sábado, dezembro 12, 2020

O tempo e o modo de Maria José Morgado

 Maria José Morgado é a estrela da revista do Expresso de hoje. E tem lá uma entrevista a propósito de...nada de especial. MJM é das poucas pessoas da magistratura que pode dizer coisas sobre tudo e o par de botas e passar incólume como se fizesse já parte da paisagem mediática. 

Além disso criou uma imagem que foi sedimentando ao longo dos anos a propósito da luta teórica contra a corrupção e é considerada nesta entrevista como "a cara da luta contra a corrupção". 




Na entrevista tem uma passagem deliciosa sobre tal fenómeno e efeito. Quando lhe perguntam se está a defender a criação de tribunais para julgar a grande criminalidade diz que "o que eu digo não interessa nada. Ando a defender coisas há 20 anos e nunca acontece nada. Tenho a noção da minha pequenez e vivo bem com isso"....

Ora bem e começando por aqui: MJM anda a defender o quê, há vinte anos a esta parte, ou seja, desde 2000? Medidas concretas contra a corrupção? Quais, em concreto? É que não me lembro assim de nada de especial, pelas leituras avulsas das suas croniquetas de Expresso e entrevistas esporádicas, mesmo nas tv´s onde aliás denotava algum desassombro em contraste com o cuidado acobardado de outros.  

Porém, já em tempos fiz aqui o balanço da actividade pública de MJM: 

Em 2000, MJM foi para a PJ, chefiar o departamento contra a corrupção, onde esteve dois anos, saindo de candeias às avessas com o então director, o juiz Adelino Salvado. Salvado não acreditava nos métodos de MJM e tinha dúvidas sobre a eficácia.

Na PJ, o que fez de mais relevante? O Público na hora da despedida, escrevia: "uma das caras do combate à corrupção e à fraude fiscal, Maria José Morgado explica hoje, em detalhe, no Parlamento as razões precisas da sua saída. A magistrada, cujo nome ficou associado a investigações da PJ relacionadas com os paquetes da Expo, com o caso Vale e Azevedo ou o megaprocesso de corrupção nas Finanças".

Portanto, MJM enquanto passou pela PJ fez coisas que se viram. Mas... que coisas? O caso das Finanças deu em condenações pesadas, dali a anos. Mas não foi por isso que se suscitaram dúvidas públicas sobre as investigações realizadas. O nome de Filipe Vieira e o Benfica já apareciam então e MJM não saiu bem desse retrato que agora não foi mostrado...

Como não voltou a ficar nada bem noutro retrato de 2003: enquanto PGD, na Relação de Lisboa terá deixado por conta a possibilidade de o STJ sindicar as absolvições no caso das FP25.

Por causa destas e doutras é que a corrupção de que MJM fala sempre é uma corrupção teorizada, porque nunca há "estudos", empírica portanto e de palpite. Até escreveu um livro em 2003 onde relata tudo isso e mais alguma coisa sobre as "offshores" outros meios de branqueamento de capital. Mas tudo muito longe do concreto e sempre em cima de um joelho de ineficácia.

Quando surge a oportunidade concreta de fazer algo em concreto nesse âmbito, falta qualquer coisa, sempre.

Por causa dessas e doutras, como foi o caso recente da investigação à violação de segredo de justiça, em 24 de Junho de 2009, quando o processo Face Oculta foi dado a conhecer a Pinto Monteiro, tudo ficou em águas de bacalhau, no DIAP dirigido por MJM. Este caso era dos mais importantes que surgiram nos últimos anos para se deslindar um esquema de corrupção gravíssimo no coração do Estado e o MºPº falhou redondamente, não se sabe bem porquê, mas as suspeitas ululam por aí. E MJM esteve no epicentro dessa investigação.

E por isso escrevi aqui: "quem dirige departamentos judiciários da importância de um DIAP ou uma PGD tem que entender isto e no caso concreto de Maria José Morgado pode ela continuar a escrever maravilhas sobre "corrupção" que a mim se me afiguram como banalidades e conversa fiada."

Porque nunca vi nada nem ninguém do MºPº do DIAP a investigar isto, por exemplo. E em 2007 e anos seguintes em que MJM esteve no DIAP passava-se isto, em Portugal.

