Para escrever sobre música espanhola e italiana dos anos sessenta e setenta do século passado é preciso voltar atrás muito tempo.
No Portugal desse tempo e também nesses países a música popular que se produzia, ouvia e vendia era mais cosmopolita e eclética, porque não havia domínio quase absoluto, como hoje, da sonoridade produzida em estúdios anglo-saxónicos. Felizmente tal situação poderá desaparecer com a relativa facilidade em produzir música, actualmente e dá-la a conhecer via internet.
Nesse tempo, os espanhóis e italianos tinham os seus cantores que por cá se ouviam com muito proveito.
No final da década de sessenta alguns nomes mais conhecidos eram divulgados nos rádios, em discos pequenos e tinham êxitos ocasionais.
Para além do grupo alargado dos cançonetistas que emparelhavam por cá com as doses diárias de Roberto Carlos ou Maria da Fé e António Calvário e que davam por nomes como Los Bravos , Massiel ou Janette, ou cantavam La La La ou Un rayo de sol, havia outros que se ouviam doutro modo.
O Pop, em Portugal do inicio dos anos setenta era mais ou menos assim, como escrevia José Cid na Mundo da Canção nº 13 de Dezembro de 1970:
Em Espanha não era muito diferente. Entre os espanhóis, o tempo de Júlio Iglesias ainda não chegara com o Canto a Galicia, só aparecido em 1972 ( Mundo da Canção, Março de 1972).
Mas chegara o de um desconhecido Joaquin Diaz, cujas canções ainda hoje se ouvem com muito proveito. o You Tube mostra tudo. A imagem é de Dezembro de 1969
Outra figura da cantoria espanhola "de qualidade" era Joan Manuel Serrat cujo disco de 1971, Mediterraneo é um clássico, particularmente a cançoneta ( Nena) Que va a ser de ti...( lejos de casa)
Serrat era um cantor preferido da esquerda portuguesa que escrevia no Mundo da Canção. Talvez seja o autor espanhol que mais letras teve nesses anos de transição dos sessenta para os setenta.
Outro era Patxi Andión que até teve capa na edição de Abril de 1970:
E também Paco Ibañez, em Janeiro de 1970:
Ou Manolo Diaz e os Aguaviva, grupo vocal de grande categoria e que se poderia inserir na corrente folk progressista ( musicalmente). Os Aguaviva têm dois discos fundamentais da música popular espanhola, para além do primeiro: Poetas andaluces de ahora 8 1975) e Apocalipsis ( 1970):
Aqui uma reportagem de Outubro de 1970:
Para além desses, em 1970, Waldo de los Rios apresentou uma parte coral da 9ª Sinfonia de Beethoven, a Ode à Alegria em tom festivaleiro que fez um grande sucesso. Reincidiu depois com parte da sinfonia nº 40 de Mozart, na mesma tonalidade ligeira. Se há música que me lembre essa época com todos os toques de nostalgia é esta:
Ainda se ouvia o grupo Mocedades com o inolvidável Eres tu, em 1973. E pouco mais. Havia um grupo C.R.A.G. que julgo não se ouvia por cá, mas devia porque tem um tema, de 1974 que é de antologia:
Solo pienso em ti, romântica até mais não se poder ouvir ( e nos anos oitenta, ouvi vezes sem conta...):
Da Itália, muito para além das Gigliola Cinqueti vinham Sergio Endrigo, da casa que não tinha tecto nem tinha nada ou seobre a Arca de Noé, muito ouvida e já um clássico e Claudio Villa com uma canção à la crooner, sobre Il tuo Mondo. Tudo em 1970
Porém, o grande contributo da música italiana para o panorama português que o escutava nessa época reside noutro tipo de música que emparelha plenamente e por vezes com vantagem sobre os progs ingleses da época.
Alguns grupos aparecidos na primeira metade dos anos setenta são simplesmente fabulosos.
Arti+Mestieri, com discos como Un Giro di valzer per domani, de 1976, um dos melhores desse ano em toda a música popular.
Area e os discos Crac, de 1975 ou Arbeit Macht Frei, de 1973 ou Maledetti de 1976.
Premiata Forneria Marconi, com os discos Storia di un minuto de 1972 ou Photos of ghosts que contém o hit de 1973 Celebration que passava por cá no rádio e até servia de indicativo a programas:
E por fim Eugenio Finardi que em 1976 publicou o disco Sugo que contém a cançoneta La Radio que ouvi inúmeras vezes e tenho o disco em versão original italiana e nacional.
