quinta-feira, fevereiro 29, 2024

Lucília Gago merece melhor crítica...

 Este artigo da Sábado de hoje merece comentário porque me parece injusto e explicarei porquê. 

Sempre que julgo pertinente, tenho aqui defendido vários procuradores-gerais de algumas investidas de defensores de arguidos excelentíssimos, embora de um jornalista como António José Vilela, julgo que nunca me aconteceu, uma vez que costuma ser alguém que investiga a realidade judiciária há alguns anos e tem livros escritos sobre os fenómenos criminais como a corrupção. Chegou a vez. 

Sobre Lucília Gago como PGR comecei por desconfiar do modo como foi designada, aparentemente por indicação de alguém próximo do PS e relacionado com familiares da mesma, ou seja o marido Carlos Gago, dirigente da PJ no tempo de Fernando Negrão e Luís Bonina. Fernando Negrão, então juiz de direito, actualmente deputado do PSD, enquanto director da PJ e o então PGR Cunha Rodrigues, incompatibilizaram-se profissionalmente ao tempo do caso Moderna.

Não sei se ficaram sequelas mas o certo é que Cunha Rodrigues tem aparecido inusitadamente nos últimos tempos a criticar a actuação das autoridades judiciárias, inclusivé do Ministério Público, a propósito do caso da Madeira...

Primeiro o artigo:

 


Ponto por ponto:

Lucília Gago foi um erro de casting para o cargo de PGR? Pode ser para quem esperava uma actuação com visibilidade acrescida e capaz de dar a cara sempre que aparecem os figurões de sempre e do costume, apaniguados do poder político e agarrados como lapas ao exercício do mesmo, em democracia. 

À ilharga aparecem jornalistas e komentadoria avulsa, sofrendo as dores daqueles porque também os incomodam, seja porque motivo for, designadamente o sentimento de que em democracia os eleitos têm prerrogativas e privilégios inerentes que aliás nenhuma lei consagra, antes pelo contrário. 

Assim, o que esta PGR fez foi algo inesperado: o silêncio como ritual e o aparecimento público através de comunicados de imprensa, por vezes lidos por outros. Não houve entrevistas vistosas no Expresso, Sol ou Público para dizer pouco ou coisa nenhuma de relevo para a função e no fim de contas resumindo um exercício de vaidade porque na verdade ninguém liga ao que um PGR pode dizer a tal propósito de entrevista. No início estranhei e quase embarquei no mesmo batel de desiludidos e das dores estranhas que fingi sentir como dores deveras sentidas. 

Depois, acordei: mas porque raio é que um PGR deve falar em público, principalmente quando se levanta o coro dos lamentos do costume, acirrado pela matilha mediática? Tal adiantou alguma coisa a Cunha Rodrigues, Souto Moura, Joana Marques Vidal ou mesmo Pinto Monteiro tal atitude de coragem duvidosa? Não adiantou nada e todos eles saíram do cargo com pesadas críticas, a maior parte delas injustas e provindas dos mesmíssimos de sempre: os políticos entalados e sus muchachos, incluindo os da comunicação social e naturalmente os advogados dos excelentíssimos. 
Lucília Gago por esta ou aquela razão, eventualmente por medo da sua sombra, pairou estoicamente acima desta cambada e fez bem. Muito bem, devo reconhecer agora. E teve um mérito de que nenhum outro PGR antes dela se pode gabar: isenção a meu ver absoluta e incólume. Notável! E inesperada, porque como o articulista refere, num exercício de cinismo também notável,  terá sido designada para uma função que "algum socialista lhe depositou no colo"!  

Só isso basta para a colocar acima de todos os demais. 

Depois, o articulista afirma que Lucília Gago não fez o que deveria e teve uma actuação irrelevante até para os seus pares porque "nunca se atreveu verdadeiramente a afrontar o poder de um sindicato de classe que há anos é o verdadeiro dono do MP"

Por partes: foi Lucília Gago quem promoveu uma directiva celerada que desmente o articulista. A ordem de actuação genérica está congelada até decisão jurisdicional, mas prova que a PGR actuou ao contrário do que afirma o articulista. Actuou mal, a meu ver, mas actuou. E o Sindicato reagiu, e bem no meu entender, o  que já por aqui em tempos tentei explicar a mim mesmo. A directiva, tal como diz o Estatuto do MP, está no STA para ser analisada em conformidade com a respectiva legalidade. Deixemo-la em descanso e repouso pelos anos necessários a que o STA acorde do sono letárgico em que mergulhou, por culpa de outros que não a PGR ou o MºPº.

O Sindicato não é dono do MºPº mesmo que o CSMP que dirige e disciplina os magistrados seja composto por maioria de magistrados, alguns deles sindicalizados e alinhados com o SMMP. As reuniões do CSMP são colectivas e de voto, com votos de vencido expressos por escrito e que podem ser lidos nas actas que serão públicas, segundo julgo, ou podem ser. Os magistrados podem vencer em número? Podem, mas é ver as questões concretas colocadas e quem vota como e porquê...e já agora, a talho de foice, ver com foram escolhidos certos magistrados para determinados cargos, no tempo em que por lá andava um certo Magalhães e Silva e outros em que o SMMP não meteu prego nem estopa.

O Sindicato tem alguma relevância, nomeadamente no comentário avulso, a pedido das tv´s, tal como acontece com o sindicato dos juízes actualmente dirigido pelo inefável Manuel Soares, seguramente o mais fotografado magistrado de todos os tempos. Tal sucede porque os demais magistrados não falam, por medo precisamente do poder hierárquico do CSMP e do CSM porque não vislumbro outra razão plausível. A PGA Maria José que o diga...

