é permitir ignorar convenientemente a certeza de que "os pretos" são, na realidade, donos de coisa nenhuma. Qualquer potência lá vai, mata os que quer, escraviza quantos quer, toma o que bem entende, deixa lá umas torneiras e umas bugigangas, e ainda se congratula como defensora dos direitos humanos.

muja disse...

Africa nos anos 60 era uma colonizacao fora do tempo

Concordo. Mas era fora do tempo porque lhe estava adiantada. Ou como soe hoje dizer-se: era uma coisa que existiu antes do seu tempo.

Penso que todos concordamos em que África está, pela maior parte, por colonizar - e falo da terra, não das gentes. Essa falta de colonização existe a par com os chamados países africanos que mais não são que o perpetuar dum estado de desordem conveniente a certos interesses que lhes permite obter, fácil, discreta e injustamente, tudo quanto desejam - interesses esses, diga-se de passagem, com os quais todos somos cúmplices. Pois muito do que compramos e usufruímos necessita, para ser fabricado, de matérias que só se encontram em África e são de lá extraídas em condições que não têm comparação - de piores - com as previamente existentes nas províncias portuguesas, para não falar noutras. Isto é matéria de facto.

Essa desordem tem provocado - têmo-lo visto e é assunto cada vez mais actual - migrações a escalas talvez nunca vistas, ou, em todo o caso, muito raramente, da África para a Europa. As pessoas procuram fugir à desordem que grassa nos seus sítios de origem, ainda por cima seduzidos por promessas, reais ou ilusórias, de acrescidos benefícios lá inimagináveis. A relativa facilidade em atingir o continente europeu - não há oceanos pelo meio, e há formas de ultrapassar o deserto, faz o resto. Como se não bastasse, o desconcerto, inconsciente ou talvez não, real em qualquer caso, da política "ocidental" - quer dizer, europeia e americana - fez abrir uma brecha - com a destruição do estado líbio - na já de si pobre barreira e fronteira que representam para a Europa o Norte de África e os países do Magreb.

A situação reverteu-se em toda a linha. A uma colonização de terra desocupada, de forma em geral ordenada, gradual e sustentada, no sentido Europa - África; substituiu-se, substitui-se, uma colonização de terra já mais que ocupada - ocupação, aliás, cuja disposição tem dado origem, ao longo dos séculos, a inúmeros conflitos -, uma colonização caótica, desordenada, aos borbotões, aos - pode dizer-se - trambolhões, por gente sem rei nem roque, ignorante em tudo daquilo que a espera, no sentido África - Europa. Por outras palavras, uma catástrofe em formação - adiantada, nunca é de mais dizê-lo.

Esta inversão do estado natural das coisas não pode durar: ou a Europa lhe põe termo ou porá ela termo à Europa.

muja disse...

Portanto, e partindo do príncipio de que a Europa dura - pois só esse tem interesse -, o sentido da colonização inverter-se-á forçosamente. Mais, o problema só pode resolver-se definitivamente levando ordem a África. Isto é, retomando eventualmente o trabalho que os portugueses lá estavam fazendo. E isto para breve.

Além disto há ainda a considerar o que parece cada vez mais vir a ser o grande conflito do ínicio do milénio: a revolta das nações contra a governância global, ou das independências nacionais contra o imperialismo supra-nacional, ou ainda, se se preferir, dos nacionalismos contra o mundialismo. Se isto se verificar, forçoso é de concluir - visto que tanto a Europa como a África continuam no mesmo sítio onde sempre estiveram - que as nações que tenham ainda em si a vontade da independência, se encontrem, mais tarde ou mais cedo, com os olhos postos em África como natural ponto de expansão, abastecimento e apoio. E se desaparecerem as nações independentes, pois também não ficarão os chamados países africanos. A ilusão das independências africanas deixará, nesse caso, de ter razão de ser e nova organização se encontrará para a exploração do imenso continente.

Não se pode propriamente afirmar que Salazar previsse tudo isto. Mas também não precisava. Bastava-lhe, bastou-lhe, considerar aquilo que era permanente. África é o complemento natural da Europa. Permanentemente. A ordem em África beneficia a Europa e a desordem prejudica-a gravemente. Já era assim no tempo dos piratas da costa Barbária, e é-o hoje com as migrações caóticas. Determina-o a geografia, desde logo. É permanente, e não há vogas, ventos, ideias ou sofismas que impeçam que, mais tarde ou mais cedo, a realidade se imponha.

