terça-feira, setembro 05, 2023

Os anagnostes franceses da informação em papel

 Quando comecei a frequentar o ensino secundário, após a primária, o francês foi logo de estudo obrigatório, com cadência regular e semanal. 

Em 1972, o livrinho obrigatório para aprender e traduzir era o Lettres de mon moulin, de Alphonse Daudet, com alguns contos típicos da França de antanho.

Não obstante, nessa altura o melhor estímulo para saber francês era o Tintin que comecei a comprar na edição original, belga e cujas histórias careciam de tradução frequente, dando o treino na aprendizagem vocabular. 

Como em Portugal, na altura e agora, não havia público suficiente para a publicação de revistas e jornais com a qualidade e diversidade das francesas, a aprendizagem da língua era uma vantagem para se poder ler o que por cá não era possível, sobre diversas matérias, mormente actualidades, artes e história. 

E até desporto. Em Junho de 1970 o campeonato do mundo de futebol, com o Brasil em grande destaque e Pelé em todas as notícias levou-me a comprar o primeiro número de uma revista que tinha muitas outras matérias e que nenhuma Flama ou Século Ilustrado nacionais conseguiam emular.

( imagem tirada da net no ebay)

Por outro lado, as revistas francesas eram um regalo gráfico estético e por isso o apelo ainda era maior. Em finais de 1973 o pretexto foi a guerra do Yom Kippur, em Israel, Palestina e Egipto. A actualidade era contada de modo mais directo e interessante em revistas como estas:



Desses dois títulos a outros foi uma questão de tempo que durou algumas décadas:







Das revistas de actualidades às de especialidades foi um pequeno passo, com a vista das mesmas expostas nos quiosques. 

Uma que então era frequente na exposição de quiosque e com capas apelativas mas de interesse relativo, e que aliás nunca comprei, era esta, neste caso num número de 1970:

( imagem tirada da Net no ebay)

Em 1974 com a música rock mais em evidência nos gostos e nas modas, a revista que passei a frequentar para saber quase tudo sobre o fenómeno, foi a Rock & Folk que se distinguia de qualquer publicação nacional, até então em voga, como o Mundo da Canção ou o Disco, música & moda, ou o Musicalíssimo,  antes de aparecer a Música & Som, em meados dos setenta, ainda assim muito pobre em relação à publicação francesa Rock & Folk, verdadeira enciclopédia de tal assunto. A par de tal publicação ainda havia a Best, no mesmo estilo e igualmente interessante que no final de 1973 apreciei pela primeira vez:


 

Isso sem esquecer as banda desenhadas de expressão franco-belga e as suas publicações de referência que por cá nem sequer por imitação se conseguia arranjar em modo original:








Destas artes, ao cinema,  também as havia expostas:



E sobre temas  culturais, gerais e específicos, também, como a Science & Vie que se manteve na vanguarda da divulgação científica para todos durante décadas, até recentemente passar a ser um "jornal sem jornalistas", com a aquisição do título pelo grupo "Reworld Media" e que originou o lançamento de um outro título, Epsiloon, pelos jornalistas que saíram:


A primeira vez que aprendi alguma coisa sobre Hi-Fi, foi num número especial dessa revista, em 1975-76:


E sobre História e outros assuntos culturais de largo espectro,  não faltavam publicações que se mantiveram interessantes durante décadas e continuam a sê-lo:














A par destas, o panorama editorial de publicações periódicas francesas é muito extenso como denota este número recente do Le Un, um dos mais notáveis a surgir nos últimos anos e que compro praticamente deste o primeiro número. 
Um jornal que se desdobra três vezes até ficar em poster.
Este número dá conta de todas as publicações francesas actuais e contém um pequeno estudo do actual estado da imprensa periódica francesa.




Assim aí se aprende que a revista L´Express actualmente pertence ao grupo de Patrick Drahi, um judeu que manda na Altice. Tal revista aliás nunca deixou de ser dominada por israelitas, tal como o Le Nouvel Observateur. 

Porém, tal não constitui capitis diminutio relevante no modo como noticia e trata os assuntos, uma vez que se pode descontar tal circunstância na maneira como são apresentados os mesmos. 

E que fizeram os jornalistas da revista para manterem um estatuto de maior independência? Lançaram um jornal digital, como o Observador, chamado Mediacités, por cá e calcularam que se obtivessem assinaturas de duas mil pessoas por cada cidade, com um valor anual de 60 euros, tal seria viável como projecto editorial. 

Com tudo isto fica-se bem informado? Nem por isso, mas certamente muito melhor do que lendo apenas o que se publica em língua portuguesa...
 Daí a importância destes anagnostes, para mim. São os fiéis servidores que disponibilizam as leituras necessárias a uma melhor informação.  Sem eles ainda estaria pior informado do que estou. 

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