Observador:
O advogado e especialista em Direito Fiscal António Lobo Xavier disse esta quarta-feira no Funchal estar mais preocupado com “conluios entre instâncias judiciais, jornalistas e políticos” do que a eventual “ilicitude” de Passos Coelho como deputado entre 1995 e 1999.
“Já tenho anos suficientes na política, em Portugal, para não acreditar que isto é apenas uma coincidência”, começou por dizer à comunicação social, à margem de um seminário sobre “Competitividade Regional”, organizado pela Associação Comercial e Industrial do Funchal (ACIF).
Para Lobo Xavier, “os delitos fiscais cometidos por políticos, seja um primeiro-ministro, seja qualquer outra pessoa, são especialmente negativos não só por causa do acentuar dessa moralidade fiscal mas, sobretudo, porque se está num período de ajustamento em que são pedidos muitos sacrifícios às pessoas”.
Por isso considera que “seja um primeiro-ministro, seja quem for, deve ter a preocupação em ser transparente nesses rumores e nessas acusações e esclarecê-las de forma cabal”.
“Agora, do meu ponto de vista, há um aspeto muito negativo nesta questão, nós não podemos deixar de perceber que estas acusações ou estes rumores sobre eventuais delitos fiscais ligadas a figuras do PSD acontecem pouco depois de ter havido condenação de figuras do Partido Socialista”, recordou.
O fiscalista considera ser “lamentável que, num país, exista a possibilidade de algum modo instrumentalizar os segredos fiscais, os segredos dos processos para fazer compensações políticas desta natureza”.
“Obviamente os delitos fiscais ou de corrupção são iguais para todos qualquer que seja a sua origem ideológica mas temos a sensação, nós, cidadãos, que pode haver algum conluio entre instâncias judiciais, jornalistas e políticos, conluios que não percebemos, que não sabemos como atuam”, disse.
“É um fator de insegurança enorme e isso preocupa-me muito mais do que o delito fiscal em si”, concluiu.
De facto, o Antoninho Xavier tem razão: é uma chatice esta coisa de andar agora a vasculhar esqueletos nos armários arrumados dos políticos que temos, para os desconjuntar quando convém. Porém, atirar a culpa para uns conspiradores tenebrosos que se escondem nas fímbrias dos poderes de facto com estatuto democraticamente institucional- "instâncias judiciais, jornalistas e políticos"- é atirar ao lado e falhar os penáltis. Porque isto é um jogo, como já se percebeu há muito.
As pedradas aos telhados de vidro dos outros são lançadas agora, a poucos meses de eleições porque cada facção e cada partido desta democracia é assim que funciona. O mal, porém, não reside todo nessa actuação nefanda. O mal reside em quem dá azo às pedradas por ter telhados de vidro que não deveria ter.
Um político moderno sabe que não pode ter determinada espécie de vidro nos seus telhados, porque também anda a espiolhar o dos vizinhos para o mesmo efeito. E pretender que não venha a ser atingido quando estiver à mercê é estultícia de neófito. O Antoninho Xavier sabe disto muito bem, mas enfim, faz-se de ingénuo e procura defender o que mediaticamente é indefensável nos dias e costumes que correm.
O que acontece agora a Passos Coelho é clássico na política portuguesa de há umas décadas a esta parte. Por exemplo, em 1979, os sindicalistas bancários do PCP descobriram que Sá Carneiro e o irmão Ricardo poderiam estar em dívida "à banca" ( nacionalizada em 1975, mas com os factos anteriores ao 25 de Abril de 74) porque viram documentos que assim o permitiam concluir.
Esquecendo toda a alteração revolucionáriado PREC, em que fizeram as maiores tropelias de índole criminosa contra a nossa Economia, toparam a agulhinha no palheiro eleitoral e fizeram gala de a ir mostrando às pinguinhas no defunto diário estalinista do Partido, em notória violação criminosa do segredo bancário. Fizeram-no como se fosse uma verdadeira causa de interesse nacional e escreveram nas paredes "Sá Carneiro, caloteiro", porque sabiam que tal calava fundo em quem já não gostava do indivíduo. E eram muitos...
Os tribunais vieram a reconhecer que não existia dívida alguma que fosse cobrável e o assunto morreu com Sá Carneiro. Desde então o PCP passa por força política impoluta e mesmo quando se prova abuso de poder, corrupção e tráfico de influências, como sucedeu no caso da autarquia lisbonense a ajudar o Partido na sua festa anual, com disponibilização de meios públicos, isso é desvalorizado e rapidamente esquecido. O partido é tão, tão impoluto que até se acredita que não tenham gasto nunca, verbas proibidas recebidas por meios esconsos da antiga URSS e quiçá, em tempos mais recentes dos monopolistas da banca. Porém, não temos media para levantar estas lebres, reservadas para quem detém o poder executivo de facto. E portanto, no pasa nada.
Agora passa, claro que passa porque é o Passos, primeiro-ministro perigoso para as aspirações da clique das negociatas e dos partidos de esquerda comunista que aspiram ao poder. O Passos é quem fica na berlinda com a história da subvenção privada vinda dos finais do século passado. Porém é como se fosse hoje e o Público, com o denodado Cerejo e companhia, já andam em campanha como andaram no caso da licenciatura de José Sócrates, assimilando esforços em situações que em nada se assemelham mas que pretendem juntar para se reunir o agradável que é mudar de governo porque este, comos e fartam de dizer os comunistas, só nos empobrece.
E qual é o facto, portanto? Ser engenheiro falso numa câmara amiga, refazendo projectos inacreditáveis a troco de dinheiros não declarados? Não. Ser estudante de licenciatura em engenharia esconsa e com equivalências concedidas por amigo de amigos de negócios antigos, frequentando aulas que ninguém atestou com verdade documental e concluindo uma licenciatura a um Domingo, através de um exame via fax? Também não. Aproveitando um desaparecimento criminoso de uma ficha biográfica arquivada no Parlamento e que era potencialmente comprometedora, porque reveladora de uma falsificação? Ora, também não.
E isso chegou para apear um primeiro-ministro? Ora...claro que não. Era o que faltava.
Porém, agora, o Passos parece que terá recebido espórtula substancial e privada durante três anos do século passado em que deputou e acumulou. A duvida, única e agora levantada depois de esgotadas as demais hipóteses que incluiam mentir ao Parlamento, é saber se Passos declarou o IRS todo, nesses anos finais do século que passou há 14 anos. Passos nem sonhava ser o que hoje é ( tal como o outro, afinal) e se não declarou a espórtula lá o saberá dizer por que razão. Se é que sabe.
Quem é que nunca fugiu ao Fisco ladrão que temos? Os jornalistas moralistas que andam a investigar nunca fugiram pois não?
Isso agora não interessa nada. O que interessa é suscitar a dúvida sobre Passos para que a dúvida fique, se solidifique e o abata ao efectivo eleitoral daqui a uns meses.
É só isso que interessa e o Antoninho Xavier deveria saber que assim é e nada há a fazer. A não ser atirar pedras aos telhados dos outros. Que aliás são de vidro de janela de guilhotina e que quebram ao primeiro seixo.
Bora lá!
Em tempo: ainda iremos a tempo de ouvir o anterior primeiro-ministro no seu espaço privativo de opinião na RTP, concedido pela dupla Ponte-Ferreira, a mencionar este caso do Passos? Vai uma aposta?