domingo, maio 28, 2023

O rei dos obituários celebra a esquerda dionísica

 No Público de hoje, o relator de obituários residente, António Araújo, "jurista historiador" ( sic), apresenta assim o perfil de um artista dos anos dourados da esquerda nacional, os do tempo do fassismo e que feneceu no tempo de Abril no activismo equívoco do esquerdismo de sempre. 





O perfil do esquerdista Mário Dionísio, intelectual activista no pós-25 de Abril e co-autor das reformas fantásticas que conduziram o ensino ao estado em que se encontra, putativo ministro da Educação falhada no tempo de Vasco Gonçalves, já foi apresentado por Vasco Pulido Valente. 

Mário Dionísio, segundo o obituarista,  foi o autor de uma apreciação pessoal de Freitas do Amaral,  no tempo da AD: um "novo Salazar em formação, o sábio, calmo e sorridente Freitas do Amaral". Perspicaz, este indivíduo. E também quem o cita, perfeito similis que emparelha cum similibus. 

Aqui fica em reprise parte do postal de 2016 sobre Dionísio, acrescentado da citação completa de VPV, no Observador. Porque é que isto tem interesse, pelo menos para mim? Porque dá a conhecer o que foi a esquerda em Portugal, durante o fassismo e após tal período de obscurantismo e repressão apregoados por tal gente como sinal distintivo.

Por outro lado, este tipo de artigos, como o do obituarista residente no Público, exalam sempre o perfume da esquerda patente ou latente, como é o caso do similis Araújo. Participam alegremente naquilo que Gramsci defendia: aculturar o povo com as ideias certas, obliterando outras que as denegam, triturando assim a realidade e a memória:  

Vasco Pulido Valente gasta o melhor da sua crónica de hoje,no Observador a desbastar a efeméride do centenário de nascimento de um crítico e escritor português, Mário Dionísio.

"É celebrado este ano o centenário de uma pessoa de que hoje ninguém se lembra e que ninguém lê, Mário Dionísio. Foi um mau poeta, um mau romancista, um mau pintor de fim-de-semana e, principalmente, um mau crítico. Mas no cume do antifascismo, logo a seguir à guerra, foi também o “controleiro” do PC para o “sector intelectual”. Quando Cunhal, já preso, exigiu aos pobres literatos portugueses o estrito acatamento do “realismo socialista” de Jdanov, Mário Dionísio saiu do partido, mas ficou até ao fim da vida um “simpatizante” convicto. Conheci muito bem o indivíduo. Primeiro, como professor de literatura portuguesa no Colégio Moderno de João Soares (avô) e, depois, porque os meus pais, igualmente devotos da seita, eram amigos dele.

À sexta-feira, havia sempre uma reunião em casa de Mário Dionísio, cuja função era discutir a “linha correcta” para o PC, os “desvios” ideológicos da “inteligência” indígena e, lateralmente, as malfeitorias da Ditadura. Faziam parte deste grupo João Cochofel e a mulher, a pianista Maria da Graça Amado da Cunha e o marido (Roger de Avelar), o erudito excêntrico Huertas Lobo e uma ou outra figura de passeio. A partir dos doze, treze anos, comecei a ser arrastado para esta catequese e passei muitas noites – calado e quieto – a ouvir aquela gente perorar.

Mário Dionísio, como é evidente, presidia. Os meus pais mal abriam a boca: a minha mãe não tinha qualquer qualificação formal e o meu pai não passava de um engenheiro químico, ainda por cima director de uma empresa. Mas, calados que estivessem, não escapavam à crítica do seu estilo de vida. Tiveram de prometer não gastar mais do que ganhava um funcionário de Estado médio, não usar o carro em viagens de prazer e não me vestir luxuosamente. O povo passava fome e um bom comunista não devia viver como um milionário. Foi assim que, com muita raiva minha, usei calça curta e casacos voltados durante o liceu inteiro, ou quase.

Fora isso, Mário Dionísio, justiça lhe seja feita, defendeu meia dúzia de escritores contra a fúria jdanovista do tempo, entre os quais José Cardoso Pires que me descreveu mais tarde os tremores com que tinha ido apresentar Os Caminheiros ao sumo sacerdote da ideologia. Como seria de esperar, Dionísio acabou a presidir à “comissão de saneamento” do Ministério da Educação. Toda a vida se preparara para esse nobilíssimo papel. Quando o meu pai morreu, deixou um quadro de Mário Dionísio: não houve leiloeiro ou ferro-velho que lhe pegasse.

Este artigo vitriólico e ajustado ao tempo do tal Dionísio contrasta com o perfil que a Wikipedia lhe traça, no qual nem uma vez aparece a menção a PCP...o que é curioso para quem foi um comunista de gema. É por isso bem vindo o artigo de VPV para mostrar outra verdade escondida, na alheira da Wiki.

Andei à procura nos catálogos que tenho, antigos, da editora do tal Dionísio e descobri que era na Europa-América.


Nada de especial, de facto, a não ser o tratamento ditirâmbico que lhe era dado, em 1971, no referido catálogo.
Mário Dionísio era ainda conhecido do suplemento Quinta-Feira à Tarde, no Diário Popular, como mostra este de 21 de Fevereiro de 1974.


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