39 comentários:
obrigado
toda essa gente ainda me diz muito
Endrigo e Modugno já faleceram
Dorelli, Carosone, Rascel e tantos outros
a minha canção ligeira preferida é
malafemmena de Tottò
seguida de
my way, Mack the knife, As Time Goes By (A kiss is just a kiss)
'napoletanas'
2 anos a comer 'pastasciutta'
É incrível o seu arquivo. Guardou tudo ehehe
Lembro-me mas não guardei nada.
No entanto, por recordar canções italianas, há um autor mais antigo que nunca esqueci e ainda hoje oiço. O Renato Carosone. Ouvi essas músicas era pré-adolescente, na orquesta da piscina da Curia. Ao fim da tarde tocavam e havia bailarico.
Agora com o youtube recuperei também essas memórias dançantes. Pesquisei no google e só dei com isto .
O José apanhou mais tarde alguma edição posterior?
Ah, o Matusalem do Floribundus lembra-se do Carosone
eheheheh
Eu ainda era pré-lolita mas também me lembro e muito mais tarde voltei a ele para dançar. Porque lava a alma.
Malafemmena do Tottò?
eheheh
Eu sou maluca por esse género de napolitanas.
Devia ser mais quase-quase zazie que pré-lolita mas vai dar ao mesmo
Nenhum desses me diz alguma coisa ao ouvido, mas estou certo que gosto.
Estes que coloquei são as minhas referências de memória auditiva e de apontamentos de época.
Os Area, com Crac; ou os Arti+Mestieri são do meu tempo de ouvir no rádio.
O Giro di valzer per domani é um dos discos preferidos de 1976. Tenho aqui apontadinho, com o nº 16 numa lista de 21. E o Crac dos Area está em 10º
Os primeiros 5:
Neil Young- Zuma
Van der Graaf Generator- Still Life
Gentle Giant- Interview
King Crimsson- Greatest Hits
Led Zeppelin-Presence.
Boa lista.
No caso que referi nem me lembro de ouvir o próprio mas apenas as versões da orquesta da piscina. Só o descobri muito mais tarde e sempre para dançar.
O tu vuò fa l'americano é delicioso.
Essa é a música popular que ainda hoje gosto e tenho todos esses discos em versão original, agora.
As músicas de Neil Young tem dois ou três acordes mas são tocados de tal modo que parecem sinfonietas, para mim.
O José tem de correr tudo para encontrar as versões originais. Imagino.
Tem que ser para ficar convencido que não há melhor som. E não há, de facto.
A não ser um ou outro caso. Por exemplo, os discos dos Creedence Clearwater Revival foram agora prensados outra vez por uma empresa americana de nicho. A Analogue Productions.
Tenho dois originais do Pendulum, de 1970, um deles partido e arranjei agora o tal da prensagem moderna com cuidado extremo. Reconheço que fizeram um trabalho extraordinário e que prefiro ao original que tenho.
Parece que fizeram o mesmo aos discos dos Beach Boys.
Por exemplo, este disco de Eugenio Finardi, Sugo, de 1976, tenho-o na versão portuguesa da Valentim de Carvalho há muitos anos. Por causa de La Radio e outras.
Há uns tempos comprei a versão original da Cramps, italiana. A comparação arrasa aquele da VC no gira-discos que agora tenho. Mas anteriormente, nem por isso.
Que engraçado e espantoso como verifica tudo isso.
Dos italianos gostava de ouvir o Adriano Celentano.
Agora não passa nada de música italiana.
É engraçado que a língua italiana é muito musical.
Costumo ouvir no canal Cmusic cantores/cantoras anglo-saxonicos cantarem em italiano.
O grande salto qualitativo de J.M.Serrat dá-se quando ele interpreta António Machado ( opinião subjectivíssima,deixada à consideração do "dono da casa").
Quanto aos italianos, acrescentaria...uma italiana :Ornella Vanone ( creio que se escreve assim).
Mais um matusalânico, como podem ver...
Ornela Vanoni, lembro-me mas não reconheço se ouvir.
J.M. Serrat era um bom cantor e o disco Mediterraneo é um portento. Tão bom como os melhores portugueses da época. A poesia de António Machado era muito apreciada pela Esquerda e era por isso que Serrat tinha o caminho livre da propaganda toda.
