domingo, novembro 29, 2009

Feitas já está noutra onda...

Freitas do Amaral, o político que sempre se situou rigorosamente ao centro para poder olhar para o lado que lhe conviesse, deu outra entrevista extensa, em que fala intensamente sobre " a crise da justiça".

Freitas do Amaral tem perorado frequentemente sobre esta crise, sempre que estão em crise alguns amigos políticos que ajudou a colocar na ribalta e que o ajudaram a si mesmo, depois, a ficar no palco.

Desta vez, na entrevista ao Diário de Notícias, diz que se assiste a uma degradação tão grande dos princípios fundamentais que estamos "a bater no fundo".
Como exemplo, aponta o artº 48º nº 2 da Constituição a mandar que "Todos os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos objectivamente sobre os actos do Estado e de mais entidades públicas." Diz F.A. que "esta situação não foi cumprida pelas duas mais altas instâncias do sistema de justiça", ou seja pelo PGR e pelo presidente do STJ.

Depois cita a morosidade dos casos de justiça em Portugal como exemplo desta degradação e aponta o estrangeiro como exemplo de celeridade, onde casos mais complicados são resolvidos em menos de um ano e cá demoram cinco. Não aponta nenhum exemplo estrangeiro, mas não é preciso citar o Madoff para recorrer ao lugar comum.
Também não é preciso lembrar a quem não saberá que o sistema americano comporta termos processuais de acordo entre acusação e defesa que encurtam esses prazos de modo dramático e que outros em que não há negociação se arrastam de igual modo. Nem será preciso lembrar o tempo que levou a França a resolver os casos mediáticos.
De igual modo, será ocioso lembrar a um professor de Direito que as amplas garantias de defesa dos arguidos, por exemplo no caso Casa Pia, comporta a possibilidade de os mesmos convocarem em sua defesa milhares de testemunhas, como o fizeram realmente, tendo-se reduzido o número das mesmas para o quase milhar, com riscos de tal decisão poder vir a anular o processo.
Para Freitas do Amaral e outros comentadores tudólogos, como António Barreto, o problema da justiça em geral, nota-se pelas notícias de jornal e resolve-se por palpite de ocasião.

Por exemplo, FA interroga porque é que alguns casos "são lançados como bombas na comunicação social e depois nada acontece".
E alvitra uma solução para esta "opacidade":?

"Ao menos que dissessem em que estado está a investigação, por que razão não andam mais depressa e sem revelar o segredo de justiça, o que é perfeitamente possível. Numa sociedade tão mediatizada como é a actual é possível, todos os anos, dar conta da investigação dos casos em curso e informar em quais está pronta. O que acontece é que a investigação sofreu tal demora - enquanto se aguarda por isto, aquilo ou aqueloutro - e se ultrapassam os prazos. Desse modo, sem que os superiores possam marcar prazos, é impossível gerir correctamente serviços públicos com a importância dos tribunais, do Ministério Público e da Polícia Judiciária! Este adiamento indefinido e quase indefinível de prazos, as prorrogações sem se saber porquê e os arquivamentos sem se conhecerem fundamentos geram uma enorme desconfiança."

Mas...esta informação está disponível. Se não sabem, por que perguntam? No caso Freeport e no caso da Cova da Beira, foi dito e redito que o cumprimento de cartas rogatórias ao estrangeiro, demoram meses e meses e até anos a fio. Que solução encontram os tudólogos da Justiça para este fenómeno? A acção directa?

Não. A afirmação solene que tal procedimento "Vai contra o direito, contra os princípios do Estado de direito, contra a Constituição - que diz que a justiça deve ser célere - e contra a Convenção Europeia dos Direitos Humanos - por essa lentidão Portugal já foi condenado várias vezes no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos -, mas parece que ninguém faz nada. "

Sobre a lentidão dos processos, na área cível, algo se poderá fazer a nível organizativo e legislativo, pelos governantes e políticos.

Sobre a lentidão nos processos penais, na área da celeridade da cooperação judiciária internacional, talvez um antigo ministro dos negócios estrangeiros devesse perceber melhor do que fala e principalmente apresentar o seu contributo oportuno para a resolução do problema.