A liberdade de expressão dos magistrados, perdeu todo o fulgor desde os tempos de Cunha Rodrigues que pleiteou publicamente em jornais e revistas ( aqui colocadas e mostradas em postais), várias vezes por tal direito perdido e legítimo segundo o mesmo. Nenhum magistrado quer expor-se a falar seja do que for por medo de ser incomodado pelo CSMP, com inquéritos e processos disciplinares, multas, suspensões ou pior ainda. Quando são incomodados têm que se defender e não é o sindicato que o faz mas os próprios, contratando advogados e pagando-lhes do seu bolso, as respectivas defesas que podem durar meses ou anos. Assim, calam-se. Tal como os juízes, o que é lamentável e trágico em termos democráticos. Os magistrados estão capados nesse direito legítimo a uma liberdade de expressão real e não apenas figurada e isso é que devia incomodar o articulista. 

Lucília Gago não impulsionou nenhuma mudança de vulto na justiça, escreve no libelo acusatório o articulista. E tinha que o fazer necessariamente? Para além do trabalho que nesse âmbito é desenvolvido pela PGR e que o articulista pelos vistos desconhece ou se esquece de mencionar, que mais deveria fazer? Promover colóquios e encontros mediáticos? Compete ao PGR entrar no jogo político-mediático que deve ser apanágio de outros poderes? 

O DCIAP pelos vistos e segundo o articulista anda em "roda livre", ou seja os magistrados titulares dos processos fazem o que querem e sobra-lhes tempo. Será assim? A PGR tem o controlo directo do DCIAP mas este organismo tem um director que para o articulista, tanto o presente como os anteriores têm o "currículo e o perfil de procuradores recrutados com um pálida imagem de quem os escolheu".   Os directores do DCIAP são escolhidos pelo CSMP após proposta do PGR para tal. Uma coisa parece certa: não falam com o articulista...e por isso não os conhece. Por mim, conheço a actuação pública de um deles, aliás lamentável, na altura do processo de Tancos em que não permitiu a audição de duas figuras do Estado-o primeiro-ministro e o presidente da República- actos processuais que foram julgados convenientes para a descoberta da verdade e que foram poupados a tal figura. A lei constitucional diz que  "Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei" mas isso não é verdade plena em certos casos, como poderemos exemplificar com os mais recentes ligados aos políticos conhecidos, com particular destaque para os do PS que se julga dono da democracia. E também diz que o MºPº é o defensor da legalidade democrática...mas isso o articulista não relaciona como deveria para repensar o que escreveu. 

A catástrofe dos casos em investigação sem fim à vista, referido pelo articulista, pode ser um problema mas atribuir exclusivamente a sua responsabilidade à PGR é capaz de ser um pouco exagerado e seguramente incorrecto. E não trazer à colação outros responsáveis maiores, designadamente aqueles que por vezes são incomodados pelo exercício do poder do DCIAP será má-fé ou desconhecimento indesculpável. 

Atribuir à PGR a responsabilidade pela ocultação de procedimentos administrativos que no entender do articulista deveriam ser públicos, tem uma solução: os tribunais ou entidades administrativas oficiais de regulação de tais matérias.  Alguma vez recorreu aos mesmos para obrigar uma entidade oficial a mostrar o que ilegitimamente pretende esconder? 

Por outro lado, relativamente aos processos arquivados por inexistirem provas suficientes para acusação, servem para quê, a um jornalista? Eu digo porque é notório: para o exercício do sensacionalismo, para vender papel e audiência mediática, apenas. O exercício democrático da sindicância dos poderes faz-se de outro modo: constituindo-se assistente nos processos em que tal é possível e passar a colaborar com as entidades oficiais da investigação. Alguma vez o articulista o fez com tal propósito? Os casos em que tal não é possível não deveriam interessar outros que não os envolvidos. 

Portanto o "rasto de destruição por inacção" é uma designação muito infeliz e lamentável uma vez que nenhum dos tópicos trazidos ao escrito merece tal epíteto qualificativo. 

O que a PGR deve ou não fazer está na lei: exercer competências em matérias de direção, fiscalização, representação e execução (artigo 19.º, EMP). 

Explicações sobre tal exercício? Os factos devem falar por si. E não é verdade que quem lidera o MP tenha que dar abertura a um discurso contraditório e de discussão democrática. Não é esse o papel do PGR. 

Quanto àquelas tarefas inerentes ao cargo, a saber, as de "exercer competências em matérias de direção, fiscalização, representação e execução (artigo 19.º, EMP)" há falhas visíveis e passíveis de crítica segura e certa? 

Não saberei dizer sem uma inspecção digna desse nome que me diga se tal coisa sucedeu no âmbito destes domínios e o que o jornalista apontou e que são tudo menos isto que aqui vai, porque vai para além disto:

 2 — Como dirigente da Procuradoria -Geral da República, compete ao Procurador -Geral da República: 

a) Promover a defesa da legalidade democrática; 

b) Dirigir, coordenar e fiscalizar a atividade do Ministério Público e emitir as diretivas, ordens e instruções a que deve obedecer a atuação dos respetivos magistrados; 

c) Emitir, em especial, as diretivas, ordens e instruções destinadas a fazer cumprir as leis de orientação da política criminal, no exercício da ação penal e das ações de prevenção atribuídas ao Ministério Público; 

d) Convocar o Conselho Superior do Ministério Público e o Conselho Consultivo da Procuradoria- -Geral da República e presidir às respetivas reuniões; 

e) Informar o membro do Governo responsável pela área da justiça e a Assembleia da República da necessidade de medidas legislativas tendentes a conferir exequibilidade aos preceitos constitucionais; 

f) Representar o Ministério Público nas relações institucionais com o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e as organizações internacionais para que seja designado por lei ou convenção internacional; 

g) Intervir hierarquicamente nos inquéritos, nos termos previstos no Código de Processo Penal; 

h) Fiscalizar superiormente a atividade processual dos órgãos de polícia criminal, nos termos do presente Estatuto;

i) Determinar superiormente os critérios de coordenação da atividade processual no decurso do inquérito e de prevenção levada a cabo pelos órgãos de polícia criminal que assistirem o Ministério Público, quando necessidades de participação conjunta o justifiquem, nos termos da lei; 

