domingo, junho 24, 2012

O nacional-jornalismo

 Manuela Moura Guedes no Correio da Manhã:

(...)

Se de cada vez que houvesse uma pressão por parte de um político o jornalista a denunciasse, as coisas seriam bem diferentes, há já muito tempo. O problema é que não há uma cultura de jornalismo contrapoder enraizada em Portugal. Pelo contrário.

Há uma enorme facilidade de ajustes editoriais sempre que há mudanças políticas e uma terrível promiscuidade entre políticos e jornalistas. Obtêm-se ‘fontes’ aceitando terríveis condições, vende-se a alma ao Diabo para segurar outras, não se chateia muito para se ter entrevistados que se dão ao luxo de escolher quem os entrevista, fica-se fascinado por ter amiguinhos políticos e dá jeito... há sempre uma ERC, uma assessoria ou o que quer que seja a cair do céu, pela prestação de bons serviços... Mas também há vítimas, como a jornalista do ‘Público’ que teve o descaramento de fazer perguntas de que o ministro não gostou. Demitiu--se e está no desemprego porque, em Portugal, mesmo "as pressões inaceitáveis" não fazem cair ministros e a vida está para os Relvas! 


Sobre este mesmo assunto, o blog de José Paulo Fafe conta uma história antiga ( do tempo de Guterre)e que envolve pressões sobre jornalistas da autoria de um dos elementos da ERC, Arons de Carvalho que devia ter vergonha, mas não tem. Esta:

Foi a exercida pelo então secretário de Estado da Comunicação Social através de um telefonema feito para o José Rocha Vieira, na altura responsável máximo do jornal e no qual o governante em causa ameaçou em queixar-se aos na altura eram proprietários do jornais (o grupo suiço Edipresse) sobre o comportamento do "T&Q", bem como alertá-los para as consequências que, a todos os níveis, que isso poderia ter para  as publicações que o grupo editorial detinha em Portugal. Mais: nesse telefonema, em que também "fui metido ao barulho", Alberto Arons chegou mesmo ao ponto de "alvitrar" que governo poderia vir a considerar como "indesejável" qualquer investimento que, no futuro, a Edipresse pretendesse vir a fazer no nosso País. Lembro-me, como se fosse hoje, da extraordinária, irónica e inteligente resposta do Zé Rocha Vieira: "O melhor é o Arons falar directamente com o escritório de advogados que tratou da 'entrada' da Edipresse em Portugal - o do dr. Jorge Sampaio e do dr. Vera Jardim ...".
Na altura, o telefonema foi-me contado timportim pelo próprio Rocha Vieira. Talvez por conhecer o Alberto Arons desde os anos 70, por até sempre ter mantido com ele uma relação cordial, a minha reacção foi - mais do que tudo -  de profunda desilusão, até porque uma atitude dessas era oposta a tudo o que, como autor, professor, deputado, membro do Conselho de Imprensa e até jornalista (ainda que por breves três anos), Alberto Arons sempre defendera. Lembro-me que na altura enviei-lhe um cartão para o seu gabinete na sede da Presidência do Conselho de Ministros e em que (sic) o mandei "badamerda". Soubesse o que sei hoje e aposto singelo contra dobrado que nessa missiva apenas teria escrito uma frase: "Uma ameaça não é grave pelo efeito que tem, mas pelo efeito que se pretendia que viesse a ter".

3 comentários:

Floribundus disse...

histórias como esta e piores ouvi na maçonaria do minúsculo oriente, donde sai por me terem roubado e por ter caído nas mãos dos xuxas.

chamavam-lhe o 'menino' arons por dirigir a js aos 40 anos

Karocha disse...

Grande Zé Paulo :-)))

Alexandre Ferreira disse...

A propósito de jornalismo recomendo a nova série televisiva The newsroom da hbo. Bem escrita e com alguma food for thought para quem se interessa.

O Público activista e relapso