Nota-se isso nas entrevistas e nos recortes que publiquei.
dos espanóis a minha preferência, além dos passodobles e dos gitanos da minha adolescência. era Manolo Diaz
ainda oiço España cañi
e baila me dos Gypsy
não referi Celentano, Nicola di Bari, Arturo Testa
Vanonne
Bravo
adoro a porca miseria de Napule e dos seus cantores
Santa Lucia Luntana
strada 'nfosa
Come facette mammete
Funiculì funiculà
O surdato innamorato
os gringos continuam a liquidar a Europa
Tuppe tuppe marescià (CLAUDIO VILLA)
Arrivederci Roma - Renato Rascel
Andion tinha classe
Lembro-me bem do Patxi Andion. Era pequeno mas lembro-me. Dos Poetas Andaluzes também. Davam na telefonia. O Paco & Banhas também; era um nome cómico, mas tenho de ir ouvi-lo a ver se me lembro. Nos anos 90 ouviram-se aí os Presuntos Implicados (outro nome cómico) e uma La Union que, salvo o Alzheimer, emparelhou por cá com os reininhos. Por essa altura também houve o Fratenóide, um italiano que me não lembra também o nome. Somada a Raffaella Carrà, cuido que seja tudo desde os anos 70.
Cumpts.
notícia triste
sismo violento destruiu parcialmente a cidade de Norcia (Núrsia para nós). terra Natal de São Bento, fundador dos Beneditinos e da ideia de Europa
e destruiu a sua basílica
um Amigo, falecido há muito, adoptou no Gol o nome símbólico de Bento de Núrsia
o secretário escreveu Múrcia na acta
devia estar a pensar que era nome de toureiro
Ahahah! A maçonaria é só coltura.
Foi ver. O Fratenóide chama-se Ramazzotti.
"Um mundo que recusa as estruturas e classes dominantes"
ehehe A esquerda antes de Abril, a propósito de Serrat.
Antonio Machado, melancolico
Nunca perseguí la gloria
ni dejar en la memoria
de los hombres mi canción:
yo amo los mundos sutiles,
ingrávidos y gentiles
como ponpas de jabón.
Me gusta verlos pintarse
de sol y grana, volar
bajo el cielo azul, temblar
súbitamente y quebrarse.
¿Para qué llamar caminos
a los surcos del azar?...
Todo el que camina anda,
como Jesus, sobre el mar.
A quien nos justifica nuestra desconfianza
llamamos enemigo, ladrón de una esperanza.
Jamás perdona el necio si ve la nuez vacía
que dio a cascar al diente de la sabiduría.
Nuestras horas son minutos
cuando esperamos saber,
y siglos cuando sabemos
lo que se puede aprender.
Ni vale nada el fruto
cogido sin sazón...
Ni aunque te elogie bruto ...
Mais uma data de coisas para ver...
Também conheço Vanoni, e tinha esperança de encontrar mais vozes femininas... Outra italiana que me despertou curiosidade foi Mina com Più di te.
Já agora, como falaram de Linda Ronstadt, ouvi muitas vezes em criança o Canciones de Mi Padre que, a quem não conheça, vale bem uma escutadela.
canção triste preferida de Rommel
cantada numa película de Rainer Werner Fassbinder, morto de sobredosagem de cocaína
Lilli Marleen
Vor der Kaserne
Vor dem grossen Tor
Stand eine Laterne
Und steht sie noch davor
So woll'n wir uns da wieder seh'n
Bei der Laterne wollen wir steh'n
Wie einst Lili Marleen
Isto passa tudo ao lado… boa dica a Analogue Productions, já vi lá uma série de coisas que gostava de ter (Beach Boys, sim, até para comparar com os CDs). Nada barato no entanto, mas já entendi que vale (deve ser como os filmes da Criterion).
Presuntos Implicados foi nos 80's por estes lados, não sei se sobreviveram para os 90's. -- JRF
Ouvi os Poetas andaluces de ahora dúzias de vezes.
Lembrei-me agora de outro grupo muito bom e que ouvia no final dos anos setenta, na Radio Popular de Vigo: Triana.
Obrigada, José.
Sim, os Triana têm algumas experiências muito boas. Exemplo:
https://www.youtube.com/watch?v=fpwr1namCh4
https://www.youtube.com/watch?v=Lo4k7W6Iowc
E o Silvio Rodríguez, embora seja cubano? Parece-me que tinha grande influência sobre os cantautores espanhóis.
Contemporâneos, há um de que gosto muito: Joaquín Sabina. Quando começou, ninguém o apreciava. Tem canções muito bonitas.
Outro caso, fugaz, por ter sido ceifado pela toxicodependência (Antonio Vega):
https://www.youtube.com/watch?v=HfM48F_p3Y4
Serrat cantou isto, mas gosto mais da versão de Vega.
https://www.youtube.com/watch?v=3vcvZvZg-rw
Borracho en un Cadillac.