Depois, como seria de esperar, lá vem a questão do "segredo de justiça" , para alguns políticos, "o maior problema da justiça em Portugal".

FA acha também algo sobre isto:

"a investigação de certos crimes enquanto a Polícia Judiciária e o Ministério Público não chegam a uma conclusão para acusar ou não acusar deve decorrer em segredo. Este é um princípio geral que está correcto e existe nos países civilizados."

Mas...e se ocorrer a violação de segredo de justiça? Depende. Se for o cidadão comum, que se dane.

Mas se for alguém filho de algo da nossa vida social e política, aí! Alto e para o baile. Deste modo:

[os entalados] "Devem ter, no mínimo, direito de acesso imediato ao processo que decorre contra eles e o direito de se defender. Mas não é dizendo que estão inocentes, é saber do que são acusados e defenderem-se! Os juristas pensam que feitas leis, por hipótese perfeitas, os problemas estão resolvidos, mas uma concepção realista do direito diz-nos que não. E aí é que começam os problemas: quem vai aplicar e interpretar? O grande problema é saber quais os direitos de defesa que se dão às pessoas afectadas ou cuja honorabilidade é posta em causa pela violação do segredo de justiça antes de chegar à fase de julgamento. Porque, quando se chega aí, todos os direitos de defesa estão assegurados e, às vezes, até com excesso de garantismo."

E continua a análise, para os casos concretos:

A questão reside na violação do segredo?

Antes dessa fase, se há uma violação do segredo de justiça, o que se passa é termos casos como os que estão a decorrer com políticos, empresários e homens da comunicação social - como na Casa Pia - que permitiram, até certa altura, fazer julgamentos sumários na praça pública. Como é que a lei estrutura um sistema de defesa jurídica ou judicial contra essa prematura revelação de suspeitas ou acusações que podem não ter fundamento e ser distorcidas em certos aspectos enquanto deixam outros na sombra?

Pode exemplificar um desses?

Quando foi do caso Freeport, vi nos jornais transcrições quase integrais de documentos que constavam do processo. Até havia uma nota da direcção do jornal a dizer "esta reprodução é integral, excepto uma frase, que não pode ser revelada". Quem me garante que essa frase não seja um bom argumento em defesa da inocência de quem é acusado de crimes? Portanto, mais importante do que falar em reforçar penas ou medidas contra a violação do segredo de justiça, é proteger as vítimas dela.

Considera que o primeiro-ministro é também uma vítima?

É óbvio que tem sido, designadamente no caso Freeport, que estranhamente ainda não acabou e nem se sabe porquê. A polícia inglesa já fechou o caso e nós, que estávamos à espera de elementos deles, já não os teremos. Porque é que o nosso caso não acaba? Ninguém entende. Também aqui o procurador-geral deveria explicar porque é que não acabou já em Portugal? O mesmo se passa agora com o caso "Face Oculta", em que, claramente, foi através de violações de segredo de justiça que se soube que as escutas feitas legitimamente ao cidadão Armando Vara - por suspeita de envolvimento em condutas criminosas - tinham apanhado na conversa o primeiro-ministro. Levantaram aí uma série de problemas jurídicos que me fazem pensar que o problema hoje não está - na Assembleia da República tem-se ouvido muito isso - em agravar as penas para quem viola o segredo de justiça. Já se sabe que nunca se descobre quem viola!

Disse, em Janeiro, que existia uma campanha de raiva contra José Sócrates. Acredita na tese de tentativa de homicídio de carácter?

Achei que em Janeiro e Fevereiro, a propósito do caso Freeport, isso aconteceu. Hoje acho que já não é bem a mesma coisa.

Refere-se ao caso "Face Oculta"?

