segunda-feira, junho 13, 2016

Os capitalistas portugueses e a esquerda nacional

A recente discussão sobre a CGD e o buraco financeiro de vários milhar de milhões de euros, cavado por sucessivas levas de gestores pagos em centenas de milhar de euros por ano, suscitou a hipótese de um inquérito parlamentar, à semelhança do ocorrido com outros bancos, como o BPN, o BES e o BANIF. Pelos vistos a esquerda unitária que governa não quer tal inquérito e as razões são muito suspeitas.

A saga dos bancos nacionais, bem como dos seus donos antes e depois de 25 de Abril de 1974 já terá sido contada em livro ou em artigos avulsos de jornal.

Porém, com estes recortes percebe-se melhor, por exemplo, o que sucedeu com um dos maiores capitães da nossa indústria e que ao morrer deixou 500 milhões de euros, seus, para uma Fundação com o seu nome: Champalimaud.

Quando se deu o golpe de 25 de Abril de 1974 Champalimaud bateu palmas porque andava de candeias às avessas com o regime. O Diário de Lisboa de 30 de Abril dá conta de que se congratulou com o golpe e enviou felicitações a Spínola e a "todos os que estiveram na base da gloriosa arrancada"...

Durou pouco tempo a perceber que foi um logro. Em Outubro de 1974 já se discutia abertamente a natureza do regime económico ( e político) e Champalimaud não tinha lugar no mesmo...


Um tal João Martins Pereira que tinha sido empregado na Siderurgia Nacional e desafiava publicamente a natureza do nosso capitalismo, defendendo a proposta marxista de nacionalização e colectivização. O comunismo, puro e simples.  


A expectativa de Champalimaud e dos demais empresários capitalistas portugueses durou poucos meses. Ou semanas. O tempo para se porem ao fresco e tentarem guardar algo do muito que ainda tinham. As medidas económicas de Vasco Gonçalves acabaram por liquidar toda a esperança numa confiança como factor essencial da economia de qualquer país. As greves, o aumento do salário mínimo, a pressão para as nacionalizações e a diabolização dos empresários acabaram por nos conduzir a 11 de Março de 1975 e às nacionalizações subsequentes de uma parte significativa da economia.  Em 14 de Abril de 1975, com 57 anos,  Champalimaud ficou-se pelo Brasil. E como ele, outros o fizeram, descapitalizando significativamente o que ainda havia de capitalismo em Portugal.
A partir daí foi sempre a descer na nossa capacidade de progresso económico significativo. Até hoje.

Fundamentalmente, a ideia era esta, numa imagem de João Abel Manta, por ocasião do 1º de Maio de 1975 e que vale mil palavras:


Em Junho de 1976 os bens de Champalimaud foram congelados em Portugal. Em Dezembro desse ano, Mário Soares, primeiro-ministro foi ao Brasil e chamou a Champalimaud e Espírito Santo "exploradores do povo".
Champalimaud respondeu no Jornal do Brasil, em 30.12.1976 argumentando que afinal o maior explorador fora Mário Soares com as suas políticas que "em tempo extraordinariamente curto" levou o país à condição mendicante, com a delapidação e o abandalhamento dos recursos públicos e privados. Como lógica era impecável porque nessa altura Portugal estava em bancarrota.
Para disfarçar o descalabro apareciam artigos como este, no O Jornal de 6.2.1976: a culpa era...dos capitalistas que fugiram. Incompetentes e protegidos pelo regime anterior.


Não obstante havia quem perguntasse se afinal as nacionalizações valeriam a pena:


Durante dez anos andamos a brincar às empresas públicas e com o aplauso vibrante do PS ( além de toda a Esquerda unida do PCP aos doentes infantis do comunismo, com os vários mr. ruis). Em Outubro de 1975 o PS queria mesmo a "irreversibilidade" dessas nacionalizações, tal como ficou na Constituição de 1976 ( artº 83º- "todas as nacionalizações são conquistas irreversíveis das classes trabalhadoras"...).



 O que se passou a seguir é conhecido e Champalimaud tinha dito o que era verdade: bancarrota atrás de bancarrota. Empobrecimento progressivo, atraso significativo em relação aos demais países europeus, miséria desnecessária. Quanto às indústrias nacionalizadas, dez anos depois era isto:


 Em 1988 e 1989 o Expresso lembrava-se dos "foragidos" escorraçados pelo regime da Esquerda Unida e lembrava assim o que sucedera:


 Fatalmente este estado de coisas teria que se alterar e Champalimaud não tinha ainda desistido, apesar da idade e das perseguições desta esquerda de sempre, de fazer alguma coisa em Portugal. E o que fez conta-se em oito páginas da biografia de  2011, escrita por Isabel Canha e Filipe S. Fernandes que explicam o essencial do que ocorreu depois:



Como se pode ler, não contentes com o que fizeram ao país, ao escorraçarem os capitalistas que tinham dinheiro, ideias e projectos, com provas dadas nas décadas anteriores, a Esquerda Unida ainda procurou impedir os mesmos de retomarem o controlo de algumas empresas que deixaram, sem indemnização alguma. O processo de atribuição dessas indemnizações foi alvo de inquérito parlamentar em 1992, promovido pela Esquerda Unida do PCP ( oito deputados requereram) e PS e ainda alvo de inquérito criminal na PGR...para apurar se tinha existido prejuízo para o Estado. Manuela Ferreira Leite, nessa altura, afiançou que não. Se fosse hoje, não é certo que o tivesse dito...

Comparando esta situação com o que se passa na CGD é caso para perguntar a que lógica obedece o PCP e a Esquerda Unida: à das conveniências políticas em que a coerência é um mero pormenor.

Os obreiros das bancarrotas estão sempre de serviço porque acreditam no trabalho de formiga para destruir um país. Fizeram-no há quarenta anos e estão apostados em voltar a fazê-lo.
É esse o seu verdadeiro patriotismo.


Questuber! Mais um escândalo!