Sabemos agora, pelo resultado da operação Marquês que tudo isso era demasiado grave e este Estado da corrupção perfeita, sempre denunciado por MJM, nunca foi verdadeiramente investigado.

Maria José Morgado, diz que agora está num cargo de "gestão". Não é verdade. Está num cargo superior da hierarquia do MºPº, de Lisboa, centro nevrálgico onde tudo isto se passa, nas barbas de todos os que as têm e nas burkas das que as usam.

Entretanto MJM fala, fala e volta a falar. Que vá falando porque é conversa inconsequente, de chacha, para mim. Como diz um amigo que muito prezo e sabe necessariamente destas coisas, para mim, o que MJM vai falando é "água destilada".
É melhor que a água suja, dos marinhos pintos, claro, mas é pouco, muito pouco para surtir efeitos necessários.

Sobre o assunto da vida profissional de MJM está feita a "inspecção"  e a minha nota é..."Bom". Sofrido e apenas por reverência a uma intenção recta, sem mais. 
Na instituição e confraria de que faz parte MJM teve sempre "muito bom", com distinção e percebe-se: sempre se comportou como "formiguinha" e de carreira certa. Entende-se mas dá uma imagem peculiar. E não ajuda nada saber como se comportou relativamente a um tal Adelino Salvado, de "direita" e portanto merecedor do tratamento digno de uma demissão em papel molhado pela ignomínia da má educação. Ou seja o contrário da tal "formiguinha" o que denota que MJJ sempre soube comportar-se segundo as circunstâncias. 

E por falar nisso, o que aconteceu antes, na tal juventude e com o "fanatismo que vivi", no tempo do MRPP é merecedor de atenção porque revela a faceta acima descrita. 
MJM desistiu do MRPP e percebeu que "estava tudo errado" quando "fui presa pelo COPCON", ou seja, em 1974. 
Em Dezembro desse ano já estava presa há meses, desde Agosto, segundo se relatava na época no órgão de informação do movimento revolucionário que falava em "morte" como quem dizia até amanhã, camaradas.



Portanto, com 23 anos, após militância radical e profissão de fé em ideias totalitárias com gosto a morte ao fascismo e a quem o apoiar, MJM desistiu e mudou de ideias porque "foi presa pelo COPCON". Foi então que na reclusão das Mónicas e no intervalo da greve de fome decidiu interiormente que o "maoismo era uma fraude. Não havia revolução proletária. O marxismo-leninismo era uma fraude no sentido em que nos queria convencer que era possível atingir um mundo justo através de uma sociedade sem classes. O mal não era o partido era mesmo a ideologia".

O que se pode dizer disto? Que afinal a Constituição de 1976 que consagrava então o desiderato a atingir da tal "sociedade sem classes" também foi uma fraude? 
Pode ser que sim mas a mim parece-me que fraude é mesmo o teor das declarações agora prestadas. Não me lembro de ver qualquer denúncia de tal fraude na época e era isso que seria importante. 

MJM saiu das Mónicas diferente do que era quando para lá entrou? E a revelação ocorreu da reflexão sobre princípios e valores que deixaram de fazer sentido a partir de então?  E que sentido faz então a carta cujo teor se mostra? É porventura de alguém que se arrependeu de ser maoista e marxista-leninista? 
E para onde foi até entrar no MºPº em 1978? Não diz. Por mim gostava de saber e quem apoiou politicamente desde então...

Esta entrevista de MJM é muito reveladora. E pelas piores razões. Era bem melhor ter estado calada, porque a mim o tom geral destas coisas soa-me demasiado a qualquer coisa que não gosto. 
O tempo e o modo de Maria José Morgado obriga-me a usar uma palavra fatal: oportunismo.  E falta de memória. Mas há quem a tenha...

Por último e relativamente ao MºPº tem uma noção que mostra bem a noção de "formiguinha" cuja liberdade é relativa à carreira, o que desmente ipso facto a sua actual ideologia ( "justiça, liberdade, ética, igualdade", segundo diz) : que a directiva da actual PGR que permite aos superiores hierárquicos dar ordens concretas nos processos aos magistrados inferiores para MJM é normal e nada de especial. 

Estamos entendidos sobre o modo como o tempo de Maria José Morgado passou: mal, porque não percebe o essencial. Parece-me que nunca percebeu, pelo que diz. 

Sem comentários: