domingo, junho 12, 2022

Oriana, a fada do jornalismo italiano pôs "Cunhal a nu" em 1975

 No CM de hoje há esta crónica do jornalista Fernando Madaíl acerca de um episódio singular do PREC de 1975.

Vale a pena ler, embora já por aqui se tenha mostrado o que foi e como foi


O assunto da entrevista da jornalista italiana Oriana Fallaci a Álvaro Cunhal, em 1975, torna-se interessante a vários títulos, ainda hoje. 
Desde logo, não é verdade o que é escrito na primeira frase, pois Oriana Fallaci era sobejamente conhecida de milhares de portugueses que liam a revista Século Ilustrado nos anos sessenta e setenta. A prova? Aqui vai, embora já fosse mostrada antes

Em 2.11.1968, no Século Ilustrado:


E em 21.8.1974:


Portanto, a jornalista Fallaci era já uma figura importante do jornalismo, muito antes de 1975, para os portugueses. 
Também não é verdade que a entrevista de Fallaci a Álvaro Cunhal fosse publicada no L´Europeo de 6 de Junho de 1975. 
Na verdade, foi publicada uma semana depois, em 13 de Junho desse ano. A prova? Pois, em 6 de Junho de 1975 a L´Europeo publicou antes esta entrevista, também interessante e também a uma figura portuguesa. Quem vir a capa da revista fica a pensar que a jornalista desenvolveu uma reportagem alargada na altura, durante o referido PREC, mas nesse número só apareceu esta entrevista e um pequeno editorial sobre o que então se passava em Portugal.
Ah! A revista vendia-se em Portogallo e custava 28$00. Alguém a comprou e leu. O Expresso parece que não lhe ligou importância:







A entrevista com Álvaro Cunhal foi assim publicada na semana seguinte e nunca apanhei o número da revista italiana para a mostrar aqui. Mas tenho a entrevista, aliás já publicada, na revista Paris Match de 28 de Junho de 1975:






Esta entrevista foi publicada num jornal português, em 27 de Junho de 1975, dias depois de ter sido originalmente publicada em Itália, mas em França. 
O jornal República que era o feudo do PS, antes e depois do 25 de Abril de 1974, fora tomado por dentro, pelos comunistas e esquerdistas da extrema, os que o PCP apelidava de doentes infantis do comunismo. Deixou de se publicar e foi impresso em França, como um suplemento do jornal francês Le Quotidien de Paris,  para denunciar tal situação inédita na imprensa portuguesa e que revelava a verdadeira noção da democracia da esquerda comunista. 
Assim, tirado daqui, as páginas respectivas: 






Por cá, nessa altura, o Expresso ainda balbuciou umas frases a propósito desse episódio de uma censura que ocorreu já em democracia e é quase sempre esquecido, em detrimento dos episódios da censura do anterior regime. 
Em 28 de Junho de 1975,  dias depois da publicação da entrevista pela L´Europeo, o jornal mostrava ter lido a entrevista e até referiu quem a publicou, mencionando a passagem mais importante. Mas foram frases soltas e perdidas neste  artigo sobre o que se passava em França a propósito do República... Incrível!


Na semana seguinte o mesmo jornal dava destaque a outra entrevista de Cunhal, ainda anterior ao 25 de Abril e o artigo era da responsabilidade do actual presidente da República, figura bem visível do tartufismo nacional na época...


O Expresso, ao longo dos anos, tal como o actual presidente da República só enganou quem se deixou enganar. Ou , pior, quem quis ser enganado.

Quando a Fallaci morreu, em 2006, o Expresso fez assim o obituário:

Oriana Fallaci entrevistou Álvaro Cunhal em 1975: os ecos do trabalho publicado pelo "Europeo", a 6 de Junho, obrigaram a Secção de Informação e Propaganda do PCP a emitir um categórico desmentido. De acordo com o "Europeo", Cunhal afirmou não haver possibilidade de Portugal ter uma democracia ou um parlamento ao estilo ocidental. A nota divulgada pelo PCP no mesmo dia referia ter havido uma "grosseira deturpação das palavras de Cunhal". Fallaci não só reiterou a "exactidão da tradução" da conversa com o secretário-geral do PCP como anunciou que colocaria as cassetes com a entrevista à disposição de quem duvidasse da sua palavra. Como afirmaria numa entrevista que concedeu a Álvaro Guerra para "A Luta", "não é de mim que têm medo, é da verdade".

O erro sobre o 6 de Junho de 1975 já lá estava e ficou, tal como o jornalista Fernando Madaíl mostra e replica. Enfim.
Aliás, em Fevereiro de 2014 outros- Joaquim Vieira e Reto Monico- repetiram o mesmo erro no livro muito interessante, Nas bocas do Mundo, que recenseia as publicações que no mundo se referiram ao 25 de Abril e ao PREC. 
Para além do mais torna-se interessante ver como alguns meses, muito poucos, a seguir ao golpe militar a figura de proa e o símbolo da mudança era...o general Spínola, actualmente relegado para a galeria dos vilões do próprio 25 de Abril de 1974. 





A edição continha reproduções da publicações logo a seguir ao golpe que mostravam quem era o herói que depois se transformou em figura odiosa, até hoje, apenas porque procurou contrariar a tentativa de tomada de poder pelo comunismo.






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