Se quisermos sobreviver enquanto nação independente, admitindo que teremos sequer essa possibilidade, é para África que teremos de virar-nos. Era assim há 800 anos, não o é menos hoje e não o será no futuro, se o ainda pudermos ter.

Vivendi disse...

Uma nação se forma com:

uma língua
uma fronteira
uma cultura


Portugal foi pois o obreiro. Se no Brasil foi possível em África também seria.

Hoje África é um continente falhado.

Vivendi disse...

Salazar casmurro?

"Cada época é salva por um pequeno punhado de homens que têm a coragem de não serem actuais."

G.K Chesterton


Angola e Moçambique acabaram dizimadas com milhões de mortas.
O grande feito de quem esteve do lado errado da história e ainda hoje o está. E o lado errado da história já está dentro da Europa.

Maria disse...

Concordo com a visão de Bic Laranja sobre a "nossa" África e nem podia ser doutro modo já que eu comungo da sua maneira de pensar.

José, contràriamente ao que tem vindo a afirmar e isto eu já aqui escrevi mais do que uma vez, quem não conheceu ou principalmente quem não viveu numa das nossas Províncias Ultramarinas por pouco tempo que tenha sido, não pode ter um ideia clara e precisa sobre o pensar e o sentir daqueles povos em relação aos portugueses europeus, numa palavra, aos brancos. Quando os portugueses aportaram ao Continente africano a maior parte daqueles territórios eram pràticamente despovoados, com a excepção d'algumas tribos disperças no interior d'Angola e de Moçambique e alguns daqueles eram mesmo terras sem vivalma, como é sabido.

Baseando-me no conhecimento profundo de alguns dos meus familiares que lá viveram, um que viveu muitos anos em S. Tomé e outros lá nascidos e ainda outros nascidos em Angola, a opinião generalizada de todos eles em relação aos pretos de qualquer dos territórios (mais abaixo falarei dos mulatos e cabritos) é que eram pessoas generosas e humildes e tinham uma relação de genuína amizade e respeito e, diria sem exagerar, de agradecimento pelo muito que deviam aos seus patrões por neles terem confiado, a maioria deles brancos mas também os havia negros, nos vários postos de trabalho - restaurantes, bombas de gasolina, lojas, hotéis, etc. E no caso de São Tomé, nas Roças. E devo acrescentar antes que me esqueça, nestas duas Ilhas encontradas desabitadas pelos portugueses, os povos que as foram povoando, muitos deles eram oriundos de Portugal e outros sobretudo de Angola, mas também da Guiné e de Cabo Verde, curiosamente este povo sempre se considerou mais europeu do que africano. Por aqui se pode ver que muitos dos que por lá se fixaram deixaram descendentes bem clarinhos de pele e com olhos verdes ou azuis, os chamados "cabritos", filhos de mulato e de branca ou vice-versa, como são de facto muitos cabo-verdianos, mas também bastantes angolanos com cabelo louro e de olhos azuis, embora alguns deles com carapinha. Um rapaz angolano que vivía próximo da nossa casa, era branco cor de leite, cabelo muito louro, olhos muito claros, feições negróides e de carapinha rústica e apesar destas características não era feio, formou-se em medicina e foi viver para a Alemanha..., uns amigos dele de Angola inventaram uma canção para o descrever dado seu aspecto peculiar e simultâneamente tão singular. Aqueles povos não eram os "donos" daquela terra, como diz e repete o José... e pelo conhecimento que tenho deles não creio que se considerassem como tal. O que eles, sim, demonstravam era extrema lealdade e agradecimento ao patrão branco que lhes desse trabalho. E até, por muito que se espantem os que se consideram superiores em classe social e raça e tendo evidente desprezo por aqueles povos, reconhecendo-o ou não (desprezo não só pelos negros mas por todos os de pele mais ou menos escura) também havia negros donos dos seus próprios negócios e com empregados tanto brancos como negros seus iguais. Certamente que poderão ter havido excepções, que as há em tudo, são aquelas que confirmam a regra.

