Quem ler estes artigos sem conhecer o que é o Ministério Público, quais são os seus órgãos e competências, o modo como se investigam os crimes e o modo como interagem os magistrados do MºPº nessa investigação, fica a saber e acredita que tudo isso depende directamente da PGR.
Esta informação é de uma pobreza, mediocridade e até ignorância que aflige.
Certamente muito por força do que se passou nos últimos 15 anos, principalmente a partir do caso Casa Pia que envolveu um partido político que predomina no espaço político nacional, a opinião pública foi sendo orientada e condicionada por notícias que tendem a concentrar numa única figura singela a responsabilidade pela instituição que é o MºPº .
Tal aconteceu muito por culpa dos próprios magistrados que não falam, não ouvem e não querem ver o que se passa à sua volta, como o macaquinho dos cartoons.
Quando os sinos dos media tocam a rebate lá aparece um ou outro comunicado, muito a medo não se sabe bem do quê e porquê, a explicar de forma críptica os factos em causa, os assuntos na berlinda. Geralmente fazem-no mal e de modo insuficiente e acabam por deixar o espaço todo à komentadoria ignara.
Não adiantou nada ser um Cunha Rodrigues ou um Souto Moura, até um Pinto Monteiro ou uma Joana Marques Vidal e esta que agora vai para lá irá fazer o mesmo de sempre: falar o menos possível com medo de ser acusada de protagonismo, o pior pecado que podem imputar a um magistrado em funções.
Compreende-se: que raio de formação específica tem alguém para comunicar publicamente seja o que for se acabou um curso universitário, ingressou numa escola de magistratura, despachou processos e fez julgamentos e por natureza sempre lhe disseram que tem que ser discreto, reservado, sereno, recatado, contido e mudo, de preferência?
O que vem de trás toca-se para a frente e temos o que temos há anos e anos. Isto não vai mudar porque as pessoas que estão nesses cargos têm medo da sombra e nem o sem vergonha do Pinto Monteiro foi muito diferente, apesar de arrogar-se como um Pinto sem medo de ninguém.
Qual é esse medo, no fim de contas? Simplesmente o de dizer asneiras que lhes descubram a careca das insuficiências ou o de dizerem algo que pode servir para os crucificar por isto e por aquilo que a lei subtil esconde ou permite. É muito mais confortável o silêncio porque quem não fala não corre esses riscos.
Para além do mais, alguns exemplos avulsos servem de aviso, como foi o caso de Souto Moura, ingénuo, a explicar que um tal Cruz não era suspeito quando já tinha um processo em cima, em segredo de justiça.
Cunha Rodrigues, quando saiu de nada lhe valeram as explicações que dera ou as declarações e várias entrevistas ( importantes, ainda hoje) em que esclareceu bem o que significava para ele o MºPº. O PS e o PSD cairam-lhe em cima como osso duro de roer e rilharam-no até ao tutano. Depois disso desapareceu praticamente da ribalta e faz muita, muita falta nos tempos que correm. Mas o MºPº actual, o que está e vai continuar a estar, correu com ele. Acham-no antiquado...
Tudo isto para dizer o quê? Simplesmente que a opinião pública ainda não sabe como funciona o MºPº e o que se escreve e diz nos media tem contribuído para essa desinformação e ignorância.
Provavelmente é propositada tal falta de vontade de esclarecimento uma vez que é muito mais fácil apontar e assestar baterias de críticas a uma pessoa do que a uma instituição. Só que deveria ser essa pessoa, ou seja o/a PGR, a demarcar-se e informar devidamente como são as coisas e como funcionam na realidade.
Não o fazem, não o fizeram, pelos motivos apontados e mais um: uma certa vaidade também e afinal aceitarem um protagonismo que lhes é emprestado, sem concurso próprio.
Perante esta ausência, o espaço vazio é ocupado pela komentadoria e pelo jornalismo que temos, feito de jornalistas formados à pressa, sem conhecimentos sólidos, que aprenderam os fundamentos básicos do funcionamento das instituições sabe-se lá onde e principalmente adquirem o estatuto de arautos de uma certa moralidade ambiente que pode muito bem ser a do populismo mais rasteiro, como se verá a seguir.
O Público é actualmente o exemplo máximo desta komenklatura.
Considero isto uma das maiores desgraças nacionais que se replica noutros sectores, praticamente em todos e que origina depois uma opinião pública mal formada e mal informada que afinal vota em líderes que são os que temos.
A quem é que serve este estado de coisas? A quem não interesse que a justiça funcione bem e a quem convém manipular a realidade quando o pretendem fazer. Estou obviamente a citar os políticos que querem alcançar o poder.
São esses mesmos que dizem que Salazar queria manter o povo num estado de analfabetismo para não perceberem o que se passava. Estes querem manter o povo desinformado para poderem manipular votos. A desinformação é uma forma de analfabetismo e provavelmente mais perversa que aquela.
Para além disso temos aqueles que percebendo do assunto escrevem em modo críptico para umas dúzias de pessoas que os podem ler e que já sabem o que escreve. É o caso de António Cluny, magistrado do MºPº, em funções no Eurojust, para onde foi ganhar "uma pipa de massa" e por um triz não ia. Aí está um caso concreto em que um/a PGR pode ter influência.
Que escreve Cluny habitualmente no i? Leia-se, na edição de hoje:
Repare-se bem na escrita, propositada para acólitos ou iluminados e que deixam de fora os jornaleiros komentadores que não chegam ao miolo do bestunto:
"o MP não se reduz à figura do PGR e que a autonomia que garante a objectividade da actuação de todos e cada um dos seus magistrados deve reflectir-se, clara e necessariamente, no seu estatuto."
Nesta pequena frase concentra-se toda a essência e importância do MºPº mas quem a compreende devidamente? Não estes jornalistas komentadores, certamente.
Nela se diz que o actual estatuto do MºPº que está em vias de apreciação pela AR, vindo do Governo, deve consagrar essa autonomia específica e solidificar esse princípio da magistratura. Diz ainda que a figura de uma Joana Marques Vidal, no caso, torna-se relativamente irrelevante para se poder chapar numa primeira página a palermice que o Público colocou. Nem o Correio da Manhã faria pior...porque percebe melhor o que se passa.
Quanto ao komentador João Miguel Tavares, enganou-se na área de profissão: deveria passar a komentar futebol. Sempre é possível ver o que se passa no campo e não confundir a linha de meio campo com o meio campo em linha.
Tudo isto tem outro efeito deletério que é o de transformar em facto político o que nunca o deveria ser. Mas depois de o ser já o é...e com isso contam os que assim organizam o seu poder.
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