Loquillo y los Trogloditas. O Rock dos anos 80 de nuestros hermanos, eh, eh...
E o catalão Raimon?
https://www.youtube.com/watch?v=5CU2cwQWlGk (a segunda canção neste vídeo é muito bonita). Letra aqui:
http://www.upv.es/contenidos/RAIMON/info/751378normalv.html
Ou este basco (Urko):
https://www.youtube.com/watch?v=hTGpDaTe42A
Silvio Rodriguez era outro muito passado na Radio Popular de Vigo.
E nos anos oitenta havia grupos de "rock espanhol" muito bons.
Lembro-me de um tema Hombe lobo em Paris, dos La Unión. Tenho o single, até.
As letras do Sabina são muito interessantes. Ele escreve, compõe, toca, etc.
talvez as versões do Youtube não sejam as melhores):
https://www.youtube.com/watch?v=aV_qpTDcIjc
https://www.youtube.com/watch?v=fyCmiBNsajs
https://www.youtube.com/watch?v=mDDImv-0JwQ
https://www.youtube.com/watch?v=U1GUEgYeFas
https://www.youtube.com/watch?v=AFThS53kYKo
https://www.youtube.com/watch?v=cVXprhSizZI
https://www.youtube.com/watch?v=AHVFj5eumfE&list=PLLwsu3eYWu6DEtc_OaB8aWV26uQcnNqFK
https://www.youtube.com/watch?v=cMVDvOasghc&list=PLLwsu3eYWu6DEtc_OaB8aWV26uQcnNqFK&index=5
É uma espécie de cantor das nossas misérias quotidianas e do modo de vida espanhol:
https://www.youtube.com/watch?v=P5GB2JTJrEg
https://www.youtube.com/watch?v=J3OtzDWBwOo
Infelizmente, está velhote e quase sem voz.
Desculpem qualquer coisinha. Abusei da caixa de comentários e da vossa paciência.
falámos da Ibéria latrina,
mas não da América
nos anos 50 os mexicanos Los Panchos
em Cuba a orquestra de Perez Prado
no distrito de Portalegre
ouvia-se Radio Andorra nos anos 40
não conheço o Finardi
o nome lembra-me finocchio ou occhio fino,
designação areibuida à paneleirada
Gigi d'Alessio
Teddy Reno
Perry como
Mario Lanza
os regresados de Calais
acampam nas ruas de Paris
Gigi d'Alessio
Teddy Reno
Perry como
Mario Lanza
Bravo Floribundus!, sem desprimor pelos gostos dos demais comentadores, muitos parabéns pelo seu gosto refinado:) Finalmente vejo que alguém aqui também aprecia aquele que foi para mim (e para muitos maestros, compositores, tenores, cantores, etc., do seu tempo e posteriores, o maior cantor/tenor da segunda metade do séc. XX.
O Floribundus menciona algumas canções e árias suas favoritas, suponho que interpetradas também por outros cantores. Mas olhe que Mario Lanza interpretou todas as que mencionou de um modo portentoso. Se conhece bem a voz dele, concordará comigo. Lanza tinha uma sonoridade e amplitude de voz que impressionava o mais distraído. E um timbre de extrema beleza bem como uma voz poderosíssima (Sinatra, seu admirador incondicional, disse uma vez que se as suas admiradoras desmaiavam ao ouví-lo cantar, o que fariam elas se ouvissem Lanza...). Alguns dos mais famosos compositores e maestros da altura (o grande Toscanini chegou a afirmar que tinha estado à espera, desde a morte de Caruso, de outra voz tão poderosa e bela), afirmaram sobre Lanza que a voz poderosíssima, aliada a uma clareza e uma dicção perfeitas, haviam sido o que o tornara famoso da noite para o dia. É bom lembrar que Lanza nasceu no mesmo dia em que Caruso morreu e várias décadas mediavam entre ambos, de modo que estes testemunhos de personalidades altamente qualificadas ligadas sobretudo ao canto lírico e à música clássica, emprestavam um significado de enorme importância sobre este fantástico tenor, que gravou também muitas canções de operetas famosas, de peças musicais e variadíssimas canções românticas e até ligeiras. A sua portentosa voz adaptava-se a todos os géneros musicais.
Floribundus, se tiver paciência e tempo aconselho-o a ver e a ouvir no youtube, pela voz de Lanza, pelo menos estas canções que citou e que reproduzo abaixo. São lindas de morrer. Estas e pràticamente todas as suas árias e canções românticas são de ouvir e de chorar por mais.
Santa Lucia Luntana
strada 'nfosa
Come facette mammete
Funiculì funiculà
O surdato innamorato
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