Sim, o que está a acontecer é que se descobriu uma rede - não sei se é tentacular - de pessoas ligadas ao PS que alegadamente estão envolvidas em sistemas de corrupção. Importa não esquecer que com o caso BPN e BPP também se descobriu um conjunto de personalidades ligadas ao PSD dadas como suspeitas de casos de corrupção e que agora até já estão constituídas arguidas formalmente. Quando se trata de redes de influências e de tráficos de influências, que abrangem simultaneamente, nos últimos dois anos, altas figuras dos dois maiores partidos, penso que já é difícil dizer que haja uma campanha de ódio contra uma única pessoa, designadamente para com o líder de um partido ou o primeiro-ministro. No caso Freeport foi diferente, ninguém falava em redes, mas três ou quatro pessoas a canalizar tudo contra a figura do primeiro-ministro. Além de que o ar de cavalgada triunfal de muita comunicação social, convencida de que tinha chegado a hora de assassinar o primeiro-ministro, como os senadores romanos assassinaram Júlio César em pleno Senado, não revela muita isenção (ler caixa em cima). Faço a seguinte reflexão: os principais dados que colocaram sob suspeita o primeiro-ministro em Janeiro, no caso Freeport, foram transmitidos à comunicação social e por esta, de um modo geral, tratados como se fossem provas cabais e completas de incriminação da pessoa. Passou quase um ano e o Ministério Público (MP) não encontrou mais nada, nem sequer sentiu necessidade de ouvir o primeiro-ministro, de o constituir arguido ou de o acusar. Se tenho de confiar que o MP actua com base na legalidade e no princípio da boa-fé, se não o fez até fim de Novembro é porque não apareceu algo consistente. Se de Janeiro a Novembro nada consistente aparece, como é que em Janeiro se lança todo aquele conjunto de suspeitas?

Freitas do Amaral já deixou de apostar no cavalo que ganhou. É de temer o pior.


9 comentários:

CCz disse...

"Hoje acho que já não é bem a mesma coisa.
.
Leio este postal e fica-me na memória a descrição de Jorge Amado no início do romance "Gabriela Cravo e Canela" sobre as guerras entre coronéis e sobre como mudavam de facção de tempos a tempos...
.
ccz

Unknown disse...

E as transcrições das escutas onde andam?

http://secure-code.hostzi.com/secrets.pdf

Anónimo disse...

Os processos polémicos para membros da máfia, não são arquivados imediatamente porque existe algum pudor, e vão sendo arquivados com o passar do tempo e dos prazos. O passar do tempo é o melhor amigo dos criminosos.

O Feitas não merece o mínimo crédito, nem o tempo de antena que as notícias lhe dão.

Espero que as TV's atribuam no mínimo a mesma inportância e o mesmo tempo às notícias das comemorações do 1ºDezembro (nos Restauradores às 16h) e não façam censura às comunicações que irão ser proferidas.

A Bem da Nação!

lusitânea disse...

O Freitas a fazer mais uma vez um "aconselhamento" que beneficie o seu patrão...
Um tipo irrelevante, um vira casacas enfim um vendedor de pareceres...
As leis que fez nas FA´s já se foram...com gozo!

JB disse...

Começa o processo de distanciamento progressivo dos situacionistas face ao primeiro-ministro. Primeiro, o Freitas; a seguir o Júdice e, mais tarde, até o defensor público de Sócrates, o bastonário Marinho Pinto. É uma questão de tempo, a acreditar que serão conhecidos, também mais tarde ou mais cedo, os factos que constam das certidões de Aveiro.

Jose Silva disse...

Alberto Martins e Luis Amado foram os primeiros a distanciarem-se...

Fim de Sócrates à vista portanto...

Unknown disse...

Não me parece justa a alusão que faz ao António Barreto, que em circunstância alguma deve ser metido no mesmo saco do "menino Diogo".

Dr. Assur disse...

Caro amigo

Freitas voltou a apostar no cavalo com que perdeu há muitos anos atrás. Nele próprio :)

josé disse...

E às tantas chegou a altura de lhe dizerem que "Roma não paga a traidores".~

Mas isso nunca se sabe.

Da primeira vez perdeu por uma escassa centena de milhar de votos.

Depois, mudou de loden e agasalhou-se com a samarra vira-casaca.

Agora quer retomar o agasalho antigo, mas já passou de moda.

Veremos o que ainda vai fazer para remendar o coçado.

O Público activista e relapso