j) Determinar, de acordo com o disposto na alínea anterior, diretamente e quando necessário, a mobilização e os procedimentos de coordenação relativamente aos órgãos de polícia criminal chamados a coadjuvar o Ministério Público no decurso de inquérito; 

k) Participar nas reuniões do conselho coordenador dos órgãos de polícia criminal, nos termos previstos na lei; 

l) Inspecionar ou mandar inspecionar a atividade e funcionamento do Ministério Público, designadamente dos seus órgãos e secretarias, e ordenar a instauração de inquérito, sindicâncias e processos criminais ou disciplinares aos seus magistrados; 

m) Propor ao membro do Governo responsável pela área da justiça e à Assembleia da República providências legislativas com vista ao incremento da eficiência do Ministério Público e ao aperfeiçoamento das instituições judiciárias ou a pôr termo a decisões divergentes dos tribunais ou dos órgãos da Administração Pública; 

n) Informar o membro do Governo responsável pela área da justiça e a Assembleia da República acerca de quaisquer obscuridades, deficiências ou contradições dos textos legais; 

o) Intervir, pessoalmente ou por substituição, nos contratos em que o Estado seja outorgante, quando a lei o exigir; 

p) Superintender os serviços de inspeção do Ministério Público; 

q) Dar posse aos magistrados do Ministério Público, nos termos do presente Estatuto; 

r) Exercer, na Procuradoria -Geral da República, os poderes administrativos e financeiros idênticos aos que integram a competência ministerial; 

s) Estabelecer os objetivos estratégicos do Ministério Público e homologar as propostas de objetivos processuais de todos os órgãos e departamentos do Ministério Público; 

t) Elaborar o relatório anual de atividades do Ministério Público e proceder à sua apresentação institucional, bem como à sua divulgação pública; 

u) Apresentar à Assembleia da República e ao membro do Governo responsável pela área da justiça o relatório bianual sobre execução da lei de política criminal; 

v) Garantir a produção estatística relativa à atividade do Ministério Público, promovendo a transparência do sistema de justiça; 

w) Apreciar os recursos hierárquicos dos atos administrativos praticados por magistrados do Ministério Público; 

x) Exercer as demais funções que lhe sejam atribuídas por lei. 

3 — As diretivas a que se referem a alínea b), que interpretem disposições legais, e a alínea c) do número anterior, bem como as relativas ao cumprimento do disposto no n.º 3 do artigo 11.º, são publicadas na 2.ª série do Diário da República, sem prejuízo do registo documental interno de todas as demais diretivas, ordens e instruções. 

4 — Em aplicação do disposto na alínea h) do n.º 2, o Procurador -Geral da República, velando pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e pelo cumprimento dos pertinentes deveres legais, por si ou nos termos da alínea e) do artigo 101.º, ordena periodicamente auditorias, sindicâncias ou inquéritos aos serviços dos órgãos de polícia criminal, destinados a fiscalizar o adequado cumprimento e efetivação das atribuições judiciárias e as inerentes condições legais do seu exercício, podendo emitir diretivas ou instruções genéricas sobre o cumprimento da lei. 

5 — É apresentado até ao dia 31 de maio de cada ano o relatório de atividade respeitante ao ano judicial anterior. 

6 — O Procurador -Geral da República é apoiado, no exercício das suas funções, por um gabinete. 

7 — A estrutura e composição do gabinete do Procurador -Geral da República são definidas em diploma próprio. 

8 — Os atos administrativos praticados pelo Procurador -Geral da República são impugnáveis perante o Supremo Tribunal Administrativo.

Quanto ao desejo final expresso e partilhado com o advogado Francisco Teixeira da Mota de o próximo PGR ser alguém "minimamente ousado e, naturalmente, inteligente e com bom senso", é um desejo razoável. 

A PGR que ainda está parece-me que afinal até assenta nos pressupostos, uma vez que a sua ousadia foi a de não cair na tentação de ser mediática como os que a antecederam e andarem a dar abébias a quem as não merecia ou pretendia realmente e que nem por isso escaparam às críticas dos mesmos jornalistas, komentadores e entalados excelentíssimos. 

Tal como agora sucede, pelo que os pgr´s estão sujeitos à sina de serem presos por terem cão; e por não terem...

Porque será? A resposta a tal pergunta, dada por jornalistas "minimamente ousados, inteligentes e com bom senso" é que seria interessante, mas não fico à espera da mesma: ao contrário do que se pode esperar dos magistrados do MºPº em que o articulista aposta que existem para ocupar o lugar de PGR não estou a ver assim tantos jornalistas com tal perfil...

sábado, fevereiro 24, 2024

A corrupção é um crime a suivre...

 Observador:







A  corrupção é um crime que acaba com o último acto. E por isso se um tribunal penal contar o prazo de prescrição desde o último acto, tal é constitucional e portanto legítimo que se conte desde aí o prazo de prescrição. 

Disse-o agora o Constitucional, por unanimidade e seguindo uma tese do professor Nuno Brandão, entre outros, considerando constitucional tal interpretação, depois da tese peregrina, seguida pelo inenarrável juiz Rosa, de que era logo no início que se deveria contar o prazo, safando ipso facto o arguido excelentíssimo, eventualmente em caso de contagem mais favorável e por efeito do atraso provocado pelo mesmo com sucessivos recursos dilatórios para o estender e beneficiar disso.  

quarta-feira, fevereiro 21, 2024

Para o presidente da ASJP a Justiça é um jogo...

 E portanto num jogo perde-se e ganha-se. No caso do processo da Madeira, o MºPº perdeu e a PGR teve "mau perder"! É este o entendimento inteligente de um juiz sindicalista!

É ler as inacreditáveis declarações públicas de um juiz que é chamado a dizer de sua justiça em variados lugares, sempre pronto para se mostrar como protagonista, num jogo que critica a outros...

