O CM volta hoje à carga com o caso e agora as casas de Montenegro.
E não, não me parece que uma capa destas e uma notícia deste teor se justifique assim, nesta autêntica fuga para a frente de uma luta que se me afigura cada vez mais...sei lá, suspeita. Pelo menos pela conquista de leitores e audiências é com certeza, mas como já escrevi ontem, não vale tudo nem o sensacionalismo mediático associado ao populismo político pode dar bons frutos democráticos. Mas enfim.
Vejamos então:
Quando alguém vai fazer uma casa por administração directa, o que procura antes do mais? Óbvio: gastar o menos possível. E como se consegue tal coisa? Pedindo orçamentos aqui e ali e confiar no construtor que é escolhido.
Nunca um construtor em vias de insolvência é opção num caso destes pelo que falha assim o fundo da notícia que nem se percebe bem qual seja a não ser enlamear ainda mais uma figura pública através de innuendos, suspeitas não confirmadas e acusações infundadas sobre "riscos" e rosquices.
Em 2016 começou a obra da casa com uma construtora que em 2019 estava em dificuldades financeiras e capacidade inerente para acabar a mesma. A quem interessa uma coisa destas? Algum dono de qualquer obra gosta de uma coisa destas que lhe prenuncia um rol de problemas financeiros?!
Então para quê uma notícia destas?!
O "rasto empresarial" dos fornecedores de material para a obra particular- uma moradia de algumas, poucas, centenas de milhar de euros, note-se- tem a sua importância neste contexto para quê?
Para se descobrir que houve facturas que fugiram a IVA ou pagamentos sem factura, é isso? Será mesmo isso?!
E se tal fosse o caso, o que se duvida e não está sequer indiciado, quid juris, no contexto nacional da hipocrisia nacional reinantes em relação a impostos? Vale a pena entrar por aí e procurar saber se as louças das oito casas de banho foram facturadas como deve ser e se não tiverem sido, pôr um candidato a primeiro-ministro no pelourinho desta inquisição?
É uma pergunta legítima no contexto nacional e na sociedade em que vivemos e só o faz quem assume o papel de torquemada mediático. Nem mais e com o pretexto nobre de grandes proclamações acerca da ética kantiana de costumes: age como se todas as tuas acções pudessem erigir-se em princípios imaculados de comportamento para todos. Exemplares, portanto. E se não puderem...fogueira! Há outros?! Lá isso haverá, mas cá estamos nós que exploramos diariamente a prostituição no jornal para dizer o que é a moral pública...e os outros, se calhar e que escapam por casualidade, também nos farão o mesmo jeito para vender mais e ter mais um lucro desejado se forem apanhados por acidente. Enfim.
Tudo isto me recorda um episódio do Portugal democrático do final dos anos setenta, o tempo em que a esquerda pós-prec tomou conta do poder político, constitucional, legal, institucional e mediático.
Em 1976 apareceu o jornal do PCP, o diário que lançou uma suspeita sobre um político que se viria a afirmar um perigo para as "conquistas democráticas": Sá Carneiro. E durante meia dúzia de anos andou a roer as canelas do indivíduo, uma mordidela de cada vez e com o apoio mais firme da imprensa dita moderada de então, particularmente num período mais conturbado em que a "luta" se impunha porque havia um risco enorme de convulsão social...
O tema então era uma suposta dívida do então primeiro-ministro Sá Carneiro, "à banca", ou seja a nacionalizada. E o motivo nem sequer se escondia: derrubar o primeiro-ministro, claramente e como objectivo político servindo-se do poder mediático manipulado por um partido.
Quem o dizia? O então militante do PCP estalinista, cripto euro-comunista e que se desvinculou do partido na 25ª hora do tempo da queda do muro, no dealbar dos anos noventa: Vital Moreira, pois claro. Who else?
Era assim, no o jornal de 31.10.1979, o medo do perigo e do papão da direita que vinha por aí para comer as criancinhas do comunismo e da esquerda feliz com a Constituição aprovada e de um pujante vigor com as nacionalizações de dois terços da economia:
Como é sabido a populaça, cansada de bancarrotas sucessivas ( uma e outra a caminho) fez ouvidos de mercador a estes profetas de uma desgraça fictícia para manterem o poder e deu uma maioria absoluta à AD e aprestava-se a dar-lhe um presidente da República, o que consistiria no maior descalabro da era democrática.
Daí a insistência no assunto e que levou o jornal de 18,7,1980 a repescar o tema, embora com outra deontologia com que o actual CM nem sonha...
Como epílogo desta triste história do jornalismo nacional imagine-se que outro jornal decidiria colocar na primeira página um título destes:
"Montenegro promove a prostituição"! ... seria falso?
Nem por sombras uma vez que se presume que o mesmo leia, compre ou aproveite o jornal Correio da Manhã para ler, vindo dos serviços do Governo.
E seria legítimo? Nem por sombras, também. Se o facto é verdadeiro o contexto é de tal modo difuso que não seria legítimo publicar tal coisa, mas alguém conseguiria acusar tal jornal sensacionalista de qualquer crime ou violação de ética? Não me parece, também. Afinal o poder mediático conseguiu derrubar um governo e até isso é proclamado com garbo e vontade publicitária.
Estamos nisto...