terça-feira, janeiro 03, 2023

Sérgio Sousa Pinto, o divulgador improvável

 Gosto de ler o que Sérgio Sousa Pinto vai dizendo a propósito de artes menores, como a banda desenhada, que cultiva como conhecedor e artista em horas vagas. É pena porque poderia desenhar para mostrar o seu trabalho em publicações correntes, talvez com maior proveito do que charlar com o Sebastião Bugalho e afins sobre assuntos do dia a dia político e que obrigam a usar fato e gravata, acompanhando personagens de uma opereta que enfastia. Sousa Pinto tem um hobby que podia ser profissão e uma profissão que transformou em hobby, com a desvantagem de esta ser irrelevante. Tirou o curso de Direito e sabe pouco de Direito, pela certa. Saberá algo de História, em manifesto esforço diletante, porque nem tirou curso, segundo julgo. 

Enfim, um falhado como muitos, nos quais me incluo, naturalmente. Alguém cujo talento ficou por explorar por inércia de vida. Ou mais prosaicamente, por malandrice generalizada em interesses muito variados.  Por isso simpatizo com o indivíduo. Com a idade que tem já não vai a tempo, mas teve sorte em enfileirar por uma carreira que lhe permitiu andar uns anos em Bruxelas a gozar o hobby que desse modo deveria fazer render melhor, para proveito de quem aprecia tais coisas. 

Não basta lamentar a miséria em que chafurdamos quando o trabalho afincado poderia produzir melhores resultados. Sei do que falo e SSP também deve saber...porque no fundo, quando se tem um talento incipiente e não o génio em flor, a questão principal é o trabalho para o desenvolver. Na ausência de esforço persistente, um malandro, um calaceiro relapso, como suspeito que será ( tal com o eu) e que a sorte bafejou com algum talento, não vai a lado algum que outros vejam e admirem.  

No Observador, há uma entrevista em que diz coisas com muito interesse e uma delas fez-me descobrir um artista que não conhecia porque me passou ao lado, mesmo nas capas da revista New Yorker. É um americano que desenha como poucos o sabem fazer. Já lá iremos.  

Em primeiro lugar, SSP fala de Stuart Carvalhais como um grande desenhador português que poderia ombrear com os maiores se por acaso tivesse nascido num país mais relevante. 

Diz assim:





Sobre Stuart Carvalhais conheço pouco uma vez que foi muito pouco divulgado nas revistas e jornais que fui comprando ao longo dos anos. Procurei mais alguma coisa e tenho pouco para mostrar.

Primeiro uma edição do Jornal de Letras de 16.3.1987 dedicado à bd portuguesa e que nem menciona o artista do tempo da idade de ouro da bd nacional quando ainda não havia fotografias para mostrar imagens das coisas e pessoas...



Depois duas páginas da História da BD publicada em Portugal, em 1995 ( dois volumes da Editora Épocas d´Ouro, com vários autores).



Stuart Carvalhais aparece misturado com outros autores, sem relevo especial. Porém, talvez merecesse tal destaque, conforme se pode ver por aqui, na NET que actualmente é a fonte mais importante de conhecimento destas matérias específicas.


Finalmente um pequeno apontamento no álbum recente, intitulado Variantes, uma homenagem à bd portuguesa, da autoria de vários e coordenado por Júlio Moreira e José Hartvig de Freitas da editora A Seita C.R.L.


Sobre o americano que não conhecia, é citado por SSP que o mencionou a Moebius aliás Jean Giraud, nos bons tempos de dolce far niente de Bruxelas, que lhe permitiu conviver com esse génio da bd europeia. 


Chris Ware, portanto. E com este video que o mostra em acção. Fantástico, simplesmente. Admirável! 



Ware é um desenhador recente, contemporâneo e que terá certamente lugar de relevo no elenco deste pesquisador de desenhadores americanos geniais e que são às mãos cheias...como este:


O virtuosismo de Ware, porém,  não chega aos pés deste Briggs que com um lápis e uns poucos traços, mostra figuras de gente e locais que nenhuma foto conseguiria alcançar. 

Ou de Fuchs:


Estes desenhadores dos anos sessenta trabalhavam como ilustradores de publicações periódicas que tinham um catálogo com nomes como estes referenciados no Anuário de 1960:

The Annual collected illustrations by "fine" artists such as Ben Shahn, Henry Moore, Leonard Baskin and Andy Warhol, all of whom were employed as illustrators that year. Other distinguished illustrators that year included Norman Rockwell, Milton Glaser, Saul Steinberg, Coby Whitmore, Al Parker, Austin Briggs, Bob Peak, Albert Dorne, Bernie Fuchs, Noel Sickles, Robert Weaver, Joe Bowler and Stanley Meltzoff. Legendary cartoonists Ronald Searle, Andre Francois and Tomi Ungerer also appeared in this collection.

Ao ver as obras destes artistas, no entanto, a frustração de um calaceiro que não explorou o pequeno talento com que foi bafejado, torna-se penosa porque se evidencia que nem com trabalhos forçados chegaria aos pés da habilidade natural dos mesmos...e daí o relativo alívio por se ter escolhido uma profissão com significado semelhante ao violino de Ingres. Aliás, outro desenhador...

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