Em resposta à PGR que tinha prestado declarações públicas a pedido de várias famílias, incluindo o dito cujo,  disse assim:


O presidente sindicalista dos juízes toma as putativas dores de um dos pares e contrariando outros, atira a matar com declarações impróprias e inadequadas, que apenas suscitam um comentário já antigo e de outras paragens: "por qué non te callas?"
 
Ou assim, na velha tradição do ridendo castigat mores, retornando à "harmónica"



ADITAMENTO: O juiz dos magistrados.

O juiz desembargador Manuel Soares, em funções de presidente do sindicato dos juízes ( que se denomina associação sindical mas não deixa de ser sindicato por tal subtileza saloia) mais uma vez apareceu no espaço público dos media a dar o seu palpite mais o par de botas habitual sobre tudo e alguma coisa que lhe perguntem. 
O juiz Manuel Soares nestas funções de komentadoria não representa ninguém senão a si próprio, mas perante o vazio de comunicação do sector do poder judicial, lá aparece, sempre solícito e disponível para se mostrar em imagem e palavras ditas. 
Desta vez foi ao Público e Renascença, assim e a propósito dos recentes casos mediáticos sobre os processos em curso na Madeira e no Continente envolvendo políticos. 
O estatuto de magistrado do juiz impede-o de desenvolver considerandos sobre tais processos, pelo famigerado dever de reserva, mas tal como certos advogados, parece haver uma excepção a tal obrigação, uma vez que as declarações, putativamente genéricas acabam sempre no caso concreto. Desta vez, a declaração sobre o que sucedeu durante o interrogatório dos arguidos detidos não difere muito do que os advogados dos arguidos livre e impunemente explanaram durante largos momentos de komentariado nas tv´s, aliás num exercício despudorado e ilegal que nunca vi ser denunciado pelo juiz sindicalista. 




Quando alguém diz que 21 dias para começar e acabar um interrogatório de arguidos detidos para tal é demasiado tempo, palpita uma evidência. Se acrescentar que é preciso mudar a lei para evitar tal fenómeno, não é novidade porque se apresenta igualmente evidente para quem deve assim proceder ( o poder político-legislativo) e não carece de reforço opinativo de um outro juiz, uma vez que é redundante e apenas acrescenta ruído a uma discussão que deveria evitar. 
Quando alguém diz que um juiz de instrução não se deve limitar a carimbar aquilo que o MP lhe leva, denota o sentido de linguagem chocarreira imprópria a um magistrado e com destino preciso e concreto, a um juiz concreto de um tribunal concreto,  ao contrário do que se possa julgar, porque o senso comum ainda merece foro de cidadania nestas matérias 
É ofensivo, manifestamente impróprio e atentatório da dignidade profissional de outro juiz que um juiz, seja sindicalista ou não, se pronuncie sobre o trabalho de outro juiz ( sim, sobre o juiz Carlos Alexandre, porque é desse que se trata e mais ninguém, neste contexto uma vez que não há outro exemplo para contrastar, no TCIC e é sobre decisões concretas no TCIC que se prestam estas declarações, que sendo equívocas, permitem por isso mesmo tais interpretações) para dizer tal tipo de coisas, sabendo de antemão que as decisões desse tal juiz "carimbador" foram esmagadoramente confirmadas por tribunais superiores e é isso que deveria contar, para qualquer magistrado que se pretenda sério e imparcial, para além de isento, na análise que efectua. 
O que irá dizer um juiz comentador deste juiz que agora se apresenta como exemplo de não carimbador se a respectiva decisão for revogada superiormente? O mesmo que se diz sobre as decisões confirmadas do "carimbador": nada! Mas o que fica agora é o contraste entre os juízes "carimbadores" e os correctos "não carimbadores" e o ruído instalado nos media a tal propósito que à medida que se vai amplificando determina actuações, por vezes políticas. Como sucedeu, no caso concreto, com as consequências visíveis.
Aliás,os termos em que é apresentada a questão permite estas observações que afinal, no dizer do ex-PGR Cunha Rodrigues, "só descredibilizam a justiça" e tal deveria ser evitado, principalmente por um juiz no activo e sem mandato para se pronunciar sobre estas matérias tão delicadas, a não ser o mero direito de opinião que qualquer pessoa tem, numa democracia. 
Entrar na discussão gerada entre o MºPº e a actuação ou omissão do juiz num caso concreto como o citado é pronunciar-se sobre o processo, uma vez que se emitem juízos de valor sobre a actuação de uma e outra entidade para atribuir razão a uma e não a outra. Não compete a um juiz comentador que está de fora ou de dentro, dar palpites desta natureza concreta e precisa, ainda por cima para insultar uma PGR atribuindo-lhe um "mau perder". Inacreditável e só compreensível pelo estado de manifesto deslumbramento que já esticou as fronteiras da sensatez comentadeira para além do razoável e até admissível. 

Quando um juiz sindicalista se pronuncia sobre a duração do mandato na PGR tal significa uma opinião pessoal tão válida como a de qualquer cidadão, logo evitável neste contexto equívoco, mas ainda assim afoita e resultado do deslumbramento mediático evidenciado. Idem para o direito à greve das forças de segurança ou sobre o caso concreto de manifestações de polícias, caso em que o entrevistado não se priva de esportular a sua opinião com juízos de valor sobre factos e actuações. 

Estas observações agora expostas são de um cidadão que se identifica como "josé", tem um email disponível e portanto não é anónimo no sentido de incognoscível e muito menos do visado que já comentou em redes sociais algo que não devia, associando o "josé" a uma profissão e um estatuto para alvitrar uma eventual acção disciplinar contra o mesmo, aludindo a uma impunidade por declarações "incríveis". 
De resto, nunca tal cidadão assumiu uma função para além dessa, neste blog, onde há mais de 20 anos comenta como tal e nada mais, os acontecimentos deste dia a dia judiciário e destes comentadores encartados que desprestigiam de algum modo as instituições, julgando que lhes estão a prestar um grande serviço. 
O direito de crítica de qualquer cidadão, anónimo ou não, ainda está legalmente consagrado, com os limites dos direitos de personalidade de cada um, claro. E este blog fala por si porque os postais estão todos disponíveis para leitura.

