quarta-feira, novembro 30, 2022

Como achincalhar um juiz

 Sábado de hoje:




É público e notório que o juiz Carlos Alexandre lida há muitos anos com os processos mais complexos da criminalidade nacional, abrangendo casos singulares e complexos em que intervêm figuras públicas e outras anónimas e algumas delas manifestamente perigosas para a segurança seja de quem for que lide com tais assuntos.

Por tal razão, há uns anos foi-lhe concedido, pelo poder político, do Ministério da Justiça, a segurança pessoal devida em tais casos, óbvia e exigível, tanto mais que outros figurões do mesmo ministério e governos respectivos, também gozam de tais prerrogativas ainda que relativamente aos mesmos nem se apresente uma exigência de segurança minimamente comparável. 

A par de tal segurança traduzida no acompanhamento de pessoal da polícia, no caso da PSP e de acordo com regulamentos habituais ( há sempre regulamentos para estas coisas...) foi-lhe disponibilizado um carro de serviço, conduzido pelos elementos de tal segurança. O carro, usado, proveniente do parque do Estado e mormente de viaturas apreendidas e declaradas perdidas a favor do mesmo Estado ( o ministro Cabrita circulava num BMW série 5, desse género) era um carro minimamente adequado e julgado razoável para tal função. Um BMW cujos gastos de manutenção decorriam a cargo do Estado e tudo por causa dos tais regulamentos que a tal obrigam, uma vez que o juiz foi considerado passível de beneficiar de protocolo de segurança " de grau 3". 

Imagino que um ministro qualquer, ou até certos directores-gerais, sejam de grau infinitamente superior, atenta a disponibilidade de motoristas, seguranças vários e carros à disposição dos governantes. Quem parte e reparte e não fica com a melhor parte...parece ser o caso. .

Durante alguns anos foi assim. Entretanto, o tribunal onde exerce foi enxameado por mais juízes com as mesmas funções, tornando extensível aos mesmos e caso a caso, a ponderação de idênticas medidas de segurança. 

O que fez o ministério da Justiça, onde estas coisas se organizam? A Secretaria-Geral, responsável pela frota automóvel e gestão da segurança de governantes e magistrados, segundo a Sábado e desde o Verão abandonou tal incumbência e deixou o juiz em causa pendurado do órgão de gestão dos magistrados, o CSM. Primeiro tiraram-lhe a possibilidade de abastecer o carro de combustível ( tal como na Ucrânia, a guerra faz-se assim, com estas pequenas filhas da putice dignas de um putin) e depois disseram-lhe simplesmente: arranje-se! Desenrasque-se! 

Foi assim, com a Secretaria-Geral do Ministério da Justiça titulada por este pessoal todo e  dirigida por Helena de Almeida Esteves, nomeada por Mário de Belo Morgado, in illo tempore ( 2021). 

Imagine-se que isto tinha acontecido com um governante! Imagine-se só, os processos disciplinares que já teriam sido instaurados...

Como foi com um juiz e no caso o juiz Carlos Alexandre, muito da estima pessoal e profissional de tal gente, presume-se, foi o que se vê agora: achincalhado, sem mais. Vergonhosamente humilhado e deixado a si mesmo, quanto à segurança e grande regalia de poder ter um carro de função. 

O CSM, a quem foi passada a batata quente, é uma entidade que supostamente é independente do poder político uma vez que se integra como órgão de gestão dos magistrados que por sua vez são os titulares do poder do Estado, o Judicial. 

Supostamente quer dizer isso mesmo, uma vez que naquilo que se refere a meios depende inteiramente do Ministério da Justiça e do Governo, depois de muitas batalhas perdidas a reivindicar um estatuto de autonomia financeira a qual lhe foi reconhecida em 2008. 

Porém tal autonomia financeira é muito mitigada, particularmente no que se refere a este assunto concreto dos meios, como são os carros de função e outras funções importantes do CSM na gestão da magistratura. 

A autonomia é algo que pode servir de arma ao poder político para controlar os juízes, naturalmente e com este governo, apesar dos protestos em sentido contrário é o que se vê, com este caso escandaloso protagonizado pela Secretaria-Geral do Ministério da Justiça. 

Assim vão sendo concedidas algumas benesses, como se o Estado fosse o Governo e o resto paisagem. Assim, algo vai sendo concedido, de modo muito mitigado, já por este Primeiro-Manho, digo, Ministro, às pinguinhas nalguns casos e que lá tem condescendido na concessão de algumas regalias reivindicadas há décadas. As dificulades continuam a ser evidentes...

Esta entidade, o CSM,  também tem carros de função, mormente para os seus presidentes e principalmente vice-presidentes, com o gabarito dos carros de estadão e por causa da cagalhufa habitual que emana de tais entidades sempre que se deslocam do serviço para casa e vice-versa. Tais regalias estendem-se naturalmente aos presidentes dos tribunais superiores e representantes do MºPº no mesmo nível. 

Porém, para o juiz, ainda titular de processos no TCIC e que o SIS considerou digno de segurança de alto grau, o CSM destinou-lhe um carro simpático, um Renault Mégane. Para quem é, bacalhau, perdão, tal viatura serve, pensaram por lá. E melhor o fizeram. Os carros de estadão são para as figuras do Estado que assegura a gestão, pois então! Os titulares do poder judicial que se habituem. O poder judicial é o CSM, não diz a Constituição mas é assim. E por isso um Mégano serve muito bem e até é demais.

Quanto á segurança pessoal, pois o juiz que se amanhe! 

É o Estado actual no seu melhor: a grande cagalhufa para os seus dignitários mais próximos do poder político e a miséria habitual para quem precisa realmente dos serviços, como é o caso do juiz em causa.

Cabe aqui assinalar casos curiosos que mereciam melhor investigação e relacionados com este juiz e o poder político. 

Aqui há uns tempos o mesmo juiz insistiu em pretender ouvir este Primeiro no caso TANCOS  porque tinha sido a própria defesa do inenarrável arguido Azeredo Lopes a requerê-lo. 

O CSM tinha que se pronunciar. O Primeiro-Manho, perdão Ministro, não queria ser ouvido, de modo algum e algo correu mal no Governo com este caso, escandaloso até mais não.  Sabemos como terminou tal pretensão... e o Primeiro não foi ouvido. Respondeu por escrito...

O que é que isto tem a ver com o Renault Mégane do juiz, o achincalhamento do mesmo pela Secretaria-Geral do MJ e tudo o resto? 

Pois tem, claro que tem porque em política o que parece, é. E o que isto parece é mesmo isto: uma vingança, ainda que por incompetência e desleixo do poder político relativamente a um juiz que não grama, quiseram correr do TCIC e conseguiram. Uma vitória completa!

E já agora talvez fosse útil perceber qual o papel do CSM no caso concreto. Já agora...

 Tal assunto de gravidade extrema merecia outro relevo para se ver quem nos governa e de que modo respeita as funções do Estado. 

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