Cândida de Almeida, a jubilada do DCIAP e do MP, escreveu um artigo no JN sobre o Tribunal Constitucional, para lembrar ao povo e ensinar às crianças, se calhar tendo em conta o estilo. A dizer coisas lindas sobre a independência e isenção da magistratura, como requisito para além das preferências políticas pessoais de cada um.
Sobre o Constitucional não quer admitir que haja alas de direita ou esquerda lá no sítio e que o órgão do terceiro poder do Estado é composto por criaturas bacteriologicamente puras de qualquer contaminação ideológica e política sempre que decidem em colectivo. Portanto não haverá decisões de esquerda ou direita senão a democracia está doente...
Pelo que escreve até permite entender-se que a existência de sensibilidades de esquerda e direita é coisa espúria a tal tribunal, porque em caso contrário, lá está!, a "democracia está doente".
Como é sabido, a escolha dos magistrados que compõe tal tribunal é simples de enunciar:
Nos termos do artigo 222º da Constituição, o Tribunal Constitucional é composto por treze juízes, sendo dez eleitos pela Assembleia da República — por maioria qualificada de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções [artigo 163º, alínea h), da Constituição] — e os três restantes cooptados pelos juízes eleitos, também por maioria qualificada (artigo 19º da LTC).
Dos treze juízes, pelo menos seis têm de ser escolhidos de entre juízes dos demais tribunais, e os restantes de entre juristas, ou seja, com um grau académico em Direito (n.º 2 do artigo 222.º da Constituição e artigo 13.º da LTC).
Quem e como se escolhem os dez eleitos pela AR? Por indicação de quem? Dos deputados, com maioria significativa. Há três que são escolhidos pelos juízes do tribunal. Desses treze, meia dúzia tem que ser de magistrados dos tribunais.
Portanto, como se escolhem os nomes dos que são indicados pela AR? O PS indica quem e como? E o PSD indica como e quem?
Só uma ingénua que ainda não descobriu tal faceta de personalidade pode acreditar que os partidos de esquerda ou direita escolhem os seus nomes aleatoriamente e sem perscrutarem antecipadamente qual a idiossincrasia político-ideológica dos que escolhem. E por isso mesmo dão corpo a um manifesto evidente de escolha ideológica para compor tal tribunal. E também por isso mesmo fazem contas à vida das futuras votações em conclave do tribunal nas decisões mais polémicas que podem dividir a direita da esquerda.
Só uma dupla ingenuidade pode explicar que o recente chumbo de um candidato a juiz do Constitucional, a escolher pelos pares, não tenha nada a ver com tal dicotomia e que se tratou de um mero acaso de votação a rejeição do candidato em causa, tido como de direita...
Sendo assim, como compreender outra ingenuidade em declarar que se é de esquerda, sem complexos, como a mesma fez em 2012 numa entrevista ao SOL?
O que será isso de ser de esquerda, sem partido e sem filiação alguma, mas com ideias "obviamente de esquerda"? Será qualquer coisa politicamente indefinida e cor de burro a fugir quando aparecem opções a tomar que implicam confrontar tais ideias e interesses de quem as defende? E que isenção e imparcialidade pode mostrar alguém que não sente qualquer prurido em assumir tal coisa?
É simples de entender, também: ser de esquerda em Portugal, particularmente para quem foi do PCP ou do MES ou de outra força política, mesmo de extrema-esquerda, como há muitos magistrados que o foram, é chique. A valer!
Ser de direita e ainda por cima poder dizê-lo, é vergonhoso, digno de opróbrio e sinal de que a democracia está "doente".
É isto e nada mais porque de facto a democracia, assim, está mesmo doente.
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