No caso, é nesses limites que se escreve e para marcar opinião divergente e indignada, pela redundância das declarações expostas, pela excessiva visibilidade de um comentador que é juiz e cujo cargo de dirigente sindical deveria situá-lo nesse perímetro e pouco mais e ainda pelo direito de qualquer cidadão a protestar por aquilo que se assemelham a desaforos.  

Sobre estes problemas da justiça prefiro ler os comentários de jornalistas como este, Eduardo Dâmaso, na Sábado de hoje. Um dos poucos, aliás que entende as questões essenciais, ao contrário do juiz comentador em causa que se alarga no âmbito das intervenções e esquece ou evita muitas vezes estas questões que no mesmo tom interventivo arranjariam espaço para explicações...


 

terça-feira, fevereiro 20, 2024

Portugal e o futuro atrasado

 Nesta semana do mês de Fevereiro de 1973 foi "lançado" um livro de capa branca e letras pretas, sóbrias, com poucas páginas, da autoria de António de Spínola que então era general, vice-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas. 


imagem tirada da Net

O livro, um sucesso editorial com vendas superiores a 200 mil exemplares, foi então considerado uma "bomba" editorial em função do seu conteúdo, aliás devidamente escapelizado pelos jornais da época, mormente o Expresso que tinha saído cerca de um ano antes. 

O livro que pouca gente terá lido integralmente, mas eventualmente compreendido na sua integralidade,  punha abertamente em causa a política ultramarina seguida até então pelo Governo e regime, já suavizado pelo consulado de Marcello Caetano que tentou modificar o Estado Novo, para um novo Estado Social. 

Quem quiser hoje ler tal livro não conseguirá sem recorrer a alfarrabistas porque está esgotado há muitos anos e não foi reeditado até agora. [ Segundo o comentador Carlos Guerreiro, o livro está disponível para leitura on-line, aqui].

O dinheiro para as comemorações do 25 de Abril vindo do Orçamento de Estado às carradas de milhões pelos vistos não chega para reeditar uma obra considerada fulcral para se entender...o 25 de Abril! Coisas de um futuro atrasado...

Assim, como faz agora 50 anos há um outro livro que aproveitando comercialmente a efeméride, tenta explicar o aparecimento do original no seu contexto da época.

O livrinho de agora é da autoria de João Céu e Silva e tem mais páginas que aquele sobre que se escreve. 


E não há lugar a dúvidas em considerar o referido livro muito importante porque é considerado "talvez o livro mais devastador alguma vez publicado em Portugal", o que se afigura curioso porque quem o quiser ler, não pode fazê-lo a não ser do modo indicado. Pelos vistos um livro "tão devastador" não suscitou curiosidade aos neófitos que andam por aí a preparar comemorações do 25 de Abril de 1974, o que diz muito sobre a respectiva cultura que os enforma:





Curiosamente, entre todos os depoimentos avulsos que tentam explicar a génese do livro, falta o mais importante, o do próprio autor.
E no entanto seria perfeitamente possível tal coisa, se o autor do livro agora editado tivesse o cuidado de ler outro livro de António de Spínola, País sem Rumo, editado em 1978, já não por aquela Arcádia, mas por outra editora, Scire e cujo intróito reza assim: 




E a explicação do autor: 





É estranho que alguém se proponha escrever um livro sobre um livro sem procurar saber nem sequer mencionar a opinião do próprio autor do livro sobre que escreve...
Será que não conhecia o livro posterior de António de Spínola ( que aliás tinha escrito outro antes deste, em 1976, intitulado Ao Serviço de Portugal) ? Não encontrei uma única referência ao mesmo, na obra de agora, o que é estranho. Duplamente estranho porque as opiniões dos entrevistados no livro actual são todas apócrifas.
Por outro lado não se compreende que as habituais cassandras que desancam no Estado Novo como se fosse o reino do obscurantismo, ignorância e perversidade, não tenham comentado a ausência de censura a um livro que questionava um regime, ao colocar em crise um dos seus aspectos fundamentais como era a política ultramarina. 

De resto compreende-se a ausência de referência a tal livro e principalmente a ausência de reedição do livro original: um dos comentadores, o historiador Luís Nuno Rodrigues diz ( a fls. 216) que "O livro ainda é revolucionário no dia 24 de Abril de 1974 e torna-se um livro conservador a 26 de Abril de 1974".
Quanto ao de 1978 apesar de o tal historiador não dizer, é fácil de adivinha o que pensa de tal livro: reaccionário. Vai uma aposta? Um anacrónico e outro reaccionário, para quê reeditar tais obras perdidas para o futuro que se atrasa?
É por isso que  simplesmente é censurado, omitido, literalmente obliterado na memória de quem deveria saber melhor e não precisa porque se alimenta a progressismo para um futuro atrasado. Sempre atrasado. 
Foi isso que Spínola chamou ao livro de 1978, adivinhando o que viria a seguir: Um país sem rumo. Tal e qual. Perdão! Sem rumo, não! Ficou na Constituição de 1976 que o rumo era o socialismo e a sociedade sem classes, ipsis verbis. 
É esse o problema, ainda hoje, do nosso país com futuro atrasado: a bempensância literata continua acorrentada a tais mitos...e António de Spínola compreendeu-o logo na época. Por isso foi afastado, perseguido e olvidado. Hoje escrevem-se livros sobre o livro que escreveu sem sequer ser possível lê-lo...

sexta-feira, fevereiro 16, 2024

PGR Lucília: uma grande PGR não precisa de dizer mais que isto.

