Em 1940 o jornal O Século comemorou um duplo centenário - o oitavo da Fundação da Nacionalidade e o terceiro da Restauração da mesma-, com um número especial em que dedicava uma boa parte a contar a nossa História pregressa com o entusiasmo mítico das gestas de antanho, misto de epopeia e tragédia alavancada pelos mitos que ainda perduram.
O capítulo que relata os séculos de independência até à sua perda em 1580 vale a pena ler. Escrito por um romancista poético, - Castelo de Morais-, todo eivado de realismo fantástico, é a versão da nossa História que evoca os heróis de infância. Era uma época em que os animais ainda falavam nos livros e a poesia saltava das pedras da calçada, nos versos de Afonso Lopes Vieira.
Era esta História que se ensinava nos anos sessenta, nas escolas primárias e foi assim que a aprendi, tal como muitos da minha geração. A alguns ficou-lhes para sempre a nostalgia do maravilhoso que estes relatos traziam ao imaginário pobre do Portugal de então. Era uma espécie de compensação. Éramos pobres mas tínhamos oitocentos anos de História tão rica quanto os mais ricos de todo o mundo. E isso nos valia a pena de sermos que éramos. Lá ao fundo do imaginário espreitava sempre o Império das quintas de além-mar.
Lembro bem de ler num dos manuais escolares a triste história do cardeal D. Henrique em versos de pé quebrado -" o cardeal D. Henrique, velho e doente, é bem a imagem da pátria decadente". Isso imediatamente antes de se contar como perdemos a independência para a terrível Castela, aqui ao lado, na sequência da funesta aventura guerreira de D. Sebastião, o vindouro numa manhã de nevoeiro .
Descubro agora neste relato de epopeia que o dito cardeal no fim prematuro da sua vida, lá nos 66 anos, só se alimentava a leite...de mulher.
Quanto ao resto, na última página, o relato das nossas borregadas sucessivas até impressiona.
Quanto ao demais da nossa História, relatada na edição, temos a "dinastia brigantina e os primeiros dezasseis anos de república" contados em...cinco páginas. Os dezasseis anos da tal república leva meia página a contar e nem se fala no Afonso Costa.
"Ia iniciar-se, primeiro em regime de ditadura, e depois, no Estado Novo Corporativo, um dos períodos de mais profunda transformação que houve até hoje, em Portugal". Até 1940, claro.
4 comentários:
Uma linguagem muito curiosa porque era mítica mas dita de forma simples e ingénua.
Quanto ao cardeal não sabia e nem imagino coisa mais marada
":O)))))
O leite "materno", é considerado o alimento mais perfeito para sustentar vida.
A seguir é o ovo, onde se cria vida.
Leite materno para sustentar vida humana, claro está.
O bebezinho, é quem mais ordenha...fazendo biquinho... -:)
Os grúdos são, sobretudo, chupistas - e na maioria, do ps - dizem... :-)
Tem-se atacado muito a historiografia feita pelo Estado Novo, mas nunca acreditei, nem acredito na justiça desses ataques.
Houve, sem dúvida, uma certa mitificação da história de Portugal durante o Estado Novo, mas no quadro geral ainda hoje muitas das obras publicadas nessa época estão actuais em muitos aspectos e eu próprio as cheguei a usar para consulta e referência nos meus tempos de universidade em Coimbra.
Divulguei:
http://historiamaximus.blogspot.pt/2015/04/a-nossa-historia-tal-como-contada-em.html
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