Isto em relação aos pretos. Quanto aos brancos que já lá haviam nascido, bem como seus pais e avós, nem vale a pena falar porque todos sabemos o que sentiam enquanto viveram em paz e alegria e o que sentem hoje, aqueles que sobreviveram ao genocídio praticado pelos terroristas a mando dos comunistas e socialistas em Lisboa, pelo modo criminoso como foram escorraçados de uma terra que consideravam tão sua quanto os demais povos autóctones. Quanto aos mestiços e cabritos, a conversa é muito outra. Estes eram pessoas com uma mentalidade totalmente diversa daquela que se possa intuir à primeira vista. Estes consideravam-se tão portugueses e tão dignos quanto os europeus e não tinham o menor sentimento de inferioridade pela cor de pele, que não sendo negra também não era totalmente branca, nem sentíam qualquer tipo d'exclusão por parte de quem quer que fosse.
(cont.)

Maria disse...

Se havia racismo nos nossos territórios africanos? Claro que terá havido algum, como aliás continua a haver em Portugal e no resto do mundo. Nas nossas Províncias Ultramarinas tê-lo-á decerto havido, mas era um sentimento muito localizado e negligenciável e certamente, como seria natural, havê-lo-ía no interior dos territórios entre descendentes das tribos primitivas (é bom lembrar que o Regime não admitia racismos de espécie alguma e os portugueses eram doutrinados nesse preciso sentido e as directivas emanadas do governo eram pacìficamente aceites e respeitadas), tanto era de brancos para negros como destes para aqueles, mas também e é bom lembrar que sempre houve racismo de negros para negros sobretudo entre os desdendentes de tribos rivais e, para não ir mais longe, existe e de que maneira na África do Sul desde a independência do país.

O José quer comparar o verdadeiro e violento racismo entre brancos e negros que tem existido desde sempre nos Estados Unidos, com aquele que jamais se praticou nos nossos Territórios Ultramarinos? E que dizer da genuína afeição que os povos das Províncias Ultramarinas tinham pelos portugueses-europeus? Mas se até no longínquo Timor os seus habitantes tinham uma apreço e mesmo amor incondicional pelos portugueses europeus e uma autêntica veneração à nossa Bandeira, guardada religiosamente pelos seus possuídores mesmo depois da Independência do território? Mas há lá comparação possível, José? Já pensou nisto?
(cont.)

Maria disse...

A pergunta que se pode pôr é se seria obrigatória a independência daqueles territórios e para quando? Sim, talvez viesse a ser, mas com tempo, método, organização, ordem e civismo, após a devida auscultação em referendo àquelas populações e em caso afirmativo, só e então com total segurança e protecção das vidas e bens dos seus habitantes, independentemente da sua cor e origem social. Nada disto aconteceu e o principal motivo não é culpa daqueles povos, que se teima em dizer que queriam independentizar-se à força de Portugal, o que é mentira, mas sim da urgência que os dois imperialismos tinham em arrebanhar os ditos territórios e as suas incomensuráveis riquezas. Urgência essa que vinha desde os anos sessenta em que Cunhal e Soares tiveram o papel principal, com a imprescindível ajuda dos apaniguados, com destaque para os traidores que se posicionavam na rádio d'Argel para, com sucessivas mensagens radiofónicas lançando ódio contra os portugueses e propaganda subversiva com apelos à insurreição d'alguma tropa desafecta ao Regime e fornecenddo informações secretas e permanentes aos movimentos terroristas sobre as movimentações dos nossos militares em missão para poderem atacá-los em emboscadas e matá-los, como aconteceu a milhares deles. Carradas de propaganda marxista que atraiu os inocentes autóctones, sobretudo os mais pobres que foram no engôdo sem desconfiarem por um segundo que o que os esperava não era riqueza nem desenvolvimento nem oportunidade de trabalho para todos, mas sim guerra e mais guerra e sofrimento indescritível e milhões de irmãos de raça assassinados e outros tantos estropiados. E toda aquela urgência com as independências foi única e exclusivamente para entregarem os nossos Territórios desde há longo tempo cobiçados, sobretudo a riquíssima Angola, aos dois imperialismos que estavam ávidos de se apoderar do nosso petróleo, ouro, diamantes e madeiras exóticas, além doutros bens preciosos. E foi exactamente o que aconteceu.