 Advocatus:




O Observador também refere:




A PGR Lucília Gago porventura tem medo da própria sombra quando lhe pedem para falar em público. Quem a conhece sabe que é loquaz, franca e aparentemente sincera no que diz. Simples e descomplexada no discurso e vai ao que interessa, sem grandes rodeios ou hipocrisias próprios a magistrados. 
Não obstante, as circunstâncias e os momentos que o Ministério Público tem vivido com as investigações a cidadãos que se julgam superiores aos demais, apenas por terem sido eleitos por estes e em listas partidárias trucadas pelo normal jogo democrático, obrigaria a um maior esforço de comunicação do que aquele que tem sido o habitual. 
A PGR não é do género de outros PGRs que a antecederam e que falavam, alguns pelos cotovelos de interesses espúrios, como era o caso de Pinto Monteiro, apegado a um certo partido que era o PS. 
A anterior, Joana Marques Vidal também não se notabilizou pela comunicação oportuna e eficaz e teve o caso Marquês que lhe marcou o percurso. O anterior a ela, Souto Moura, também não tinha confessadamente jeito para comunicar oportuna e eficazmente. Porém, quem o antecedeu, Cunha Rodrigues, sendo mais aperfeiçoado no estilo comunicativo, tal de pouco lhe valeu quando foi fustigado pelos mesmos de sempre, políticos, comentadores e jornalistas, afectos a interesses político-partidários conhecidos e ligados ao PS e ao PSD. Foi humilhado na praça pública mediática por causa da sua função e no meio de escândalos político-partidários, como os da Universidade Moderna e outros casos de hemofílicos, alguns politicamente motivados pelos mesmos de sempre: o PS e o PSD. 
Aliás, todos os PGR foram humilhados do mesmo modo sistemático, pela mesma canalha político-mediática, alguns deles os mesmos de agora, por motivos similares: simplesmente por o Ministério Público, no exercício das suas atribuições legais,  colocar em crise os seus cargos, empregos ou sinecuras. Mesmo os de eleição. 
É sempre a mesma coisa que aliás é uma vergonha nacional que só não é devidamente denunciada porque são precisamente aqueles que o deveriam fazer os que são os seus fautores: os jornalistas das madrassas ligadas a interesses político-partidários e que são colocados nas direcções de informação para manipular a mesma e condicionar os jornalistas de microfone ou de redacção. E estes obedecem porque o que ganham não chega para serem independentes, autónomos e personalizados. São escravos, no fim de contas de tais interesses e poderes cuja condição assumem como um ónus de sobrevivência. 

A corja político-partidária que nos governa e assume ares de superioridade moral e institucional, cujo paradigma máximo se encontra num Santos Silva que nunca deveria estar onde está, ou seja no lugar da segunda figura de Estado, tal o seu estado catatónio de indigência moral, tem sempre o discurso aparado pelos media que dominam de vários modos. 

Tudo isto me parece sabido e consabido e por isso concordo com a posição reservada da PGR Lucília Gago, cujo desempenho me parece notável e superior a todos, digo mesmo, repetindo, a todos os PGRs que passaram pela PGR desde o 25 de Abril de 74. 
Porquê? Porque se me afigura ser a mais isenta, imparcial, independente e corajosa de todos eles, Cunha Rodrigues incluído. 
A prova? O que sucedeu no processo Influencer. Não é preciso mais porque nenhum dos outros teria procedido do mesmo modo destemido e se calhar temerário. Nem Souto Moura, quer-me parecer. 

Além disso a PGR não precisa de falar a propósito de processos como estes que envolvem políticos e que são sempre os mesmos que originam esta confusão mediática e este estenderete de evidências que colocam em crise o princípio constitucional de que todos os cidadãos são iguais perante a lei. A Constituição não tem excepções a esta regra e muito menos para quem por obrigação de função deveria respeitar os princípios mais que ninguém...
Talvez o papel de falar aos media devesse ficar circunscrito aos directores dos departamentos judiciários, mormente o director do DCIAP ou mesmo dos seus magistrados que melhor preparados estivessem para o fazer, com aliás dantes acontecia, com um Rodrigues Maximiano, por exemplo. Na falta deles, sobram os representantes sindicais, de todo inadequados a tal papel comunicativo e supletivo

De resto para complementar, ficam duas páginas do CM de hoje a dar conta do triste papel do juiz de instrução de turno ( a titular, Carina Santos, estava de baixa o que é típico da magistratura feminina dos tempos que correm...) e que vem por contraste mostrar que um super-juiz, aliás ápodo colado pelo mesmo CM, é sempre bem preferível a um juiz de turno, assim como este:



Particularmente impressivo é o apontamento de Eduardo Dâmaso, comparando e definido o perfil dos juízes que são super-competentes e adequados à função de julgar, em detrimento dos que nem deveriam aproximar-se de um tribunal. 

ADITAMENTO:

