quarta-feira, agosto 26, 2009

Uma personagem shakespeareana


Clicar na imagem para ler o artigo de Philippe Raynaud que Mário S. deveria ter lido para ser mais comedido no que escreve e não andar sempre a reboque de lampejos de "esquerda" que lhe servem para se afirmar o que nunca foi...

Mário S. , o principal apaniguado do regime que temos, escreveu um artigo no Diário de Notícias de ontem, 25 de Agosto.

Nele estende ideias feitas há muitos anos, sobre o “socialismo democrático” que nada mais significa do que a rendição de um partido socialista dito de esquerda a uma social-democracia de direita envergonhada.

Como sempre, fala de cor e citando ideias alheias que bebe nos sítios habituais, como é, por exemplo, a revista francesa Le Nouvel Observateur. Nos anos setenta, havia quem jurasse que Mário S. só tinha ideias políticas sobre assuntos internacionais, depois de ler Jean Daniel, o director da publicação.

Agora, no artigo do DN, cita mais uma vez o Nouvel Obs. para repescar outra ideia peregrina que já adiantou noutros sítios, depois de ler qualquer coisa sobre o assunto: Marx e a explicação da crise económica que se vive no mundo.

Para Mário S. que cita ( mal) outros opinionistas, Marx permite compreender melhor o capitalismo de hoje. Mário S. compreende, por assim dizer. Assimila-o “à deriva neoliberal “ e está dado o mote para fustigar até os “socialistas neoliberais formados na terceira via, uma verdadeira fraude intelectual” . Pasme-se! Mário S. acaba de dar o golpe de misericórdia na falta de ideias políticas do actual PS.

Mário S. não deve ter lido o artigo do NouvelObs até ao fim, com a opinião do autor Aude Lancelin, quando o mesmo afirma que Marx poderá ter prenunciado a crise actual do capitalismo, ao descrever o seu funcionamento e essência visível, mas “ após a desorientação do Inverno, o capitalismo está por aqui, mais que nunca e as suas alternativas credíveis ainda não foram inventadas”.

Aliás, Mário S. numa perspectiva marxista quem é? Um bruguês típico. Um apaniguado do capitalismo e dos seus rebentos florescentes que sempre lhe apararam o jogo, enquanto esteve no poder político executivo. Mário S. nunca foi um socialista, porque optou imediatamente a seguir a 25 de Abril de 1974 em “ meter o socialismo na gaveta”, de onde nunca mais saiu. Inventou depois a treta da expressão "socialismo democrático" , para não assumir abertamente o que sempre foi : uma social-democrata indistinguível dos restantes e que se sentam nos partidos que putativamente estão "à direita". Uma vergonha taxionómica e que tem servido os intentos pessoais e político-partidários de quem nunca foi o que diz ser.

Foi Mário S. enquanto político que nos conduziu para uma bancarrota quase certa se não tivesse vindo o capitalissimo FMI. Foi Mário S. quem deu os passos finais ( os iniciais já tinham sido dados pelo marcelismo) para nos meter na capitalíssima CEE e foi Mário S. quem sempre governou para satisfazer as “políticas de direita” ou seja, anti-socialistas como os comunistas sempre, sempre denunciaram.

Vere Mário S. escrever em prol de Marx. só mesmo por ironia. Um burguês típico a cuspir na própria sopa? Nem tanto. Um burguês típico refastelado no único refúgio que lhe consente a coerência: o paradoxo, como sempre foi.

O artigo de Mário S. aliás, revela outra coisa extraordinária que faz luz intensa sobre acontecimentos relativamente recentes da história portuguesa.

Ao referir-se a um pretenso conflito institucional, Mario S. confessa o assédio de “uma boa dezena de jornalistas” que o tentou contactar para falar sobre o assunto “ para colher de mim uma frase ou duas-não seria preciso mais- para alimentar o pseudoconflito institucional”.

Para lidar com essa situação, Mário S. é um mestre e dá a sua receita a conhecer: “ Claro que o bom senso-e alguma experiência que conservo de um passado, cada vez mais longínquo-aconselhou-se a estar calado, a não lançar achas numa fogueira cujo objectivo ignoro(...)”.

Esta frase ilumina o mistério do silêncio de Mário S. nos primeiros meses do escândalo Casa Pia que abalou o PS de alto a baixo e justificou reuniões de cúpula em gabinetes de crise para lidar com a situação catastrófica que se anunciava para o partido, com vários dos seus dirigentes suspeitos de envolvimento em práticas pedófilas.

Mário S. durante essa época de crise grave e intensa para o partido, manteve-se sempre calado e sem qualquer referência nos media que não nos “mentideros” e nos boatos.

Estranhei sempre que um indivíduo que nunca teve medo de se pronunciar sobre fosse o que fosse, estivesse sempre tão calado e ausente da ribalta. Não se ouviu nunca uma palavra de defesa dos entalados, apaniguados do seu partido e a única vez que saiu dessa toca escura foi para atacar em modo soez o antigo PGR, Souto Moura, a propósito de uma infâmia que Mário S. devia saber melhor que ninguém do que se tratava: um estratagema para castigar o antigo PGR pelo que putativamente fez ao PS, deixando correr a investigação sem entraves de maior. Coisa nunca vista em Portugal, em épocas passadas. Coisa nunca vista no tempo em que Mário S. estava no poder supremo da própria presidência...

Mesmo no tempo dos “ballet rose” , escândalo que o mesmo Mário S. tomou a iniciativa de denunciar publica e internacionalmente para entalar o regime, com base em provas que recentemente se conheceram através do advogado que as apresentou.

Confesso que tal atitude de Mário S., em paralelo com a de agora, me lembra inapelavelmente uma peça shakespeareana. Não sei se uma tragédia se uma comédia, embora penda para esta última...com um nojo profundo.

3 comentários:

Wegie disse...

José: Post genial! Uma malha de 1ª categoria!

joserui disse...

Bem bom. Se os jornais tivessem textos destes, até eu os comprava. Mas para ler o senhor Mário, prefiro aplicar a verba noutros lados. -- JRF

MARIA disse...

Mário Soares fala assim porque nenhum camarada ainda o convidou a partilhar férias, por ex.
Estou certa que no dia em que dois camaradas compartilharem umas férias de ministro à portuguesa, MS até passa a entender estes fenómenos políticos de maneira iluminada e a explicá-los de forma que todos compreenderemos.
É que assim este socialismo-marxista está difícil de entender ...

O Público activista e relapso