Já o disse e volto a repetir, tivesse Gorbachov chegado ao poder vinte anos antes e as independências dos nossos Territórios não se teríam realizado. O José diz que tinha que ser porque a Rodésia e a África do Sul, primeiro aquela e depois esta, também se tinham tornado independentes. Repare que a posição geográfica destes dois países só lhes permitiria continuar com os seus regimes caso Angola e Moçambique continuassem portuguesas ou seja, protegidos do vírus comunista que já havia contagiado meio mundo, com a excepção do regime do Estado Novo e de poucos mais, tendo-se infiltrado em quase toda a África e subvertido os regimes de vários dos seus países. Penso que foi Botha (ou o seu primeiro ministro, não me recordo do nome) que disse que graças ao regime português, livre dos partidos comunistas em Angola e Moçambique, o seu país tinha resistido tanto tempo à investida comunista.
Por amor de Deus, José, não queira comparar o racismo/apartheid infra-humano que se praticava na África do Sul e a vivência pacífica e harmoniosa e a inexistência de qualquer racismo entre pessoas de todas as cores e origens nos nossos Territórios Ultramarinos.

E pronto. Muito mais haveria para dizer mas já chega, que este já vai longo. Para não variar:)

josé disse...

Parece-me uma coisa que já escrevi no outro postal acima:

A África não é dos europeus. E os pretos nunca admitiriam pacificamente um governo de brancos numa terra com maioria autóctone de pretos.

Dêem as voltas que quiserem que não me parece que tal fosse possível assim e era isso que o colonialismo significava.

Isto nada tem contra os pretos ou os brancos, mas é apenas uma simples constatação da realidade natural.

Pensar que os pretos em maioria admitiriam uma minoria de brancos a mandar neles é utópico.

Dêem-me um exemplo. Um único em que tal tenha funcionado bem...

josé disse...

Se entre os pretos há racismo puro por motivos tribais o que dizer da diferença entre africanos e europeus caucasianos?

josé disse...

O que V. estão a confundir, parece-me, é a pacificação pela força. E não a paz natural entre povos, tribos ou gentes que se compreendem e aceitam mutuamente, como tendo a mesma identidade.


Uma nação pode formar-se com uma "língua, uma fronteira e uma cultura" mas falta lá o elemento fundamental: um povo.

Severo disse...

Assino por baixo o excelente comentário de Maria. Como antigo combatente em Angola, constatei o excelente relacionamento entre indígenas europeus brancos, assim como brancos nascidos em África. É evidente que existiam certamente algumas excepções que confirmam a regra. A descrição de Maria, a quem cumprimento cordialmente, foca com bastante minúcia o excelente relacionamento do povo no seu dia-a-dia. Quanto ao seu relato sobre o que os traidores transmitiam pela Rádio Argel, posso confirmar solenemente pois fui testemunha, já que como radiotelegrafista , ouvi muitas vezes as informações dadas aos terroristas. Há muita ignorância no diz respeito à guerra em África, e distorções nos relatos que muita gente faz devido ás suas ideologias, e por isso é lamentável, que ainda hoje se façam relatos tendenciosos do que na realidade se passou. A Pátria chamou-me e eu poderia fazer como muitos fizeram, "pirar-me" para o estrangeiro, não o fiz, preferi cumprir o meu dever como tantos colegas o fizeram, e hoje orgulho-me disso, muito embora votados ao ostracismo pela classe política pós 25/4.
Cps

josé disse...

Severo:
Parece-me que uma coisa é o relacionamento entre as pessoas comuns; outra o relacionamento entre forças que detêm o poder político ou pretendem vir a tê-lo.

Acredito que muitos autótones pretos preferissem os brancos a alguns elementos de tribos diversas. Mas daí a aceitarem de bom grado que o poder e o domínio das riquezas fosse dos brancos e suas empresas vai um passo que não me parece deve dar. E por isso não acredito nessa boa ideia de paz social através do multi-culturalismo rácico.

Maria disse...

Severo, concordando totalmente com o que escreveu, dou-lhe os parabéns por demonstrar ser um grande português e um patriota à moda antiga.

Agradeço-lhe ainda, muito, as amáveis palavras que me teceu.

O Público activista e relapso