O Cm e o Público de hoje têm estes dois comentários sobre o assunto em causa que denotam a perplexidade causada por uma decisão de um juiz singular contrariando promoções do MºPº e factos apresentados que o senso comum permite julgar de modo diverso e o senso judiciário obrigaria a entender de outra forma. 
A idiossincrasia de juízes singulares em tribunais como o TCIC permite estas aparentes aberrações de que o exemplo concreto de Ivo Rosa é paradigmática. 
Um juiz " das liberdades e das garantias" tem obrigação de respeitar o bom senso sob pena de falhar uma das condições de julgar. O CSM não se pronuncia sobre decisões jurisdicionais, mas tem obrigação de perceber quem é colocado num tribunal central como o TCIC e agir em conformidade. É assim que escolhem inspectores judiciais...com muito cuidado e circunspecção, porque sabem ser aí que se situa o poder de controlar administrativamente os juízes, como efectivamente acontece em alguns casos. O de Carlos Alexandre é um exemplo, com procedimentos disciplinares adequados à criação de ambiente de intimidação, ou seja bullying e consequente criação de ambiente artificial aproveitado pelos mesmos de sempre ( PS) para substituir um juiz incómodo para os interesses instalados no meio político-partidário do PS e do PSD, principalmente. Os advogados dos arguidos entalados ajudam à festa e promovem os foguetes, com aplauso da plateia da associação sindical dos juízes, cujo actual presidente funcionou como activista de tal situação.
Ontem, o advogado do arguido Paulo Calado, o inefável Paulo Sá e Cunha, esteve pela enésima vez nas tv´s a explicar o caso aos espectadores, convidado pela direcção de informação da SIC. O entrevistador não teve bestunto para lhe perguntar se estava ali, autorizado pela Ordem dos Advogados, portanto com legitimidade para falar do assunto. 
Como tal não sucedeu e a Ordem dos Advogados sistematicamente ignora a violação grave dos respectivos estatutos, é assim que se faz a informação em Portugal: manipulando a mesma e dando a conhecer apenas um dos lados dos casos que aparecem, sem qualquer preocupação em indagar a verdade factual ou pelo menos actuar de modo isento e independente como compete a um órgão de informação. Esta actuação das direcções de informação televisivas é sistemática e espelha bem o estado dos media televisivos em Portugal, mormente a SIC sempre que está em causa a situação de políticos entalados em investigações judiciárias. O catatua director da SIC é o exemplo flagrante do despudor da estação e nas tv´s aparecem os advogados dos arguidos a expôr a versão dos mesmos, sobre os factos, sem contraditório algum, muito menos de quem os entrevista. 

Finalmente aparece por exemplo este cada vez mais patarata Rui Rio a declarar urbi et orbi uma das suas obsessões como "político", falhado, neste caso e desejoso de controlar a investigação criminal a seu contento de economista cujo conhecimento constitucional fica pelo palpite avulso:


É isto informação?! 





quinta-feira, fevereiro 15, 2024

Caso Madeira: fiasco ou apenas fumaça?

 Depois de um juiz do TCIC, Jorge Bernardes de Melo, ter validado os indícios apresentados pelo MºPº, a propósito de factos relacionados com corrupção em instâncias políticas e empresariais da Madeira, o mesmo juiz autorizou buscas, incluindo domiciliárias e em departamentos do governo regional e caucionou as detenções operadas. 

Entre tais diligências e a decisão acerca das medidas de coacção aplicadas aos arguidos detidos, mediaram três semanas, durante as quais o mesmo juiz recusou alterar a situação processual dos arguidos detidos. 

Ontem, libertou-os todos, considerando de caminho que afinal não havia razão para as buscas e muito menos para as detenções efectuadas, ao afirmar no despacho sobre tais medidas que não só não havia indícios fortes da prática dos crimes imputados como nem sequer indícios existiam...

A decisão causa natural perplexidade e os habituais comentadores, com destaque para os advogados do processo, já se pronunciaram sobre tal despacho, sendo percepção geral da comunidade mediática que tal transmite ao público em geral que o Ministério Público averbou uma monumental derrota, um fiasco sem paralelo, a não ser no recente caso do Influencer, aliás com demasiadas semelhanças entre si.

O que se passa afinal? 

O inefável presidente da Associação sindical dos juízes, o ávido de exposição mediática Manuel Soares, já disse da sua justiça particular, assim, mostrando de que lado está neste assunto que recomenda toda a cautela e a mínima precipitação. Manuel Soares está do lado dos que estão contra o Ministério Público e a investigação criminal a este tipo particular de criminalidade. Provavelmente está do lado do juiz Bernardes, porque foi muito por sua causa que este género de juízes arribou ao TCIC e por isso este exercício cínico de exposição mediática, uma vez mais:


Luís Rosa, no Observador, também deu conta da sua perplexidade com a decisão, assim:










Como a PGR Lucília Gago, mais uma vez, resiste estoicamente a declarar seja o que for de relevante para o caso, uma vez que efectivamente pouco há a dizer de substancial e os magistrados do DCIAP ou mesmo o director estão mudos e quedos porque não lhes permitem outra postura nestes casos ( ao menos na Alemanha, o procurador responsável pelo caso Bruckner aparece na tv, fala abertamente e defende a sua posição, sem problema algum...) , aparece o director da PJ, Luís Neves a prestar declarações, quase assumindo o papel de dirigente da investigação criminal e titular do procedimento respectivo, o que não deixando de ser lamentável é afinal de contas o que se torna possível obter a este propósito...



O que dizer depois disto? Simplesmente que estou com o director da PJ quando leio que este figurão, advogado das dúzias de delinquentes excelentíssimos e ex-vogal do CSMP continua a esportular o seu indisfarçável e particular asco ao MºPº no exercício das suas funções:


O que pretendem os Magalhães e Silva que por aí pululam nas tv´s? Apenas a hubris, a confusão, o desmantelamento de um MºPº que consiga investigar a criminalidade político-económica. Neste caso, com a demissão da PGR para ser colocado no mesmo lugar alguém que lhes convenha, do género Pinto Monteiro...

O mesmo entendimento subido e oportuno tem este político falhado e marreta por feitio:


Por outro lado, veremos se este juiz Bernardes não é outro Ivo Rosa...ou seja, mais um juiz idiossincrático, com poder singular para se distinguir dos demais e capaz de feitos como o de ontem. Os advogados de entalados excelentíssimos adoram estes juízes. Quando estão do lado dos assistentes, execram-nos...

quarta-feira, fevereiro 14, 2024

Rádio fora do tempo

O jornal Intransmissível, reencarnação em formato semanário do jornal "i"  publicou esta semana uma reportagem alargada sobre o rádio em Portugal e um dos artigos, assinado por Sara Porto, foi dedicado aos "programas históricos", uma dezena deles, ao longo das décadas. 

A jornalista que não deverá ter ouvido nenhum desses programas, entreteu-se a fazer o jornalismo que lhe ensinaram: foi ouvir e ler relatos alheios sobre tais programas que nunca ouviu, consultou alguns livros ou a internet e escreveu o artigo que lhe pediram. Assim:







Como sou do tempo da maior parte dos programas elencados ( só dois deles- Companheiros da Alegria e Em Órbita, primeira fase de 1965 a 1969- não escutei no tempo próprio) vou dar o meu contributo para o óbulo com vários buracos factuais no artigo em causa. 

O primeiro programa citado, Pão com manteiga,  começou em 1980, da autoria principal de Carlos Cruz que aliás fala de tal programa no artigo ( embora em termos muito semelhantes aos que se podem ver aqui) e acompanhado de colaboradores como Bernardo Brito e Cunha ( o arranjador das músicas) e José Duarte, o dos 5 minutos de jazz e Mário Zambujal, do livrinho da Crónica dos Bons Malandros
Comecei por embirrar com o título que associava comida gordurosa a um programa de rádio. Segundo Carlos Cruz, citado no artigo, diz que como o programa era ao domingo de manhã, queriam associar o mesmo ao pequeno-almoço. Sendo assim, teria sido preferível  o nome de "pão tostado", já sem a dita e com uma eufonia bem mais catita.
Enfim, o teor do programa, demasiado idiossincrático para o meu gosto, como aqui se pode ouvir, nem sequer se aproveitava pela música, mesmo em Fm, com predomínio jazz-rock e fusão, julgando, salvo o erro que o indicativo era de Herbie Hancock, no primeiro tema, Chameleon, do disco Headhunters, de 1973, uma pequena estopada funk de baixo sintetizado por meios electrónicos e relativa novidade há 50 anos. 
O programa teve algum sucesso, com livrinhos editados com as tais temáticas idiossincráticas e mesmo com uma revistinha avulsa cujo interesse principal residia na profusão de ilustrações de vários desenhadores nacionais, já de renome, alguns deles, como Vasco ou António e Carlos Zíngaro, o Vaughn Bodé nacional, autor do desenho da capa do primeiro lp da Banda do Casaco, em finais de 1974, Dos benefícios de um vendido no reino dos bonifácios


O programa Quando o telefone toca, um clássico desses tempos gloriosos do rádio em Onda média, era programa a evitar e só escutado em audição forçada em ambiente alheio. A exposição do gosto popular dos pedintes de discos avulsos era demasiado pindérica para se ouvir regaladamente. 

O Rock em Stock, de finais dos anos setenta já pouco me interessava, mesmo com os "berros" do apresentador, pois a música popular dos anos oitenta, deixava-me muito a desejar relativamente à década anterior que ainda nem tinha ouvido na sua plenitude de discos perdidos num tempo em que não havia acesso aos mesmos e então passou a ser mais facilitado com o advento do cd.
Falhou no artigo a menção aos programas de rádio de um António Sérgio, esse sim, mais conhecedor da nata anglo-saxónica e menos da manteiga apresentada no tal Rock em Stock.

O programa que me traz a este comentário, porém, é o Página Um, cuja descrição é de tal modo pobre em referências que quem o não ouviu fica sem saber como era. 
Como o artigo do jornal começa a mencionar o cantor José Mário Branco, no caso do Página um quem ler o excerto fica a pensar que era um programa essencialmente de música portuguesa dos cantores progressistas da época, com alguns estrangeiros para compor o ramalhete. 
Aliás a fonte de informação privilegiada para a descrição é um sítio na net, denominado, Hypotheses, uma loca infecta de referências sociológicas sem eira nem beira, a não ser a esquerdista, da estirpe ISCTE e com factos errados. 
Assim, como "fait-diver"(sic) o programa não terminou exactamente em Fevereiro de 1975 como se escreve na loca infecta, porque se estendeu até ao início do Verão desse ano. O que sucedeu em Fevereiro de 1975 foi uma interrupção, por um par de meses,  por causa das greves da época que preparavam o PREC. 
O Página Um era um programa-farol ( "carro-chefe") muito devido a um conjunto de circunstâncias que se explicam melhor que no artigo em causa, desde modo:

Em primeiro lugar com uma citação de um dos seus locutores da época prè e pós 25 de Abril de 1974, Luís Filipe Paixão Martins, no seu livrinho "Tinha tudo para correr mal". 




 
Ou então para ainda melhor informação, uma passagem do livrinho  Biografia do ié-ié, de 2014, de Luís Pinheiro de Almeida, também citado no artigo,:



Ou então para completa informação acerca do conteúdo do programa, que ia muito para além da música baladeira, progressista e revolucionária nacional ou estrangeira, esta lista de músicas passadas nos últimos programas de Maio e Junho de 1975 e que mostram a predominância da música anglo-saxónica dos discos estrangeiros, alguns deles trazidos da Inglaterra por correspondentes do programa e que antecipavam em largos meses a divulgação por cá, em lp´s nacionais ou importados. O apontamento é dos dias do programa...


De resto, o enviesamento do artigo mostra-se bem no destaque dado ao despedimento de Adelino Gomes, ainda antes do 25 de Abril de 1974, por razões políticas ( o locutor aproveitava o microfone para divulgar mensagens ideologicamente comprometidas e de esquerda comprometida com o comunismo...)  mas não referir nada sobre o despedimento igualmente abusivo, segundo tal lógica, daquele Luís Filipe Paixão Martins, nas circunstâncias que o mesmo conta e ocorridas já em 1975: "despedido de braço no ar em plenário". De trabalhadores, entenda-se...e sem qualquer motivo, sequer ideológico.
É o que faz fiar-se em sítios aparentados ao ISCTE. 
O rádio e os programas elencados foram muito mais do que a descrição permite vislumbrar à distância de décadas e só ouvindo se poderia aquilatar sobre tal facto. 
Infelizmente, sobre tais programas há muitíssimo pouca informação disponível, seja por escrito em papel, seja na Net. 
Parece que quem os protagonizou os esqueceu ou nem quer lembrar e por isso as memórias por vezes são...inventadas. 

O Público activista e relapso